23/05/2020

LEITURA ESPIRITUAL


São João

Cap. I


1 No princípio existia o Verbo; o Verbo estava em Deus; e o Verbo era Deus. 2 No princípio Ele estava em Deus. 3 Por Ele é que tudo começou a existir; e sem Ele nada veio à existência. 4 Nele é que estava a Vida de tudo o que veio a existir. E a Vida era a Luz dos homens. 5 A Luz brilhou nas trevas, mas as trevas não a receberam. 6 Apareceu um homem, enviado por Deus, que se chamava João. 7 Este vinha como testemunha, para dar testemunho da Luz e todos crerem por meio dele. 8 Ele não era a Luz, mas vinha para dar testemunho da Luz. 9 O Verbo era a Luz verdadeira, que, ao vir ao mundo, a todo o homem ilumina. 10 Ele estava no mundo e por Ele o mundo veio à existência, mas o mundo não o reconheceu. 11 Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. 12 Mas, a quantos o receberam, aos que nele crêem, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. 13 Estes não nasceram de laços de sangue, nem de um impulso da carne, nem da vontade de um homem, mas sim de Deus. 14 E o Verbo fez-se homem e veio habitar connosco. E nós contemplámos a sua glória, a glória que possui como Filho Unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade. 15 João deu testemunho dele ao clamar: «Este era aquele de quem eu disse: ‘O que vem depois de mim passou-me à frente, porque existia antes de mim.’»      16 Sim, todos nós participamos da sua plenitude, recebendo graças sobre graças. 17 É que a Lei foi dada por Moisés, mas a graça e a verdade vieram-nos por Jesus Cristo. 18 A Deus jamais alguém o viu. O Filho Unigénito, que é Deus e está no seio do Pai, foi Ele quem o deu a conhecer. 19 Foi este o testemunho de João, quando os judeus lhe enviaram, de Jerusalém, sacerdotes e levitas, para lhe perguntarem: Tu quem és? 20 Ele confessou e não negou: Eu não sou o Messias – confessou. 21 Quem és então? – perguntaram-lhe: – És Elias? Não sou – respondeu ele. És o Profeta? Ele retorquiu: Não! 22 Disseram-lhe então: Quem és tu? É para darmos resposta aos que nos enviaram: Que dizes de ti mesmo? 23 Ele declarou: Sou a voz de um que brada no deserto: ‘Endireitai o caminho do Senhor’. Como disse o profeta Isaías. 24 Tinham sido enviados alguns dos Fariseus. 25 Interrogaram-no eles nestes termos: Então porque é que baptizas, se não és o Messias, nem Elias nem o Profeta? 26 Respondeu-lhes João dizendo: Eu baptizo em água; mas no meio de vós se encontra quem vós não conheceis. 27 Aquele que vem depois de mim; a quem eu não sou digno de desatar as correias das sandálias. 28 Deram-se estes factos em Betânia, além-Jordão, onde João estava a baptizar. 29 No dia seguinte, vê este a Jesus, que vinha ter com ele, e diz: aí está o Cordeiro de Deus, que vai tira o pecado do mundo. 30 Era deste que eu dizia: Depois de mim vem um homem que passou à minha frente porque era antes de mim. 31 Eu não O conhecia, mas para Ele se manifestar a Israel é que eu vim baptizar em água. 32 João deu mais este testemunho: Eu, eu vi o Espírito que descia do Céu como uma pomba, e permaneceu sobre Ele. 33 E eu não O conhecia, mas quem me enviou a baptizar em água é que me disse: ‘Aquele sobre quem vires o Espírito descer e permanecer é o que baptiza no Espírito Santo’. 34 Ora eu vi e sou testemunha de que Ele é o Filho de Deus. 35 No dia seguinte, João encontrava-se de novo ali com dois dos seus discípulos. 36 Então, pondo o olhar em Jesus, que passava, disse: «Eis o Cordeiro de Deus!» 37 Ouvindo-o falar desta maneira, os dois discípulos seguiram Jesus. 38 Jesus voltou-se e, notando que eles o seguiam, perguntou-lhes: «Que pretendeis?» Eles disseram-lhe: «Rabi - que quer dizer Mestre - onde moras?» 39 Ele respondeu-lhes: «Vinde e vereis.» Foram, pois, e viram onde morava e ficaram com Ele nesse dia. Eram as quatro da tarde. 40 André, o irmão de Simão Pedro, era um dos dois que ouviram João e seguiram Jesus. 41 Encontrou primeiro o seu irmão Simão, e disse-lhe: «Encontrámos o Messias!» - que quer dizer Cristo. 42 E levou-o até Jesus. Fixando nele o olhar, Jesus disse-lhe: «Tu és Simão, o filho de João. Hás-de chamar-te Cefas» - que significa Pedra. 43 No dia seguinte, Jesus resolveu sair para a Galileia. Encontrou Filipe, e disse-lhe: «Segue-me!» 44 Filipe era de Betsaida, a cidade de André e de Pedro. 45 Filipe encontrou Natanael e disse-lhe: «Encontrámos aquele sobre quem escreveram Moisés, na Lei, e os Profetas: Jesus, filho de José de Nazaré.» 46 Então disse-lhe Natanael: «De Nazaré pode vir alguma coisa boa?» Filipe respondeu-lhe: «Vem e verás!» 47 Jesus viu Natanael, que vinha ao seu encontro, e disse dele: «Aí vem um verdadeiro israelita, em quem não há fingimento.» 48 Disse-lhe Natanael: «Donde me conheces?» Respondeu-lhe Jesus: «Antes de Filipe te chamar, Eu vi-te quando estavas debaixo da figueira!» 49 Respondeu Natanael: «Rabi, Tu és o Filho de Deus! Tu és o Rei de Israel!» 50 Retorquiu-lhe Jesus: «Tu crês por Eu te ter dito: ‘Vi-te debaixo da figueira’? Hás-de ver coisas maiores do que estas!» 51 E acrescentou: «Em verdade, em verdade vos digo: vereis o Céu aberto e os anjos de Deus subindo e descendo por meio do Filho do Homem.»

Comentários:

O início do Evangelho escrito por São João sugere-me reflexões que vou “dividir” em 5 partes.

Parte 1 - Jesus Cristo: Considerando que conhecemos que Deus É Três Pessoas – a Santíssima Trindade – tal como nos foi revelado por Jesus Cristo, ficamos também a saber que Quem encarnou da Santíssima Virgem assumindo um corpo humano foi a Santíssima Trindade, já que sendo Deus Trino e Uno tudo quanto faz é assim assumido. Humanamente não podemos compreender como é isto possível, ou melhor, porque Jesus Cristo se refere ao Pai como se Seu Deus se tratasse. De facto quando o faz – reza, ou invoca, ou interpela como por exemplo na Cruz «porque me abandonaste?», - fá-lo como Jesus Cristo Homem, porque, de facto, Deus não reza nem Se interpela a Si Próprio. Esta “dupla” categoria de Jesus Cristo – Deus verdadeiro e homem verdadeiro (União hipostática) - não inpede que, umas vezes, actue como homem e, outras como Deus. Como é então possível? Só me ocorre uma pálida comparação: Sendo, eu, um homem e um cristão, não é concebível – ou melhor, aceitável – que umas vezes proceda como homem e outras como ho­mem cristão. Não estaria certo fundamentalmente porque sendo homem cristão, isto é, tendo recebido o Baptismo – que como sabemos imprime carácter indelével (não pode suprimir-se) – tudo quanto faço, penso, desejo ou quero, é assumido pela minha pessoa “completa”: Homem e Cristão. Mas, mais: Com a Sua Ressurreição, Jesus Cristo deu-me a categoria de Filho de Deus que é, também, indelével e para sempre. Mas, esta “categoria” foi dada a todos os homens pelo que, qualquer um – com Fé ou sem ela, Baptizado ou não – vive e actua, pensa, deseja e quer como Filho de Deus. Mas, mais ainda: Tenho uma alma que foi criada expressamente por Deus para a minha pessoa, tal como para todos os homens. A alma – que é o sopro da Vida – é a Imagem de Deus impressa – também indelevelmente – no ser humano, logo existe de facto – inde­pendentemente da vontade própria de cada um – uma como que au­têntica personalidade divina em cada um, em cada uma. Isto leva-me a pensar que quando erro, actuo mal, desejo o que não devo, não faço o que deveria fazer – que é lícito a Deus esperar de cada um – de acordo com as minhas capacidades, forças e potências, virtudes e defeitos, sou eu apenas – isto é, homem – que assim pro­cedo, porque eu divino não posso actuar desse modo.

Parte 2 - Família Divina: Quase sempre quando nos referimos à Santíssima Virgem lhe chama­mos “MÃE DE DEUS”, e embora por vezes também a invoquemos como “FILHA DE DEUS PAI, MÃE DE CRISTO, ESPOSA DO ES­PÍRITO SANTO”, a referência, digamos assim, que procede é: “MÃE DE DEUS”. Esta realidade vem “confirmar” a nossa qualidade de autênticos Filhos de Deus porque, sendo ela nossa Mãe a partir daquele entranhável momento no Gólgota (Cfr. Jo 19, 25-27), somos irmãos de Cristo o que “reforça” a nossa categoria de pertencermos – de facto – à Família Divina. Assim como um membro de uma família humana que tendo uma enti­dade própria possui também uma entidade familiar. Também esta situação é indelével, isto é, ninguém poderá jamais “apa­gar” a realidade de ter Pais, irmãos, etc. Sendo assim – como estou convicto que é – chego a uma conclusão: Qualquer ser humano nasce para a eternidade, porque embora, o corpo desapareça a sua alma continua viva para todo o sempre. “Estendendo” a conclusão mais além, posso afirmar que, eu, sou eterno? Então e se acredito que assim é, a minha vida ganha uma dimensão extraordinária que ultrapassa a minha compreensão porque, real­mente, não sei o que é a eternidade! Sei muito bem que Deus é eterno na verdadeira acepção da palavra: não conheceu princípio nem terá fim. Sendo assim, como de facto é, a minha “eternidade” não é comparável à de Deus já que houve um momento no tempo em que comecei a existir. De certa forma fica respondida a questão: não sou eterno! O que acontece é um bastante diferente e, por isso mesmo, mais ex­traordinário: Deus deu-me vida para sempre! Ele que é o «Deus dos vivos e não dos mortos» (Cfr. Mt 22, 32), quer que viva para sempre com Ele, essa foi a verdadeira razão para me dar a vida. Às vezes pergunto-me – sob o efeito da saudade, da “pressão” da au­sência de quem me era tão querido – para que quer o Senhor que eu viva? (Claro que me refiro a esta vida terrena que tanto me custa viver.) E dizem-me – e eu compreendo e entendo – que tenho de viver para ter acesso à “vida verdadeira”, aquela porque anseio. E, nesta ânsia de viver a “vida verdadeira”, pergunto-me também: Pode desejar-se a morte? Estou dividido na resposta porque penso que esta depende muito das circunstâncias mas, de facto, só me ocorre uma em que esse desejo se pode aceitar e que é: morrer em vez de pecar mortalmente. Se o pecado mortal traz consigo a morte da alma porque corta de forma abrupta a relação com Deus, que, definitivamente é o pior que pode acontecer, então talvez se justifique desejar que o Senhor conceda a graça de uma morte na segurança da Vida Eterna. Neste caso talvez não se deva chamar "desejo de morrer" mas sim ânsia de salvação. (ama, reflexões, 2014.11.23).

Parte 3 - A Plenitude: “Plenitude” tem significados como: Totalidade; Integridade. Por isso, no episódio da “sarça-ardente” (Cfr. Ex 3, 2-6), Deus explica a Moisés: O meu nome é: «Eu Sou». Jesus Cristo repetirá exactamente as mesmas palavras (Cfr. por ex. Jo 8, 24) e alguma vez com uma advertência solene: «Por isso Eu vos disse que morreríeis nos vossos pecados; sim, se não crerdes que “Eu sou”, morrereis nos vossos pecados» (Cfr. Jo 8, 24). Dado o que atrás disse poderemos nós, criaturas, membros da Família divina, dizer o mesmo: ‘Eu Sou’? Evidentemente não! Mas, pode argumentar-se: sendo da Família divina não é verdade que somos Deus? O próprio Jesus Cristo afirmou: «Vós sois deuses(Cfr. Jo 10, 34) A resposta não é fácil de argumentar, mas se considerarmos a decla­ração de Jesus Cristo, verificaremos que Ele emprega o plural “Deu­ses”, e não o singular “Deus”. Por outras palavras não podemos ser “Deus”, apenas conseguiremos – se cumprirmos o que Ele espera de nós – parecer-nos com Ele. Bom… mas Jesus Cristo também afirmou: «Para que todos sejam um, como Tu, Pai, estás em Mim e Eu em Ti, para que também eles sejam um em Nós» (Cfr. Jo 17, 21) Parece-me claro que estas palavras de Jesus Cristo se referem à dese­jável unidade dos cristãos que, se de facto existir, se configura com a Unidade Divina, da Santíssima Trindade. Em breve parêntesis direi que nós os cristãos, devemos ter o cuidado de não cair no erro, infelizmente tão comum entre outras Igrejas - ou assim chamadas – de retirar do seu contexto palavras ou afirmações das Escrituras – inclusive proferidas pelo próprio Senhor Jesus Cristo – para justificar conceitos próprios ou para fins não de todo aceitáveis.

Parte 4 - A Palavra: «O Verbo era Deus» diz o Evangelista logo no início do Evangelho que escreveu. Verbo e Palavra são sinónimos, como sabemos, e ambos se aplicam a Deus Uno e Trino. Parece-me lógico! A palavra é a expressão mais concreta que se pode ter quando se quer comunicar algo. Deus não criou o homem por um “capricho” adrede ou para satisfação de alguma necessidade; Ele não precisa de coisa nenhuma e, neste caso, não necessita do homem para nada. Então? O “responsável” pela criação do homem foi o Amor Imenso, Absoluto de Deus que, encontrou na criação da humanidade como que uma ex­tensão desse mesmo Amor: ter o que amar, neste caso, o homem. Como poderia deixar de FALAR com o objecto do Seu Amor? Como não fazer tudo para que esse objecto do Seu Amor tivesse pos­sibilidades de O amar também, considerando que só amando-o poderia ser totalmente feliz? O Senhor, então, fala ao homem, constantemente, sem descanso e como em certa altura da história da criação o homem já não escutava – ou entendia correctamente – o que Ele lhe comunicava vem Ele pró­prio ter com o homem – fazendo-se homem – comunicar de viva voz o que quer que o homem saiba, o que o homem necessita saber. Jesus Cristo é A Palavra, O Verbo em Pessoa Verdadeira e Concreta que fala, discursa, explica, ensina, urge a que O escutem. Ciente disto mesmo, São Pedro dirá: «A quem iremos, Senhor, Tu tens palavras de vida eterna» (Cfr. Jo 6, 68). Escutar a Palavra é ouvir o próprio Deus a falar, fazer o que Ele diz, é cumprir a Sua Vontade; cumprir a Sua Vontade é assegurar – a única forma – a Vida Eterna.


Parte 5 - A Luz: Alguma vez Jesus Cristo chamou-nos «filhos da luz»! (Cfr. Jo 12, 36) dando como que uma indicação de como o poderemos ser: «Enquanto tendes a luz, crede na luz» (Cfr. Jo 12, 36). Que luz é esta? Exactamente a luz de que fala o Evangelista: (Cfr. Jo 1, 4-9) Jesus Cristo é a Luz por excelência! Jesus Cristo é a vida verdadeira! A luz, portanto, é a vida, como aliás o Apóstolo atesta. O Baptismo concede a Vida Verdadeira – simbolizada na água - que é a Vida em Deus, logo dá a Luz – aliás identificada na vela que os pa­drinhos apresentam ao baptizando. Noutro breve parêntesis cabe perguntar se alguma vez nos interroga­mos porquê os pintores colocam uma auréola de luz envolvendo a ca­beça dos Santos, da Santíssima Virgem, das figuras celestes… Pensamos que esta auréola assinala a santidade do retratado na pin­tura. Talvez… mas, eu, creio que a realidade, quer dizer exactamente, que essa santidade era tão grande que a luz própria do retratado se tornava visível. A Escritura fala-nos algumas vezes de pessoas cujo estreito contacto com Deus por vezes lhes fazia resplandecer tal luminosidade no rosto que era difícil fixá-lo. Podemos referir, por exemplo, Moisés, mas, na história recente da Igreja também revela outros casos como São Filipe de Néri, o Santo Padre Pio de Peltrecina, São João Maria Vianey. Quer dizer: esse “estreito contacto com Deus” traduz-se numa santi­dade pessoal cuja luz resplandece. Caminhar na Luz – sempre preferível que andar na escuridão – é seguir Cristo: A LUZ! «Eu sou a luz do mundo; quem Me segue não anda nas trevas, mas terá a luz da vida». (Cfr. Jo 8, 12) Outra vez a Luz e a Vida que, para Jesus Cristo, são sinónimos, ou por outras palavras: sem Luz – a Luz de Cristo – não há vida, a única vida que vale a pena viver! Algumas vezes pode acontecer que a nossa alma se sinta como que envolta em escuridão o que acontece, principalmente, quando sucum­bimos à tentação e nos deixamos levar por e para onde não devemos. É uma situação a que urgentemente se tem de pôr cobro porque, per­manecer na escuridão, é o mesmo que estar morto, não ter vida. E o remédio, a solução, está claramente indicada pela Fé: ir ter com Jesus! Junto ao sacrário das Igrejas deste mundo existe sempre uma pequena luz acesa que nos lembra exactamente que, ali, naquele pequeno ce­náculo, escondido, inerme e humildissimamente expectante, está a “Luz do Mundo”, a “Vida”! É com enorme dor que a Santa Igreja constata que tantos dos seus filhos se afastam, se deixam corromper por falsas e insidiosas promessas, por desleixo ou incúria e não usam com a frequência necessária – e re­comendável – desse maravilhoso instrumento que lhes coloca à dispo­sição: o Sacramento da Confissão Sacramental. Com efeito, poderíamos apelidá-lo de “Sacramento da Luz” porque exactamente, pelo poder que lhe foi transmitido pelo próprio Jesus Cristo seu Chefe e Cabeça, restitui à Luz aquele que a tenha perdido. Por isso, penso, que um dos maiores actos de caridade – misericórdia – que possamos praticar com o nosso próximo é exactamente esse apostolado da Confissão! Penso em tantos e tantas que morrem sem que alguém – movido, tal­vez por uma “falsa piedade” de “não ferir susceptibilidades” – lhes fale desse extraordinário bem e, não menos, extraordinária graça de se confessar na previsão da morte eminente. Tenho a certeza que não me engano se afirmar que quem tendo podido fazê-lo não o fez comete uma falta grave de que terá de dar estreitas contas. Até há poucos anos a filmologia nomeadamente norte-americana, apresentava sempre um sacerdote acompanhando os condenados à morte nos seus últimos momentos antes da execução. (Não sei se ainda hoje sucede…). Como experiência pessoal posso referir companheiros meus que, so­frendo nas vascas da agonia pelos ferimentos mortais recebidos em combate, depois da Absolvição recebida do Capelão militar, apresen­tarem visivelmente um ar de serenidade e paz nos últimos momentos de vida. São João Paulo II alterou uma oração – com séculos de existência -muito querida dos cristãos: o Santo Rosário. Acrescentou, por assim dizer, mais um Terço dedicado à contemplação dos Mistérios Luminosos. O Santo Papa, de tão grata memória, terá entendido que à oração ma­riana, faltaria algo: Aos Mistérios Gozosos, Dolorosos e Gloriosos era conveniente acrescentar os Luminosos. Não sabemos, evidentemente, porque o terá feito, mas não me custa absolutamente admitir que a Santíssima Virgem não será alheia a essa inspiração que terá concedido ao “seu Papa”. Sim… “o seu Papa” tal como ele era dela: “Totus tuus” era o seu lema que, para grande alegria minha, tenho escrito pela sua própria mão numa “pagela” que recebi em Fátima em Treze de Maio de 1991 direc­tamente das mãos de outro grande santo, D. Alberto Cosme do Ama­ral, na altura Bispo de Leiria-Fátima, onde os seus restos repousam na Basílica. A Luz! A grande preocupação dos homens com lugares de mando é terem as ruas das áreas populacionais bem iluminadas para que as pessoas ve­jam bem por onde vão e, também, para afastar aqueles que preferem andar a coberto da escuridão. E, de facto, as pessoas sentem-se mais seguras e confortáveis porque caminham nas ruas iluminadas. Que conforto, então, sentirá quem caminha na Luz Verdadeira, a Luz de Cristo?  O caminho que os magos seguiram para encontrar o Menino Jesus foi indicado por uma luz, uma estrela que os conduziu com segurança desde muito longe até ao local exacto. E para terminar este comentário sirvo-me das palavras com que o Rv. Cónego António Ferreira os Santos terminou a sua homilia na Missa do Dia de Reis de 2016: “Vem Menino Jesus! Precisamos da Tua LUZ!” Quem não conhece esta cena entranhável que nos recorda o Nasci­mento do Salvador? Mesmo os que não celebram esta Festa ou que, por este ou aquele motivo, se colocam à margem sabem que hoje é Dia de Natal. Nunca mais, desde essa Santa Noite há três mil anos, esta história deixou de ser um marco da humanidade.

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