Tempo comum VII Semana |
Padroeiros do blog: SÃO PAULO; SÃO TOMÁS DE AQUINO; SÃO FILIPE DE NÉRI; SÃO JOSEMARIA ESCRIVÁ
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01/03/2014
Leitura espiritual para Mar 01
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
Evangelho: Lc 2, 21-40
21 Depois que se
completaram os oito dias para ser circuncidado o Menino, deram-Lhe o nome de
Jesus, como Lhe tinha chamado o anjo, antes que fosse concebido no ventre
materno. 22 Depois que se completaram os dias da purificação de
Maria, segundo a Lei de Moisés, levaram-n'O a Jerusalém para O apresentar ao
Senhor 23 segundo o que está escrito na Lei do Senhor: “Todo o varão
primogénito será consagrado ao Senhor”, 24 e para oferecerem em
sacrifício, conforme o que também está escrito na Lei do Senhor: “Um par de
rolas ou dois pombinhos”. 25 Havia então em Jerusalém um homem chamado
Simeão. Este homem era justo e piedoso; esperava a consolação de Israel, e o
Espírito Santo estava nele. 26 Tinha-lhe sido revelado pelo Espírito
Santo que não veria a morte sem ver primeiro o Cristo do Senhor. 27
Foi ao templo conduzido pelo Espírito. E, levando os pais o Menino Jesus, para
cumprirem as prescrições usuais da Lei a Seu respeito, 28 ele tomou-O
nos braços e louvou a Deus, dizendo: 29 «Agora, Senhor, podes deixar
o teu servo partir em paz segundo a Tua palavra; 30 porque os meus
olhos viram a Tua salvação, 31 que preparaste em favor de todos os
povos; 32 luz para iluminar as nações, e glória de Israel, Teu
povo». 33 O Seu pai e a Sua mãe estavam admirados das coisas que
d'Ele se diziam. 34 Simeão abençoou-os e disse a Maria, Sua mãe:
«Eis que este Menino está posto para ruína e ressurreição de muitos em Israel e
para ser sinal de contradição. 35 E uma espada trespassará a tua
alma. Assim se descobrirão os pensamentos escondidos nos corações de muitos». 36
Havia também uma profetisa, chamada Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Era
de idade muito avançada. Tinha vivido sete anos com o seu marido, após o seu
tempo de donzela, 37 e tinha permanecido viúva até aos oitenta e
quatro anos, e não se afastava do templo, servindo a Deus noite e dia com
jejuns e orações. 38 Ela também, vindo nesta mesma ocasião, louvava
a Deus e falava de Jesus a todos os de Jerusalém que esperavam a redenção. 39
Depois que cumpriram tudo, segundo o que mandava a Lei do Senhor, voltaram para
a Galileia, para a sua cidade de Nazaré. 40 O Menino crescia e
fortificava-Se, cheio de sabedoria, e a graça de Deus estava com Ele.
EXORTAÇÃO APOSTÓLICA
EVANGELII GAUDIUM
DO SANTO PADRE FRANCISCO
AO EPISCOPADO, AO CLERO ÀS PESSOAS CONSAGRADAS E AOS
FIÉIS LEIGOS
SOBRE
O ANÚNCIO DO EVANGELHO NO MUNDO ACTUAL
Capítulo
I
A TRANSFORMAÇÃO
MISSIONÁRIA DA IGREJA
1.
A Alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se
encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele são libertados do pecado,
da tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus Cristo, renasce sem
cessar a alegria. Quero, com esta Exortação, dirigir-me aos fiéis cristãos a
fim de os convidar para uma nova etapa evangelizadora marcada por esta alegria
e indicar caminhos para o percurso da Igreja nos próximos anos.
I.
Alegria que se renova e comunica
2.
O grande risco do mundo actual, com sua múltipla e avassaladora oferta de
consumo, é uma tristeza individualista que brota do coração comodista e
mesquinho, da busca desordenada de prazeres superficiais, da consciência
isolada. Quando a vida interior se fecha nos próprios interesses, deixa de
haver espaço para os outros, já não entram os pobres, já não se ouve a voz de
Deus, já não se goza da doce alegria do seu amor, nem fervilha o entusiasmo de
fazer o bem. Este é um risco, certo e permanente, que correm também os crentes.
Muitos caem nele, transformando-se em pessoas ressentidas, queixosas, sem vida.
Esta não é a escolha duma vida digna e plena, este não é o desígnio que Deus
tem para nós, esta não é a vida no Espírito que jorra do coração de Cristo
ressuscitado.
3.
Convido todo o cristão, em qualquer lugar e situação que se encontre, a renovar
hoje mesmo o seu encontro pessoal com Jesus Cristo ou, pelo menos, a tomar a
decisão de se deixar encontrar por Ele, de O procurar dia a dia sem cessar. Não
há motivo para alguém poder pensar que este convite não lhe diz respeito, já
que «da alegria trazida pelo Senhor ninguém é excluído» 1. Quem
arrisca, o Senhor não o desilude; e, quando alguém dá um pequeno passo em direcção
a Jesus, descobre que Ele já aguardava de braços abertos a sua chegada. Este é
o momento para dizer a Jesus Cristo: «Senhor, deixei-me enganar, de mil
maneiras fugi do vosso amor, mas aqui estou novamente para renovar a minha
aliança convosco. Preciso de Vós. Resgatai-me de novo, Senhor; aceitai-me mais
uma vez nos vossos braços redentores». Como nos faz bem voltar para Ele, quando
nos perdemos! Insisto uma vez mais: Deus nunca Se cansa de perdoar, somos nós
que nos cansamos de pedir a sua misericórdia. Aquele que nos convidou a perdoar
«setenta vezes sete» (Mt 18, 22) dá-nos o exemplo: Ele perdoa setenta vezes
sete. Volta uma vez e outra a carregar-nos aos seus ombros. Ninguém nos pode
tirar a dignidade que este amor infinito e inabalável nos confere. Ele
permite-nos levantar a cabeça e recomeçar, com uma ternura que nunca nos
defrauda e sempre nos pode restituir a alegria. Não fujamos da ressurreição de
Jesus; nunca nos demos por mortos, suceda o que suceder. Que nada possa mais do
que a sua vida que nos impele para diante!
4.
Os livros do Antigo Testamento preanunciaram a alegria da salvação, que havia
de tornar-se superabundante nos tempos messiânicos. O profeta Isaías dirige-se
ao Messias esperado, saudando-O com regozijo: «Multiplicaste a alegria,
aumentaste o júbilo» (9, 2). E anima os habitantes de Sião a recebê-Lo com
cânticos: «Exultai de alegria!» (12, 6). A quem já O avistara no horizonte, o
profeta convida-o a tornar-se mensageiro para os outros: «Sobe a um alto monte,
arauto de Sião! Grita com voz forte, arauto de Jerusalém» (40, 9). A criação
inteira participa nesta alegria da salvação: «Cantai, ó céus! Exulta de
alegria, ó terra! Rompei em exclamações, ó montes! Na verdade, o Senhor consola
o seu povo e se compadece dos desamparados» (49, 13).
Zacarias,
vendo o dia do Senhor, convida a vitoriar o Rei
que chega «humilde, montado num jumento»: «Exulta de alegria, filha de
Sião! Solta gritos de júbilo, filha de Jerusalém! Eis que o teu rei vem a ti.
Ele é justo e vitorioso» (9, 9). Mas o convite mais tocante talvez seja o do
profeta Sofonias, que nos mostra o próprio Deus como um centro irradiante de
festa e de alegria, que quer comunicar ao seu povo este júbilo salvífico.
Enche-me de vida reler este texto: «O Senhor, teu Deus, está no meio de ti como
poderoso salvador! Ele exulta de alegria por tua causa, pelo seu amor te
renovará. Ele dança e grita de alegria por tua causa» (3, 17).
É
a alegria que se vive no meio das pequenas coisas da vida quotidiana, como
resposta ao amoroso convite de Deus nosso Pai: «Meu filho, se tens com quê,
trata-te bem (...). Não te prives da felicidade presente» (Sir 14, 11.14).
Quanta ternura paterna se vislumbra por detrás destas palavras!
5.
O Evangelho, onde resplandece gloriosa a Cruz de Cristo, convida
insistentemente à alegria. Apenas alguns exemplos: «Alegra-te» é a saudação do
anjo a Maria (Lc 1, 28). A visita de Maria a Isabel faz com que João salte de
alegria no ventre de sua mãe (cf. Lc 1, 41). No seu cântico, Maria proclama: «O
meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador» (Lc 1, 47). E, quando Jesus
começa o seu ministério, João exclama: «Esta é a minha alegria! E tornou-se
completa!» (Jo 3, 29). O próprio Jesus «estremeceu de alegria sob a acção do
Espírito Santo» (Lc 10, 21). A sua mensagem é fonte de alegria: «Manifestei-vos
estas coisas, para que esteja em vós a minha alegria, e a vossa alegria seja
completa» (Jo 15, 11). A nossa alegria cristã brota da fonte do seu coração
transbordante. Ele promete aos seus discípulos: «Vós haveis de estar tristes,
mas a vossa tristeza há-de converter-se em alegria» (Jo 16, 20). E insiste: «Eu
hei-de ver-vos de novo! Então, o vosso coração há-de alegrar-se e ninguém vos
poderá tirar a vossa alegria» (Jo 16, 22). Depois, ao verem-No ressuscitado,
«encheram-se de alegria» (Jo 20, 20). O livro dos Actos dos Apóstolos conta
que, na primitiva comunidade, «tomavam o alimento com alegria» (2, 46). Por
onde passaram os discípulos, «houve grande alegria» (8, 8); e eles, no meio da
perseguição, «estavam cheios de alegria» (13, 52). Um eunuco, recém-baptizado,
«seguiu o seu caminho cheio de alegria» (8, 39); e o carcereiro «entregou-se,
com a família, à alegria de ter acreditado em Deus» (16, 34). Porque não
havemos de entrar, também nós, nesta torrente de alegria?
6.
Há cristãos que parecem ter escolhido viver uma Quaresma sem Páscoa. Reconheço,
porém, que a alegria não se vive da mesma maneira em todas as etapas e
circunstâncias da vida, por vezes muito duras. Adapta-se e transforma-se, mas
sempre permanece pelo menos como um feixe de luz que nasce da certeza pessoal
de, não obstante o contrário, sermos infinitamente amados. Compreendo as
pessoas que se vergam à tristeza por causa das graves dificuldades que têm de
suportar, mas aos poucos é preciso permitir que a alegria da fé comece a
despertar, como uma secreta mas firme confiança, mesmo no meio das piores
angústias: «A paz foi desterrada da minha alma, já nem sei o que é a felicidade
(…). Isto, porém, guardo no meu coração; por isso, mantenho a esperança. É que
a misericórdia do Senhor não acaba, não se esgota a sua compaixão. Cada manhã
ela se renova; é grande a tua fidelidade. (...) Bom é esperar em silêncio a
salvação do Senhor» (Lm 3, 17.21-23.26).
7.
A tentação apresenta-se, frequentemente, sob forma de desculpas e queixas, como
se tivesse de haver inúmeras condições para ser possível a alegria.
Habitualmente isto acontece, porque «a sociedade técnica teve a possibilidade
de multiplicar as ocasiões de prazer; no entanto ela encontra dificuldades
grandes no engendrar também a alegria». 2 Posso dizer que as
alegrias mais belas e espontâneas, que vi ao longo da minha vida, são as
alegrias de pessoas muito pobres que têm pouco a que se agarrar. Recordo também
a alegria genuína daqueles que, mesmo no meio de grandes compromissos profissionais,
souberam conservar um coração crente, generoso e simples. De várias maneiras,
estas alegrias bebem na fonte do amor maior, que é o de Deus, a nós manifestado
em Jesus Cristo. Não me cansarei de repetir estas palavras de Bento XVI que nos
levam ao centro do Evangelho: «Ao início do ser cristão, não há uma decisão
ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa
que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo». 3
8.
Somente graças a este encontro – ou reencontro – com o amor de Deus, que se
converte em amizade feliz, é que somos resgatados da nossa consciência isolada
e da auto-referencialidade. Chegamos a ser plenamente humanos, quando somos
mais do que humanos, quando permitimos a Deus que nos conduza para além de nós
mesmos a fim de alcançarmos o nosso ser mais verdadeiro. Aqui está a fonte da
acção evangelizadora. Porque, se alguém acolheu este amor que lhe devolve o
sentido da vida, como é que pode conter o desejo de o comunicar aos outros?
II.
A doce e reconfortante alegria de evangelizar
9.
O bem tende sempre a comunicar-se. Toda a experiência autêntica de verdade e de
beleza procura, por si mesma, a sua expansão; e qualquer pessoa que viva uma
libertação profunda adquire maior sensibilidade face às necessidades dos
outros. E, uma vez comunicado, o bem radica-se e desenvolve-se. Por isso, quem
deseja viver com dignidade e em plenitude, não tem outro caminho senão reconhecer
o outro e buscar o seu bem. Assim, não nos deveriam surpreender frases de São
Paulo como estas: «O amor de Cristo nos absorve completamente» (2 Cor 5, 14);
«ai de mim, se eu não evangelizar!» (1 Cor 9, 16).
10.
A proposta é viver a um nível superior, mas não com menor intensidade: «Na
doação, a vida se fortalece; e se enfraquece no comodismo e no isolamento. De
facto, os que mais desfrutam da vida são os que deixam a segurança da margem e
se apaixonam pela missão de comunicar a vida aos demais» 4. Quando a
Igreja faz apelo ao compromisso evangelizador, não faz mais do que indicar aos
cristãos o verdadeiro dinamismo da realização pessoal: «Aqui descobrimos outra
profunda lei da realidade: “A vida se alcança e amadurece à medida que é
entregue para dar vida aos outros”. Isto é, definitivamente, a missão» 5.
Consequentemente, um evangelizador não deveria ter constantemente uma cara de
funeral. Recuperemos e aumentemos o fervor de espírito, «a suave e
reconfortante alegria de evangelizar, mesmo quando for preciso semear com
lágrimas! (...) E que o mundo do nosso tempo, que procura ora na angústia ora
com esperança, possa receber a Boa Nova dos lábios, não de evangelizadores
tristes e descoroçoados, impacientes ou ansiosos, mas sim de ministros do
Evangelho cuja vida irradie fervor, pois foram quem recebeu primeiro em si a
alegria de Cristo» 6.
Uma
eterna novidade
11.
Um anúncio renovado proporciona aos crentes, mesmo tíbios ou não praticantes,
uma nova alegria na fé e uma fecundidade evangelizadora. Na realidade, o seu
centro e a sua essência são sempre o mesmo: o Deus que manifestou o seu amor
imenso em Cristo morto e ressuscitado. Ele torna os seus fiéis sempre novos;
ainda que sejam idosos, «renovam as suas forças. Têm asas como a águia, correm
sem se cansar, marcham sem desfalecer» (Is 40, 31). Cristo é a «Boa Nova de
valor eterno» (Ap 14, 6), sendo «o mesmo ontem, hoje e pelos séculos» (Heb 13,
8), mas a sua riqueza e a sua beleza são inesgotáveis. Ele é sempre jovem, e
fonte de constante novidade. A Igreja não cessa de se maravilhar com a
«profundidade de riqueza, de sabedoria e de ciência de Deus» (Rm 11, 33). São
João da Cruz dizia: «Esta espessura de sabedoria e ciência de Deus é tão
profunda e imensa, que, por mais que a alma saiba dela, sempre pode penetrá-la
mais profundamente». 7 Ou ainda, como afirmava Santo Ireneu: «Na sua
vinda, Cristo trouxe consigo toda a novidade». 8 Com a sua novidade,
Ele pode sempre renovar a nossa vida e a nossa comunidade, e a proposta cristã,
ainda que atravesse períodos obscuros e fraquezas eclesiais, nunca envelhece.
Jesus Cristo pode romper também os esquemas enfadonhos em que pretendemos
aprisioná-Lo, e surpreende-nos com a sua constante criatividade divina. Sempre
que procuramos voltar à fonte e recuperar o frescor original do Evangelho,
despontam novas estradas, métodos criativos, outras formas de expressão, sinais
mais eloquentes, palavras cheias de renovado significado para o mundo actual.
Na realidade, toda a acção evangelizadora autêntica é sempre «nova».
12.
Embora esta missão nos exija uma entrega generosa, seria um erro considerá-la
como uma heróica tarefa pessoal, dado que ela é, primariamente e acima de tudo
o que possamos sondar e compreender, obra de Deus. Jesus é «o primeiro e o
maior evangelizador». 9 Em qualquer forma de evangelização, o
primado é sempre de Deus, que quis chamar-nos para cooperar com Ele e
impelir-nos com a força do seu Espírito. A verdadeira novidade é aquela que o
próprio Deus misteriosamente quer produzir, aquela que Ele inspira, aquela que
Ele provoca, aquela que Ele orienta e acompanha de mil e uma maneiras. Em toda
a vida da Igreja, deve-se sempre manifestar que a iniciativa pertence a Deus,
«porque Ele nos amou primeiro» (1 Jo 4, 19) e é «só Deus que faz crescer» (1
Cor 3, 7). Esta convicção permite-nos manter a alegria no meio duma tarefa tão
exigente e desafiadora que ocupa inteiramente a nossa vida. Pede-nos tudo, mas
ao mesmo tempo dá-nos tudo.
13.
E também não deveremos entender a novidade desta missão como um
desenraizamento, como um esquecimento da história viva que nos acolhe e impele
para diante. A memória é uma dimensão da nossa fé, que, por analogia com a
memória de Israel, poderíamos chamar «deuteronómica». Jesus deixa-nos a
Eucaristia como memória quotidiana da Igreja, que nos introduz cada vez mais na
Páscoa (cf. Lc 22, 19). A alegria evangelizadora refulge sempre sobre o horizonte
da memória agradecida: é uma graça que precisamos de pedir. Os Apóstolos nunca
mais esqueceram o momento em que Jesus lhes tocou o coração: «Eram as quatro
horas da tarde» (Jo 1, 39). A memória faz-nos presente, juntamente com Jesus,
uma verdadeira «nuvem de testemunhas» (Heb 12, 1). De entre elas, distinguem-se
algumas pessoas que incidiram de maneira especial para fazer germinar a nossa
alegria crente: «Recordai-vos dos vossos guias, que vos pregaram a palavra de
Deus» (Heb 13, 7). Às vezes, trata-se de pessoas simples e próximas de nós, que
nos iniciaram na vida da fé: «Trago à memória a tua fé sem fingimento, que se
encontrava já na tua avó Lóide e na tua mãe Eunice» (2 Tm 1, 5). O crente é,
fundamentalmente, «uma pessoa que faz memória».
________________________________
Notas:
1
Paulo VI, Exort. ap. Gaudete in Domino (9 de Maio de 1975), 22: AAS 67 (1975),
297.
2 Ibid., 8: o. c., 292.
3 Carta enc. Deus
caritas est (25 de Dezembro de 2005), 1: AAS 98 (2006), 217.
4V
Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe, Documento de
Aparecida (29 de Junho de 2007), 360.
5 Ibid., 360.
6 Paulo VI, Exort. ap. Evangelii
nuntiandi (8 de Dezembro de 1975), 80: AAS 68 (1976), 75.
7
Cântico espiritual, 36, 10.
8
Adversus haereses, IV, 34, 1: PG 7, 1083: «Omnem novitatem attulit, semetipsum
afferens».
9
Paulo VI, Exort. ap. Evangelii nuntiandi (8 de Dezembro de 1975), 7: AAS 68
(1976), 9.
Tratado dos vícios e pecados 26
Em
seguida devemos tratar do sujeito dos vícios ou dos pecados. E sobre esta
questão discutem-se dez artigos:
Art.
1 ― Se a vontade pode ser sujeito do pecado.
Art.
2 ― Se só a vontade é sujeito do pecado.
Art.
3 ― Se na sensualidade pode haver pecado.
Art.
4 ― Se na sensualidade pode haver pecado mortal.
Art.
5 ― Se o pecado pode existir na razão.
Art.
6 ― Se o pecado da deleitação morosa reside na razão.
Art.
7 ― Se o pecado do consentimento no acto reside na razão superior.
Art.
8 ― Se o consentimento na deleitação é pecado mortal.
Art.
9 ― Se na razão superior, enquanto directiva das potências inferiores, i. é,
enquanto consente no acto do pecado, pode haver pecado venial.
Art.
10 – Se na razão superior, como tal, i. é, enquanto contempla as razões
eternas, pode haver pecado venial.
Art. 1 ― Se a vontade pode
ser sujeito do pecado.
O
primeiro discute-se assim. ― Parece que a vontade não pode ser sujeito do
pecado.
1.
― Pois, como diz Dionísio, o mal é contrário à vontade e à intenção 1.
Ora, o pecado constitui um mal. Logo, não pode existir na vontade.
2.
Demais. ― A vontade busca o bem ou a aparência dele. Ora, querendo o bem, não
peca, e o querer o bem aparente, que não é verdadeiramente bem, pertence a uma
deficiência, antes, da virtude apreensiva, que da vontade. Logo, nesta o pecado
de nenhum modo existe.
3.
Demais. ― Não se pode identificar o sujeito e a causa eficiente do pecado,
porque a causa eficiente e a material não têm a mesma incidência, como diz
Aristóteles 2. Ora, a vontade é causa eficiente do pecado, pois, no
dizer de Agostinho, a primeira causa do pecado é a vontade 3. Logo,
esta não é sujeito do mesmo.
Mas,
em contrário, diz Agostinho, que, pela vontade, pecamos e vivemos retamente 4.
Como já dissemos (q. 21, a. 1, q. 71, a. 1, 6), o pecado é um acto. Ora, há actos
transitivos para a matéria exterior, como queimar e cortar. E a matéria e o
sujeito desses é aquilo sobre o que recai a acção, assim, o Filósofo diz, que o
movimento é o acto do móvel, procedente do motor 5. Outros actos
porém não são transeuntes para a matéria exterior, mas permanecem no agente,
como desejar e conhecer, e esses são todos actos morais, quer sejam de
virtudes, quer de pecados. Donde e necessariamente, o sujeito próprio do acto
pecaminoso é a potência, que é princípio do mesmo. Ora, como é próprio dos actos
morais o serem voluntários, segundo já estabelecemos (q. 1, a. 1, q. 18, a. 6,
9), resulta que a vontade, princípio dos actos voluntários, bons ou maus, que
são os pecados, é princípio destes. Donde se conclui, que o pecado está na
vontade como no sujeito.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― Diz-se que o mal é contrário à vontade,
porque esta não tende para ele, como tal. Mas como há males que são bens
aparentes, a vontade deseja às vezes algum mal, e deste modo há mal nela.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― Se a deficiência da faculdade apreensiva de nenhum modo dependesse
da vontade, seguir-se-ia a não existência do pecado, nem nesta nem naquela,
como é o caso dos que laboram em ignorância invencível. Donde se conclui que
também a deficiência da faculdade apreensiva, dependente da vontade, contribui
para o pecado.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― A objecção colhe no atinente às causas eficientes, cujas acções,
transitivas para a matéria exterior, não se movem a si mesmas, mas a outros
móveis. Ora, o contrário dá-se com a vontade. Logo, a objecção não procede.
Revisão da tradução portuguesa por ama
_______________________________________
Notas:
1. De div. nom. (lect. XXII).
2.
II Physic. (lect. XI).
3.
De duabus animabus (c. X, XI).
4.
Lib. I Retract., cap. IX.
5. III Physic., lect. IV.
Reflectindo 8
Um
diálogo comigo mesmo!
Estranha
coisa!
Parece-me
uma perda de tempo, porque, na verdade, não se trata de um diálogo no
verdadeiro sentido do termo mas de um monólogo.
Desta
discussão será difícil surgir um vencedor. Que um prevaleça sobre o outro
parece-me quase impossível já que conheço em detalhe os argumentos de cada uma
das partes.
Pensando
um pouco melhor… resolvi continuar.
Perda
de tempo?
Não…
talvez conseguisse arranjar algo que justificasse este envolvimento em coisa
tão singular.
Argumentei
muito com a vida, as incidências do dia-a-dia, daquilo que acontece contra
todas as previsões, as dificuldades, os problemas, os entusiasmos e sonhos
caídos por terra, a conclusão, por vezes triste, de uma condição humana nada
agradável.
Não
entendo como é possível este ‘encarniçamento’ divino contra mim.
O
que é que Deus pretende?
Levar-me
ao limite das minhas forças, da minha compreensão, da minha capacidade de
aceitar?
Porque,
na verdade, parece-me que é isto que tem acontecido e, pior, parece-me que é
isto que vai continuar a acontecer só que, piorando e muito as coisas.
É
possível Deus ter-se enganado a meu respeito, achar que eu sou capaz, que
aguento, que “convenho” realmente aos Seus planos, sejam eles quais forem?
Que
qualidades terá encontrado – qualidades que eu não descubro – para Se
‘arriscar’ em tal aventura?
Dei
comigo a pensar na vida e na morte e, chego à conclusão que tenho mais medo da
vida que da morte.
Aliás,
da morte não tenho medo nenhum e, até, penso nela com frequência, não a
desejando mas… quase. Seria coisa cómoda, como disse S. Josemaria e, isso, é o
suficiente para que Deus a não queira, ainda, para mim.
Começo
a desenhar o percurso de há mais ou menos doze anos para cá e descubro,
atónito, como que um plano muito bem delineado para me levar onde estou agora.
As
promessas que não foram cumpridas por parte de pessoas em quem acreditei
cegamente, as expectativas goradas dia após dia, mês após mês, os enganos,
embustes, adiamentos o fazer de conta.
E… eu? O que fiz? Sou uma vítima pura e
simples?
Claro que sou uma vítima mas de mim
próprio. Não ter visto a realidade da vida, querer ser alguém que nunca poderia
ser, a vaidade, o orgulho, o protagonismo sempre desejado, o atordoamento com
fortunas passageiras, o malbaratar a vida, as oportunidades, os ensejos.
“Atiro” sempre para os lados quando o alvo
está aqui, neste metro e oitenta e tal de carne e ossos que por vezes se
esquece que é bastante mais que isso: Uma imagem, concreta, real, verdadeira do
Deus Criador e Senhor de todas as coisas!
Fui e sou, ‘o carpinteiro da minha cruz’. [1]
De facto, não
precisei de ajuda de ninguém, fiz tudo sozinho com aplicação e esmero tais que,
agora, nada mais me resta que pedir a Deus que a leve por mim que, eu, não
posso!
(ama, 2008.01.18) [2]
Dispostos a uma nova rectificação
Os teus parentes, os teus colegas, os teus amigos, vão notando a
diferença, e reparam que a tua mudança não é uma mudança passageira; que já não
és o mesmo. Não te preocupes. Para a frente! Cumpre o "vivit vero in me
Christus" – agora é Cristo quem vive em ti! (Sulco, 424)
Qui habitat in adiutorio Altissimi in protectione Dei coeli
commorabitur – Habitar sob a protecção de Deus, viver com Deus: eis a arriscada
segurança do cristão. É necessário convencermo-nos de que Deus nos ouve, de que
está sempre solícito por nós, e assim se encherá de paz o nosso coração. Mas
viver com Deus é indubitavelmente correr um risco, porque o Senhor não Se
contenta compartilhando; quer tudo. E aproximar-se d'Ele um pouco mais significa
estar disposto a uma nova rectificação, a escutar mais atentamente as suas
inspirações, os santos desejos que faz brotar na nossa alma, e a pô-los em
prática.
Desde a nossa primeira decisão consciente de viver integralmente a
doutrina de Cristo, é certo que avançámos muito pelo caminho da fidelidade à
sua Palavra. Mas não é verdade que restam ainda tantas coisas por fazer? Não é
verdade que resta, sobretudo, tanta soberba? É precisa, sem dúvida, uma outra
mudança, uma lealdade maior, uma humildade mais profunda, de modo, que,
diminuindo o nosso egoísmo, cresça em nós Cristo, pois illum oportet crescere,
me autem minui, é preciso que Ele cresça e que eu diminua.
Não é possível deixar-se ficar imóvel. É necessário avançar para a
meta que S. Paulo apontava: não sou eu quem vive; é Cristo que vive em mim. A
ambição é alta e nobilíssima: a identificação com Cristo, a santidade. Mas não
há outro caminho, se se deseja ser coerente com a vida divina que, pelo
Baptismo, Deus fez nascer nas nossas almas. O avanço é o progresso na
santidade; o retrocesso é negar-se ao desenvolvimento normal da vida cristã.
Porque o fogo do amor de Deus precisa de ser alimentado, de aumentar todos os
dias arreigando-se na alma; e o fogo mantém-se vivo queimando novas coisas. Por
isso, se não aumenta, está a caminho de se extinguir. (Cristo que Passa,
58)
Temas para meditar 29
Esperança
Dentre as virtudes que deixam um sulco
mais profundo no espírito humano, que
influem mais notoriamente sobre a vida e
a actuação dos homens, destaca-se a
virtude cristã, teologal, da esperança.
(SALVATORE CANALS, Ascética Meditada, Éfeso, nr.53)