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30/09/2014

Deus, que te criou sem ti, não te salvará sem ti

 Para que não o imites, copio de uma carta este exemplo de covardia: "Antes de mais, agradeço-lhe muito que se lembre de mim, porque necessito de muitas orações. Mas também lhe agradeço que, ao suplicar ao Senhor que me faça “apóstolo”, não se esforce em pedir-Lhe que me exija a entrega da liberdade". (Sulco, 11)

Precisamente por isso, percebo muito bem aquelas palavras do Bispo de Hipona (Santo Agostinho), que soam como um cântico maravilhoso à liberdade: Deus, que te criou sem ti, não te salvará sem ti, porque cada um de nós, tu, eu, temos sempre a possibilidade – a triste desventura – de nos levantarmos contra Deus, de rejeitá-lo –talvez só com a nossa conduta – ou de exclamar: não queremos que reine sobre nós . (...)
Queres pensar – pela minha parte também farei o meu exame – se manténs imutável e firme a tua escolha da Vida? Se, ao ouvires essa voz de Deus, amabilíssima, que te estimula à santidade, respondes livremente que sim? Dirijamos o olhar para o nosso Jesus, quando falava às multidões pelas cidades e campos da Palestina. Não pretende impor-se. Se queres ser perfeito..., diz ao jovem rico. Aquele rapaz rejeitou o convite e o Evangelho conta que abiit tristis , que se retirou entristecido. Por isso, alguma vez lhe chamei a ave triste: perdeu a alegria, porque se negou a entregar a liberdade a Deus. (Amigos de Deus, 23–24)


Temas para meditar - 252


Paciência


Em muitas ocasiões perguntamo-nos por que razão Deus não nos responde, por que Se fica calado, porque não faz imediatamente o que para nós é talvez evidente. Muitas vezes desejaríamos que Deus se mostrasse mais forte, que actuasse com mais força, que derrotasse de uma vez o mal e criasse um mundo melhor. Todavia, quando pretendemos organizar o mundo adoptando ou jogando o papel de Deus, o resultado é que, então, fazemos um mundo pior. Podemos e devemos influir para que o mundo melhore, mas sem esquecer nunca quem é o Senhor da história. Como assinalou Bento XVI, nós talvez soframos ante a paciência de Deus. Mas todos necessitamos da sua paciência. O mundo salva-se pelo Crucificado e não pelos crucificadores. O mundo é redimido pela paciência de Deus e destruído pela impaciência dos homens. 


(Alfonso Aguiló, interrogantes trad ama, 2010.05.20)  

Bento VXI – Pensamentos espirituais 18

Sentir como Jesus


O Cristo encarnado e humilhado pela morte mais infame, a morte de cruz, é proposto aos cristãos como modelos de vida. Com efeito, estes (…) devem ter «os mesmos sentimentos que estão em Cristo Jesus» (cfr. Fl 2, 5), sentimentos de humildade e doação, de desapego e de generosidade.

(Catequese da audiência geral (1.Jun.05)


(in “Bento XVI, Pensamentos Espirituais”, Lucerna 2006)

O Sagrado Coração de Jesus

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Desde sempre o coração foi visto e sentido, pelo homem, como a fonte do amor, o gerador dos sentimentos do homem.
É normal ouvir-se dizer que uma pessoa boa é uma pessoa de bom coração.
O coração é assim, (para além dos conceitos médico/científicos), o centro da vida do homem em tudo aquilo que ele vive física, emocional, sentimental e até espiritualmente.

Que dizer então do Coração do Homem perfeito, daquele que sendo Homem era Deus, e sendo Deus se fez Homem?
Que dizer do Coração de Jesus Cristo? 

É afinal o Coração de Deus, do Deus que se fez Homem, do Deus que quis ter coração como o coração dos homens.

Mas o Coração de Jesus, Coração de Deus, Coração do Homem, é:
Um Coração que “apenas” sabe amar.
Um Coração que “apenas” sabe querer.
Um Coração que “apenas” sabe acolher.
Um Coração tão grande e infinito que nele todos cabem: os que O amam, os que não O amam, os que O rejeitam, os que Lhe dedicam indiferença.


“Dou-te o meu coração”, dizemos nós, quando queremos mostrar o nosso amor por alguém. Mas é sempre, obviamente, uma afirmação simbólica, um desejo que nunca conseguimos cumprir na totalidade.

“Dou-te o meu Coração”, diz Jesus, e dá-O efectivamente, entrega-O, esgota-O, (embora Ele nunca se esgote), é enfim um desejo divino que se torna inteira e total realidade.

No Coração de Jesus encontramos o tudo da salvação, o amor e o perdão, o acolhimento e o envio, o divino e o humano, a vida agora e a vida para além da morte, a porta aberta de um Coração que não aprisiona, porque “apenas” ama, e o amor é sempre liberdade.

Sabemos bem que todos estamos no Coração de Deus!
A pergunta que nos devemos fazer é saber se nos nossos corações está também, por nossa vontade, o Sagrado Coração de Jesus.


Marinha Grande, 19 de Junho de 2014
Joaquim Mexia Alves


Nota: 
Texto publicado no “Grãos de Areia”, boletim mensal da paróquia da Marinha Grande.
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Evang., Coment. Leit. Espiritual (Enc. Auspiciam quaedam)

Tempo comum XXVI Semana

São Jerónimo – Doutor da Igreja

Evangelho: Lc 9, 51-56

51 Aconteceu que, aproximando-se o tempo da Sua partida deste mundo, dirigiu-Se resolutamente para Jerusalém, 52 e enviou adiante de Si mensageiros, que entraram numa aldeia de samaritanos para Lhe prepararem pousada. 53 Não O receberam, por dar mostras de que ia para Jerusalém. 54 Vendo isto, os Seus discípulos Tiago e João disseram: «Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu que os consuma?». 55 Ele, porém, voltando-Se para eles, repreendeu-os. 56 E foram para outra povoação.

Comentário:

Jesus Cristo deu aos Seus discípulos orientações precisas quanto ao que fazer quando não são recebidos nalgum local: procurar outros que estejam receptivos.
Assim no apostolado dos cristãos.
Com a orientação do director espiritual, procurar onde e quem espera pela Boa Nova do Reino de Deus.

(ama, comentário sobre Lc 9, 51-56, 2013.10.01)


Leitura espiritual


Documentos do Magistério

CARTA ENCÍCLICA
AUSPICIA QUAEDAM
DO SUMO PONTÍFICE PAPA PIO XII
AOS VENERÁVEIS IRMÃOS
PATRIARCAS, PRIMAZES, ARCEBISPOS, BISPOS
E DEMAIS ORDINÁRIOS LOCAIS
EM PAZ E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA

ORAÇÕES NO MÊS DE MAIO
PARA A CONCÓRDIA ENTRE AS NAÇÕES

1. Alguns indícios parecem hoje demonstrar claramente que toda a grande comunidade dos povos, após tantos excídios e devastações causados pela longa e terrível guerra, se orienta com ardor para os caminhos salutares da paz; e que no presente se ouve com melhor boa vontade os que se dedicam incansavelmente às obras de reconstrução, procuram acalmar e compor as discórdias e se propõem reconstruir tantas ruínas, do que aqueles que instigam contendas acerbas, ódios e rancores, dos quais não podem surgir senão novos e maiores danos.

2. Entretanto, bem que nós mesmos e o povo cristão tenhamos não leves motivos de consolação e possamos confortar-nos com a esperança de tempos melhores, não faltam todavia fatos e acontecimentos que acarretam grande preocupação e angústia à nossa alma paternal. Com efeito, não obstante a guerra tenha terminado quase por toda parte, a suspirada paz ainda não serenou as almas e os corações; pelo contrário, vemos ainda o céu toldar-se de nuvens ameaçadoras.

3. De nossa parte, não só não deixamos de nos esforçar, quanto nos seja possível, para afastar da família humana os perigos de outras calamidades que a ameaçam, mas, quando os meios humanos se revelam insuficientes, nos voltamos suplicantes a Deus, e exortamos ao mesmo tempo a todos os nossos filhos em Cristo, espalhados em todos os países da terra; a unirem-se a nós na impetração do auxílio divino.

4. Por esse motivo, como nos anos passados tivemos o conforto de dirigir nossa exortação a todos, e especialmente às crianças a nós tão queridas, afim de que durante o mês de maio cerrassem fileiras em torno do altar da grande Mãe de Deus, para implorar-lhe o término da funesta guerra, assim também hoje, por meio desta carta, convidamo-los ardentemente a não interromperem esse piedoso costume e a unirem às suas súplicas propósitos de renovação cristã e obras de salutar penitência.

5. Antes de tudo apresentem à Virgem Mãe de Deus e nossa Mãe benigníssima os mais vivos agradecimentos por ter alcançado com sua poderosa intercessão o tão almejado término da grande conflagração mundial, e pelos outros muitos benefícios alcançados do Altíssimo. Mas ao mesmo tempo implorem, com orações repetidas, que finalmente resplandeça como um dom do céu a paz mútua, fraterna e plena, entre todos os povos, e a suspirada concórdia entre todas as classes sociais.

6. Cessem as discórdias, que não trazem vantagem a ninguém; de acordo com a justiça, componham-se as contendas, que são freqüentemente origem de novas desventuras; cresçam e consolidem-se entre as nações as relações públicas e privadas; goze a religião, alimentadora de todas as virtudes, da liberdade que lhe é devida; e o pacífico trabalho humano, sob os auspícios da justiça e o bafejo divino da caridade, produza, para o bem de todos, os frutos mais abundantes.

7. Bem sabeis, veneráveis irmãos, que nossas orações são gratas a santíssima Virgem sobretudo quando não são vozes passageiras e vazias, mas refletem almas ornadas das necessárias virtudes. Esforçai-vos; portanto, com vosso zelo apostólico por que, às orações públicas elevadas ao céu durante o mês de maio, corresponda um renascimento da vida cristã. De fato, somente daí é lícito esperar que o curso dos fatos e dos acontecimentos, na vida tanto pública quanto privada, possa ser dirigido conforme a reta ordem, e que aos homens seja dado conquistar, com o auxílio de Deus, não só a prosperidade deste mundo, mas também a felicidade sem fim do céu.

8. Mas há no momento outro motivo particular que aflige e angustia vivamente nosso coração. É sabido que os lugares santos da Palestina já de há muito tempo são perturbados por acontecimentos lutuosos, e são quase todos os dias devastados por novos morticínios e ruínas. Entretanto, se há uma região no mundo que deve ser particularmente cara a toda alma civilizada, é de certo aquela donde nasceu para todos os povos, desde os mais remotos primórdios da história, tanta luz de verdade; na qual o Verbo de Deus encarnado mandou anunciar por coros de anjos a paz a todos os homens; e na qual, enfim, Jesus Cristo, suspenso ao madeiro da cruz, trouxe a salvação a todo o gênero humano, e estendendo os braços como que a convidar todos os povos a um amplexo fraterno, consagrou com a efusão de seu sangue o grande preceito da caridade.

9. Desejamos, portanto, veneráveis irmãos, que neste ano as orações do mês de maio tenham de um modo particular o fim de impetrar da santíssima Virgem que finalmente as coisas da Palestina sejam compostas com eqüidade, e que também lá triunfem felizmente a concórdia e a paz.

10. Nutrimos grande confiança no poderosíssimo patrocínio de nossa Mãe celestial; patrocínio que durante o mês a ela consagrado, especialmente as criancinhas inocentes impetrarão com uma santa cruzada de orações. E será vossa tarefa exortá-las e estimulá-las para tanto com toda a solicitude; e não só elas, mas também seus pais e suas mães, que também nisso devem precedê-las com o exemplo.

11. Sabendo que jamais apelamos em vão ao vosso zelo ardente, já nos parece ver multidões de crianças, de homens e de mulheres, encherem os templos para impetrar da virgem Mãe de Deus grande abundância de favores celestes.

12. Obtenha-nos a santíssima Virgem – que nos deu Jesus – que todos aqueles que se afastaram do caminho reto a ele voltem arrependidos; obtenha-nos nossa Mãe benigníssima – que em todos os perigos se mostrou sempre nosso valoroso auxílio e mediadora dos favores divinos – que também nas graves necessidades que hoje nos angustiam se componham os dissídios, e uma paz segura e livre resplandeça finalmente sobre a Igreja e sobre todas as nações.

13. Há poucos anos, como todos recordam, quando ainda enfurecia a recente guerra mundial, nós, vendo que os meios humanos se mostravam insuficientes e desproporcionados para extinguir a conflagração, voltamos nossas fervorosas preces ao misericordiosíssimo Redentor, interpondo o poderoso patrocínio do coração imaculado de Maria. E como o nosso predecessor de imortal memória Leão XIII, nos albores do século XX, quis consagrar todo o gênero humano ao sacratíssimo coração de Jesus, também nós, como que representando a família humana por ele redimida, quisemos solenemente consagrá-la ao coração imaculado de Maria virgem.

14. Desejamos que todos façam o mesmo, sempre que a oportunidade o aconselhar; e não só em cada diocese e cada paróquia, mas também em cada família. Assim esperamos que desta consagração particular e pública nasçam abundantes benefícios e favores celestiais. Seja presságio desses favores celestes e penhor de nossa benevolência paterna a bênção apostólica que damos com efusão de coração a cada um de vós, veneráveis irmãos, a todos aqueles que de boa mente corresponderem a esta nossa carta de exortação, e de um modo particular as caríssimas crianças.

Dado em Roma, junto de São Pedro, no primeiro dia de maio de 1948, X ano de nosso pontificado.

PIO PP. XII



29/09/2014

Senhor, tantas almas longe de Ti!

Vejo a tua Cruz, meu Jesus, e alegro-me com a tua graça, porque o prémio do teu Calvário foi para nós o Espírito Santo... E dás-te a mim, cada dia, amoroso – louco! – na Hóstia Santíssima... E fizeste-me filho de Deus e deste-me a tua Mãe! Não me basta a acção de graças; vai-se-me o pensamento: – Senhor, Senhor, tantas almas longe de Ti! Fomenta na tua vida as ânsias de apostolado, para que o conheçam..., e o amem..., e se sintam amados! (Forja, 27)

Que respeito, que veneração, que carinho temos de sentir por uma só alma, ante a realidade de que Deus a ama como algo seu! (Forja, 34)

Ante a aparente esterilidade do apostolado, assaltam-te as cristas de uma onda de desalento, que a tua fé repele com firmeza... Mas reparas que necessitas de mais fé, humilde, viva e operativa.
– Tu, que desejas a salvação das almas, grita como o pai daquele rapaz doente, possesso: "Domine, adiuva incredulitatem meam!" – Senhor, ajuda a minha incredulidade!
Não duvides: o milagre repetir-se-á. (Forja, 257)



Temas para meditar - 251


Liberdade



A liberdade torna novo o amor. A ela opõe-se a coacção, não a determinação que o Bem implica. Não se pode dizer, por exemplo, que uma mãe perdeu a liberdade porque, por amor aos seus filhos, fica em casa e não pode ir ao teatro com as amigas. A liberdade realiza-se plenamente no amor.


(Francisco Fernández carvajal e Pedro B. López, Filhos de Deus, DIEL, 1996, Nr. 130)

Evang., Coment. Leit. Espiritual (Enc. Immortale Dei)

Tempo comum XXVI Semana

S. Miguel, S. Gabriel, S. Rafael – Arcanjos

Evangelho: Jo 1, 47-51

47 Jesus viu Natanael, que vinha ter com Ele, e disse dele: «Eis um verdadeiro israelita em quem não há fingimento». 48 Natanael disse-lhe: «Donde me conheces?». Jesus respondeu-lhe: «Antes que Filipe te chamasse, Eu te vi, quando estavas debaixo da figueira». 49 Natanael respondeu: «Mestre, Tu és o Filho de Deus, Tu és o Rei de Israel». 50 Jesus respondeu-lhe: «Porque te disse que te vi debaixo da figueira, acreditas?; verás coisas maiores que esta». 51 E acrescentou: «Em verdade, em verdade vos digo, vereis o céu aberto e os anjos de Deus subir e descer sobre o Filho do Homem».

Comentário:

Aparentemente, Natanael não fica surpreendido com a revelação de Cristo: «Antes que Filipe te chamasse, Eu te vi, quando estavas debaixo da figueira», o que poderá parecer estranho já que revela um poder extraordinário.

Poderá atribuir-se este facto a que Natanael estivesse meditando sobre o que na Escritura se dizia a respeito do Messias e dos poderes que demonstraria?

Quando Jesus declara que no futuro Apóstolo «não há fingimento» quererá dizer exactamente isso, não tem de espantar-se com algo que já sabia pelas Escrituras e, além disso, não tem qualquer razão para duvidar do que Filipe lhe dissera. A “questão” de Jesus ser de Nazaré ficará logo “resolvida” com a afirmação do Senhor, logo, a sua decisão é célere e sem evasivas: «Tu és o Filho de Deus».

(ama, comentário sobre Jo 1, 45-51, 2013.01.05)

Leitura espiritual


Documentos do Magistério
CARTA ENCÍCLICA
IMMORTALE DEI
DO SUMO PONTIFÍCE PAPA LEÃO XIII
A TODOS OS NOSSOS VENERÁVEIS
IRMÃOS, OS PATRIARCAS, PRIMAZES, ARCEBISPOS
E BISPOS DO ORBE CATÓLICO,
EM GRAÇA E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA
SOBRE A CONSTITUIÇÃO CRISTÃ
DOS ESTADOS

49. Pelo contrário, liberdade verdadeira e desejável é a que, na ordem individual, não deixa o homem escravo nem dos erros, nem das paixões, que são os seus piores tiranos; e na ordem pública traça regras sábias aos cidadãos, facilita largamente o incremento do bem-estar e preserva do arbítrio de outrem a coisa pública.
Essa liberdade honesta e digna do homem, a Igreja aprova-a ao mais alto ponto, e, para garantir aos povos o firme e integral gozo dela, nunca cessou de lutar e de combater.

50. Sim, na verdade, tudo o que pode haver de salutar para o bem geral no Estado; tudo o que é útil para proteger o povo contra a licença dos príncipes que lhe não provêm ao bem; tudo o que impede as usurpações injustas do Estado sobre a comuna ou sobre a família; tudo o que interessa à honra, à personalidade humana e à salvaguarda dos direitos iguais de cada um; de tudo isso a Igreja Católica sempre tomou quer a iniciativa, quer o patrocínio, quer a protecção, como atestam os monumentos das idades precedentes.
Sempre coerente consigo mesma, se, de uma parte, dela repele uma liberdade imoderada que, para os indivíduos e para os povos, degenera em licença ou em escravidão, de outra parte abraça com todo o gosto os progressos que todo dia nascem, se verdadeiramente contribuem para a prosperidade desta vida, que é como um encaminhamento para a vida futura e para sempre duradoura.
Assim, pois, dizer que a Igreja vê com maus olhos as formas mais modernas dos sistemas políticos e repele em bloco todas as descobertas do génio contemporâneo, é uma calúnia vã e sem fundamento.
Sem dúvida, ela repudia as opiniões malsãs, reprova a inclinação perniciosa para a revolta, e mui particularmente essas predisposições dos espíritos em que já reponta a vontade de se afastar de Deus; mas, como tudo o que é verdadeiro não pode proceder senão de Deus, em tudo o que as investigações do espírito humano descobrem de verdade, a Igreja reconhece como que um vestígio da inteligência divina; e como não há nenhuma verdade natural que infirme a fé nas verdades divinamente reveladas, como há muitas que a confirmam, e como todo descobrimento da verdade pode levar a conhecer e a louvar ao próprio Deus, a Igreja acolherá sempre de bom grado e com alegria tudo o que contribuir para alargar a esfera das ciências; e, assim como sempre o fez para com as outras ciências, favorecerá e incentivará aquelas que tem por objecto o estudo da natureza.
Nesse género de estudos, a Igreja não se opõe a nenhuma descoberta do espírito; vê sem desprezar tantas investigações que tem por fim o prazer e o bem-estar; e, mesmo, inimiga nata da inércia e da preguiça, deseja grandemente que o exercício e a cultura façam o génio do homem dar frutos abundantes.
Ela tem incentivos para toda espécie de artes e indústrias, e, dirigindo pela sua virtude todas essas investigações para um fim honesto e salutar, aplica-se a impedir que a inteligência e a indústria do homem não o desviem de Deus e dos bens celestes.

51. Esta maneira de agir, todavia tão racional e tão sábia, é que é desacreditada nestes tempos em que os Estados não somente recusam conformar-se aos princípios da filosofia cristã, mas parecem querer afastar-se dela cada dia mais.
Não obstante, sendo próprio da luz irradiar por si mesma ao longe e penetrar aos poucos os espíritos dos homens, movidos como somos pela consciência das altíssimas e santíssimas obrigações da missão apostólica de que estamos investidos para com todos os povos, livremente proclamamos, consoante o Nosso dever, a verdade, não porque não levemos em nenhuma conta os tempos, ou julgamos dever proscrever os honestos e úteis progressos da Nossa idade; mas porque quereríamos ver os negócios públicos seguirem caminhos menos perigosos e repousarem em fundamentos mais sólidos, e isso deixando intacta a liberdade legítima dos povos; essa liberdade de que a verdade é entre os homens a fonte e a melhor salvaguarda: “A verdade vos libertará” (Jo 7, 32).

52. Se, pois, nessas conjunturas difíceis os católicos Nos escutarem, como é seu dever, saberão exactamente quais são os deveres de cada um na “teoria” como na “prática”.
Na teoria, primeiro, é necessário ater-se com decisão inabalável a tudo o que os Pontífices romanos têm ensinado ou ensinarem, e, todas as vezes que as circunstâncias o exigirem, fazer disso profissão pública.
Particularmente no que diz respeito às “liberdades modernas”, como lhes chamam, deve cada um ater-se ao julgamento da Sé Apostólica e conformar-se com suas decisões.
Cumpre resguardar-se de se deixar enganar pela honestidade especiosa dessas liberdades, e lembrar-se de que fontes elas emanam e por que espírito se propagam e se sustentam.
A experiência já tem feito suficientemente conhecer os resultados que elas têm tido para a sociedade, e o quanto os frutos que elas têm dado inspiram com toda razão pesares aos homens funestos e prudentes.
Se existe algures, ou pelo pensamento se imaginar um Estado que persiga disfarçada e tiranicamente o nome cristão, e se o confrontarmos com o género do governo moderno de que falamos, este último poderá parecer mais tolerável.
Certamente, os princípios em que este último se baseia são de tal natureza, como dissemos, que em si mesmo por ninguém devem ser aprovados.

53. Na prática, a cação pode exercer-se já nos negócios privados e domésticos, já nos negócios públicos.
Na ordem privada, o primeiro dever de cada um é de conformar exactamente a própria vida e os próprios costumes aos preceitos do Evangelho, e de não recuar ante o que a virtude cristã impõe de um pouco difícil de sofrer e aturar.
Todos devem, além disso, amar a Igreja como sua Mãe comum, obedecer às suas leis, prover à sua honra, salvaguardar-lhe os direitos, e tomar cuidado de que aqueles sobre os quais exercem alguma autoridade a respeitem e a amem com a mesma piedade filial.

54. À salvação pública importa ainda que os católicos emprestem sensatamente o seu concurso à administração dos negócios municipais e se apliquem sobretudo a fazer com que a autoridade pública atenda à educação religiosa e moral da juventude, como convém a cristãos: daí depende sobretudo a salvação da sociedade.
Será geralmente útil e louvável que os católicos estendam a sua acção além dos limites desse campo demasiado restrito, e se cheguem aos grandes cargos do Estado.
 “Geralmente”, dizemos, porque aqui os Nossos conselhos se dirigem a todas as nações.
Aliás, pode suceder algures que, por motivos os mais graves e os mais justos, absolutamente não seja conveniente participar dos negócios públicos seria tão repreensível como não trazer à utilidade comum nem desvelo nem concurso: tanto mais quanto, em virtude mesmo da doutrina que professam, os católicos são obrigados a cumprir esse dever com toda integridade e consciência.
Aliás. Abstendo-se eles, as rédeas do governo passarão sem contestação às mãos daqueles cujas opiniões certamente não oferecem grande esperança de salvação para o Estado.

55. Seria isso, ademais, pernicioso aos interesses cristãos, porque os inimigos da Igreja teriam todo o poder e os defensores dela, nenhum. Evidentemente é, pois, que os católicos têm justos motivos para participar da vida política; porquanto o fazem e o devem fazer não para aprovar aquilo que pode haver de censurável presentemente nas instituições políticas; porquanto o fazem e o devem fazer não para aprovar aquilo que pode haver de censurável presentemente nas instituições políticas, mas para tirar dessas próprias instituições, tanto quanto possível, o bem público sincero e verdadeiro, propondo-se infundir em todas as veias do Estado, como uma seiva e um sangue reparador, a virtude e a influência da religião católica.

56. Assim foi nas primeiras idades da Igreja.
Nada estava mais distanciado das máximas e costumes do Evangelho do que as máximas e costumes dos pagãos; viam-se, todavia, os cristãos, incorruptíveis em plena superstição e sempre semelhantes a si mesmos, entrarem corajosamente em toda parte onde se abria um acesso.
De uma fidelidade exemplar para com os príncipes e de uma obediência às leis do Estado tão perfeita como lhes era lícito, eles lançavam de toda parte um maravilhoso brilho de santidade, esforçavam-se por ser úteis a seus irmãos e por atrair os outros a seguirem Nosso Senhor, dispostos entretanto a ceder o lugar e a morrer corajosamente se não pudessem, sem vulnerar a sua consciência, conservar as honras as magistraturas e os cargos militares.
Desse modo, introduziram eles rapidamente as instituições cristãs não somente nos lares domésticos, mas nos acampamentos, na cúria, e até no palácio imperial.
“Somos apenas de ontem, e já enchemos tudo o que é vosso, vossas cidades, vossas ilhas, vossas fortalezas, vossos municípios, vossos conciliábulos, vossos próprios acampamentos, as tribos, as decúrias, o palácio, o senado, o fórum” (Tertull., Apol., n. 37).
Por isso, quando foi permitido professar publicamente o Evangelho, a fé cristã apareceu em grande número de cidades não em vagidos ainda, porém forte e já cheia de vigor.

57. Nos tempos em que estamos, há toda razão para renovar esses exemplos de nossos pais. 
Antes de tudo, é necessário que todos os católicos dignos deste nome se determinem a ser e mostrar-se filhos dedicados da Igreja; que repilam sem hesitar tudo o que seja incompatível com essa profissão; que se sirvam das instituições públicas, tanto quanto o puderem fazer em consciência, em proveito da verdade e da justiça; que trabalhem para que a liberdade não exceda o limite traçado pela lei natural e divina; que tomem a peito reconduzir toda constituição pública a essa forma cristã que havemos proposto para modelo.

58. Não é coisa fácil determinar um modo único e certo para realizar esses dados, visto ele dever convir a lugares e a tempos mui dispares entre si. Não obstante, cumpre antes de tudo conservar a concórdia das vontades e tender à uniformidade da acção.
Obter-se-á seguramente esse duplo resultado se cada um tomar como regra de conduta as prescrições da Sé Apostólica e a obediência aos bispos, que “o Espírito Santo estabeleceu para reger a Igreja de Deus” (At 20, 28).
A defesa do nome cristão reclama imperiosamente que o assentimento das doutrinas ensinadas pela Igreja seja da parte de todos unânime e constante, e, por este lado, cumpre resguardar-se ou de estar, no que quer que seja, de conivência com as falsas opiniões, ou de combatê-las mais molemente do que comporta a verdade.
Quanto às coisas sobre que se pode discutir livremente, será lícito discutir com moderação e no intuito de procurar a verdade, mas pondo de lado as suspeitas injustas e as acusações recíprocas.

59. Para este fim, no medo de que a união dos espíritos seja destruída por acusações temerárias, eis aqui o que todos devem admitir: a profissão íntegra da fé católica absolutamente incompatível com as opiniões que se aproximam do “racionalismo” e do “naturalismo”, e cujo capital é destruir completamente as instituições cristãs e estabelecer na sociedade a autoridade do homem em lugar da de Deus.
Não é, tão pouco, permitido ter duas maneira de proceder: uma em particular e outra em público, de modo a respeitar a autoridade da Igreja na vida privada e a rejeitá-la na vida pública; isso seria aliar juntos o bem e o mal e pôr o homem em luta consigo mesmo, quando, ao contrário, deve ele sempre ser coerente, e em nenhum género de vida ou de negócios afastar-se da virtude cristã.
Mas se se tratar de questões puramente políticas, do melhor género de governo, de tal ou tal sistema de administração civil, divergências honestas são lícitas.
A justiça não sobre, pois, que se criminem homens cuja piedade é aliás conhecida, e cuja mente é inteiramente disposta a aceitar docilmente as decisões da Santa Sé, por serem de opinião diferente sobre os pontos em questão.
Injustiça muito maior ainda seria suspeitar-lhes a fé ou acusá-los de traí-la, como mais de uma vez o havemos lamentado.
Seja esta lei imprescritível para os escritores e sobretudo para os jornalistas.

60. Numa luta em que os maiores interesses estão em jogo, não se deve deixar lugar algum às dissensões intestinas ou ao espírito de partido; mas, num acordo unânime dos espíritos e dos corações, todos devem perseguir o escopo comum, que é salvar os grandes interesses da religião e da sociedade.
Se, pois, no passado, tiveram lugar alguns dissentimentos, cumpre sepultá-los num sincero esquecimento; se alguma temeridade, se alguma injustiça foi cometida, seja qual for o culpado, cumpre tudo reparar por uma caridade recíproca tudo redimir por um comum assalto de deferências para com a Santa Sé.
Deste modo, obterão os católicos duas vantagens importantíssimas: a de ajudarem a Igreja a conservar e a propagar a doutrina cristã, e a de prestarem o serviço mais assinalado à sociedade, cuja salvação está fortemente comprometida pelas más doutrinas e pelas más paixões.

61. É isso, Veneráveis Irmãos, o que julgamos dever ensinar a todas as nações do orbe católico sobre a constituição cristã dos Estados e os deveres privados dos súditos.
Resta-Nos implorar por ardentes preces o socorro celeste, e suplicar a Deus fazer Ele próprio atingirem o termo desejado todos os Nossos desejos e todos os Nossos esforços para a sua glória e para a salvação do género humano, Ele que é só quem pode iluminar os espíritos e tocar os corações dos homens.
Como penhor das bênçãos divinas e em testemunho da Nossa paternal benevolência, damo-Vos na caridade do Senhor, Veneráveis Irmãos, a Vós bem como ao clero e ao povo inteiro confiado à Vossa guarda e à Vossa vigilância, a Bênção Apostólica.

Dado em Roma, em S. Pedro, a 1° de Novembro de 1885, oitavo ano do Nosso Pontificado.

LEÃO XIII, PAPA.







28/09/2014

Se te faltar afã apostólico, tornar-te-ás insípido

Como quer o Mestre, tu tens de ser – bem metido neste mundo, que nos coube em sorte, e em todas as actividades dos homens – sal e luz. Luz, que ilumina as inteligências e os corações; sal, que dá sabor e preserva da corrupção. Por isso, se te faltar afã apostólico, tornar-te-ás insípido e inútil, defraudarás os outros e a tua vida será um absurdo. (Forja, 22)

Muitos, com ar de autojustificação, perguntam-se: Eu, porque é que me vou meter na vida dos outros?
– Porque tens obrigação, por seres cristão, de te meteres na vida dos outros, para os servires!
Porque Cristo se meteu na tua vida e na minha! (Forja, 24)

Se fores outro Cristo, se te comportares como filho de Deus, onde estiveres queimarás: Cristo abrasa, não deixa indiferentes os corações. (Forja, 25)


Temas para meditar - 250


Perseverança



A maior ajuda na perseverança da vida espiritual é o hábito de oração, especialmente sob a direcção do nosso confessor.



(S. FILIPE DE NERI, Maxim’s, F.W.Faber, Cromwell Press SN12 8PH, nr. 20-19, trad ama)  

Evang., Coment. Leit. Espiritual (Enc. Immortale Dei)

Tempo comum XXVI Semana

Evangelho: Mt 21, 28-32

28 «Mas que vos parece? Um homem tinha dois filhos. Aproximando-se do primeiro, disse-lhe: “Filho, vai trabalhar hoje na minha vinha”. 29 Ele respondeu: “Não quero”. Mas, depois, arrependeu-se e foi. 30 Dirigindo-se em seguida ao outro, falou-lhe do mesmo modo. E ele respondeu: “Eu vou, senhor”, mas não foi. 31 Qual dos dois fez a vontade do pai?». Eles responderam: «O primeiro». Disse-lhes Jesus: «Na verdade vos digo que os publicanos e as meretrizes vos precederão no reino de Deus. 32 Porque veio a vós João pelo caminho da justiça, e não crestes nele; e os publicanos e as meretrizes creram nele. E vós, vendo isto, nem assim fizestes penitência depois, crendo nele.

Comentário:

Uma vez mais se verifica que os circunstantes entendem perfeitamente o que Jesus Cristo quer significar com as Suas palavras.

Assim, é justíssima a afirmação que faz: «E vós, vendo isto, nem assim fizestes penitência depois, crendo nele» e não se trata de o exemplo que dá ser sobre os «os publicanos e as meretrizes»  porque, noutra circunstância, aqueles a quem se dirige ficarem sem dar resposta porque tiveram medo do povo que considerava João um profeta.

(ama, comentário sobre Mt 21, 28-32, 2014.05.31)

Leitura espiritual


Documentos do Magistério

CARTA ENCÍCLICA
IMMORTALE DEI
DO SUMO PONTIFÍCE PAPA LEÃO XIII
A TODOS OS NOSSOS VENERÁVEIS
IRMÃOS, OS PATRIARCAS, PRIMAZES, ARCEBISPOS
E BISPOS DO ORBE CATÓLICO,
EM GRAÇA E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA
SOBRE A CONSTITUIÇÃO CRISTÃ
DOS ESTADOS

36. A simples razão natural demonstra o quanto se afasta da verdade esta maneira de entender o governo civil.
O testemunho dela, com efeito, basta para estabelecer que tudo o que há de autoridade entre os homens procede de Deus, como de uma fonte augusta e suprema.
Quanto à soberania do povo, que, sem levar em nenhuma conta a Deus, se diz residir por direito natural no povo, se ela é eminentemente própria para lisonjear e inflamar uma multidão de paixões, não assenta em nenhum fundamento sólido e não pode ter força bastante para garantir a segurança pública e a manutenção tranquila da ordem.
Com efeito, sob o império dessas doutrinas, os princípios cederam a ponto de, para muitos, ser uma lei imprescritível em direito político poder legitimamente levantar sedições.
Porquanto prevalece a opinião de que os chefes do governo são meros delegados encarregados de executar a vontade do povo: donde esta consequência necessária: que tudo pode igualmente mudar ao sabor do povo, e que sempre há a temer distúrbios.

37. Relativamente à religião, pensar que é indiferente tenha ela formas disparatadas e contrárias equivale simplesmente a não querer nem escolher nem seguir qualquer delas.
É o ateísmo menos o nome.
Efectivamente, quem quer que creia em Deus, se for consequentemente e não quer cair no absurdo, deve necessariamente admitir diferença, disparidade e oposição, mesmo sobre os pontos mais importantes, não podem ser todos igualmente bons, igualmente agradáveis a Deus.

38. Assim, também, a liberdade de pensar e publicar os próprios pensamentos, subtraída a toda regra, não é por si um bem de que a sociedade tenha que se felicitar; mas é antes a fonte e a origem de muitos males.
A liberdade, esse elemento de perfeição para o homem, deve aplicar-se ao que é verdadeiro e ao que é bom.
Ora, a essência do bem e da verdade não pode mudar ao sabor do homem, mas persiste sempre a mesma, e, não menos do que a natureza das coisas, é imutável.
Se a inteligência adere as opiniões falsas, se a vontade escolhe o mal e a ele se apega, nem uma nem outra atinge a sua perfeição, ambas decaem da sua dignidade nativa e se corrompem.
Não é, pois, permitido dar a lume e expor aos olhos dos homens o que é contrário à virtude e à verdade, e muito menos ainda colocar essa licença sob a tutela e a proteção das leis.
Não há senão um caminho para chegar ao céu, para o qual todos nós tendemos: é uma boa vida.
O Estado afasta-se, pois, das regras e prescrições da natureza se favorece a licença das opiniões e das ações culposas ao ponto de se poderem impunemente desviar os espíritos da verdade e as almas da virtude.

39. Quanto à Igreja, que o próprio Deus estabeleceu, excluí-la da vida pública, das leis, da educação da juventude, da sociedade doméstica, é um grande e pernicioso erro.
Uma sociedade sem religião não pode ser bem regulada; e, mais talvez do que fora mister, já se vê o que vale em si e nas suas consequências, essa pretensa moral civil.

40. A verdadeira mestra da juventude e a guardiã dos costumes é a Igreja de Cristo.
É ela quem conserva na sua integridade os princípios de onde emanam os deveres, e quem sugerindo os mais nobres motivos de bem viver, ordena não somente fugir às más acções, mas domar os movimentos da alma contrários à razão, ainda quando não se traduzem em acto.

41. Pretender sujeitar a Igreja ao poder civil no exercício do seu ministério é a um tempo uma grande injustiça e uma grande temeridade.
Por essa mesma razão, perturba-se a ordem, pois se dá lugar às coisas naturais sobre as coisas sobrenaturais; estanca-se, ou, certamente, se diminui muito o afluxo dos bens com que, se estivesse sem peias, a Igreja cumularia a sociedade; e, demais, abre-se a voz a ódios e a lutas cuja grande e funesta influência sobre ambas as sociedades tem sido demonstrado por experiências mais do que frequentes.

42. Essas doutrinas, que a razão humana reprova e têm uma influência tão considerável sobre a marcha das coisas públicas, os Pontífices romanos, Nossos predecessores, na plena consciência daquilo que deles reclamava o múnus apostólico, jamais sofreram fossem impunemente emitidas.
Assim foi que, na sua Carta Encíclica “Mirari vos”, de 15 de Agosto de 1832, Gregório XVI, com grande autoridade doutrinal, repeliu o que se avançava desde então, insto é, que em matéria de religião não há escolha a fazer: que cada um depende apenas da própria consciência e pode, além disso, publicar o que pensa e tramar revoluções no Estado.
A respeito da separação da Igreja do Estado, exprime-se nestes termos esse Pontífice: “Não podemos esperar para a Igreja e para o Estado resultados melhores das tendências dos que pretendem separar a Igreja do Estado e romper a concórdia mútua entre o sacerdócio e o império. É que, com efeito, os fautores de uma liberdade desenfreada temem essa concórdia, que sempre foi tão propícia e salutar aos interesses religiosos e civis”.
Da mesma maneira, Pio IX, cada vez que se apresentou ensejo, condenou as falsas opiniões mais em voga, e que, em tal dilúvio de erros, os católicos tivessem uma direcção segura.

43. Dessas decisões dos Sumos Pontífices, cumpre absolutamente admitir que a origem do poder público deve atribuir-se a Deus, e não à multidão; que o direito à rebelião repugna à razão; que não fazer nenhum caso dos deveres da religião, ou tratar da mesma maneira as diferentes religiões, não é permitido nem aos indivíduos nem às sociedades; que a liberdade ilimitada de pensar e de emitir em público os pensamentos próprios de modo algum deve ser colocada entre os direitos dos cidadãos, nem entre as coisas dignas de favor e de protecção.

44. Do mesmo modo, cumpre admitir que, não menos que o Estado, a Igreja, por sua natureza e de pleno direito, é uma sociedade perfeita; que os depositários do poder não devem pretender escravizar e subjugar a Igreja, nem lhe diminuir a liberdade de acção na sua esfera, nem lhe tirar seja qual for dos direitos que lhe foram conferidos por Jesus Cristo.
Nas questões do direito misto, é plenamente conforme à natureza, bem como aos desígnios de Deus, não separar um poder do outros, e ainda menos pô-los em luta, mas sim estabelecer entre eles essa concórdia que está em harmonia com os atributos especiais por cada sociedade recebidos da sua natureza.

45. Tais são as regras traçadas pela Igreja Católica relativamente à constituição e ao governo dos Estados.
Esses princípios e esses decretos, se se quiser julgar somente deles, não reprovam em si nenhuma das diferentes formas de governo, visto que estas nada têm que repugne à doutrina católica, e, se forem aplicadas com sabedoria e justiça, todos podem garantir a prosperidade pública.
Bem mais, não se reprova em si que o povo tenha a sua parte maior ou menor no governo; isto até, em certos tempos e sob certas leis, pode tornar-se não somente uma vantagem, mas um dever para os cidadãos.
Demais, não há para ninguém justo motivo de acusar a Igreja de ser inimiga quer de uma justa tolerância, quer de uma são e legítima liberdade.

46. Efectivamente, se a Igreja julga não ser lícito por os diversos cultos no mesmo pé legal que a verdadeira religião, nem por isso condena os chefes de Estado que, em vista de um bem a alcançar ou de um mal a impedir, toleram na prática que esses diversos cultos tenham cada um seu lugar no Estado.

47. É, aliás, costume da Igreja velar com o maior cuidado por que ninguém seja forçado a abraçar a fé católica contra a sua vontade, porquanto, como observa sabiamente Santo Agostinho, “o homem não pode crer senão querendo” (tract. XXVI in Ioan., n. 2).

48. Pela mesma razão, não pode a Igreja aprovar uma liberdade que gera o desgosto das mais santas leis de Deus e sacode a obediência devida à autoridade legítima.
Isso é mais uma licença do que uma liberdade, e Santo Agostinho lhe chama mui justamente “uma liberdade de perdição” (Epist. CV, ad Donatistas, cap. II, n. 9) e o Apóstolo S. Pedro “um véu de maldade” (1 Ped 2, 16). Muito mais: sendo oposta à razão, essa pretensa liberdade é uma verdadeira escravidão. “Aquele que comete o pecado é escravo do pecado” (Jo 8, 34).
(cont)
(revisão da versão portuguesa por ama)