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19/04/2013

Tratado das paixões da alma 1


Questão 22: Do sujeito das paixões da alma.



Em seguida devemos tratar das paixões da alma. Primeiro, em geral. Segundo, em especial. Em geral, devemos estudar quatro questões, relativamente a elas. Primeiro, do sujeito delas. Segundo, da diferença entre elas. Terceiro, da comparação mútua entre as mesmas. Quarto, da sua malícia e bondade.

Sobre a primeira questão três artigos se discutem:
Art. 1 ― Se a alma tem paixões.
Art. 2 ― Se a paixão reside mais na parte apreensiva que na apetitiva.
Art. 3 ― Se a paixão reside mais no apetite sensitivo que no intelectivo.

Art. 1 ― Se a alma tem paixões.

(III Sent., dist. XV. Q. 2, a . 1, qª 2, De Verit., q. 26, a . 1, 2).

O primeiro discute-se assim. ― Parece que a alma não tem paixões.


1. ― Pois, sofrer é próprio da matéria. Ora, a alma não é composta de matéria e forma, como estabelecemos na primeira parte 1. Logo, a alma não tem paixões.

2. Demais. ― A paixão é um movimento, como diz Aristóteles 2. Ora, a alma não é movida, como ainda Aristóteles o prova 3. Logo, nela não há paixões.

3. Demais. ― A paixão é causa de corrupção, pois, como diz Aristóteles, toda a paixão aumenta em detrimento da substância 4. Ora, a alma é incorruptível. Logo, não tem paixões.

Mas, em contrário, diz o Apóstolo (Rm 7, 5): Porque, enquanto estávamos na carne, as paixões dos pecados, que havia pela lei, obravam em nossos membros. Ora, os pecados existem propriamente, na alma. Logo, também as paixões chamadas pecados.

A palavra sofrer tem tríplice acepção. Uma, comum, pela qual todo o receber é sofrer, mesmo que o ser nenhum detrimento sofra, assim dizemos que o ar sofre quando é iluminado. Ora, isto é mais propriamente aperfeiçoar-se que sofrer. ― Num sentido próprio, empregamos a palavra sofrer para significar uma coisa recebida com exclusão de outra, o que se pode dar de dois modos. Ora, é excluído o que não convém ao ser, assim, quando o corpo de um animal sara, dizemos que sofre porque recebe a saúde, por exclusão da doença. ― De outro modo, inversamente, assim, dizemos que estar doente é sofrer, porque recebemos a doença, por exclusão da saúde, e este é o modo mais próprio à paixão. Pois sofrer implica em alguma coisa ser atraída para o agente, porquanto, o ser que fica privado do que lhe é conveniente é considerado, sobretudo, como actraído para outro ser. E semelhantemente, Aristóteles 5 diz que quando do menos nobre se gera o mais nobre há geração, absolutamente, e corrupção, relativamente, e ao inverso, quando do mais nobre é gerado o menos nobre.

Ora, deste três modos a alma tem paixões. Assim, quanto à recepção, dizemos que sentir e compreender é de certo modo sofrer. Por outro lado, a paixão acompanhada de exclusão só existe seguida de alteração corpórea. Donde, a paixão propriamente dita não pode convir à alma senão acidentalmente, a saber, na medida em que o composto comporta o sofrimento. Ora, há aqui diversidade de situações, assim, quando tal alteração se faz para pior mais propriamente se realiza a noção de paixão, do que quando se faz para melhor, e por isso a tristeza é mais propriamente paixão que a alegria.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― Sofrer acompanhado de exclusão e de alteração é próprio da matéria, e por isso só afecta os seres compostos de matéria e forma. Mas, quando implica somente recepção, não afecta só e necessariamente a matéria, mas pode também afectar qualquer ser existente em potência. Ora, a alma, embora não seja composta de matéria e forma, encerra contudo uma certa potencialidade, em virtude da qual lhe convém o receber e o sofrer, e nesse sentido dizemos que inteligir é sofrer, conforme Aristóteles 6.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Sofrer e ser movido, embora não convenha à alma, em si mesma convém-lhe contudo acidentalmente, como diz Aristóteles 7.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― A objecção colhe relativamente à paixão que implica alteração para pior, e tal paixão senão acidentalmente pode convir à alma, mas, em si mesma convém ao composto, que é corruptível.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
Q. 75, a. 5.
2. III Physic., lect. V.
3. I De Anima, lect. VI.
4. VI Topic., cap. VI, 21.
5. I De generactione, lect. VIII.
6. III De Anima, lect. IX.
7. I De Anima, lect. VI.

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