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11/07/2012

Leitura espiritual para 11 Jul 2012

Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemariaCaminho 116)


Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.




Para ver, clicar SFF.
Evangelho: Mt 24, 1-22



1 Tendo saído Jesus do templo, retirava-Se; e aproximaram-se d'Ele os Seus discípulos, para Lhe fazerem notar as construções do templo. 2 Mas Ele, respondendo, disse-lhes: «Vedes tudo isto? Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra sobre pedra que não seja derrubada». 3 Estando sentado sobre o monte das Oliveiras, aproximaram-se d'Ele Seus discípulos, em particular, e perguntaram: «Diz-nos quando sucederá isto, e qual será o sinal da Tua vinda e do fim do mundo». 4 Jesus respondeu-lhes: «Vede que ninguém vos engane. 5 Porque muitos virão em Meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo, e enganarão a muitos. 6 Ouvireis falar de guerras e de rumores de guerras. Olhai, não vos assusteis, porque importa que estas coisas aconteçam, mas ainda não é o fim. 7 Levantar-se-á nação contra nação e reino contra reino, e haverá fomes, pestes e terramotos em diversas regiões. 8 Todas estas coisas são apenas o princípio das dores. 9 Então sereis sujeitos aos tormentos e vos matarão, e sereis odiados de todas as gentes por causa do Meu nome. 10 Então muitos se escandalizarão, se entregarão uns aos outros, e se odiarão. 11 Levantar-se-ão muitos falsos profetas, e enganarão a muitos. 12 Multiplicando-se a iniquidade, se resfriará a caridade de muitos. 13 Mas quem perseverar até ao fim, esse será salvo. 14 Será pregado este Evangelho do reino por todo o mundo, em testemunho a todas as gentes; e então chegará o fim. 15 «Quando, pois, virdes a abominação da desolação, já anunciada pelo profeta Daniel, instalada no lugar santo - quem lê entenda -16 então os habitantes da Judeia fujam para os montes, 17 quem estiver no terraço não desça para tomar coisa alguma de sua casa, 18 e quem estiver no campo, não volte atrás para buscar o seu manto. 19 Ai das mulheres grávidas e das que tiverem crianças de peito naqueles dias! 20 Rogai para que a vossa fuga não seja no Inverno ou em dia de sábado, 21 porque então será grande a tribulação, como nunca foi, desde o princípio do mundo até agora, nem jamais será. 22 «E, se aqueles dias não se abreviassem, não se salvaria ninguém; porém, aqueles dias serão abreviados em atenção aos escolhidos.





Ioannes Paulus PP. II
Fides et ratio
aos Bispos da Igreja Católica
sobre as relações
entre Fé e Razão

…/3

23. Deste modo, a relação do cristão com a filosofia requer um discernimento radical. No Novo Testamento, especialmente nas cartas de S. Paulo, aparece claramente este dado: a contraposição entre « a sabedoria deste mundo » e a sabedoria de Deus revelada em Jesus Cristo. A profundidade da sabedoria revelada rompe o círculo dos nossos esquemas de reflexão habituais, que não são minimamente capazes de exprimi-la de forma adequada.


O início da primeira carta aos Coríntios apresenta radicalmente este dilema. O Filho de Deus crucificado é o acontecimento histórico contra o qual se desfaz toda a tentativa da mente para construir, sobre razões puramente humanas, uma justificação suficiente do sentido da existência. O verdadeiro ponto nodal, que desafia qualquer filosofia, é a morte de Jesus Cristo na cruz. Aqui, de facto, qualquer tentativa de reduzir o plano salvífico do Pai a mera lógica humana está destinada à falência. «Onde está o sábio? Onde está o erudito? Onde está o investigador deste século? Porventura, Deus não considerou louca a sabedoria deste mundo?» (1 Cor 1, 20) — interroga-se enfaticamente o Apóstolo. Para aquilo que Deus quer realizar, não basta a simples sabedoria do homem sábio, requer-se um passo decisivo que leve ao acolhimento duma novidade radical: «O que é louco segundo o mundo é que Deus escolheu para confundir os sábios (...). O que é vil e desprezível no mundo, é que Deus escolheu, como também aquelas coisas que nada são, para destruir as que são» (1 Cor 1, 27-28). A sabedoria do homem recusa ver na própria fragilidade o pressuposto da sua força; mas S. Paulo não hesita em afirmar: «Quando me sinto fraco, então é que sou forte» (2 Cor 12, 10). O homem não consegue compreender como possa a morte ser fonte de vida e de amor, mas Deus, para revelar o mistério do seu desígnio salvador, escolheu precisamente o que a razão considera «loucura» e «escândalo». Usando a linguagem dos filósofos do seu tempo, Paulo chega ao clímax da sua doutrina e do paradoxo que quer exprimir: «Deus escolheu, no mundo, aquelas coisas que nada são, para destruir as que são» (cf. 1 Cor 1, 28). Para exprimir o carácter gratuito do amor revelado na cruz de Cristo, o Apóstolo não tem medo de usar a linguagem mais radical que os filósofos empregavam nas suas reflexões a respeito de Deus. A razão não pode esgotar o mistério de amor que a Cruz representa, mas a Cruz pode dar à razão a resposta última que esta procura. S. Paulo coloca, não a sabedoria das palavras, mas a Palavra da Sabedoria como critério, simultaneamente, de verdade e de salvação.

Por conseguinte, a sabedoria da Cruz supera qualquer limite cultural que se lhe queira impor, obrigando a abrir-se à universalidade da verdade de que é portadora. Como é grande o desafio lançado à nossa razão e como são enormes as vantagens que terá, se ela se render! A filosofia, que por si mesma já é capaz de reconhecer a necessidade do homem se transcender continuamente na busca da verdade, pode, ajudada pela fé, abrir-se para, na «loucura» da Cruz, acolher como genuína a crítica a quantos se iludem de possuir a verdade, encalhando-a nas sirtes dum sistema próprio. A relação entre a fé e a filosofia encontra, na pregação de Cristo crucificado e ressuscitado, o escolho contra o qual pode naufragar, mas também para além do qual pode desembocar no oceano ilimitado da verdade. Aqui é evidente a fronteira entre a razão e a fé, mas torna-se claro também o espaço onde as duas se podem encontrar.
CAPÍTULO III - INTELLEGO UT CREDAM

1. Caminhar à procura da verdade

24. Nos Actos dos Apóstolos, o evangelista Lucas narra a chegada de Paulo a Atenas, numa das suas viagens missionárias. A cidade dos filósofos estava cheia de estátuas, que representavam vários ídolos; e chamou-lhe a atenção um altar, que Paulo prontamente aproveitou como motivo e base comum para iniciar o anúncio do querigma: «Atenienses — disse ele —, vejo que sois, em tudo, os mais religiosos dos homens. Percorrendo a vossa cidade e examinando os vossos monumentos sagrados, até encontrei um altar com esta inscrição: "Ao Deus desconhecido". Pois bem! O que venerais sem conhecer, é que eu vos anuncio» (Act 17, 22-23). Partindo daqui, S. Paulo fala-lhes de Deus enquanto criador, como Aquele que tudo transcende e a tudo dá vida. Depois continua o seu discurso, dizendo: «Fez a partir de um só homem, todo o género humano, para habitar em toda a face da Terra; e fixou a sequência dos tempos e os limites para a sua habitação, a fim de que os homens procurem a Deus e se esforcem por encontrá-Lo, mesmo tacteando, embora não Se encontre longe de cada um de nós» (Act 17, 26-27).

O Apóstolo põe em destaque uma verdade que a Igreja sempre guardou no seu tesouro: no mais fundo do coração do homem, foi semeado o desejo e a nostalgia de Deus. Recorda-o a liturgia de Sexta-feira Santa, quando, convidando a rezar pelos que não crêem, diz: «Deus eterno e omnipotente, criastes os homens para que Vos procurem, de modo que só em Vós descansa o seu coração». 22 Existe, portanto, um caminho que o homem, se quiser, pode percorrer; o seu ponto de partida está na capacidade de a razão superar o contingente para se estender até ao infinito.

De vários modos e em tempos diversos, o homem demonstrou que conseguia dar voz a este seu desejo íntimo. A literatura, a música, a pintura, a escultura, a arquitectura e outras realizações da sua inteligência criadora tornaram-se canais de que ele se serviu para exprimir esta sua ansiosa procura. Mas foi sobretudo a filosofia que, de modo peculiar, recolheu este movimento, exprimindo, com os meios e segundo as modalidades científicas que lhe são próprias, este desejo universal do homem.

25. «Todos os homens desejam saber», 23 e o objecto próprio deste desejo é a verdade. A própria vida quotidiana demonstra o interesse que tem cada um em descobrir, para além do que ouve, a realidade das coisas. Em toda a criação visível, o homem é o único ser que é capaz não só de saber, mas também de saber que sabe, e por isso se interessa pela verdade real daquilo que vê. Ninguém pode sinceramente ficar indiferente quanto à verdade do seu saber. Se descobre que é falso, rejeita-o; se, pelo contrário, consegue certificar-se da sua verdade, sente-se satisfeito. É a lição que nos dá Santo Agostinho, quando escreve: «Encontrei muitos com desejos de enganar outros, mas não encontrei ninguém que quisesse ser enganado». 24 Considera-se, justamente, que uma pessoa alcançou a idade adulta, quando consegue discernir, por seus próprios meios, entre aquilo que é verdadeiro e o que é falso, formando um juízo pessoal sobre a realidade objectiva das coisas. Está aqui o motivo de muitas pesquisas, particularmente no campo das ciências, que levaram, nos últimos séculos, a resultados tão significativos, favorecendo realmente o progresso da humanidade inteira.

E a pesquisa é tão importante no campo teórico, como no âmbito prático: ao referir-me a este, desejo aludir à procura da verdade a respeito do bem que se deve realizar. Com efeito, graças precisamente ao agir ético, a pessoa, se actuar segundo a sua livre e recta vontade, entra pela estrada da felicidade e encaminha-se para a perfeição. Também neste caso, está em questão a verdade. Reafirmei esta convicção na carta encíclica Veritatis splendor: «Não há moral sem liberdade (...). Se existe o direito de ser respeitado no próprio caminho em busca da verdade, há ainda antes a obrigação moral grave para cada um de procurar a verdade e de aderir a ela, uma vez conhecida». 25

Por isso, é necessário que os valores escolhidos e procurados na vida sejam verdadeiros, porque só estes é que podem aperfeiçoar a pessoa, realizando a sua natureza. Não é fechando-se em si mesmo que o homem encontra esta verdade dos valores, mas abrindo-se para a receber mesmo de dimensões que o transcendem. Esta é uma condição necessária para que cada um se torne ele mesmo e cresça como pessoa adulta e madura.

26. Ao princípio, a verdade apresenta-se ao homem sob forma interrogativa: A vida tem um sentido? Para onde se dirige? À primeira vista, a existência pessoal poderia aparecer radicalmente sem sentido. Não é preciso recorrer aos filósofos do absurdo, nem às perguntas provocatórias que se encontram no livro de Job para duvidar do sentido da vida. A experiência quotidiana do sofrimento, pessoal e alheio, e a observação de muitos factos, que à luz da razão se revelam inexplicáveis, bastam para tornar iniludível um problema tão dramático como é a questão do sentido da vida. 26 A isto se deve acrescentar que a primeira verdade absolutamente certa da nossa existência, para além do facto de existirmos, é a inevitabilidade da morte. Perante um dado tão desconcertante como este, impõe-se a busca de uma resposta exaustiva. Cada um quer, e deve, conhecer a verdade sobre o seu fim. Quer saber se a morte será o termo definitivo da sua existência, ou se algo permanece para além da morte; se pode esperar uma vida posterior, ou não. É significativo que o pensamento filosófico tenha recebido, da morte de Sócrates, uma orientação decisiva que o marcou durante mais de dois milénios. Certamente não é por acaso que os filósofos, perante a realidade da morte, sempre voltam a pôr-se este problema, associado à questão do sentido da vida e da imortalidade.

27. Ninguém se pode esquivar a tais questões, — nem o filósofo, nem o homem comum. E, da resposta que se lhes der, deriva uma orientação decisiva da investigação: a possibilidade, ou não, de alcançar uma verdade universal. Por si mesma qualquer verdade, mesmo parcial, se realmente é verdade, apresenta-se como universal e absoluta. Aquilo que é verdadeiro deve ser verdadeiro sempre e para todos. Contudo, para além desta universalidade, o homem procura um absoluto que seja capaz de dar resposta e sentido a toda a sua pesquisa: algo de definitivo, que sirva de fundamento a tudo o mais. Por outras palavras, procura uma explicação definitiva, um valor supremo, para além do qual não existam, nem possam existir, ulteriores perguntas ou apelos. As hipóteses podem seduzir, mas não saciam. Para todos, chega o momento em que, admitam-no ou não, há necessidade de ancorar a existência a uma verdade reconhecida como definitiva, que forneça uma certeza livre de qualquer dúvida.

Os filósofos procuraram, ao longo dos séculos, descobrir e exprimir tal verdade, criando um sistema ou uma escola de pensamento. Mas, para além dos sistemas filosóficos, existem outras expressões nas quais o homem procura formular a sua «filosofia»: trata-se de convicções ou experiências pessoais, tradições familiares e culturais, ou itinerários existenciais vividos sob a autoridade de um mestre. A cada uma destas manifestações, subjaz sempre vivo o desejo de alcançar a certeza da verdade e do seu valor absoluto.

2. Os diferentes rostos da verdade do homem

28. Há que reconhecer que a busca da verdade nem sempre se desenrola com a referida transparência e coerência de raciocínio. Muitas vezes, as limitações naturais da razão e a inconstância do coração ofuscam e desviam a pesquisa pessoal. Outros interesses de vária ordem podem sobrepor-se à verdade. Acontece também que o próprio homem a evite, quando começa a entrevê-la, porque teme as suas exigências. Apesar disto, mesmo quando a evita, é sempre a verdade que preside à sua existência. Com efeito, nunca poderia fundar a sua vida sobre a dúvida, a incerteza ou a mentira; tal existência estaria constantemente ameaçada pelo medo e a angústia. Assim, pode-se definir o homem como aquele que procura a verdade.

29. É impensável que uma busca, tão profundamente radicada na natureza humana, possa ser completamente inútil e vã. A própria capacidade de procurar a verdade e fazer perguntas implica já uma primeira resposta. O homem não começaria a procurar uma coisa que ignorasse totalmente ou considerasse absolutamente inatingível. Só a previsão de poder chegar a uma resposta é que consegue induzi-lo a dar o primeiro passo. De facto, assim sucede normalmente na pesquisa científica. Quando o cientista, depois de ter uma intuição, se lança à procura da explicação lógica e empírica dum certo fenómeno, fá-lo porque tem a esperança, desde o início, de encontrar uma resposta, e não se dá por vencido com os insucessos. Nem considera inútil a intuição inicial, só porque não alcançou o seu objectivo; dirá antes, e justamente, que não encontrou ainda a resposta adequada.

O mesmo deve valer também para a busca da verdade no âmbito das questões últimas. A sede de verdade está tão radicada no coração do homem que, se tivesse de prescindir dela, a sua existência ficaria comprometida. Basta observar a vida de todos os dias para constatar como dentro de cada um de nós se sente o tormento de algumas questões essenciais e, ao mesmo tempo, se guarda na alma, pelo menos, o esboço das respectivas respostas. São respostas de cuja verdade estamos convencidos, até porque notamos que não diferem substancialmente das respostas a que muitos outros chegaram. Por certo, nem toda a verdade adquirida possui o mesmo valor; todavia, o conjunto dos resultados alcançados confirma a capacidade que o ser humano, em princípio, tem de chegar à verdade.

30. Convém, agora, fazer uma rápida menção das diversas formas de verdade. As mais numerosas são as verdades que assentam em evidências imediatas ou recebem confirmação da experiência: esta é a ordem própria da vida quotidiana e da pesquisa científica. As verdades de carácter filosófico ocupam nível diverso, que o homem alcança através da capacidade especulativa do seu intelecto. Por último, existem as verdades religiosas, que de algum modo têm as suas raízes também na filosofia; estão contidas nas respostas que as diversas religiões oferecem, nas suas tradições, às questões últimas. 27

Quanto às verdades filosóficas, é necessário especificar que não se limitam só às doutrinas, por vezes efémeras, dos filósofos profissionais. Como já disse, todo o homem é, de certa forma, um filósofo e possui as suas próprias concepções filosóficas, pelas quais orienta a sua vida. De diversos modos, consegue formar uma visão global e uma resposta sobre o sentido da própria existência: e, à luz disso, interpreta a própria vida pessoal e regula o seu comportamento. É aqui que deveria colocar-se a questão da relação entre as verdades filosófico-religiosas e a verdade revelada em Jesus Cristo. Antes de responder a tal questão, é preciso ter em conta outro dado da filosofia.

31. O homem não foi criado para viver sozinho. Nasce e cresce numa família, para depois se inserir, pelo seu trabalho, na sociedade. Assim a pessoa aparece integrada, desde o seu nascimento, em várias tradições; delas recebe não apenas a linguagem e a formação cultural, mas também muitas verdades nas quais acredita quase instintivamente. Entretanto, o crescimento e a maturação pessoal implicam que tais verdades possam ser postas em dúvida e avaliadas através da actividade crítica própria do pensamento. Isto não impede que, uma vez passada esta fase, aquelas mesmas verdades sejam «recuperadas» com base na experiência feita ou em virtude de sucessiva ponderação. Apesar disso, na vida duma pessoa, são muito mais numerosas as verdades simplesmente acreditadas que aquelas adquiridas por verificação pessoal. Na realidade, quem seria capaz de avaliar criticamente os inumeráveis resultados das ciências, sobre os quais se fundamenta a vida moderna? Quem poderia, por conta própria, controlar o fluxo de informações, recebidas diariamente de todas as partes do mundo e que, por princípio, são aceites como verdadeiras? Enfim, quem poderia percorrer novamente todos os caminhos de experiência e pensamento, pelos quais se foram acumulando os tesouros de sabedoria e religiosidade da humanidade? Portanto, o homem, ser que busca a verdade, é também aquele que vive de crenças.

32. Cada um, quando crê, confia nos conhecimentos adquiridos por outras pessoas. Neste acto, pode-se individuar uma significativa tensão: por um lado, o conhecimento por crença apresenta-se como uma forma imperfeita de conhecimento, que precisa de se aperfeiçoar progressivamente por meio da evidência alcançada pela própria pessoa; por outro lado, a crença é muitas vezes mais rica, humanamente, do que a simples evidência, porque inclui a relação interpessoal, pondo em jogo não apenas as capacidades cognoscitivas do próprio sujeito, mas também a sua capacidade mais radical de confiar noutras pessoas, iniciando com elas um relacionamento mais estável e íntimo.

Importa sublinhar que as verdades procuradas nesta relação interpessoal não são primariamente de ordem empírica ou de ordem filosófica. O que se busca é sobretudo a verdade da própria pessoa: aquilo que ela é e o que manifesta do seu próprio íntimo. De facto, a perfeição do homem não se reduz apenas à aquisição do conhecimento abstracto da verdade, mas consiste também numa relação viva de doação e fidelidade ao outro. Nesta fidelidade que leva à doação, o homem encontra plena certeza e segurança. Ao mesmo tempo, porém, o conhecimento por crença, que se fundamenta na confiança interpessoal, tem a ver também com a verdade: de facto, acreditando, o homem confia na verdade que o outro lhe manifesta.

Quantos exemplos se poderiam aduzir para ilustrar este dado! O primeiro que me vem ao pensamento é o testemunho dos mártires. Com efeito, o mártir é a testemunha mais genuína da verdade da existência. Ele sabe que, no seu encontro com Jesus Cristo, alcançou a verdade a respeito da sua vida, e nada nem ninguém poderá jamais arrancar-lhe esta certeza. Nem o sofrimento, nem a morte violenta poderão fazê-lo retroceder da adesão à verdade que descobriu no encontro com Cristo. Por isso mesmo é que, até agora, o testemunho dos mártires atrai, gera consenso, é escutado e seguido. Esta é a razão pela qual se tem confiança na sua palavra: descobre-se neles a evidência dum amor que não precisa de longas demonstrações para ser convincente, porque fala daquilo que cada um, no mais fundo de si mesmo, já sente como verdadeiro e que há tanto tempo procurava. Em resumo, o mártir provoca em nós uma profunda confiança, porque diz aquilo que já sentimos e torna evidente aquilo que nós mesmos queríamos ter a força de dizer.

33. Deste modo, foi possível completar progressivamente os dados do problema. O homem, por sua natureza, procura a verdade. Esta busca não se destina apenas à conquista de verdades parciais, físicas ou científicas; não busca só o verdadeiro bem em cada um das suas decisões. Mas a sua pesquisa aponta para uma verdade superior, que seja capaz de explicar o sentido da vida; trata-se, por conseguinte, de algo que não pode desembocar senão no absoluto. 28 Graças às capacidades de que está dotado o seu pensamento, o homem pode encontrar e reconhecer uma tal verdade. Sendo esta vital e essencial para a sua existência, chega-se a ela não só por via racional, mas também através de um abandono fiducial a outras pessoas que possam garantir a certeza e autenticidade da verdade. A capacidade e a decisão de confiar o próprio ser e existência a outra pessoa constituem, sem dúvida, um dos actos antropologicamente mais significativos e expressivos.

É bom não esquecer que também a razão, na sua busca, tem necessidade de ser apoiada por um diálogo confiante e uma amizade sincera. O clima de suspeita e desconfiança, que por vezes envolve a pesquisa especulativa, ignora o ensinamento dos filósofos antigos, que punham a amizade como um dos contextos mais adequados para o recto filosofar.

Do que ficou dito conclui-se que o homem se encontra num caminho de busca, humanamente infindável: busca da verdade e busca duma pessoa em quem poder confiar. A fé cristã vem em sua ajuda, dando-lhe a possibilidade concreta de ver realizado o objectivo dessa busca. De facto, superando o nível da simples crença, ela introduz o homem naquela ordem da graça que lhe consente participar no mistério de Cristo, onde lhe é oferecido o conhecimento verdadeiro e coerente de Deus Uno e Trino. Deste modo, em Jesus Cristo, que é a Verdade, a fé reconhece o apelo último dirigido à humanidade, para que possa tornar realidade o que experimenta como desejo e nostalgia.

Revisão da tradução portuguesa por ama
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Notas:
22 «Ut te semper desiderando quærerent et inveniendo quiescerent»: Missale Romanum.
23 Aristóteles, Metafísica, I, 1.
24 Confissões, X, 23, 33: CCL 27,173.
25 N. 34: AAS 85 (1993), 1161.
26 Cf. João Paulo II, Carta ap. Salvifici doloris (11 de Fevereiro de 1984), 9: AAS 76 (1984), 209-210.
27 Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Decl. sobre a relação da Igreja com as religiões não-cristãs Nostra ætate, 2.
28 Desenvolvo, há muito tempo, esta argumentação, tendo-a expresso em diversas ocasiões: «"Quem é o homem, e para que serve? E que bem ou que mal pode ele fazer?" (Sir 18, 8) (...) Estas perguntas estão no coração de cada homem, como bem demonstra o génio poético de todos os tempos e de todos os povos, que, quase como profecia da humanidade, repropõe continuamente a séria pergunta que torna o homem verdadeiramente tal. Exprimem a urgência de encontrar um porquê da existência, de todos os seus instantes, tanto das suas etapas salientes e decisivas como dos seus momentos mais comuns. Em tais perguntas, é testemunhada a razão profunda da existência humana, pois nelas a inteligência e a vontade do homem são solicitadas a procurar livremente a solução capaz de oferecer um sentido pleno à vida. Estes interrogativos, portanto, constituem a expressão mais elevada da natureza do homem; por conseguinte, a resposta a eles mede a profundidade do seu empenho na própria existência. Em particular, quando o porquê das coisas é procurado a fundo em busca da resposta última e mais exaurível, então a razão humana atinge o seu vértice e abre-se à religiosidade. De facto, a religiosidade representa a expressão mais elevada da pessoa humana, porque é o ápice da sua natureza racional. Brota da profunda aspiração do homem à verdade, e está na base da busca livre e pessoal que ele faz do divino» [Alocução da Audiência Geral de quarta-feira, 19 de Outubro de 1983, 1-2: L'Osservatore Romano (ed. portuguesa, de 23 de Outubro de 1983), 12].

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