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20/04/2011

Confidências de alguém - 5


Nota de AMA: 
Estas “confidências” têm, obviamente, um autor, que não se revela; foram feitas em tempo indeterminado, por isso não se lhes atribui a data. O estilo discursivo revela, obviamente, que se tratam de meditações escritas ao correr da pena. A sua publicação deve-se a ter considerado que, nelas se encontram muitas situações e ocorrências que fazem parte do quotidiano que, qualquer um, pode viver.



Quarta Feira Santa

Simão de Cirene é compelido pelos soldados a levar o madeiro, a Cruz que Jesus não pode, manifestamente, carregar.

Uma noite sem dormir, tensa e estranha, semeada de contradições e sofrimentos indizíveis, de troças e insultos, de humilhações e desenganos, que terminara pelo abandono mais completo, total, dos Seus discípulos queridos. Jesus olha em volta e não vê nenhum rosto conhecido, nem o meu rosto Ele consegue ver, de tal forma estou escondido no meio da multidão.
Também eu O abandono, não sei quem é, não O conheço. Estive com Pedro, há poucas horas, chorando amargamente tê-lo negado, ter jurado que não O conhecia, que não sabia quem era. Depois de O Senhor ter deixado que o Seu olhar triste repousasse em mim por breves instantes, tudo dentro de mim se desmoronou e vi, sim….vi o pouco que sou, o fraco e incrívelmente pusilânime comportamento de que sou capaz. Esmagado ainda pela minha dor, pelo meu arrependimento, mantenho-me todavia à margem, vou vendo as coisas de longe, tenho pena de Jesus, sofro com os Seus sofrimentos, mas tenho ainda receio de me aproximar dele, de O ajudar, de aliviar um pouco que seja o Seu sofrimento.

Nem sequer faço um pequeno movimento de ajuda, quando compelem o Cireneu, não digo: Não… eu…. Eu é que levarei a Cruz de Cristo. 

E, mais uma vez, perdida uma oportunidade de mudar a minha vida, o meu comportamento, fico-me na inveja do lugar que é do Cireneu e poderia ter sido o meu.
Secretamente pergunto-me como é possível este meu comportamento, sim, eu que tantas vezes tenho dito ao Senhor: Amo-te! Que todos os dias O recebo na Hóstia puríssima, eu que me digo e me tenho entre os Seus amigos mais íntimos, não passo de um cobarde e um fraco.

Triste amigo tens, Senhor, que mal servido Te encontras. Se todos os Teus amigos fossem como eu não precisarias de inimigos, nem de Príncipes de Sacerdotes, nem de Fariseus, nem de ninguém mais, para cumprir a Tua sublime tarefa de Redenção do mundo: eu bastaria!

Leva-me Senhor, contigo, bem junto de Ti, até ao cimo desse Monte Calvário para onde caminhas. Arrasta-me juntamente sem me deixar um instante sequer – basta um pequeno instante para eu ser capaz das piores torpezas, como abandonar-te, por exemplo – leva-me como criança pequena que quero ser.

Senhor, eu nem sei o que quero verdadeiramente, tenho estes (…) anos de vida e sinto-me como uma criança que regressa a cada instante ao colo amigo e seguro do Seu Pai, do Seu irmão mais velho. Aqui me sinto bem, protegido de mim mesmo ao abrigo das minhas próprias loucuras, sem necessidade de tomar decisões, que são sempre as piores e mais inadequadas, as mais cobardes e manhosas, aqui me sinto tranquilo porque nada acontece que tenha de interferir directamente, limito-me a seguir-te, fielmente como o mais humilde cachorrinho, contente e feliz por me deixares ir contigo.
Nada sou, nada valho, nada sei. Senhor…. Senhor, deixa-me que desfrute destes momentos de indizível ternura que sinto invadir-me a alma e sentir o Teu abraço a moroso e amigo, confiante e terno; ouvir a Tua voz serena e amorosa:

Tu…. Vem comigo!


As contrariedades, os sofrimentos físicos e morais, as angústias, as incertezas no futuro, enfim, tudo nisto que sinto e me pesa na alma está agora a atapetar o duro caminho para o Gólgota, tornado mais fácil o Teu doloroso caminhar, suavizando um pouco a agressividade do caminho da salvação que queres, por mim, levar a cabo. Com as minhas lágrimas vou empapando os Teus vestidos, suavizando um pouco a dor e incómodo das feridas secas, mal cicatrizadas e “não suavizadas com azeite e vinho”. [1]

Chega de traições e troças, abandonos e falsas promessas, chega de ser mau filho. Faço o propósito firme de Te merecer, de tudo fazer para não me afastar um milímetro de Ti, de me manter agarrado à orla do Teu manto par assim não me desviar no caminho.
Não mais Senhor chamarás por mim sem que Te responda com prontidão, porque eu estarei ao Teu lado, disponível e solícito para o que de mim necessitares.


[1] S. josemaría, Via-sacra

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