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06/02/2021

Filosofia, Religião, Condição Humana

 

A doutrina sagrada é uma ciência?

 

QUANTO AO SEGUNDO ARTIGO, ASSIM SE PROCEDE: Parece não ser ciência a doutrina sagrada.

1. – Pois toda ciência provém de princípios por si evidentes, ao passo que procede a doutrina sagrada dos artigos da fé, inevidentes em si, por serem não universalmente aceitos; porque a fé não é de todos, diz a Escritura (II Ts. 3, 2). Logo, não é ciência a doutrina sagrada.

2. – Ademais, do indivíduo não há ciência. Mas a doutrina sagrada trata de factos individuais, como sejam os feitos de Abraão, Isaac, Jacó e semelhantes. Logo, não é ciência a doutrina sagrada.

EM SENTIDO CONTRÁRIO, diz Agostinho: “A esta ciência pertence apenas aquilo pelo qual a fé, bem salutar, é gerada, alimentada, defendida, corroborada”. Ora, tais funções não pertencem a ciência alguma, a não ser à doutrina sagrada. Logo, a doutrina sagrada é uma ciência.



RESPONDO. A doutrina sagrada é ciência. Porém, cumpre saber que há dois géneros de ciências. Umas partem de princípios conhecidos à luz natural do intelecto, como a aritméctica, a geometria e semelhantes. Outras provém de princípios conhecidos por ciência superior; como a perspectiva, de princípios explicados na geometria, e a música, de princípios aritmécticos. E deste modo é ciência a doutrina sagrada, pois deriva de princípios conhecidos à luz duma ciência superior, a saber: a de Deus e dos santos. Portanto, como aceita a música os princípios que lhe fornece o aritméctico, assim a doutrina sagrada tem fé nos princípios que lhe são revelados por Deus.

QUANTO AO 1º, portanto, deve dizer-se que os princípios de qualquer ciência, ou são por si mesmos evidentes, ou se reduzem à evidência de alguma ciência superior. E tais são os princípios da doutrina sagrada, como dissemos.

QUANTO AO 2º, deve dizer-se que na doutrina sagrada, os factos individuais não são tratados principalmente, senão apenas introduzidos a título de exemplo prático, como nas ciências morais; ou também no intuito de apurar a autoridade dos homens que nos transmitiram a revelação divina, na qual se funda a Sagrada Escritura ou doutrina.

 

São Tomás de Aquino, Summa Theológica

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