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03/05/2020

LEITURA ESPIRITUAL

COMENTANDO OS EVANGELHOS

São Lucas

Cap. V




1  E aconteceu que, apertando-o a multidão, para ouvir a palavra de Deus, estava ele junto ao lago de Genesaré; 2  E viu estar dois barcos junto à praia do lago; e os pescadores, havendo descido deles, estavam lavando as redes. 3  E, entrando num dos barcos, que era o de Simão, pediu-lhe que o afastasse um pouco da terra; e, assentando-se, ensinava do barco a multidão. 4  E, quando acabou de falar, disse a Simão: Faze-te ao mar alto, e lançai as vossas redes para pescar. 5  E, respondendo Simão, disse-lhe: Mestre, havendo trabalhado toda a noite, nada apanhamos; mas, sobre a tua palavra, lançarei a rede. 6  E, fazendo assim, colheram uma grande quantidade de peixes, e rompia-se-lhes a rede. 7  E fizeram sinal aos companheiros que estavam no outro barco, para que os fossem ajudar. E foram, e encheram ambos os barcos, de maneira tal que quase iam a pique. 8  E vendo isto Simão Pedro, prostrou-se aos pés de Jesus, dizendo: Senhor, ausenta-te de mim, que sou um homem pecador. 9  Pois que o espanto se apoderara dele, e de todos os que com ele estavam, por causa da pesca de peixe que haviam feito. 10  E, de igual modo, também de Tiago e João, filhos de Zebedeu, que eram companheiros de Simão. E disse Jesus a Simão: Não temas; de agora em diante serás pescador de homens. 11  E, levando os barcos para terra, deixaram tudo, e o seguiram. 12  E aconteceu que, quando estava numa daquelas cidades, eis que um homem cheio de lepra, vendo a Jesus, prostrou-se sobre o rosto, e rogou-lhe, dizendo: Senhor, se quiseres, bem podes limpar-me. 13  E ele, estendendo a mão, tocou-lhe, dizendo: Quero, sê limpo. E logo a lepra desapareceu dele. 14  E ordenou-lhe que a ninguém o dissesse. Mas vai, disse, mostra-te ao sacerdote, e oferece, pela tua purificação, o que Moisés determinou, para que lhes sirva de testemunho. 15  A sua fama, porém, se propagava ainda mais, e ajuntava-se muita gente para o ouvir e para ser por ele curada das suas enfermidades. 16  Ele, porém, retirava-se para os desertos, e ali orava. 17  E aconteceu que, num daqueles dias, estava ensinando, e estavam ali assentados fariseus e doutores da lei, que tinham vindo de todas as aldeias da Galileia, e da Judéia, e de Jerusalém. E a virtude do Senhor estava com ele para curar. 18  E eis que uns homens transportaram numa cama um homem que estava paralítico, e procuravam fazê-lo entrar e pó-lo diante dele. 19  E, não achando por onde o pudessem levar, por causa da multidão, subiram ao telhado, e por entre as telhas o baixaram com a cama, até ao meio, diante de Jesus. 20  E, vendo ele a fé deles, disse-lhe: Homem, os teus pecados te são perdoados. 21  E os escribas e os fariseus começaram a arrazoar, dizendo: Quem é este que diz blasfémias? Quem pode perdoar pecados, senão só Deus? 22  Jesus, porém, conhecendo os seus pensamentos, respondeu, e disse-lhes: Que arrazoais em vossos corações? 23  Qual é mais fácil? dizer: Os teus pecados te são perdoados; ou dizer: Levanta-te, e anda? 24  Ora, para que saibais que o Filho do homem tem sobre a terra poder de perdoar pecados (disse ao paralítico), a ti te digo: Levanta-te, toma a tua cama, e vai para tua casa. 25  E, levantando-se logo diante deles, e tomando a cama em que estava deitado, foi para sua casa, glorificando a Deus. 26  E todos ficaram maravilhados, e glorificaram a Deus; e ficaram cheios de temor, dizendo: Hoje vimos prodígios. 27  E, depois disto, saiu, e viu um publicano, chamado Levi, assentado na recebedoria, e disse-lhe: Segue-me. 28  E ele, deixando tudo, levantou-se e o seguiu. 29  E fez-lhe Levi um grande banquete em sua casa; e havia ali uma multidão de publicanos e outros que estavam com eles à mesa. 30  E os escribas deles, e os fariseus, murmuravam contra os seus discípulos, dizendo: Por que comeis e bebeis com publicanos e pecadores? 31  E Jesus, respondendo, disse-lhes: Não necessitam de médico os que estão sãos, mas, sim, os que estão enfermos; 32  Eu não vim chamar os justos, mas, sim, os pecadores, ao arrependimento. 33  Disseram-lhe, então, eles: Por que jejuam os discípulos de João muitas vezes, e fazem orações, como também os dos fariseus, mas os teus comem e bebem? 34  E ele lhes disse: Podeis vós fazer jejuar os filhos das bodas, enquanto o esposo está com eles? 35  Dias virão, porém, em que o esposo lhes será tirado, e então, naqueles dias, jejuarão. 36  E disse-lhes também uma parábola: Ninguém tira um pedaço de uma roupa nova para a coser em roupa velha, pois romperá a nova e o remendo não condiz com a velha. 37  E ninguém deita vinho novo em odres velhos; de outra sorte o vinho novo romperá os odres, e entornar-se-á o vinho, e os odres se estragarão; 38  Mas o vinho novo deve deitar-se em odres novos, e ambos juntamente se conservarão. 39  E ninguém tendo bebido o velho quer logo o novo, porque diz: Melhor é o velho.

Comentários:

1-11 -
Tal como na pesca – que o Evangelho relata – as redes não se romperam, também na Igreja fundada por Jesus Cristo cabem todos, absolutamente. O reconhecimento de Pedro – instantâneo – da sua indignidade perante a presença do Cristo, é também a nossa quando meditamos na grandeza de Deus perante o pouco que somos. Mas, é exactamente esse “pouco” que o Senhor quer e por isso nos escolhe, não pelas qualidades que possamos ter mas – atrevo-me – pelos defeitos pessoais que estamos dispostos a vencer.
O que nos faltar em coragem e perseverança nessa luta por melhoria Ele o porá desde que nos entreguemos confiadamente nas Suas Mãos Misericordiosas.
Como é que aqueles homens, simples pescadores da Galileia, deixam tudo para trás e seguem Jesus? Nem fazem qualquer pergunta porque, aliás, o Senhor já tinha esclarecido o “programa” que preparara para eles nas palavras dirigidas a Pedro: «Não tenhas receio; de futuro, serás pescador de homens.» Receio? Não! Não podem sentir qualquer receio mesmo que não se dêem conta da dimensão e grandeza da missão que os espera porque têm uma garantia: aquele Senhor que os chamava estaria com eles. Evidentemente que, como Pedro, todos deveriam sentir-se indignos de Jesus, consideravam-se fracos e pecadores mas, nem por isso, sentiam medo. Jesus tinha conquistado a sua inteira confiança e, se Ele os chamava que mais poderiam fazer a não ser segui-Lo?
Pescar requer, entre outras, qualidades de paciência e perseverança.
Não são a mesma coisa. Enquanto a primeira se pode traduzir na aceitação de resultados adversos, a segunda implica um esforço contínuo na obtenção desses mesmos resultados. Assim no apostolado pessoal que rarissimamente produz frutos imediatos. Eles aparecerão quando o Senhor, em nome de Quem actuamos, assim achar oportuno.
A pesca exige qualidades e aptidões que nem todos têm. Lembramos, hoje, uma importantíssima: A confiança! Sem esta virtude é muito difícil resistir aos fracassos e maus resultados. Mas, o pescador sabe que, algures no mar onde navega, o peixe existe e que, mais tarde ou mais cedo não deixará de entrar na rede que uma e outra vez lança às águas. Compara-se muito o apostolado pessoal com a pesca e é, de facto, uma comparação muito real. Como dissemos, para se obterem resultados na pesca, há que insistir com confiança no trabalho mil vezes repetido e não desistir nunca pois não é de crer que, sem mais, o peixe salte das águas para dentro do barco. Pois também não devemos esperar que o objecto do nosso apostolado venha subitamente, ter connosco aceitando aquele convite que alguma vez fizemos e que não tornámos a repetir. Será a nossa insistência sem desfalecimento nem intervalos que produzirá os frutos que esperamos mas, atenção, tal como neste trecho do Evangelho de São Lucas é fundamental que sigamos fielmente as instruções – direcção espiritual – que nos vão sendo dadas por quem pode e tem autoridade para o fazer. Entregues a uma tarefa por nosso livre alvedrio, sem direcção e ajuda pouco ou nada conseguiremos.

12-16 -                                                                              
São Lucas relata algo extraordinário: Jesus estendeu a mão e tocou o leproso! Naquele tempo a lepra obrigava à segregação radical dos que a tinham e (era uma doença bastante comum naquele tempo) esta segregação imposta pela Lei era observada com todo o rigor. Os circunstantes deverão ter ficados mudos de espanto ao ver o gesto do Senhor. Não obstante, Jesus Cristo deseja que tudo fique devidamente registado e por isso mesmo manda que o miraculado cumpra o que a Lei previa em casos de cura. Nós pensamos que seríamos capazes de fazer o mesmo? Ultrapassar a repulsa natural e tocar alguém na mesma situação?Bom… mas e o pecado… essa autêntica lepra da alma que a torna tão repulsiva como a da doença, convivemos com ele sem problema algum?


17-26 -
É interessante verificar que o Evangelista tem o cuidado de mencionar a presença de fariseus e doutores da lei na assembleia que rodeava Jesus. Talvez estivessem ali por mera curiosidade, mas, a sua presença confere, de certo modo, uma credibilidade maior ao milagre que Jesus irá praticar. De facto, foram eles próprios que “obrigaram” o Senhor a curar o paralítico para que ficassem com um testemunho iniludível do Seu poder como Deus Verdadeiro.


27-32 -
De forma iniludível Jesus confirma a Sua divindade e neste caso como que a pedido dos fariseus e doutores da lei. Podemos perguntar que mais seria necessário para que acreditassem! A verdade é que constatam o milagre com os seus próprios olhos, mas o seu coração não quer ver não quer aceitar a evidência. Pessoas assim não acreditam senão em si próprias e só os seus valores ou critérios é que contam. Não são dignas de pena? A resposta de Jesus não pode ser mais clara ou concludente. E, além disso, na “lógica” dos planos divinos para a salvação da humanidade, perfeitamente natural. Não parece possível que alguém não tivesse entendido as Suas palavras ou não entendesse o Seu propósito.
Já estamos como que habituados ao chamamento de Jesus Cristo mas, nem por isso deixa de nos impressionar a simplicidade do desafio: «Segue-me». Claro que não conhecemos a entoação ou enfâse com que o Senhor diria este «Segue-me» mas, a verdade, é que o que é convidado aceita sem mais o convite deixando umas redes de pesca, um posto de cobrança de impostos, o que for. Pensemos um pouco se, acaso, este «Segue-me» nos fosse dirigido a nós; o que faríamos?

33-39 -
Uma aparente contradição? Não me parece. Quem não quer beber o vinho novo porque o “velho é que é bom” não está disposto a mudar de vida, mantém-se fechado às insinuações do Espírito, conforma-se com o que tem, acomoda-se com o que faz. É o aburguesamento, o estado terrível dos que se consideram muito bem naquilo que fazem e sabem e se recusam a tentar fazer outra coisa melhor e a saber mais detalhadamente as verdades da Fé. É o comodismo dos que não querem “incomodar-se” com novos desafios, ou outras hipóteses de vida: mudar o quê e para quê? Cumprem os “mínimos” vão á Missa ao Domingo, procurando uma que seja breve e pouco exigente, rezam “alguma coisa” só porque, enfim, não custa muito e sempre é melhor prevenir… São os que, nas aflições que a vida traz, pedem, às vezes com fervor, mas, raramente se lembram de dar graças por tantos benefícios que o Senhor dá, nomeadamente, o dom da vida.

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