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29/03/2020

Leitura espiritual

Pensamentos para a vida diária 

Capítulo VII

TRIUNFO E DERROTA

Não é tanto o trabalho mas sim o desengano que advém de se ter dado demasiada importância às banalidades, o que realmente magoa as almas.
Poucos estão prontos a obedecer à ordem que Nosso Senhor deu a Pedro nas margens do Mar da Galileia:
«Leva a tua barca mais para o largo e lança as redes até fundo». [1]

Quando Pedro ouviu esta ordem respondeu que todas as tentativas para pescar no lago tinham sido vãs:
«Mestre, trabalhámos toda a noite e nada pescámos, mas à Tua Palavra…». [2]

Pode muito bem ter sucedido que tenhamos procurado para ganhar o bastante para sustentar a família, para aprender uma profissão, para corresponder a uma vocação, para obter um emprego, sem que, todavia, qualquer desses esforços parecesse ter tido êxito.
A ordem do Senhor é, porém, não desistir.
À Sua Palavra tornemos a lançar as redes.
O dever tem de estar sempre antes do prazer, pois as distracções são recompensa e não alternativa ou substituição do trabalho e tê, por conseguinte, de ser merecidas.

Quantas vezes, Deus está pronto a ajudar-nos muitos mais, principalmente quando reconhecemos que não conseguimos nada apenas pelo nosso esforço.
«Mas à Tua Palavra…».
É assim o estímulo dos heróis da perseverança.
Mercê da confiança na promessa de Nosso Senhor tornam-se dignos do auxílio d’Aquelecuja omnipotência criou do nada o Universo.

A Arca foi edificada em terra firme e, enquanto esteva a ser construída, uma multidão de curiosos reuniu-se à sua volta, troçando sarcasticamente do velho Noé.
Indiferente aos sarcasmos, Noé levantava os olhos ao Céu e dizia: “Senhor foi por Tua ordem que construi esta barca» [3]

Por sua vez, Pedro diria, não porque tivesse alcançado êxito, mas precisamente porque o não conseguira:

«Mas, à Tua Palavra, tornarei a lançar a redes» [4], quer dizer: sem a bênção de Deus a rede viria vazia e, com essa bênção, veio carregada de peixe.
Aqule noite de trabalho em vão transformou-se numa lição de fé obediente.
Pode acontecer-nos pior que uma derrota, porque podemos triunfar, orgulhar-nos do nosso êxito, ou até mesmo ao das redes., desprezando ao mesmo tempo os que não conseguem pescar nada e esquecendo que tudo depende da Vontade d’Aquele que tudo pode dar e tudo pode tirar.

Quando Pedro obedeceu, a sua rede vinha tão cheia que quase rebentava com o peso da pescaria.
À derrota seguiu-se o triunfo, não se seguiu à desistência do esforço mas sim à persistência.

Aqueles que disseram: “Trabalhei toda a noite em vão e “, agora quero dormir”, ou “não quero continuar a lançar as redes”, ou “já estou farto de trabalhar para nada”, não têm direito a esperar que Deus queira prestar-lhes ajuda.
Tal é o significado do velho e bem conhecido provérbio: “ Ajuda-te que Deus te ajudará”.

Quer isto dizer que devemos trabalhar como se tudo somente dependesse de nós e confiar em Deus como se tudo dependesse da Sua Vontade.

Quantas vezes o trabalho em que temos menos confiança que no fim nos dá a maior alegria!

O milagre Da pesca maraviçhosa fez com que Pedro caísse de joelhos aos pés de Jesus, dizendo-Lhe:

«Afasta-te de mim, Senhor, porque eu não passo de um pecador!» [5]

Era um grito de amor desesperado, não de desesperado ódio, o grito de alguém que ambicionava o bem infinito e se reconhecia indigno dele.

A maior parte da humanidade não tem plena consciência das suas deficiências morais, embora conheça perfeitamente as suas deficiências físicas.

Os que vivem afastados de Deus na verdade, carecem completamente de qualquer padrão pelo qual possa aferir até que distancia se afastaram dos preceitos da Lei Moral!
O cevado não tem a mínima ideia da limpeza nem do que significa.
Assi, os homens só começam a apreciar a degradação própria e a misericórdia de Deus, quando começam a elevar-se acima do ambiente dos miasmas das suas vidas pecaminosas.

A intuição e o talento de um grande médico fazem com que o doente acabe par ter consciência, não soda gravidade da doença de que escapou, como do encanto da saúde recuperada.
Ninguém pode, contudo, esperar ser admitido à presença de Deus, sem que primeiro tenha compreendido e cumprido o preceito que se impõe a todos os homens de purificarem primeiro as suas vidas, par que assim se assemelhem o mais possível à Sua imagem.

Naquela exclamação de São Pedro - «mas em vista da Tua Palavra…», - [6], encontra-se vibrantemente a nota da aceitação da Vontade de Deus, e não da sua rejeição.
Assim como um homem tem mais viva a sensação das suas culpas na presença de uma criança inocente, assim também é principalmente na presença de Deus que compreende que realmente nada vale, e pode muito bem suceder, que faça essa descoberta após a desilusão de uma grande derrota.

Fulton J. Sheen, Thoughts for dayly living, (tradução por AMA)


[1] Cfr. Lc 5, 4
[2] Ibid.
[3] Nas religiões abraâmicas, Noé ou Noach, é o nome do herói bíblico que recebeu ordens de Halá para a construção de uma arca, para salvar a Criação do Dilúvio
[4] Cfr. Lc 5, 4
[5] Cfr. Lc 5, 8
[6] Cfr. Lc 5, 5

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