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20/01/2020

THALITA KUM 76


THALITA KUM 76 

(Cfr. Lc 8, 49-56)


Saudade

Parece que só a língua portuguesa tem esta palavra única para significar a vontade, o desejo de voltar a viver algo que se viveu num passado, rever uma pessoa que está afastada, enfim, sentir a falta de algo ou alguém que naturalmente guardamos na memória como algo bom de que gostámos.

Noutros idiomas para exprimir este sentimento tem de usar-se uma frase composta. Realmente, em português as coisas são mais simples. E exactamente por ser simples, descrever o sentimento que representa pode ser complexo e difícil.
Por isso mesmo quase sempre se usa a palavra sem acrescentar nada mais porque ela já diz tudo quanto precisamos para descrever um estado de alma.

A saudade pode ser algo condicionante e esmagador sendo necessário exercer um controlo sério para que não tome demasiado vulto ou atinja níveis emocionais que terão sempre uma consequência: o mergulhar na tristeza, desesperança, abandono.
Depois, se não se actua a tempo, vem a auto-comiseração, o sentir-se o centro e único protagonista digno de toda a atenção, carinho, solidariedade.
Tende-se assim, em plano perigosamente inclinado, para o amor-próprio e, finalmente o orgulho.
Não se conclui que a saudade seja um defeito, de modo nenhum, mas pode converter um sentimento nobre numa sujeição pessoal torpe e sem mérito.
É aqui principalmente que se deve redobrar a atenção de forma a impedir a que esse sentimento atinja proporções grandes demais para o equilíbrio emocional da pessoa.

Disse antes que tal pode levar a um excessivo ensimesmamento que naturalmente conduzirá à solidão, ao sofrimento íntimo, que tenderá também a tornar-se um hábito e, pior, converter-se em desculpa para fugir ao comportamento normal, convívio com os outros, afectando virtudes importantes como a paciência, o bom humor, a alegria, a disponibilidade para servir, ser útil, a atenção aos outros, a diligência no trabalho.

A pessoa dominada pela saudade torna-se de trato difícil, maçadora, exigente, centralizadora das atenções dos outros.

De alguma forma tem sempre uma "desculpa" para não fazer o que deve quando deve.
Adia para um futuro qualquer em que "se sinta melhor" o que deveria fazer no momento e, quase sempre, parece-lhe que esta é uma justificação que todos devem aceitar e compreender.


AMA, reflexões sobre o Evangelho, 2006)

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