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Leitura espiritual


São Josemaria Escrivá

Amigos de Deus

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Jesus, parando, mandou chamá-lo.
E alguns dos melhores que o rodeiam, dirigem-se ao cego: Tem confiança; levanta-te; Ele chama-te.
É a vocação cristã!
Mas, na vida de cada um de nós, não há apenas um chamamento de Deus.
O Senhor procura-nos a todo o instante: levanta-te - diz-nos - e sai da tua preguiça, do teu comodismo, dos teus pequenos egoísmos, dos teus problemazinhos sem importância.
Desapega-te da terra; estás aí rasteiro, achatado e informe.
Ganha altura, peso, volume e visão sobrenatural.

Aquele homem, deitando fora a capa, levantou-se de um salto e foi ter com Jesus.
Atirou a capa!
Não sei se estiveste alguma vez na guerra.
Há já muitos anos, tive ocasião de andar por um campo de batalha, algumas horas depois de ter acabado a luta.
Lá havia, abandonados pelo chão, mantas, cantis e mochilas cheias de recordações de família: cartas, fotografias de pessoas queridas... E não pertenciam aos derrotados, mas aos vitoriosos!
Tudo aquilo lhes sobrava para correrem mais depressa e saltarem as trincheiras do inimigo.
Tal como acontecia com Bartimeu, para correr atrás de Cristo.

Não te esqueças de que, para chegar até Cristo, é preciso o sacrifício.
Deitar fora tudo o que estorva: manta, mochila, cantil. Tens de proceder da mesma maneira nesta luta pela glória de Deus, nesta luta de amor e de paz, com que procuramos difundir o reinado de Cristo. Para servires a Igreja, o Romano Pontífice e as almas, deves estar disposto a renunciar a tudo o que sobeja; a ficar sem essa manta, que é abrigo para as noites frias, sem essas recordações queridas da família e sem o refrigério da água.
Lição de fé, lição de amor, porque é assim que se tem de amar Cristo.

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Fé com obras

E imediatamente começa um diálogo divino, um diálogo maravilhoso, que comove, que abrasa, porque tu e eu somos agora Bartimeu.
Da boca divina de Cristo sai uma pergunta: quid tibi vis faciam?
Que queres que te faça?
E o cego: Mestre, faz que eu veja.
Que coisa mais lógica!

E tu, vês?
Não te aconteceu já, alguma vez, o mesmo que a esse cego de Jericó?
Não posso agora deixar de recordar que, ao meditar nesta passagem há já muitos anos e ao compreender então que Jesus esperava alguma coisa de mim - algo que eu não sabia o que era! - compus para mim, umas jaculatórias:
Senhor, que queres?
Que me pedes?
Pressentia que me procurava para uma realidade nova e o Rabboni, ut videam - Mestre, que eu veja - levou-me a suplicar a Cristo, numa oração contínua: Senhor, que se faça isso que Tu queres.

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Rezai comigo ao Senhor: doce me facere voluntatem tuam, quia Deus meus es tu, ensina-me a cumprir a tua Vontade, porque Tu és o meu Deus.
Por outras palavras: que brote dos nossos lábios o afã sincero por corresponder, com um desejo eficaz, aos convites do nosso Criador, procurando seguir os seus desígnios com uma fé inquebrantável, com a convicção de que Ele não pode falhar.

Amando deste modo a Vontade divina, percebemos como o valor da fé não consiste apenas na clareza com que se expõe, mas também na resolução de a defender com obras.
Assim, agiremos de acordo com ela.

Mas voltemos à cena que se desenrola à saída de Jericó.
Agora é contigo que Cristo fala.
Diz-te: que queres de Mim?
Que eu veja, Senhor, que eu veja!
E Jesus: Vai, a tua fé te salvou.
Nesse mesmo instante, começou a ver e seguia-o pelo caminho. Segui-lo pelo caminho.
Tu tomaste conhecimento do que o Senhor te propunha e decidiste acompanhá-lo pelo caminho.
Tu procuras seguir os seus passos, vestir-te com as vestes de Cristo, ser o próprio Cristo: portanto, a tua fé - fé nessa luz que o Senhor te vai dando - deverá ser operativa e sacrificada.
Não te iludas, não penses em descobrir novas formas.
É assim a fé que Ele nos pede: temos de andar ao seu ritmo com obras cheias de generosidade, arrancando e abandonando tudo o que seja estorvo.

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Fé e humildade

Agora é S. Mateus quem nos descreve um quadro comovedor.
Eis que uma mulher, que, havia doze anos, padecia de um fluxo de sangue, se chegou por detrás dele e tocou a fímbria do seu manto. Que humildade a desta mulher!
Dizia dentro de si: Basta que eu toque somente o seu manto para ficar curada.
Nunca faltam doentes que imploram, como Bartimeu, com uma fé grande, e que não têm pejo em confessá-la aos gritos.
Mas reparai como, no caminho de Cristo, não há duas almas iguais. Grande é também a fé desta mulher, e não grita: aproxima-se sem que ninguém a note.
Basta-lhe tocar ao de leve o traje de Jesus, porque tem a certeza de que será curada.
E ainda mal tinha acabado de fazê-lo, quando Nosso Senhor se volta e a olha.
Já sabe o que se passa no interior daquele coração.
Apercebeu-se da sua segurança: Tem confiança, filha, a tua fé te salvou.

Tocou com delicadeza a orla do manto, aproximou-se com fé, acreditou e soube que tinha sido curada...
Também nós, se queremos salvar-nos, devemos tocar com fé o manto de Cristo.
Estás bem persuadido de como há-de ser a nossa fé?
Humilde.
Quem és tu, quem sou eu, para merecer este chamamento de Cristo? Quem somos nós, para estar tão perto dele?
Tal como àquela pobre mulher no meio da multidão, ofereceu-nos uma oportunidade.
E não só para tocar um pouco do seu traje ou, num breve momento, a ponta do seu manto, a orla.
Temo-lo a ele próprio.
Entrega-se-nos totalmente, com o seu Corpo, com o seu Sangue, com a sua Alma e com a sua Divindade.
Comemo-lo todos os dias, falamos intimamente com Ele, como se fala com um pai, como se fala com o Amor.
E isto é verdade.
Não são imaginações.

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Procuremos que aumente a nossa humildade.
Porque só uma fé humilde permite que tenhamos visão sobrenatural. Não existe outra alternativa.
Só são possíveis dois modos de viver na terra: ou se vive vida sobrenatural ou vida animal.
E tu e eu não podemos viver senão a vida de Deus, a vida sobrenatural.
Que aproveitará ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a sua alma.
Que proveito terá para o homem tudo o que existe na terra, todas as ambições da inteligência e da vontade? Que vale tudo isto, se tudo se acaba, se tudo se desfaz, se são bambolinas de teatro todas as riquezas deste mundo terreno, se depois é a eternidade para sempre, para sempre, para sempre?

Este advérbio - sempre - tornou grande Teresa de Jesus. Quando ela - em criança - saía pela porta do rio Adaja, atravessando as muralhas da cidade acompanhada por seu irmão Rodrigo, com o intuito de chegar a terras de moiros, para que os decapitassem por amor de Cristo, ia segredando ao irmão que já dava mostras de cansaço: para sempre, para sempre, para sempre.

Mentem os homens ao dizer para sempre em coisas temporais. Só é verdade, com uma verdade total, o para sempre em relação a Deus.
E assim hás-de viver tu, com uma fé que te ajude a sentir sabor de mel, doçura de céu, ao pensares na eternidade, que é, de verdade, para sempre.

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Vida corrente e contemplação

Voltemos ao Santo Evangelho e detenhamo-nos no que refere S. Mateus, no capítulo vigésimo primeiro.
Conta-nos que Jesus, quando voltava para a cidade, teve fome.
Vendo uma figueira junto do caminho, aproximou-se dela.
Que alegria, Senhor, ver-te com fome, ver-te também sedento, junto do poço de Sicar!
Contemplo-te perfectus Deus, perfectus homo: verdadeiro Deus, mas também verdadeiro homem, com carne como a minha.
Aniquilou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, para que eu nunca mais duvidasse de que Ele me compreende e me ama.

Teve fome.
Sempre que nos cansemos - no trabalho, no estudo, na tarefa apostólica - sempre que no horizonte haja trevas, então é preciso olhar Cristo: Jesus bom, Jesus cansado, Jesus faminto e sedento.
Como te fazes compreender bem, Senhor!
Como te fazes amar!
Mostras-te igual a nós em tudo, excepto no pecado, para que sintamos que contigo poderemos vencer as nossas más inclinações e as nossas culpas.
Efectivamente, não têm importância o cansaço, a fome, a sede, as lágrimas...
Cristo cansou-se, passou fome, teve sede, chorou.
O que importa é a luta - uma luta amável, porque o Senhor permanece sempre a nosso lado - para cumprir a vontade do Pai que está nos céus.

(cont)


Pequena agenda do cristão


TeRÇa-Feira


(Coisas muito simples, curtas, objectivas)




Propósito:

Aplicação no trabalho.

Senhor, ajuda-me a fazer o que devo, quando devo, empenhando-me em fazê-lo bem feito para to poder oferecer.

Lembrar-me:
Os que estão sem trabalho.

Senhor, lembra-te de tantos e tantas que procuram trabalho e não o encontram, provê às suas necessidades, dá-lhes esperança e confiança.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?




Evangelho e comentário


TEMPO COMUM

São Gregório Magno – Doutor da Igreja

Evangelho: Lc 4, 31-37

Naquele tempo, Jesus desceu a Cafarnaum, cidade da Galileia, e ali ensinava aos sábados. Todos se maravilhavam com a sua doutrina, porque falava com autoridade. Encontrava-se então na sinagoga um homem que tinha um espírito de demónio impuro, que bradou com voz forte: «Ah! Que tens que ver connosco, Jesus de Nazaré? Vieste para nos destruir? Eu sei quem Tu és: o Santo de Deus». Disse-lhe Jesus em tom severo: «Cala-te e sai desse homem». O demónio, depois de o ter arremessado para o meio dos presentes, saiu dele sem lhe fazer mal nenhum. Todos se encheram de assombro e diziam entre si: «Que palavra esta! Ordena com autoridade e poder aos espíritos impuros e eles saem!». E a fama de Jesus espalhava-se por todos os lugares da região.

Comentário:

Vê-se bem a diferença de acolhimento prestado a Jesus em Cafarnaum e em Nazaré.


Será porque os de Cafarnaum têm mais fé?

Será, talvez, porque não têm preconceitos nem reservas de intenção, mas, antes, genuína vontade de aprender.

(AMA, comentário sobre Lc 4, 31-37, 05.09.2017)


Temas para reflectir e meditar


Unidade de vida


Hoje não parece que haja muita gente que sofra com a Sua ausência; há cristãos para os quais a presença ou ausência de Cristo nas suas almas não significa praticamente nada.
Passam da graça ao pecado e não experimentam sofrimento nem dor, aflição nem angústia.
Passam do pecado à graça e não dão a impressão de homens que voltaram do inferno, que passaram da morte à vida: não se lhes vê o alívio, o gozo, a paz e o sossego de quem recuperou Jesus.


(f. suarezJosé o esposo de Maria, 195)



O trabalho é uma bênção de Deus


O trabalho é a vocação original do homem; é uma bênção de Deus; e enganam-se lamentavelmente aqueles que o consideram um castigo. O Senhor, o melhor dos pais, colocou o primeiro homem no Paraíso – "ut operaretur", para trabalhar. (Sulco, 482)

O trabalho acompanha necessariamente a vida do homem sobre a terra. Com ele nascem o esforço, a fadiga, o cansaço, as manifestações de dor e de luta que fazem parte da nossa existência humana actual e que são sinais da realidade do pecado e da necessidade da redenção. Mas o trabalho, em si mesmo, não é uma pena nem uma maldição ou castigo: os que assim falam não leram bem a Sagrada Escritura.

É a hora de nós, os cristãos, dizermos bem alto que o trabalho é um dom de Deus e que não tem nenhum sentido dividir os homens em diversas categorias segundo os tipos de trabalho, considerando umas tarefas mais nobres do que outras. O trabalho, todo o trabalho, é testemunho da dignidade do homem, do seu domínio sobre a criação. É um meio de desenvolvimento da personalidade. É um vínculo de união com os outros seres; fonte de recursos para sustentar a família; meio de contribuir para o melhoramento da sociedade em que se vive e para o progresso de toda a Humanidade.

Para um cristão, essas perspectivas alargam-se e ampliam-se, porque o trabalho aparece como participação na obra criadora de Deus que, ao criar o homem, o abençoou dizendo-lhe: Procriai e multiplicai-vos e enchei a terra e subjugai-a, e dominai sobre todo o animal que se mova à superfície da terra. (Cristo que passa, 47)