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19/10/2018

Leitura espiritual

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LEGENDA MAIOR  

(Vida de São Francisco de Assis)

CAPÍTULO 3

Fundação da Ordem e aprovação da Regra

10. O servo de Deus entregou-se imediatamente à oração fervorosa e com suas humildes súplicas obteve do Senhor que lhe revelasse o que deveria falar ao Pontífice e que este sentisse em seu íntimo os efeitos da inspiração divina. Como Deus lhe havia sugerido, contou ao Pontífice a parábola de um rei muito rico que, feliz, desposara uma bela senhora pobre e dela tivera vários filhos com a mesma fisionomia do rei, pai deles, e que por isso forem educados em seu palácio. E acrescentou à guisa de explicação: “Não há nada a temer que morram de fome os filhos e herdeiros do Rei dos céus, os quais, nascidos por virtude do Espírito Santo, à imagem de Cristo Rei, de uma mãe pobre, serão gerados pelo espírito da pobreza numa religião sumamente pobre. Pois se o Rei dos céus promete a seus seguidores a posse de um reino eterno, quanto mais seguros podemos estar de que lhes dará também todas aquelas coisas que comummente não nega nem aos bons nem aos maus!”

O Vigário de Cristo ouvira com muito interesse a parábola e sua explicação; estava maravilhado e já não duvidava de que Cristo havia falado pela boca deste homem. Tivera, aliás, pouco tempo antes uma visão em que o Espírito de Deus lhe mostrara a missão a que Francisco estava destinado. De facto, vira em sonho a basílica do Latrão prestes a ruir e um homem pobrezinho, pequeno e de aspecto desprezível, a sustinha com os ombros para não cair.
E concluiu o Pontífice: “Este é, na verdade, aquele que com seu exemplo e doutrina há de sustentar a santa Igreja de Deus”.
Por essa razão anuiu benignamente ao pedido do santo, e daí em diante o teve sempre em grande estima.
Concedeu-lhe pois o que pedia, prometendo-lhe conceder muito mais para o futuro.
Aprovou também a Regra e deu-lhe a missão de ir por todo o mundo pregar a penitência.
Mandou igualmente impor tonsuras em todos os leigos companheiros de Francisco para lhes permitir pregar a palavra de Deus sem empecilhos. “

CAPITULO 4

Progresso da Ordem sob a sua direcção e confirmação da Regra aprovada anteriormente

1. Com a graça de Deus e aprovação do papa, Francisco sentia-se agora confiante; e outra vez tomou O caminho pelo vale de Espoleto, onde resolveu pregar o Evangelho de Cristo e viver de acordo com ele. E confabulando pelo caminho com os seus companheiros, discutiam a maneira como observar com toda sinceridade a Regra que haviam recebido e como viveriam diante de Deus em santidade e justiça. Discutiam igualmente como se aperfeiçoariam e dariam aos outros o bom exemplo.
Já se fazia tarde e eles ainda prosseguiam o colóquio.
Estavam cansados pelo esforço contínuo do caminho e começaram a ficar com fome. Decidiram então parar num lugar solitário. Premidos por essa necessidade e não podendo de nenhum modo ir à procura de alimentos, experimentaram logo os efeitos da amorosa providência do Senhor.
Apareceu inesperadamente um homem carregando algum pão que lhes deu, desaparecendo logo a seguir, sem lhes deixar qualquer ideia de onde viera ou para onde seguira.
Os irmãos reconheceram então que a companhia do homem de Deus era para eles uma garantia da ajuda de Deus e sentiram-se saciados mais pelo dom da generosidade divina do que pelo alimento material recebido.
Ainda muito comovidos, decidiram firmemente e assumiram o compromisso irrevogável de jamais ser infiéis ao voto de pobreza, quaisquer que fossem sua escassez e trabalhos.

2. Chegaram finalmente ao vale de Espoleto, animados dessas boas disposições.
Começaram a discutir se haveriam de viver entre o povo ou procurar a solidão.
Francisco, que era um verdadeiro servo de Deus, recusou confiar apenas na sua própria opinião ou nas sugestões dos seus companheiros. Mas quis saber a vontade de Deus perseverando na oração. Depois, iluminado por uma revelação divina, sentiu que era enviado por Deus para conquistar para Cristo as almas que o demónio estava tentando roubar. Por isso resolveu viver para utilidade de todos e não apenas para si só, sentindo nisso o exemplo daquele que se dignou morrer pela salvação de todos os homens.

3. Retirou-se pois o servo de Deus com os seus companheiros para um tugúrio pobre e abandonado, perto de Assis.
Viviam aí trabalhando muito e passando penúria, de acordo com a altíssima pobreza, comprazendo-se em alimentar-se mais com o pão das lágrimas do que com a abundância e as delícias terrenas.
Entregavam-se ali a santos e piedosos exercícios; a sua oração devota e quase nunca interrompida era mais mental do que vocal, pois não dispunham de livros litúrgicos pelos quais pudessem recitar as horas canónicas do ofício divino. Mas, na falta desses, revolviam dia e noite o livro da cruz de Cristo, que sempre tinham à vista, incitados pelo exemplo e pela palavra do amantíssimo pai, que frequentemente lhes pregava com inefável doçura as glórias da cruz de Cristo. E como os irmãos lhe pedissem com insistência que os ensinasse a orar, disse-lhes:
“Quando quiserdes orar, dizei:
“Pai-nosso” e: “Nós vos adoramos, ó Cristo, em todas as igrejas que estão no mundo inteiro e vos bendizemos porque por vossa santa cruz remistes o mundo”. Ensinou-lhes também a louvar a Deus em todas as suas criaturas, a venerar com especial respeito os sacerdotes, a crer firmemente e confessar com simplicidade os dogmas da fé conforme crê e ensina a santa Igreja Romana.
Os discípulos seguiam fielmente a doutrina do seu santo mestre e todas as vezes que divisavam ao longe alguma igreja ou cruz, prostravam-se humildemente e adoravam-nas na forma que haviamaprendido.

4. Durante o tempo em que os irmãos moravam nesse lugar, foi o santo à cidade de Assis num Sábado para no Domingo fazer o sermão costumeiro na catedral.
Enquanto passava a noite em oração, conforme seu hábito, num tugúrio situado no jardim dos cónegos, longe dos seus filhos, eis que por volta da meia-noite - alguns irmãos dormiam, outros ainda oravam - um carro de fogo de maravilhoso esplendor encimado por um globo resplandecente, semelhante ao sol, que iluminava a noite, entrou pela porta da cabana e deu três voltas.
Os que vigiavam ficaram estupefactos e os que dormiam acordaram apavorados; os seus corações iluminaram-se mais que os seus corpos, embora a essa luz admirável pudessem ler às claras a consciência de cada um; eram capazes de penetrar os sentimentos uns dos outros, e acreditavam unanimemente que era o Pai que, embora ausente de corpo, se encontrava presente em espírito, aparecendo-lhes sob essa imagem, fulgurante e abrasado de amor.
Também tinham plena certeza de que o Senhor lhes queria mostrar por esse carro de fogo resplendente que eles seguiam, como verdadeiros israelitas, o novo Elias estabelecido por Deus para ser “o carro e o condutor” (cf. 4Rs 2,12) dos homens do Espírito.
Devemos crer que Deus, pela oração de Francisco, abriu os olhos desses homens simples para que contemplassem as suas grandezas, como outrora havia aberto os olhos do servo de Eliseu para que visse “a montanha coberta de carros de fogo e de cavalos que rodeavam o profeta” (cf. 4Rs 6,17).
Ao voltar o santo homem para junto de seus irmãos, penetrou os segredos das suas consciências, reanimou-lhes a coragem falando-lhes da visão extraordinária que haviam tido e fez-lhes numerosas predições com relação aos progressos da Ordem.
Ao ouvi-lo expor assim tantas coisas fora do alcance de uma inteligência humana, compreenderam os irmãos claramente que o Espírito do Senhor estava sobre seu servo Francisco com tal plenitude que para eles a escolha mais acertada era seguir a sua vida e doutrina.

5. Depois desses acontecimentos, Francisco, pastor da pequena grei, inspirado pela graça divina, conduziu os seus doze irmãos a Santa Maria da Porciúncula, pois desejava que a Ordem dos irmãos menores crescesse e se desenvolvesse sob a protecção da Mãe de Deus, naquele lugar em que, pelos méritos dela, havia dado os primeiros passos.
Como arauto do Evangelho, percorria cidades e vilas, anunciando o reino de Deus, “não por doutas palavras da sabedoria humana, mas pela virtude do Espírito Santo” (1Cor 2,13).
Parecia um homem do outro mundo, conservando a alma e o semblante continuamente voltados para o alto e procurando erguer da terra todos os corações.
Desde então a vinha do Senhor começou a produzir rebentos perfumados, flores de suavidade, de honra e de santidade e a dar frutos abundantes.


São Boaventura

(cont)

(Revisão da versão portuguesa por AMA)

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