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04/03/2018

Leitura espiritual

Jesus Cristo o Santo de Deus

CAPÍTULO VI

«TU AMAS-ME?»

O AMOR POR JESUS

1.   Porquê amar Jesus Cristo?

O primeiro motivo para amar Jesus Cristo e o mais simples, é que Ele mesmo no-lo pede.
Na última aparição de Jesus ressuscitado recordada no evangelho de João, a um certo momento, Jesus dirige-se a Simão Pedro e pergunta-lhe por três vezes seguidas:
«Simão, filho de João, tu amas-Me?» [i]

Por duas vezes, nestas palavras de Jesus é utilizado o verbo agapao que significa, habitualmente, a forma mais alta do amor, do ágape, ou da caridade, e uma vez que o verbo phileo, que significa o amor de amizade, o querer bem ou ter afeição por alguém.
“No fim da vida seremos interrogados sobre o amor” [ii] e vemos que o mesmo sucede com os Apóstolos: no fim da sua vida com Jesus, no fim do evangelho, foram interrogados sobre o amor.
Não sobre outra coisa.

Como todas as grandes palavras de Cristo no evangelho, também esta «Tu amas-Me?» não é dirigida só a quem a ouviu pela primeira vez, neste caso a Pedro, mas a todos aqueles que leem o evangelho.
De outro modo o evangelho não seria o livro que é, o livro que contém palavras que «Não passam» [iii]
Como pode, de resto, alguém que sabe quem é Jesus Cristo, ouvir aquelas palavras dos Seus lábios e não se sentir pessoalmente interpelado, não perceber que aquele «tu» do «tu amas-Me?» se dirige a ele mesmo?

Esta pergunta coloca-nos de repente numa posição especial, isola-nos de todos, individualiza-nos, faz de nós pessoas.
À pergunta “Tu amas-Me?” não se pode responder por interposta pessoa ou interposta instituição.
Não basta fazer parte de um corpo, a Igreja, que ama Jesus.
Notamos isso na própria narração evangélica, sem com isto querer forçar o texto.
Até àquele momento o cenário, apresenta-se apinhado de gente e movimentado: juntamente com Simão Pedro, estavam Tomé e Natanael, os dois filhos de Zebedeu e outros dois discípulos.
Em conjunto tinham pescado comido e reconhecido o Senhor.
Mas, agora, improvisamente àquela pergunta do Jesus, tudo e todos são como que mergulhados do nada e desaparecem da cena evangélica.
Cria-se um espaço íntimo em que se encontram sozinhos, um defronte do outro, Jesus e Pedro.
O Apóstolo é individualizado e isolado de todos por aquela pergunta inesperada: “Tu amas-Me?”
É uma pergunta à qual ninguém pode responder por Ele e à qual ele não pode responder – como fez tantas outras vezes – em nome de todos os outros, mas a que deve responder só por si mesmo.
E, de facto, vê-se que Pedro é constrangido, pelo aperto das três perguntas, a reflectir, passando das primeiras duas repostas, imediatas mas superficiais, última, na qual se vê assomar nele o conhecimento do seu passado etambém uma grande humildade:
«Senhor, Tu conheces tudo; Tu sabes que eu Te amo» [iv].

Deve-se, portanto, amar Jesus porque Ele mesmo no-lo pede.
Mas também por um outro motivo: porque Ele nos amou em primeiro lugar.
Era isso que inflamava mais que outra coisa o Apóstolo Paulo:
«Ele amou-me – dizia – e entregou-Se a Si mesmo por mim[v].
«O amor de Cristo – dizia ele ainda – leva-nos a pensar que um morreu por todos» [vi].
O facto de Jesus nos ter amado em primeiro lugar e até ao ponto de dar a Sua vida por nós, ”constrange-nos”, ou, como se pode dizer também – “força-nos de todos os lados”, e urge em nós interiormente.
Trata-se daquela tão conhecida lei pela qual o amor «a nullo amato amar perdona» [vii],isto é, não permite àquele que é amado corresponder com o seu amor!
«Como não corresponder com amor a quem tanto nos amou?», canta um hino da Igreja. [viii]
O amor só com amor se paga.
Nenhum outro peço é adequado.

Deve-se, pois, amar Jesus sobretudo porque Ele édigno de amor e amável em Si mesmo.
Ele reúne em Si toda a beleza, toda a perfeição e santidade.
O nosso coração tem necessidade de “alguma coisa de majestoso” para amar; por isso, nada a não ser Ele pode satisfazê-lo plenamente.
Se o Pai celeste encontra n’Ele, como está escrito, «toda a complacência», se o Filho é objecto de todo o Seu amor [ix]como não há-de ser também do nosso?
Se Ele enche e satisfaz toda a capacidade infinita de amor de Deus Pai, não encherá também a nossa?

Além disso, deve-se amar Jesus, porque somente O conhece quem O ama:
«Manifestar-Me-ei a quem Me ama» [x]
Se é1 verdadeiro o axioma que “não se pode amar aquilo que não se conhece” (Nihil volitum quim precognitum), é do mesmo modo verdadeiro, especialmente quando se trata das coisas divinas, também o seu contrário, isto é, não se conhece senão aquilo que se ama.
Stº Agostinho exprimiu este conceito dizendo que, «não se entra na verdade senão através da caridade» [xi].
Esta intuição e valorizada também nalgumas correntes do pensamento moderno, como a fenomenologia e o existencialismo [xii].
Mas quando se trata de Cristo e Deus, é valorizada sobretudo pela constante experiência dos santos e de todos os crentes.
Sem um verdadeiro amor, inspirado pelo Espirito Santo, o Jesus que se vem a conhecer através das mais brilhantes e refinadas análises cristológicas, não é o verdadeiro Jesus.

(cont)
rainiero cantalamessa, Pregador da Casa Pontifícia.





[i] Jo 21,16
[ii] S. João da Cruz, Sentenças, n. 57
[iii] Mt 24,35
[iv] Jo 21,17
[v] Gl 2,20
[vi] 2Cor 5,14
[vii] Hino Adeste Fideles.
[viii] Stº Agostinho, C. Faustum, 32,18 (PL,42,507
[ix] Cfr. Mt 3,17; 17,5
[x] Jo 14,21
[xi] Stº Agostinho, CFaustum, 32,18 (PI. 42,507)
[xii] Cfr. M. Heldegger, Ser e Tempo, I, 5,29

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