Páginas

13/05/2016

Os demónios do apostolado 7

7. Perder o sentido das pessoas

Este demónio converte o apóstolo num executivo da pastoral. Alguns cargos e trabalhos se prestam mais a isso, mas em todo caso, o resultado, progressiva e às vezes imperceptivelmente, se dá de maneira semelhante. Isso ocorre quando o apóstolo se vai deixando absorver de tal modo pelo administrativo, o organizativo, o planeamento e a supervisão, que já não tem tempo, e sobretudo espaço psicológico, para dedicar-se às pessoas pelas quais trabalha, para dedicar-lhes o tempo necessário e para estar próximo delas.

O demónio da despersonalização do apostolado faz com que o apóstolo esteja tão dedicado aos meios de ação e de serviço, que esquece das pessoas a quem serve e em função das quais estão organizações e programas que tanto o absorvem.

Esta tentação pode tomar outras formas. Por exemplo, o apóstolo que se converte em executivo pastoral, poderá ter a tendência a dar um valor excessivo aos planos, aos programas e às linhas de ação, esquecendo-se da realidade das pessoas que devem levar a cabo tudo isso. Acaba impondo esquemas às pessoas em lugar de adaptar os esquemas e programas à realidade delas. E assim, realidade o apóstolo executivo vão se tornando cada vez mais distante.

O ponto de partida de todo o apostolado são as pessoas, com suas possibilidades e seus limites, e não os esquemas, por melhores e mais ideais que sejam.

Fonte: presbíteros

(revisão da versão portuguesa por ama)

Este texto é um extracto do livro do teólogo chileno segundo galilea, Tentación y Discernimiento, Narcea, Madrid 1991, p. 29-67

Antigo testamento / Êxodo 1

Êxodo 1

Os israelitas oprimidos

1 São estes, pois, os nomes dos filhos de Israel que entraram com Jacob no Egipto, cada um com a sua respectiva família:

2 Rúben, Simeão, Levi e Judá;

3 Issacar, Zebulom e Benjamim;

4 Dã, Naftali, Gade e Aser.

5 Ao todo, os descendentes de Jacob eram setenta; José, porém, já estava no Egipto.

6 Ora, morreram José, todos os seus irmãos e toda aquela geração.

7 Os israelitas, porém, eram férteis, proliferaram, tornaram-se numerosos e fortaleceram-se muito, tanto que encheram o país.

8 Então subiu ao trono do Egipto um novo rei, que nada sabia sobre José.

9 Disse ele ao seu povo: "Vejam! O povo israelita é agora numeroso e mais forte que nós.

10 Temos que agir com astúcia, para que não se tornem ainda mais numerosos e, no caso de guerra, aliem-se aos nossos inimigos, lutem contra nós e fujam do país".

11 Estabeleceram, pois, sobre eles chefes de trabalhos forçados, para os oprimir com tarefas pesadas. E assim os israelitas construíram para o faraó as cidades-celeiros de Pitom e Ramessés.

12 Todavia, quanto mais eram oprimidos, mais numerosos se tornavam e mais se espalhavam. Por isso os egípcios passaram a temer os israelitas e os sujeitaram a cruel escravidão.

13 Tornaram-lhes a vida amarga, impondo-lhes a árdua tarefa de preparar o barro e fazer tijolos, e executar todo tipo de trabalho agrícola; em tudo os egípcios os sujeitavam a cruel escravidão.

14 O rei do Egipto ordenou às parteiras dos hebreus, que se chamavam Sifrá e Puá:

15 "Quando ajudarem as hebreias a dar à luz, verifiquem se é menino. Se for, matem-no; se for menina, deixem-na viver".

16 Todavia, as parteiras temeram a Deus e não obedeceram às ordens do rei do Egipto; deixaram viver os meninos.

17 Então o rei do Egipto convocou as parteiras e perguntou-lhes: "Porque fizeram isso? Porque deixaram viver os meninos?"

18 Responderam as parteiras ao faraó: "As mulheres hebreias não são como as egípcias. São cheias de vigor e dão à luz antes de chegarem as parteiras".

19 Deus foi bondoso com as parteiras; e o povo ia-se tornando ainda mais numeroso, cada vez mais forte.

20 Visto que as parteiras temeram a Deus, ele concedeu-lhes que tivessem as suas próprias famílias.

21 Por isso o faraó ordenou a todo o seu povo: "Lancem ao Nilo todos os menino recém-nascidos, mas deixem viver as meninas".


(Revisão da versão portuguesa por ama)

Maio - Fátima


NOSSA SENHORA DE FÁTIMA 13 Maio

Nota Histórica    

No ano 1917, quando o mundo se debatia ainda nas violências e atrocidades da guerra, a Virgem Maria apareceu seis vezes em Fátima a três pastorinhos, Lúcia, Jacinta e Francisco. Por meio deles, a Santa Mãe de Deus recomendou insistentemente aos homens a firmeza da fé e o espírito de oração, penitência e reparação. O culto de Nossa Senhora de Fátima, depois de ter sido aprovado pelo Bispo da diocese e mais tarde confirmado pela Autoridade Apostólica, foi especialmente honrado com a peregrinação do papa Paulo VI ao local das aparições no ano 1967 e João Paulo II nos anos 1982 e 1991.

Maria, Mãe da Igreja e Advogada dos fiéis

Por ocasião das cerimónias religiosas que têm lugar nestes dias em Fátima, Portugal, em honra da Virgem Mãe de Deus, onde acorrem numerosas multidões de fiéis para venerarem o seu coração maternal e compassivo, desejamos mais uma vez chamar a atenção de todos os filhos da Igreja para o inseparável vínculo que existe entre a maternidade espiritual de Maria e os deveres que têm para com Ela os homens resgatados.
Julgamos ser de grande utilidade para as almas dos fiéis considerar duas verdades muito importantes para a renovação da vida cristã.
A primeira verdade é esta: Maria é Mãe da Igreja, não só por ser Mãe de Jesus Cristo e sua íntima colaboradora na nova economia da graça, quando o Filho de Deus n’Ela assumiu a natureza humana para libertar o homem do pecado mediante os mistérios da sua carne, mas também porque brilha à comunidade dos eleitos como admirável modelo de virtude.
Depois de ter participado no sacrifício redentor de seu Filho, e de maneira tão íntima que mereceu ser por Ele proclamada Mãe não somente do discípulo João, mas – seja consentido afirmá-lo – do género humano, por este de algum modo representado, Ela continua agora no Céu a desempenhar a sua função materna de cooperadora no nascimento e desenvolvimento da vida divina em cada alma dos homens remidos.
Mas de que modo coopera Maria no crescimento da vida da graça nos membros do Corpo Místico? Antes de tudo, pela sua oração incessante, inspirada por uma ardentíssima caridade. A Virgem Santa, de facto, gozando embora da contemplação da Santíssima Trindade, não esquece os seus filhos que caminham, como Ela outrora, na peregrinação da fé; pelo contrário, contemplando-os em Deus e conhecendo bem as suas necessidades, em comunhão com Jesus Cristo que está sempre vivo para interceder por nós, deles se constitui Advogada, Auxiliadora, Amparo e Medianeira.
No entanto, a cooperação da Mãe da Igreja no desenvolvimento da vida divina nas almas não consiste apenas na sua intercessão junto do Filho. Ela exerce sobre os homens remidos outra influência importantíssima, a do exemplo, segundo a conhecida máxima: as palavras movem, o exemplo arrasta. Realmente, tal como os ensinamentos dos pais adquirem maior eficácia quando são acompanhados pelo exemplo duma vida conforme as normas da prudência humana e cristã, assim também a suavidade e o encanto das excelsas virtudes da Imaculada Mãe de Deus atraem irresistivelmente as almas para a imitação do divino modelo, Jesus Cristo, de que Ela foi a mais perfeita imagem.
Mas nem a graça do divino Redentor nem a poderosa intercessão de sua e nossa Mãe espiritual poderiam conduzir-nos ao porto da salvação, se a tudo isso não correspondesse a nossa perseverante vontade de honrar Jesus Cristo e a Virgem Mãe de Deus com a fiel imitação das suas sublimes virtudes.
É, pois, dever de todos os cristãos imitar religiosamente os exemplos de bondade que lhes deixou a Mãe do Céu. É esta a segunda verdade sobre a qual nos agrada chamar a vossa atenção. É em Maria que os cristãos podem admirar o exemplo que lhes mostra como realizar, com humildade e magnanimidade, a missão que Deus confiou a cada um neste mundo, em ordem à sua eterna salvação e à do próximo.
Uma mensagem de suma utilidade parece chegar hoje aos fiéis da parte d’Aquela que é a Imaculada, a toda santa, a cooperadora do Filho na restauração da vida sobrenatural das almas. A santa contemplação de Maria incita-os, de facto, à oração confiante, à prática da penitência, ao santo temor de Deus, e recorda-lhes com frequência aquelas palavras com que Jesus Cristo anunciava estar perto o reino dos Céus: Arrependei-vos e acreditai no Evangelho, bem como a sua severa advertência: Se não vos arrependerdes, perecereis todos de maneira semelhante.
Comemorando-se este ano o vigésimo quinto aniversário da solene consagração da Igreja a Maria Mãe de Deus e ao seu Coração Imaculado, feita pelo Nosso Predecessor Pio XII no dia 31 de Outubro de 1942, por ocasião da Rádio-Mensagem à Nação Portuguesa – consagração que Nós mesmo renovámos no dia 21 de Novembro de 1964 – exortamos todos os filhos da Igreja a renovar pessoalmente a sua própria consagração ao Coração Imaculado da Mãe da Igreja e a viver este nobilíssimo acto de culto com uma vida cada vez mais conforme à vontade divina, em espírito de serviço filial e devota imitação da sua celeste Rainha.

(Da Exortação Apostólica Signum magnum do Papa Paulo VI, Dia 13 de Maio de 1967: AAS 56, 1967, 4-473, 475)


Evangelho, comentário, L. espiritual


Páscoa

Evangelho: Lc 11, 27-28

27 Aconteceu que, enquanto Ele dizia estas palavras, uma mulher, levantando a voz do meio da multidão, disse-Lhe: «Bem-aventurado o ventre que Te trouxe e os peitos a que foste amamentado». 28 Porém, Ele disse: «Antes bem-aventurados aqueles que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática».

Comentário:

Que extraordinária resposta do Senhor!

Coloca-nos a todos os homens no mesmo nível, posição e categoria da Sua Santíssima Mãe!

Além da honra excepcional que nos concede - sem qualquer mérito da nossa parte - atribui-nos a responsabilidade dessa mesma honra: pôr em prática as Suas palavras.

Não o esqueçamos!

(ama, comentário sobre Lc 11, 27-28, 2015.10.10)


Leitura espiritual



INTRODUÇÃO AO CRISTIANISMO

INTRODUÇÃO


“CREIO – AMÉM”

CAPÍTULO PRIMEIRO

Fé no Mundo Hodierno

  1. Dúvida e Fé Situação do homem frente ao problema "Deus”

…/6

Verum quia faciendum – quer dizer que o domínio do "facto" foi substituído mais e mais, a partir do meado do século XIX, pelo domínio do factível, do a-ser-feito e do passível-de-fazer, com o que a preponderância da história cede lugar à techne, à técnica. Pois, quanto mais o homem avança pela rota nova, concentrando-se no "facto" e nele buscando certeza, tanto mais se vê obrigado a reconhecer que o "facto", ou seja a obra de suas mãos, lhe foge sempre mais das mãos. A comprovação visada pelo historiador, surgida apenas no século XIX como grande triunfo da história contra a especulação, conserva sempre algo de problemático, um momento de reconstrução, de exegese e de equívoco, de modo que arrastou a história, já no começo deste século, para uma crise, tornando duvidoso o historicismo na sua orgulhosa pretensão científica. Revelou-se sempre mais claramente a impossibilidade do "facto" em estado puro, cercado de certeza inabalável, pois também nele se encerram sempre o sentido e a sua duplicidade. Tornou-se sempre mais difícil ocultar que não se detinha entre as mãos aquela certeza que inicialmente se tinha esperado conseguir da pesquisa dos factos, voltando-se as costas à especulação.

Assim impôs-se forçosamente e gradativamente a convicção de que, em última análise, é acessível ao conhecimento humano somente aquilo que o homem pode reproduzir quantas vezes quiser, através da experiência. Tudo o que ele consegue perceber apenas mediante provas secundárias torna-se passado e, mau-grado todas as provas, não é plenamente conhecível. Com isto surge o método das ciências naturais, resultante da matemática (Descartes) e do retorno à facticidade em forma de experiência repetível, como único e seguro portador de certeza. Da fusão do pensamento matemático e dos factos resulta a nova realidade espiritual, determinada pelas ciências naturais, do homem moderno, o lugar novo que conota retorno à realidade na sua feição de facticidade. O facto fez sair de dentro de si o factível; o repetível é o comprovável e existe por sua causa. Chega-se ao primado do factível sobre o facto, pois realmente de que servirá ao homem o que meramente existiu? Querendo ser dono do seu presente, o homem não pode encontrar sentido em ser guarda de museu do seu próprio passado.

Com o que, como antes a história, agora a técnica cessa de ser um degrau subordinado da evolução espiritual do homem, mesmo conservando ainda certo ar de barbárie dentro de uma consciência orientada expressamente para as ciências naturais. A situação alterou-se substancialmente sob o ponto de vista da situação espiritual no seu conjunto: a técnica deixou de ser uma exilada na câmara das ciências; ou, mais exactamente: a câmara surge aqui como o elemento determinante diante do qual o "senado" não passa de residência de nobres aposentados. A técnica tornou-se poder e possibilidade peculiar do homem. O que, até aí, estava em baixo, passou para cima: simultaneamente torna a deslocar-se a perspectiva: na antiguidade e na Idade Média, o homem estava voltado para o eterno; a seguir, durante o domínio efémero do historicismo, para o passado; agora, o factível polariza-o para o futuro daquilo que ele mesmo pode criar. Se antes, por exemplo, mediante os resultados do evolucionismo, o homem constatava resignado que, sob a luz do seu passado, não ia além de pó e mero acaso da evolução, sentindo-se desiludido e degradado por um tal conhecimento, isto não mais deve preocupá-lo, pois agora, qualquer que tenha sido a sua origem, tem meios de enfrentar com decisão o futuro, contando com recursos para transformá-lo no que quiser; não lhe é preciso mais parecer impossível transformar-se a si mesmo num Deus, que se encontra no fim como o factível, o a-ser-feito, e não mais, como logos, como sentido, no início. Aliás, isto tudo já está actuando hoje de maneira concreta em forma de problema antropológico. Mais importante do que o evolucionismo, que já ficou atrás de nós como algo evidente, surge hoje a cibernética, a planificação do homem a ser re-criado (homem novo, homem do futuro), de modo tal que, também sob o ponto de vista teológico, a maleabilidade do homem de acordo com o seu próprio plano, se apresenta como um problema mais importante do que a questão do passado humano embora ambas as questões não possam ser separadas e se inter-determinem no seu rumo: a redução do homem a um "facto" é a suposição para compreendê-lo como "factível", a ser guiado, moldado, do seu actual domínio, para um futuro novo.

c) A questão do lugar da Fé. Com o segundo passo do espírito moderno, com a volta à facticidade, fracassou, simultaneamente, uma primeira investida da teologia na resposta às novas realidades. Pois a teologia tentou enfrentar a problemática do historicismo, ou seja, a redução da verdade ao facto, construindo a mesma fé como história. E, à primeira vista, poderia sentir-se plenamente satisfeita com sua manobra. Afinal, a fé cristã, no seu conteúdo, está essencialmente vinculada à história; as declarações da Bíblia não têm carácter metafísico, mas factivo. Por isso, a teologia, aparentemente, devia ser substituída pela história, porquanto parecia realmente estar soando a sua hora: e até, quiçá, pudesse contabilizar essa nova evolução como resultado de seu próprio ponto de partida.

Esperança depressa abafada e desiludida pela desentronização crescente da história, substituída pela técnica. Em seu lugar vai-se firmando um outro pensamento – os teólogos sentem-se tentados a colocar a fé, não mais no plano do facto, mas do factível, explicando-a como instrumento de mudanças do mundo mediante uma "teologia política". Creio que assim se repete, na situação actual, o que a reflexão teológica já empreendera, unilateralmente, em relação ao historicismo. Percebe-se que o mundo moderno é determinado pela perspectiva do factível e responde-se, transferindo a fé para o mesmo plano. Não tenho em mente apontar meramente como irracionais ambas estas tentativas, para não correr o risco de cometer uma injustiça. Revela-se, antes, num e outro caso, substancialmente, o que havia sido omitido, mais ou menos, noutras constelações. Com efeito, a fé cristã tem nexo com o "facto", movimenta-se de modo específico na esfera da história, e não foi por acaso que historicismo e história cresceram no âmbito da fé cristã. Indubitavelmente a fé também tem relação com a evolução do mundo, com a formação do mundo, com a pretensão contra a inércia das instituições humanas e contra os que delas se aproveitam. Também seria difícil considerar acaso o facto de a compreensão do mundo se ter desenvolvido como facticidade no âmbito da tradição judaico-cristã e das suas inspirações até mesmo em Marx, muito embora imaginada e formulada em antítese ao cristianismo. Em todo caso é indiscutível que, em ambos os casos, transparece um pouco da verdadeira mentalidade da fé cristã, antes excessivamente oculta. A fé cristã tem nexo decisivo com as correntes essenciais do tempo moderno. Com efeito o actual momento histórico apresenta a chance de poder compreender de modo todo novo a estrutura da fé, colocada entre o facto e o factível. "É tarefa da teologia aceitar esse convite e essa possibilidade para descobrir e preencher os vazios deixados pelos tempos idos.
Mas, ninguém deve deixar-se arrastar por julgamentos precipitados, como também a correr o risco de curtos circuitos. Onde as duas tentativas citadas se tornam exclusivas, relegando a fé, totalmente, para a esfera do "facto" ou da "facticidade", ali desaparece sob o entulho o significado último, o sentido último de um homem que diz: "Credo" – eu creio. Pois, ao declarar-se crente, o homem não elabora um programa de modificação activa do mundo, nem adere simplesmente a uma corrente de eventos históricos. Tentando ilustrar o meu pensamento, diria que o fenómeno da fé não pertence à relação "saber – fazer", típica para a constatação da mentalidade factível, mas a uma outra relação muito diversa "estar – compreender". Parece-me que assim se tornam visíveis duas mentalidades e duas possibilidades da existência humana, que não se acham sem nexo mútuo e que, contudo, devem ser distinguidas.

5. Fé como "estar" e "compreender"

Ao contrapor o par de conceitos "estar – compreender" àquele outro "saber – fazer", aludo a uma expressão bíblica fundamental, intraduzível, sobre a fé, cujo profundo jogo de palavras Lutero tentara reproduzir na fórmula: "Se não crerdes, não ficareis"; mais literalmente poder-se-ia traduzir: "Se não crerdes (se não vos agarrardes a Jahvé), não tereis apoio algum" [1]. A única raiz 'mn abrange uma multiplicidade de sentidos cuja interdependência e diferenciação perfaz a grandiosidade desta frase. A raiz 'mn (amen) inclui os sentidos de: verdade, firmeza, fundamento sólido, solo, conotando ainda: fidelidade, fiel, confiar-se, apoiar-se em alguma coisa, crer em alguém ou nalguma coisa. Deste modo a fé em Deus surge como um apoiar-se em Deus, mediante o qual o homem consegue base sólida para a sua vida. Com o que a fé é descrita como adesão, como um colocar-se confiante no terreno da palavra de Deus. A versão grega (Septuaginta) reproduziu a citada frase não só idiomaticamente, mas também conceitualmente, para o mundo grego, formulando-a: "Se não crerdes, não compreendereis". Afirmou-se, por vezes, que nesta tradução se patenteia o processo de helenização, o afastamento do sentido bíblico original. A fé teria sido intelectualizada: em vez de exprimir: estar postado no terreno firme da palavra de Deus digna de fé, teria sido criado um nexo com a compreensão e a razão, desalojando assim a fé para um plano que, de modo algum lhe condiz. No que, talvez, haja um pouco de razão. Apesar disto, julgo que, no seu conjunto, se conservou a ideia básica, embora com os sinais alterados. "Estar colocado", como vem indicado no texto hebraico, como conteúdo da fé, tem algo em comum com "compreender". Dentro em pouco teremos de reflectir mais sobre isto. Por enquanto basta-nos reatar o fio das anteriores considerações, dizendo que a fé conota uma esfera totalmente outra do que a do "fazer" e da facticidade. É precisamente o confiar-se ao não-feito-por-nós e ao jamais factível por nós, que sustenta e possibilita todo o nosso agir ou fazer. Isto significa ainda que a fé não se encontra, nem pode encontrar-se no plano do verum quia factum seu faciendum e que qualquer tentativa de apresentá-la ali, "num cardápio", e de querer prová-la no sentido do conhecimento do factível necessariamente estaria fadada ao fracasso. Não se deve procurar nesta espécie de estrutura de conhecimento e quem, apesar disto, ali a apresentar, estará servindo uma coisa falsa. O penetrante "talvez" com que a fé questiona o homem em toda parte e em todo lugar, não aponta para uma incerteza dentro do conhecimento do factível, mas representa o questionamento do carácter absoluto deste âmbito, a sua relativização como uma das esferas da existência humana e do ser em geral, relativização e âmbito capazes de conservarem apenas o carácter de algo penúltimo. Expresso por outras palavras: as nossas considerações levaram-nos apenas a um lugar onde se torna visível a existência de duas formas básicas de atitude humana face à realidade, das quais uma não pode ser reduzida a outra, por se movimentarem as duas em planos completamente separados.

Talvez venha ao caso lembrar aqui uma contraposição de Martin Heidegger que fala do dualismo do pensamento calculador e do pensamento reflexivo. Ambas as maneiras de pensar são legítimas e necessárias, mas, exactamente por isso, nenhuma delas pode dissolver-se na outra. Portanto, cumpre que existam ambas as coisas: o pensamento calculador subordinado à facticidade e o pensamento reflexivo que busca o sentido das coisas. Nem se deixaria de dar alguma razão ao pensador friburguense, ao exprimir o receio de que, numa época em que o pensamento calculador festeja os triunfos mais extraordinários, o homem, no entanto, quiçá mais do que nunca, esteja ameaçado pela fuga diante da reflexão, pela superficialidade e leviandade. Pondo no centro do seu pensamento exclusivamente o factível, corre o perigo de esquecer-se de reflectir sobre si mesmo e sobre o sentido da sua existência. Sem dúvida, esta tentação é comum a todos os tempos. Assim, no século XIII, o grande filósofo franciscano Boaventura julgava-se obrigado a lançar no rosto dos colegas da Faculdade de Filosofia de Paris a censura de que, tendo aprendido a medir o mundo, esqueceram a arte de medir-se a si mesmos. Repitamos o mesmo noutros termos: Fé, no sentido visado pelo "Credo", não é uma forma inacabada de conhecimento, uma opinião que se possa ou deva trocar em saber factível. É antes uma forma essencialmente diversa de comportamento espiritual, colocada ao lado dele como algo independente e próprio, não podendo ser-lhe reduzida, nem dele derivada. Pois a fé não se encontra no âmbito da facticidade e do "feito", tendo embora relações com ambos, mas localiza-se na esfera das decisões fundamentais, diante das quais o homem não pode furtar-se nem omitir-se, decisões que, que pela sua própria natureza, só podem ser feitas de uma forma, forma à qual chamamos fé. Parece-me imprescindível destacá-lo com toda a clareza: cada homem deve tomar uma posição, de qualquer forma, dentro do âmbito das decisões fundamentais; e nenhum homem pode fazê-lo de modo outro que não pela fé. Existe uma esfera que não admite outra resposta senão a da fé; e precisamente esta esfera não pode ser contornada por ninguém. Cada homem há de "crer" de qualquer modo.

A mais impressionante tentativa de subordinar a atitude da "fé" à atitude do conhecimento factível deve-se ao marxismo. Pois nele o "faciendum", o "a-ser-feito", o factível acoberta-se com o próprio futuro a ser criado, e, simultaneamente, com o mesmo sentido do homem, de modo que o esclarecimento que se realiza, e respectivamente se aceita pela fé, é transferido para o plano do factível. Com isto, sem dúvida, tirou-se a consequência extrema do pensamento moderno; parece ter sortido efeito relacionar o sentido do homem totalmente com o factível e até identificar um com o outro. Contudo, a uma análise mais demorada não escapará que também o marxismo não logrou fazer a quadratura do círculo. Pois nem ele é capaz de tornar cognoscível o factível enquanto sentido, mas apenas prometido, oferecendo-o à opção da fé. O que hoje torna a fé marxista tão atraente e facilmente acessível, é a impressão de harmonia com o conhecimento do factível que ela desperta.

Após esta breve digressão voltemos a uma pergunta que sintetiza tudo: que é a fé, afinal de contas? A nossa resposta poderia ser: a fé é a forma de o homem se firmar no conjunto da realidade, forma irredutível ao conhecimento e incomensurável pelo conhecimento; fé é o dar-sentido sem o que a totalidade do homem ficaria localizada, sentido que constitui a base do cálculo e da actividade humana e sem a qual, finalmente, não poderia nem calcular, nem agir, porque somente é capaz disto à luz de um sentido que o norteie. Com efeito, o homem não vive apenas do pão da facticidade; como homem, ele vive do amor, do sentido das coisas. O sentido é o pão que lhe possibilita subsistir, em sentido próprio, como homem. Sem a palavra, sem uma finalidade, sem o amor, o homem chega à situação de não poder mais viver, mesmo cercado de todo o conforto humano. Quem ignoraria até que ponto uma tal situação de fracasso (entregar os pontos... não poder mais...) pode surgir no meio da fartura exterior? Ora, sentido não deriva de saber. Querer torná-lo real através do conhecimento da facticidade seria como a absurda tentativa do barão de Münchhausen ao querer livrar-se a si mesmo do atoleiro, puxando-se pelos cabelos. O absurdo deste quadro expõe com exactidão a situação básica do homem. Ninguém está em condições de se arrancar a si mesmo do pantanal da incerteza, da incapacidade de viver. Nem nos salvamos de semelhante situação, como quiçá ainda poderia pensar Descartes com o seu cogito, ergo sum, mediante uma série de conclusões racionais. Sentido auto-fabricado não é sentido; sentido, ou seja, um solo, um pedaço de chão sobre o qual a existência possa firmar-se e desenvolver-se como um todo, um tal sentido não pode ser feito, só pode ser recebido.

(cont)

joseph ratzinger, Tübingen, verão de 1967.


(Revisão da versão portuguesa por ama)




[1] Is 7,9

Doutrina – 142

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA

Compêndio


PRIMEIRA PARTE: A PROFISSÃO DA FÉ
SEGUNDA SECÇÃO: A PROFISSÃO DA FÉ CRISTÃ
CAPÍTULO PRIMEIRO CREIO EM DEUS PAI

OS SÍMBOLOS DA FÉ

46. O que nos revela Jesus Cristo sobre o mistério do Pai?

Jesus Cristo revela-nos que Deus é «Pai», não só enquanto é Criador do universo e do homem, mas sobretudo porque, no seu seio, gera eternamente o Filho, que é o seu Verbo, «resplendor da sua glória, e imagem da sua substância». [1]



[1] Heb1, 3

Pequena agenda do cristão


Sexta-Feira


(Coisas muito simples, curtas, objectivas)


Propósito:

Contenção; alguma privação; ser humilde.


Senhor: Ajuda-me a ser contido, a privar-me de algo por pouco que seja, a ser humilde. Sou formado por este barro duro e seco que é o meu carácter, mas não Te importes, Senhor, não Te importes com este barro que não vale nada. Parte-o, esfrangalha-o nas Tuas mãos amorosas e, estou certo, daí sairá algo que se possa - que Tu possas - aproveitar. Não dês importância à minha prosápia, à minha vaidade, ao meu desejo incontido de protagonismo e evidência. Não sei nada, não posso nada, não tenho nada, não valho nada, não sou absolutamente nada.

Lembrar-me:
Filiação divina.

Ser Teu filho Senhor! De tal modo desejo que esta realidade tome posse de mim, que me entrego totalmente nas Tuas mãos amorosas de Pai misericordioso, e embora não saiba bem para que me queres, para que queres como filho a alguém como eu, entrego-me confiante que me conheces profundamente, com todos os meus defeitos e pequenas virtudes e é assim, e não de outro modo, que me queres ao pé de Ti. Não me afastes, Senhor. Eu sei que Tu não me afastarás nunca. Peço-Te que não permitas que alguma vez, nem por breves instantes, seja eu a afastar-me de Ti.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?



Ano Jubilar da misericórdia – Reflexão

Resultado de imagem para santuário de fátimaEste dia – 13 de Maio – é particularmente adequado para reflectir sobre a Misericórdia de Deus para com a humanidade e, em particular, para com os portugueses.
Com efeito, o Senhor naqueles anos – 1917 – digamos com palavras humanas – deveria sentir o Seu Amantíssimo Coração angustiado.

A humanidade estava envolvida em conflitos com consequências gravíssimas e no horizonte perfilavam-se nuvens negras ainda mais terríveis.

Os homens afastavam-se de Deus e os ânimos exaltavam-se em rancores e prepotências sem limites, ofendendo gravemente a dignidade das pessoas outorgando-se o direito de quem poderia viver ou deveria ser pura e simplesmente eliminado, muitas vezes com requintes de insensibilidade e frieza tais que ainda hoje chocam a humanidade.

Tudo isto constituía gravíssimas ofensas ao Nosso Criador.

Na Rússia instalava-se um sistema de terror e perseguição religiosa que em breve iria estender os seus tentáculos por grande parte da Ásia e da Europa.

Em Portugal, concretamente, um prócere recém-chegado ao poder, jurara que em poucos anos acabaria com a Religião e a sua prática; eram perseguidos e aviltados com vexames de toda a ordem Bispos, Sacerdotes, Religiosos Consagrados; os Templos e os Conventos eram transformados em tabernas, casas comerciais ou repartições públicas.

E, Deus, Nosso Pai Amantíssimo, o que faz?
Deixa uma vez mais, que a Sua Misericórdia Infinita actue:

Envia a Fátima a Sua própria Mãe com uma mensagem definitiva de apelo à conversão e à paz!

A verdade é que muito mais que a loucura dos homens pode a “loucura” do Amor de Deus, e, hoje, o Altar do Mundo em que Fátima se converteu, congrega à sua volta, milhões de homens e mulheres de todos os cantos da terra num cortejo infindável de pedidos, acções de raças, manifestações de Fé genuína e Esperança inquebrantável.

Fátima é, portanto, a manifestação viva e actuante da Misericórdia Divina. [1]




[1] (ama, Reflexão, Ano Jubilar da Misericórdia, 2016.03.07)