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27/11/2016

Leitura espiritual


DE MAGISTRO

(DO MESTRE)

CAPÍTULO VIII

NÃO SE DISCUTEM INUTILMENTE ESTAS QUESTÕES.
ASSIM, PARA RESPONDER ÀQUELE QUE INTERROGA,
DEVEMOS DIRIGIR A MENTE,
DEPOIS DE PERCEBER OS SINAIS,
ÀS COISAS QUE ESTES SIGNIFICAM

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AGOSTINHO

– Qual motivo então te fez preferir tomar só a palavra do meio (homo) segundo o som e o significado?

ADEODATO

– Mas agora tomo-a exclusivamente pelo seu significado. Concordo contigo não ser possível conversar se a mente, ouvidas as palavras, não evocar logo as coisas de que aquelas são sinais. Por isso, mostra-me como eu pude ser enganado por esse raciocínio, que concluiu que não sou homem.

AGOSTINHO

– Será mais oportuno reapresentar-te as mesmas perguntas, para que tu possas perceber por ti mesmo onde erraste.

ADEODATO

– Está bem.

AGOSTINHO

– Não vou perguntar-te o mesmo que antes, pois já o concedeste. Antes, observa com mais atenção, se na palavra “homo” (homem) a sílaba “ho” é outra coisa que não “ho” e a sílaba “mo” nada mais que “mo”.

ADEODATO

– Não vejo, na realidade, nada além disso.

AGOSTINHO

– Observa ainda se, ao juntar estas duas sílabas, se pode fazer um homem.

ADEODATO

– Absolutamente te concederia isto, uma vez que concordamos, acertadamente, que, depois de ouvir o sinal, a mente examina o seu significado, e só após o exame concede ou nega o que foi proposto.
Mas aquelas duas sílabas, quando separadas, soam sem qualquer significado, e por isso ficou assente que têm valor apenas como som.

AGOSTINHO

– Estás, pois, convicto que não se deve responder às perguntas senão de acordo com as coisas que as palavras significam?

ADEODATO

– Não vejo como haveria de concordar com isto, desde que se trate de palavras.

AGOSTINHO

– Gostaria de saber o que responderias àquele zombeteiro que, dizem, fez sair um leão da boca do companheiro com quem discutia.
Após indagar-lhe se o que dizemos sai da nossa boca, e não lhe sendo possível nega-lo, induziu facilmente o interlocutor a proferir o nome “leão”; feito isso, começou a andar ao redor dele e escarnecê-lo, pois admira que aquilo que dizemos sai da  nossa boca e não podendo negar que proferira a palavra “leão”, estava assumindo que, sendo embora boa pessoa, vomitara um animal tão feroz.

ADEODATO

– Não seria difícil responder a esse brincalhão, pois eu não concordaria que tudo o que dizemos sai da nossa boca, uma vez que proferimos apenas sinais, e o que da nossa boca sai não é a coisa significada, mas o sinal que a significa; assunto este de que tratamos há pouco.

AGOSTINHO

– Com isso o refutarias correctamente; mas que me responderias se te perguntasse se homem é um nome?

ADEODATO

– Que mais haveria de ser?

AGOSTINHO

– Então, quando te vejo, vejo um nome?

ADEODATO

– Não.

AGOSTINHO

– Queres que te diga o que disso resulta?
ADEODATO

– Não te incomodes: eu mesmo, ao responder-te que um homem é nome quando me perguntaste se homem era nome, reconheço que declarei não ser eu homem, e fiz isto apesar de já termos estabelecido que só devemos admitir ou negar o que é dito conforme o significado das coisas.

AGOSTINHO

– Parece-me, todavia, que não foste incidir nesta reposta sem motivo, pois a própria lei da razão, gravada nas nossas mentes, pode iludir a tua vigilância. De facto, se te perguntasse o que é “homem”, responderias talvez: “animal”; porém, se te perguntasse que parte da oração é “homem”, só poderias responder correctamente dizendo “nome”; por aí concluímos que “homem” é nome e animal: o primeiro (ser nome) dizemos enquanto é sinal; o segundo (ser animal) quanto à coisa significada.
Se alguém, pois, me perguntasse se homem é nome, responderia que é, uma vez que esta pergunta deixa entender que a indagação é a respeito de “homem” só como sinal.

Se, ao contrário, me perguntar se homem é animal, anuirei mais facilmente porque, mesmo que se omitissem os termos “nome” e “animal” indagando apenas “o que é homem”, obedecendo àquela regra do falar que já estabelecemos, a minha mente voltar-se-ia para o significado daquelas duas sílabas e só poderia responder “animal”, e até poderia acrescentar a definição completa, isto é, “animal racional, mortal”; não te parece?

ADEODATO

– Certamente; mas, se concordamos que é um nome, como nos subtrairmos a conclusão desagradável de que não somos homens?

AGOSTINHO

– Demonstrando que a ela não se chegou pelo sentido das palavras, quando concordamos com o nosso interlocutor.
E se este quisesse deduzi-la da palavra considerada como sinal, nada haveria a temer, pois qual prejuízo haveria em confessar que não sou aquelas duas sílabas?

ADEODATO

– Nada mais verdadeiro. Mas por que então incomoda ouvir dizer: “Tu não és homem” uma vez que, pelo que já vimos, é uma verdade incontestável?

AGOSTINHO

– Por ser difícil evitar de pensar que aquela conclusão – ao ouvirmos estas duas sílabas – não se relacione com seu significado, pela regra de grande e natural valor, segundo a qual a nossa atenção, ao ouvirmos os sinais, volta-se logo para as coisas significadas.

ADEODATO

– Aceito quando dizes.

(Revisão de versão portuguesa por ama

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