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05/05/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Páscoa

Evangelho: Jo 16, 16-20

16 «Um pouco, e já não Me vereis; outra vez um pouco, e ver-Me-eis, porque vou para o Pai». 17 Disseram então entre si alguns dos Seus discípulos: «Que é isto que Ele nos diz: Um pouco, e já não Me vereis, e outra vez um pouco, e ver-Me-eis? Que significa também: Porque vou para o Pai?». 18 Diziam pois: «Que é isto que Ele diz: Um pouco? Não sabemos o que Ele quer dizer». 19 Jesus, conhecendo que queriam interrogá-l'O, disse-lhes: «Vós perguntais uns aos outros porque é que Eu disse: Um pouco, e já não Me vereis, e outra vez um pouco, e ver-Me-eis. 20 Em verdade, em verdade vos digo que haveis de chorar e gemer, e o mundo se há-de alegrar; haveis de estar tristes, mas a vossa tristeza há-de converter-se em alegria.

Comentário:

Jesus Cristo está a falar-nos da “alegria cristã” que é própria dos que acreditam nele e O seguem.

E porquê?

Porque, para o cristão, Jesus Cristo está sempre presente em todos os momentos e circunstâncias da sua vida, participa – quer participar – das ocorrências, pequenas ou grandes, importantes ou de escasso relevo, de tudo o que diga respeito aos Seus Fiéis.

E, se mais fora necessário, o cristão sabe que pode receber directamente o Seu próprio Corpo, Alma e Divindade no Santíssimo Sacramento da Eucaristia.

(ama, comentário sobre Jo 16, 16-20, 2014.05.29)


Leitura espiritual



SANTO AGOSTINHO – CONFISSÕES

LIVRO DÉCIMO-TERCEIRO

CAPÍTULO XXVI

O dom e o fruto

Nutrem-se com esses alimentos os que neles se alegram; neles não encontram alegria os homens cujo deus é o seu ventre. E até entre os que oferecem esses frutos, o fruto não é o que eles dão, mas o espírito com que o oferece. Por isso, naquele que servia o seu Deus e não o seu ventre percebo claramente a fonte da sua alegria; e participo fortemente do seu regozijo. Paulo recebera os presentes que os filipenses lhes tinham mandado por intermédio de Epafrodito. Vejo bem a razão da sua alegria. E é dela que se nutria, porque ele diz com verdade: “Alegrei-me muito no Senhor, vendo enfim reflorescer para mim a vossa estima, da qual já andáveis desgostados”.

Eles, de facto, tinham estado realmente aborrecidos e, tornados áridos, não produziam mais o fruto das boas obras; e Paulo alegra-se por eles, porque as suas simpatias tornaram a florescer, e não por o terem socorrido na sua indigência. Porque ele diz em seguida: “Não é por causa das privações que sofro que falo assim: aprendi a contentar-me com o que tenho. Sei acomodar-me às privações, e sei viver na abundância. Em tudo e por tudo habituei-me à saciedade e à fome, à abundância e à penúria. Tudo posso naquele que me fortalece”.

Qual então o motivo da tua alegria, ó grande Paulo? De onde vem tal júbilo, de que te alimentas, ó homem renovado para o conhecimento de Deus, conforme a imagem do teu Criador, alma viva que possui tal domínio de si, língua alada que exprime os mistérios? É certamente a tais almas que se deve este alimento. O que foi para ti esse alimento substancioso? A alegria.

Ouçamos o que segue: “Contudo, fizestes bem ao partilhar das minhas tribulações” – Esta é a fonte da alegria, isto é o que o nutre, as boas obras, e não o conforto que aliviou a sua miséria. Ele diz: “Na tribulação dilatastes o meu coração” – pois ele aprendeu a viver na abundância e sofrer as privações, em ti, que o confortas. – “Bem sabeis, filipenses – diz ele – que nos primórdios da minha pregação do Evangelho, quando deixei a Macedónia, nenhuma Igreja me assistiu com os seus bens quanto ao dar e receber, com excepção de vós, que, várias vezes me enviaste, para Tessalónica, com que suprir às minhas necessidades”. – Alegra-se agora por voltarem à prática de boas acções, felicitando-se por eles terem reflorido como campo fértil e verdejante.

Referia-se por acaso às próprias necessidades quando dizia: “Socorrestes às minhas necessidades”? – Será este o motivo da sua alegria? Certamente que não. E como o sabemos?

Porque ele diz em seguida: “Eu não procuro a dádiva, mas o fruto”. – Aprendi de ti, meu Deus, a discernir a dádiva do fruto. O dom é a própria coisa dada por aquele que acode às nossas necessidades; é o dinheiro, a comida, a bebida, a roupa, um abrigo, e auxílio. O fruto é a vontade boa e recta do doador. O bom Mestre não se limita a dizer: “Aquele que receber um profeta” – mas acrescenta: “Aquele que receber um justo...” – mas acrescenta: “na qualidade de justo”. – E assim, aquele receberá a recompensa do profeta, e o outro, a do justo. Ele não diz apenas: “Aquele que der um copo de água fresca a um dos meus pequeninos” – mas acrescenta: “na qualidade de discípulo”. – E prossegue: “Na verdade vos digo: este não ficará sem recompensa”.

– Dom é receber o profeta, receber o justo, dar um copo de água fresca a um discípulo; fruto é fazer isso em consideração da sua qualidade de profeta, de justo, de discípulo. É com este fruto que Elias era alimentado pela viúva: ela sabia que alimentava um homem de Deus, e por isso o fazia. Os alimentos, porém, que lhe eram levados pelo corvo, não passavam de dom, e não era o Elias interior, mas o Elias exterior que recebia esse alimento, o que poderia morrer se lhe faltasse esse alimento.

CAPÍTULO XXVII

Peixes e cetáceos

Por isso, Senhor, direi diante de ti a verdade. Por vezes, ignorantes e infiéis que, para serem iniciados e conquistados para a fé, precisam desses rituais de iniciação e de milagres mirabolantes, simbolizados, a meu ver, pelos peixes e pelos cetáceos, acolhem os teus servos e os socorrem, ou os auxiliam nas necessidades da vida presente, sem saber por que o fazem nem em vista de que devem agir. Desse modo, nem aqueles os alimentam, nem estes são alimentados por eles, pois os primeiros não são movidos por vontade santa e recta, e os segundos não se alegram com os dons recebidos, não descobrindo neles fruto algum. Ora, a alma só se alimenta com o que lhe traz alegria. É esta a razão pela qual os peixes e os cetáceos se nutrem de alimentos que a terra só pode produzir depois de separados e purificados de amargura das águas do mar.

CAPÍTULO XXVIII

A bondade da criação

Viste, meu Deus, que tudo o que criaste te pareceu excelente. Também nós vemos a tua criação, e ela nos parece excelente. Para cada espécie de obra criada, disseste: “Faça-se” e quando elas se fizeram, viste que eram boas. Sete vezes está escrito – eu contei-as – que viste a excelência da tua obra; e na oitava vez contemplaste toda a criação, e disseste que, no seu conjunto, era não apenas boa, mas muito boa. Tomadas separadamente, as tuas obras eram boas; consideradas no seu conjunto, elas eram boas e até excelentes. O mesmo julgamento se pode fazer da beleza dos corpos. Um corpo, formado de membros todos belos, é muito mais bonito que cada um desses membros cuja harmoniosa organização forma o conjunto, embora, considerados à parte, também eles tenham sua beleza própria.

CAPÍTULO XXIX

A palavra de Deus e o tempo

Procurei ver com atenção se foram sete ou oito as vezes que constataste a bondade das tuas obras quando elas te agradaram. Mas não encontrei uma sequência temporal não tua visão, de onde pudesse deduzir que foi esse o número de vezes que viste as tuas criaturas. Então disse: “Senhor, não será verdadeira a tua Escritura, inspirada por ti, que és a própria verdade? Porque então me dizes que a tua visão das coisas não está sujeita ao tempo, enquanto a tua Escritura me diz que dia por dia viste a bondade das tuas obras? E calculei quantas vezes o fizeste.”

A isto respondes-me, porque és meu Deus, falando com voz forte no ouvido interior do teu servo, rompendo a minha surdez, exclamas-me: “Ó homem, o que a minha Escritura diz, eu digo o mesmo.

Mas ela fala no tempo, enquanto este não atinge o meu verbo, que permanece em mim, eterno como eu. Assim, o que vês pelo meu Espírito, sou eu quem o vê; o que dizes pelo meu Espírito, sou eu quem o diz. Mas o que vês no tempo, eu não o vejo no tempo; e o que dizes no tempo, eu não digo no tempo.”

CAPÍTULO XXX

Erro dos maniqueus

Ouvi, Senhor, meu Deus, a tua voz, e recolhi no meu coração uma gota de doçura da tua verdade. Compreendi que há uns aos quais as tuas obras desagradam. Eles sustentam que fizeste muitas delas constrangido pela necessidade, como a estrutura dos céus, a ordem dos astros; afirmam que não as criaste por ti mesmo, mas que elas já existiam alhures, criadas por outra fonte; que te limitaste a reuni-las, a ordená-las, a entrelaçá-las; que com elas construíste as muralhas do mundo, depois de teres vencido os teus inimigos, para que essa construção os mantivesse captivos, e não mais pudessem revoltar-se contra ti; que não criaste nem organizaste outros seres, como os corpos carnais, os animais pequenos e tudo o que se prende à terra por meio de raízes; que foi um espírito hostil, uma outra natureza, não criada por ti, e que se opõe a ti nas regiões inferiores do mundo, que as gerou e organizou. Esses insensatos falam assim porque não veem as tuas obras através do teu Espírito, nem te reconhecem neles.

CAPÍTULO XXXI

A luz do espírito divino

O oposto sucede aos que veem as tuas obras através do teu Espírito, pois és tu é quem as vê neles. Portanto, quando veem que elas são boas, tu também vês essa bondade; em tudo o que lhes agrada por tua causa, tu és que nos agradas, e o que nos agrada através do teu Espírito é em nós que te agrada. Com efeito, quem dentre os homens sabe das coisas do homem, senão o espírito do homem que nele habita? Do mesmo modo o que pertence a Deus ninguém o sabe, a não ser o Espírito de Deus. “Quanto a nós, diz ainda Paulo, não recebemos e espírito deste mundo, mas o Espírito de Deus, para que conheçamos os dons que nos vêm de Deus”.

E isto fez-me perguntar: Posto que certamente ninguém sabe das coisas de Deus, com excepção do Espírito de Deus, como então nós conhecemos os dons que nos vêm de Deus? Eis a resposta que recebi: As coisas que sabemos pelo seu Espírito, ninguém as sabe a não ser o Espírito de Deus. É pois justo que foi dito aos que falavam, inspirados pelo Espírito de Deus: “Não sois vós os que falais” – e aos que obtêm o seu saber do Espírito de Deus: “Não sois vós os que sabeis”. – E com igual razão se diz aos que veem através do Espírito de Deus: “Não sois vós os que veem”. Assim, em tudo o que vemos de bom pelo Espírito de Deus, não somos nós que vemos, mas Deus.

Por isso, uma coisa é julgar mau o que é bom, como o fazem aqueles de quem falei acima, e outra coisa é o homem ver o que é bom. Todavia, muitos amam a tua criação porque é boa, mas não te amam nessa criação; e por isso preferem gozar dela que de ti. Há ainda outro caso, quando alguém vê que uma coisa é boa, mas é Deus que nele vê que essa coisa é boa, e é Deus que é amado na sua criação. Ele só o pode ser graças ao Espírito que Deus nos deu, porque o amor de Deus foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. Por ele, vemos que tudo o que de algum modo existe é bom, pois recebe o seu ser daquele que é, não de um modo qualquer, mas de modo absoluto.

(Revisão de versão portuguesa por ama)



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