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19/05/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Tempo ComumPáscoa

Evangelho: Mc 9, 41-50

41 «Quem vos der um copo de água, porque sois de Cristo, em verdade vos digo que não perderá a sua recompensa. 42 «Quem escandalizar um destes pequeninos que creem em Mim, melhor fora que lhe atassem ao pescoço a mó que um asno faz girar, e que o lançassem ao mar. 43 Se a tua mão é para ti ocasião de pecado, corta-a; melhor te é entrar na vida eterna mutilado, do que, tendo as duas mãos, ir para a Geena, para o fogo inextinguível. 44 Omitido pela Neo-Vulgata. 45 Se o teu pé é para ti ocasião de pecado, corta-o; melhor te é entrar na vida eterna coxo, do que, tendo os dois pés, ser lançado na Geena.46 Omitido pela Neo-Vulgata. 47 Se o teu olho é para ti ocasião de pecado, lança-o fora; melhor te é entrar no reino de Deus sem um olho do que, tendo dois, ser lançado na Geena, 48 “onde o seu verme não morre e o seu fogo não se apaga”.49 Todo o homem será salgado no fogo. 50 O sal é uma coisa boa; porém, se se tornar insípido, com que haveis de lhe dar o sabor? Tende sal em vós, e tende paz uns com os outros».

Comentário:

Literalmente, Jesus Cristo dá-nos uma dimensão da realidade mais evidente: o que temos que fazer para ganhar a Vida Eterna.

Nada pode ser admitido que constitua obstáculo no nosso caminhar de cristãos em busca da salvação e, esses obstáculos, combatem-se com as boas obras por mais pequenas ou insignificantes que possam considerar-se: como dar um simples copo de água.


(ama, comentário sobre Mc 9, 41-50, 2014.02.27)


Leitura espiritual



INTRODUÇÃO AO CRISTIANISMO

INTRODUÇÃO

“CREIO – AMÉM”

CAPÍTULO SEGUNDO

PRIMEIRA PARTE

DEUS

«Creio em Deus Pai, Todo-poderoso, Criador do céu e da terra"

CAPÍTULO SEGUNDO

A Fé em Deus na Bíblia

Para compreender a fé bíblica em Deus é preciso seguir-lhe a evolução histórica, desde as origens nos patriarcas de Israel até aos escritos do Novo Testamento. O Antigo Testamento, com o qual logicamente devemos começar, põe-nos nas mãos um fio condutor que orienta os nossos esforços: com efeito, o Antigo Testamento formulou a sua ideia de Deus essencialmente em dois nomes: Elohim e Iahvé. Nestas duas denominações revela-se a segregação e a escolha feita por Israel no seu mundo religioso e, simultaneamente, torna-se visível a opção positiva realizada numa tal escolha e na subsequente conversão do eleito.

1.   O problema histórico da sarça-ardente

Como texto central do conhecimento de Deus no Antigo Testamento certamente deve ser apontada a narrativa da sarça-ardente [1] em que, juntamente com a revelação do nome de Deus a Moisés, se coloca a base decisiva do deus que, a partir dali, dominará a Israel. O texto descreve a vocação de Moisés para chefe de Israel pelo Deus oculto-revelante na chama da sarça, e a hesitação de Moisés que exige um conhecimento claro do seu comitente e uma clara prova da sua autoridade. Neste contexto desenvolve-se o diálogo em torno do qual jamais cessarão as especulações:

"E Moisés disse a Deus: "Eis que eu me apresentarei aos filhos de Israel e lhes direi: O Deus dos vossos pais enviou-me a vós. Mas se me perguntarem: "Como se chama?" Que lhes responderei?" E Deus disse a Moisés: "SOU AQUELE QUE SOU". E acrescentou: "Assim falarás aos filhos de Israel: EU SOU mandou-me a vós". E Deus disse ainda a Moisés: "Assim falarás aos filhos de Israel: Jahvé, o Deus de vossos pais, o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacob enviou-me a vós. Esse é o meu nome para a eternidade, e essa é a minha denominação para todos os séculos" [2], [3] .

Dentro do sentido do texto é evidente a intenção de fundamentar o nome "Iahvé" como nome decisivo de deus em Israel, primeiro fixando-o historicamente na origem da génese do povo israelita e no acontecimento da aliança, e, em seguida, dando-lhe uma explicação do conteúdo. Este último sucede pela redução do incompreensível vocábulo "Iahvé" à raiz "haia" (= ser). Isto é possível dentro do resíduo consonantal hebraico. Mas, ao menos é problemático que tal explicação corresponda filologicamente à real procedência do termo "Iahvé": trata-se – como tantas vezes no Antigo Testamento – de uma etimologia teológica e não filológica. Não é o caso de pesquisar um sentido primitivo dentro da gramática histórica, mas de realizar um sentido, em concreto. A etimologia realmente torna-se instrumento de um comportamento que cria um sentido. A este esclarecimento do nome "Iahvé" pela palavra "ser" acrescenta-se então uma segunda tentativa de esclarecer: quando se diz que lahvé é o Deus dos pais, o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob. Ou seja: a compreensão da palavra deve ser alargada e aprofundada pela equiparação do Deus assim denominado ao Deus dos patriarcas de Israel, que era invocado com "El" ou "Elohim".

Tentemos ver a imagem de Deus assim surgida. Primeiro, que significa essa ideia do "ser" trazida à colacção como explicação de Deus? Para os Padres vindos da filosofia grega havia aí uma inesperada e ousada confirmação do seu próprio passado filosófico, pois a filosofia grega considerava decisiva a sua descoberta do ter averiguado a presença omni-abarcante da ideia do ser por trás das inumeráveis coisas com que o homem diariamente se tinha de haver, ideia esta em que viam a mais adequada expressão da divindade. E a Bíblia parecia afirmar exactamente o mesmo no seu texto central sobre a imagem de Deus. Não era o caso de ver aí uma espantosa confirmação da unidade de fé e filosofia? Com efeito, a patrística viu revelar-se aí a mais profunda unidade de pensamento e fé, de Platão e Moisés, do espírito grego e bíblico. Sentiu tão completamente a identidade entre a busca filosófica e a aceitação do que se lhe oferecia na fé de Israel, que chegou a defender a tese de que Platão não seria capaz de chegar a semelhante conhecimento pelos seus próprios recursos, tendo seguramente conhecido o Antigo Testamento donde haurira as suas ideias. Assim o cerne da filosofia platónica viu-se reduzido indirectamente à Revelação – já que não se ousava derivar das forças do espírito humano uma concepção de profundeza tão radical como o platonismo.

Na realidade, o texto do Antigo Testamento ao alcance dos Padres favorecia o desabrochar da ideia de identidade entre Platão e Moisés, aliás com a dependência colocada, antes, do outro lado: os tradutores do Antigo Testamento para o grego estavam sob a influência da filosofia grega, tendo lido e interpretado o texto original à luz desta filosofia. Deve tê-los impressionado o pensamento de que o espírita helénico e a fé bíblica se entrosavam; os tradutores construíram, por assim dizer, a ponte a ligar o conceito bíblico de Deus com o pensamento grego, ao traduzir o versículo 14: "Sou aquele que sou" com a frase: "Sou o existente". Assim identifica-se o nome bíblico com o conceito filosófico. O escândalo do nome, do Deus que se nomeia, fica diluído no oceano do pensamento ontológico; a fé casa-se com a ontologia. Com efeito, constitui escândalo para o pensamento o facto de o Deus bíblico ter nome. Será este facto mais do que uma lembrança do mundo politeísta em que a fé bíblica começou a germinar? Num mundo que formigava de deuses, era impossível Moisés dizer: Deus manda-me. Nem mesmo: O Deus dos pais envia-me. Ele sabia que isto não significava nada e que iriam perguntar-lhe: Que Deus? Mas a questão é a seguinte: ter-se-ia podido dar ao "Ente" platónico um nome, manifestando-o como indivíduo? Ou, o facto de poder denominar-se esse Deus não seria expressão de uma ideia fundamentalmente diversa? E, acrescentando-se que, para o texto, é de importância a ideia de que só se pode chamar pelo nome a Deus, porque ele mesmo se chamou, aprofunda-se o fosso para a ideia platónica, para o ser como ponto final do pensamento ontológico que não é nomeado e, muito menos, se nomeia.

Então a versão grega e as conclusões patrísticas dela tiradas basear-se-iam num equívoco? A respeito disto não são só os exegetas de hoje que têm o mesmo parecer, como também os sistemáticos acentuam-no com muita força e com a exactidão que esta questão merece, acima de todos os problemas exegéticos. Assim Emil Brunner afirma com toda a firmeza que o sinal de identidade entre o Deus da fé e o Deus dos filósofos, aqui colocado, significa a conversão da ideia bíblica de Deus no seu oposto. Em lugar do nome põe-se aqui o conceito, em lugar do indefinível entra a definição. Com o que se coloca em discussão a exegese patrística inteira, a fé em Deus da Igreja antiga, a profissão e a imagem do Deus do símbolo. Trata-se de uma queda na helenização, da apostasia do Deus ao qual o Novo Testamento chama Pai de Jesus Cristo, ou estará expresso aqui, sob novos pressupostos, o que é sempre de afirmar-se?

Antes de mais, cumpre, embora muito ao de leve, pesquisar o estado real exegético da situação. Que significa o nome "Iahvé" e o que quer dizer a sua interpretação pela palavra "ser"? As duas perguntas dependem uma da outra, sem que sejam idênticas. Tentemos primeiro focalizar mais de perto a primeira delas. Ainda estamos em condições de estipular alguma coisa sobre significado o primitivo do nome Iahvé, partindo de sua origem linguística? Isto é quase impossível, porque exactamente a respeito desta origem tateamos no escuro. Sem dúvida uma coisa pode afirmar-se claramente: falta uma comprovação segura do nome Iahvé, antes de Moisés, fora de Israel; e nenhuma das tentativas de descobrir as raízes pré-israelitas do nome convence. Sem dúvida conhecem-se, já antes, partículas como iha, ia, iahv, contudo o pleno desdobramento do nome Iahvé realizou-se primeiramente em Israel, enquanto o podemos constatar hoje; parece ser obra da fé de Israel que, não sem relação com o resto, refundiu de modo criativo, para si, o seu próprio nome divino e desenvolveu nele a sua própria imagem de Deus.

Mas hoje existem indícios de que a formação desse nome realmente foi obra de Moisés, que, mediante ele, carreou nova esperança aos seus compatriotas escravizados: a formação definitiva de um nome divino próprio e, com ele, a ideia própria de Deus parecem ter sido o ponto de partida da génese étnica dos israelitas. Também sob o enfoque meramente histórico pode afirmar-se que Israel se tornou povo a partir de Deus, e exclusivamente a partir da vocação para a esperança que o nome divino significava, é que chegou a ser o que é. Entre as numerosas indicações e pontos de referências para a época pré-israelita do nome Iahvé, que dispensam um debate neste lugar, a mais bem fundamentada e, ao mesmo tempo, objectivamente de uma fertilidade peculiar, parece-me a observação de H. Cazelles que chama a atenção para os nomes teofóricos (nomes de pessoas com uma referência a Deus) no reino da Babilónia, nomes formados com a partícula "yaun", respectivamente encerrando o elemento "yau" ou "ya", que conota aproximadamente "o meu", "meu Deus". Na confusão de tipos divinos com que tinha de haver-se, essa forma aponta para o Deus pessoal, isto é, para o Deus que, voltado para o homem, é pessoal e tem relação com as pessoas. É o Deus que, existindo pessoalmente, tem a ver com o homem como homem. Esta observação é digna de nota, enquanto se cruza com um elemento central da fé pré-mosaica, a saber, com a imagem de Deus que costumamos chamar "o Deus, dos nossos pais", com apoio na Bíblia. A etimologia proposta cobrir-se-ia assim com o que narra a história da sarça-ardente, como suposição interna da fé em Iahvé, ou seja com a fé do Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob. Portanto, voltemos a atenção para esta figura sem a qual não é possível desvendar o sentido da mensagem de Iahvé.

(cont)

joseph ratzinger, Tübingen, verão de 1967.

(Revisão da versão portuguesa por ama)





[1] Ex 3
[2] Ex 3,13-15
[3] Texto da Bíblia Sagrada Ed. Paulinas, 1967

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