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11/05/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Páscoa

Evangelho: Jo 17, 11-19


11 Já não estou no mundo, mas eles estão no mundo, e Eu vou para Ti. Pai Santo, guarda em Teu nome aqueles que Me deste para que sejam um, assim como Nós. 12 Quando Eu estava com eles, os guardava em Teu nome. Conservei os que Me deste; nenhum deles se perdeu, excepto o filho da perdição, cumprindo-se a Escritura. 13 Mas agora vou para Ti e digo estas coisas, estando ainda no mundo, para que eles tenham em si mesmos a plenitude da Minha alegria. 14 Dei-lhes a Tua palavra, e o mundo odiou-os, porque não são do mundo, como também Eu não sou do mundo. 15 Não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do mal. 16 Eles não são do mundo, como Eu também não sou do mundo. 17 Santifica-os na verdade. A Tua palavra é a verdade. 18 Assim como Tu Me enviaste ao mundo, também Eu os enviei ao mundo. 19 Por eles Eu santifico-Me a Mim mesmo, para que também sejam santificados na verdade.


Comentário:


O discurso testamentário de Cristo continua pondo ainda mais ênfase nos três principais objectivos que o cristão deve tentar conseguir: a Verdade, a Unidade e a Santidade.

Verdadeiramente a última não é possível sem as outras duas e a terceira não se consegue sem conhecer e viver a primeira.

Também São Josemaria Escrivá insistia na "unidade de vida" para que a vida do cristão pudesse ser Verdadeira e, assim, alcançar a santidade pessoal.

(ama, comentário sobre Jo 17, 11-19, 2015.05.20)




Leitura espiritual



INTRODUÇÃO AO CRISTIANISMO

INTRODUÇÃO

“CREIO – AMÉM”

CAPÍTULO PRIMEIRO

Fé no Mundo Hodierno

  1. Dúvida e Fé Situação do homem frente ao problema "Deus”

…/3

3. O dilema da Fé no mundo de hoje

Tomada clara a aventura encerrada no seio da fé, é inevitável uma nova consideração, na qual se revela a agudeza especial da dificuldade de crer em relação ao homem de hoje. Ao abismo do "visível" e do "invisível" acrescenta-se, aumentando a dificuldade, o báratro do "outrora" e do "hoje". O paradoxo fundamental, já por si inerente à fé, aguça-se pelo facto de se apresentar a fé em roupagem de outrora, e até de se identificar com o passado, com a forma de vida e de existência de outrora. Todas as actualizações, chamem-se "desmitização" intelectual-académica ou aggiornamento eclesial-pragmático, em nada mudam a situação. Pelo contrário: tais esforços reforçam a suspeita de se apresentar aqui, nervosamente, como hodierno, o que, na verdade, é o passado. Essas tentativas de actualização trazem bem à tona da consciência até que ponto é "de ontem" aquilo que nos é apresentado; e a fé, deixando de parecer um salto temerário, asemelha-se a um salto desafiador da generosidade do homem, do trampolim da aparente totalidade do mundo visível para o aparente nada do invisível e incompreensível. Parece, antes, uma pretensão, um atrevimento, querer comprometer o hoje com o ontem, evocando-o como perpétuamente válido. E quem desejará fazê-lo numa época na qual, em lugar da ideia de "tradição" se colocou o conceito de "progresso"?

De passagem, deparamo-nos aqui com uma característica da moderna conjuntura, não sem importância para o nosso problema. Em constelações espirituais passadas o conceito de "tradição" conotava determinado programa; surgia como elemento protector em que o homem podia confiar; podendo apelar para a tradição, havia certeza de se encontrar no lugar certo. Hoje predomina o sentimento diametralmente oposto: tradição é o abandonado, o meramente de ontem; progresso é a promessa explícita do ser, de modo que o homem não se sente em casa dentro da tradição, do passado, mas dentro do progresso e do futuro. E também sob este ponto de vista há de parecer-lhe ultrapassada uma fé que lhe vem ao encontro com a etiqueta de "tradição", incapaz de lhe abrir um lugar para existir, a ele que vê no futuro a sua possibilidade e obrigação propriamente ditas. O que quer dizer que o primário escândalo da fé, a distância entre visível e invisível, entre Deus e não-Deus, se acha encoberto e bloqueado pelo escândalo secundário do "outrora" e do "hoje", pela antítese de tradição e progresso, pelo compromisso com o passado que parece estar incluído na fé.

O facto de nem o profundo intelectualismo da desmitização, nem o pragmatismo do aggiornamento serem capazes de convencer, sem mais, torna evidente que também a absorção do escândalo fundamental da fé cristã representa algo de muito profundo que não se pode abordar, sem mais nem menos, nem por meio de teorias, nem pela acção. Aliás, em certo sentido, justamente aqui se patenteia o específico do escândalo cristão, a saber, aquilo que se poderia denominar positivismo cristão, a inamovível positividade do crístico. Eis o que tenho em mente: a fé cristã não se ocupa somente com o eterno, como à primeira vista poderia supor-se, com o eterno que se conservasse como algo totalmente diverso, fora do mundo humano e do tempo; ela ocupa-se muito mais com o Deus na história, com Deus como homem. A fé apresenta-se como revelação, ao parecer vencer o abismo entre eterno e temporal, entre visível e invisível, fazendo-nos encontrar Deus como homem, o Eterno como temporal, Deus como um de nós. Aliás, a sua pretensão de ser revelação funda-se no facto de ela ter trazido o eterno, por assim dizer, para dentro do nosso mundo: "O que ninguém jamais viu – Ele no-lo explicou, aquele que descansa no peito do Pai" [1] – Cristo tornou-se "exegese" de Deus para os homens, quase estaria tentado a afirmar com base no texto bíblico. Mas contentemo-nos com o vocábulo português; o original autoriza-nos a tomá-lo bem ao pé da letra: Jesus realmente explicou (ou seja, desdobrou, abriu) a Deus, conduzindo-o para fora de si, ou, mais drasticamente, na primeira carta de João: libertou-o à nossa contemplação e palpação, de modo tal que o jamais avistado por alguém agora está ao alcance do nosso tacto histórico.

À primeira vista parece tratar-se realmente do máximo em revelação, do limite extremo de Deus patentear-se. O salto que até agora conduzia ao infinito parece abreviado a uma ordem de grandeza humana possível, bastando-nos, para tanto, dar uns poucos passos até àquele homem na Palestina, no qual o mesmo Deus se nos revela. Mas estamos aí diante de uma estranha duplicidade, como que dois rostos de Jano: o que parece ser, de entrada, a mais radical revelação e, em certa medida, permanece para sempre sendo não só uma revelação, como a revelação por excelência, no mesmo instante se trai como a treva mais pesada e o mais estranho disfarce. O que Deus parece trazer, em primeira mão, para bem perto de nós, a ponto de podermos palpá-lo como nosso semelhante, seguir-lhe as pegadas e até avaliá-las e medi-las, tudo isto torna-se, em sentido muito profundo, base para a "morte de Deus", que, a partir dali, há de imprimir o seu cunho irrevogável ao desenvolvimento da história e às relações humanas com Deus: Deus ficou tão perto de nós, que o pudemos matar e assim, ao que parece, ele cessa de ser Deus. Por isso, vemo-nos hoje um tanto desconcertados diante dessa "revelação" cristã e, confrontando-a com a religiosidade, sobretudo, da Ásia, lançamos a pergunta: não teria sido muito mais simples crer no eterno-oculto, confiando-se a ele em meditação e anseio? Não teria sido melhor Deus deixar-nos na nossa infinita distância? Não fora mais simples e mais realizável perceber o eternamente incompreensível mistério mediante serena contemplação, mediante uma fuga de tudo o que é profano, em vez de render-se ao positivismo da fé numa única figura, confinando a salvação do homem e do mundo, por assim dizer, a algo como a cabecinha de um alfinete, que mais não parece representar esse um e único ponto fortuito? Não será a morte definitiva o fatal destino desse Deus reduzido a um único ponto dentro de um mundo que relativiza intolerantemente o homem e sua história a um ínfimo grãozinho de pó no cosmos, a um ponto que só poderia ser considerado como centro do universo pelo homem na sua ingenuidade dos anos de infância, mas, uma vez ultrapassados estes anos, impor-se-ia a coragem de acordar do sono, esfregar os olhos e sacudir para longe de si um sonho louco, por lindo que tenha sido, entrosando-se incondicionalmente no formidável mecanismo para o qual a nossa insignificante vida está destinada, vida que, precisamente assim, deveria encontrar um sentido novo, na aceitação de sua insignificância?

Só com esse aprofundamento total da questão e com esse enfoque que coloca o escândalo, muito mais profundo, do "positivismo" cristão, ou seja o "estreitamento" de Deus dentro de um único ponto da história à frente do aparentemente secundário escândalo do "outrora" e do "hoje", só assim tocamos o fundo da problemática cristã da fé, tal como hoje deve ser enfrentada. Podemos crer ainda? Não, impõe-se uma pergunta mais radical: temos ainda a liberdade de crer, ou avoluma-se diante de nós um dever maior, a saber, o dever de romper com o sonho e de colocar-se dentro da realidade? O cristão de hoje deve perguntar-se assim; não pode contentar-se em constatar que, afinal, é possível ainda encontrar uma interpretação do cristianismo através de uma porção de rodeios e subterfúgios, interpretação que não se choque com nada. Se alhures declara um teólogo que "ressurreição da carne" quer dizer apenas que cada um diariamente deve arregaçar as mangas corajosamente na preparação do futuro, com certeza está afastado o escândalo. Mas terá havido sinceridade numa tal interpretação? Não existe uma falsidade perigosa em tais prestidigitações interpretativas, em tais malabarismos, com que se tenta manter em pé o cristianismo e defendê-lo? Ou, sentindo-nos compelidos a lançar mão de tais recursos, não estaríamos obrigados a reconhecer que alcançamos o fim da linha? Então, não deveríamos sujeitar-nos simplesmente à realidade concreta, sem lançar cortinas de fumo? Acentuemo-lo com energia: um cristianismo assim esvaziado da sua realidade através de uma tal interpretação significa falta de sinceridade face às perguntas dos não-cristãos, cujo "talvez não" afinal deveria urgir-nos da mesma maneira como desejamos que eles sejam urgidos pelo "talvez" cristão.

Tentando aceitar assim a pergunta do outro como o ininterrupto questionamento da nossa própria existência, impossível de ser concentrado nas páginas de um tratado para, a seguir, ser posto de lado, teremos o direito de constatar, também aqui, a existência de uma contra-pergunta. A tendência hodierna é supor, como realidade propriamente dita, o tangível, o que se pode provar. Mas, é permitido fazer isso? Parece caber aqui uma pergunta mais cuidadosa: O que, na verdade, é "o real"? Será somente o comprovado e o comprovável? Ou não será, quiçá, a averiguação, apenas uma determinada maneira de comportamento face à realidade, maneira que, de modo algum, pode abranger o todo e que até conduz à adulteração da verdade e da existência humana, sempre que for aceite como critério único da realidade? Lançando esta pergunta, tornamos ao dilema do "outrora" e do "hoje", aliás, postos agora frente à frente com a problemática específica do nosso "hoje". Tentemos analisá-la com mais clareza nos seus elementos essenciais.

(cont)

joseph ratzinger, Tübingen, verão de 1967.

Revisão da versão portuguesa por ama

(cont)





[1] Jo 1,18

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