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12/03/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Quaresma

Semana IV

Evangelho: 7, 40-53

40 Entretanto, alguns daquela multidão, tendo ouvido estas palavras, diziam: «Este é verdadeiramente o profeta». 41 Outros diziam: «Este é o Messias». Alguns, porém, diziam: «Porventura é da Galileia que há-de vir o Messias? 42 Não diz a Escritura: “Que o Messias há-de vir da descendência de David e da aldeia de Belém, donde era David”?». 43 Houve, portanto, desacordo entre o povo acerca d'Ele. 44 Alguns deles queriam prendê-l'O, mas nenhum pôs as mãos sobre Ele. 45 Voltaram, pois, os guardas para os príncipes dos sacerdotes e fariseus, que lhes perguntaram: «Porque não O trouxestes preso?». 46 Os guardas responderam: «Nunca homem algum falou como Este homem». 47 Os fariseus replicaram: «Porventura, também vós fostes seduzidos? 48 Houve, porventura, algum dentre os chefes do povo ou dos fariseus que acreditasse n'Ele? 49 Quanto a esta plebe, que não conhece a Lei, é maldita». 50 Nicodemos, que era um deles, o que tinha ido de noite ter com Jesus, disse-lhes: 51 «A nossa Lei condena, porventura, algum homem antes de o ouvir e antes de se informar sobre o que ele fez?». 52 Responderam: «És tu também galileu? Examina as Escrituras, e verás que da Galileia não sai nenhum profeta». 53 E foi cada um para sua casa.

Comentário:

Para conhecer as coisas de Deus não podemos usar critérios exclusivamente humanos mas, e em primeiro lugar, ter o desejo genuíno e sincero de saber, compreender e aceitar.

Tal não é possível sem recta intenção, ou seja, sem qualquer preconceito.

(ama, comentário sobre Jo 7 40-53 Monte Real 2015.03.21)

Leitura espiritual



SANTO AGOSTINHO - CONFISSÕES

LIVRO QUATRO

CAPÍTULO VIII

O consolo do tempo e da amizade

O tempo não corre debalde, nem passa inutilmente sobre nossos sentidos; antes, causa na alma efeitos maravilhosos. Assim vinha e passava, dias após dias, e passando deixava em mim novas esperanças e novas recordações; pouco a pouco restituía-me aos meus prazeres de outrora, a que ia cedendo minha dor. Substituíam-na não novas dores, mas sementes de novas dores.

Mas, por que me penetrara aquela dor tão profundamente, até o mais íntimo de meu ser, senão porque derramei a minha alma sobre a areia, amando a um mortal como se não o fora? O que mais me confortava e alegrava eram sobretudo as consolações de outros amigos, com os quais partilhava o amor para o que amava em teu lugar, isto é, uma fábula enorme, uma longa mentira, cujo contato impuro corrompia nossa mente, arrastada pelo prurido de ouvir aquilo que a agradava; fábula esta que não morria para mim, ainda que morresse algum de meus amigos.

Havia neles outros prazeres que cativavam mais fortemente a minha alma, como conversar, rir, agradar-nos mutuamente com amabilidade, ler juntos livros bem escritos, gracejar uns com os outros e divertir-nos juntos; às vezes discutir, mas sem ódio, como quando discordamos de nós mesmos para, com tais discórdias muito raras, temperar as muitas conformidades; ensinar ou aprender reciprocamente muitas coisas, suspirar impacientes pelos ausentes e receber alegres os recém-chegados. Estes sinais, e outros semelhantes, que procedem de corações que se amam, e que se manifestam no rosto, na fala, nos olhos, e em mil outros gestos graciosos, inflamavam as nossas almas, como uma centelha, fazendo de muitas uma só.

CAPÍTULO IX

O amigo de Deus

É isto o que se ama nos amigos; e de tal modo se ama, que a consciência humana se julga culpada se não ama ao que a ama, ou se não retribui amor com amor procurando na pessoa do amigo apenas o sinal exterior de sua benevolência. Daqui o pranto do luto quando morre um amigo, as trevas de dores, e as lágrimas que inundam o coração quando a doçura se transforma em angústia, e a morte dos que morrem na morte dos que vivem.

Bem-aventurado o que te ama, Senhor, e ama ao amigo em ti, e ao inimigo por amor a ti; só não perde o amigo quem tem a todos por amigos naquele que nunca se perde. E quem é este, senão o nosso Deus, o Deus que fez o céu e a terra, e os enche, porque, enchendo-os, os criou?

Ninguém, Senhor, te perde senão o que te abandona. Mas, quem te deixa, para onde vai, ou para onde foge, senão de ti benévolo para ti irado? Onde não achará tua lei para seu castigo? Porque tua lei é a verdade, e a verdade és tu mesmo.

CAPÍTULO X

As mentiras da beleza

Ó Deus das virtudes! Converte-nos e mostra-nos tua face, e seremos salvos! Porque, para onde quer que se volte a alma humana, onde quer que se estabeleça fora de ti, sempre encontrará dor, mesmo que sejam as belezas que estão fora de ti e fora de si mesma; e todavia, estas não seriam nada se não existissem em ti. Elas nascem e morrem; e, nascendo, começam a existir, e crescem para alcançar a perfeição e, uma vez perfeitas, começam a envelhecer e morrem. Embora nem tudo envelheça, tudo perece. Logo, quando os seres nascem e se esforçam para existir, quanto mais depressa crescem para existir, tanto mais se apressam para deixar de existir. Esta é a sua condição. Eis tudo o que lhes deste, porque são partes de coisas que não existem simultaneamente mas, morrendo e sucedendo-se umas às outras, formam o conjunto de que são partes.

Assim forma-se também o nosso discurso, por meio dos sinais sonoros; este nunca se realizaria se uma palavra não se extinguisse, depois de pronunciadas suas sílabas, para dar lugar à seguinte.

Que a minha alma te louve por tudo isto, ó Deus, criador de todas as coisas; mas não se pegue a elas com o visco do amor dos sentidos, pois também elas caminham para o não-ser, e dilaceram a alma com desejos pestilenciais, e ela quer existir e gosta de descansar nas coisas que ama. Mas nelas não acha onde, porque as coisas não são estáveis. Elas são fugazes, e quem poderá segui-las com os sentidos da carne? Ou quem as pode alcançar, mesmo estando presentes? Lento é o sentido da carne, por ser da carne, mas essa é a sua condição. É suficiente para o que foi criado, mas não o é para reter o curso das coisas, do princípio que lhes foi fixado, até o fim que lhes foi designado, porque em teu Verbo, que as criou, ouvem estas palavras: “Daqui até ali”.

CAPÍTULO XI

A verdade de Deus

Não seja vã, ó minha alma, nem ensurdeças o ouvido do coração com o tumulto da tua vaidade. Ouve também: o próprio Verbo clama que voltes, porque só acharás repouso imperturbável lá onde o amor não é abandonado, se ele não nos abandona antes. Eis que as coisas passam para ceder lugar as outras, e para que assim se forme este universo inferior, de todas as suas partes. “Mas, por acaso, afasto-me de um lugar para outro? – diz o Verbo de Deus.

– Fixa nele a tua morada, confia a ele tudo o que dele recebeste, alma minha, já cansada de tantos enganos. Confia à Verdade quanto da Verdade recebeste, e nada perderás; antes, a tua podridão reflorescerá e serão curadas todas as tuas fraquezas, e serão retomadas e renovadas, estreitamente unidas a ti, as tuas partes inconscientes; e já não te arrastarão para a ladeira por onde descem, mas permanecerão contigo para sempre onde está Deus, eterno e imutável.

Por que, perversa, segues o apelo de tua carne? Seja esta, convertida a te seguir. Tudo o que por ela sentes é parte, mas ignoras o todo de que é parte, ainda que te dê prazer. Mas, se os sentidos de tua carne fossem idóneos para compreender o todo, e se, para teu castigo, não tivessem sido justamente limitados a compreender apenas partes do universo, certamente desejarias que passasse tudo o que presentemente existe, para melhor desfrutar do conjunto.

O que falamos também ouves com os ouvidos da carne, e com certeza não queres que as sílabas se detenham, mas que voem, para que outras lhes sucedam, e assim ouvires o conjunto.

O mesmo acontece com todas as coisas que compõem um todo, quando essas partes constituintes não existem simultaneamente; há mais encanto no todo do que nas partes percebidas separadamente. Mas melhor do que todas elas, é o que as fez, que é nosso Deus, que não passa, porque nada vem depois dele.

CAPÍTULO XII

O amor em Deus

Se te agradam os corpos, louva a Deus neles, e dirige teu amor para teu artífice, para não o desagradar nas mesmas coisas que te agradam.

Se te agradam as almas, ama-as em Deus, porque, embora mutáveis, se fixas nele, terão estabilidade; de outro modo, passariam e pereceriam. Ama-as, pois, nele, e arrasta contigo até ele quantas almas puderes, dizendo-lhes: “Amemo-lo”. Porque ele criou estas coisas, e não está longe; ele não as fez para depois ir embora, mas dele procedem e nele estão. E ele está onde aprecia a verdade: no mais íntimo do coração; mas o coração errante se afastou dele.

Voltai, pecadores, ao coração, e ligai-vos àquele que é vosso criador. Firmai-vos nele, e estareis firmes; descansai nele, e estareis descansados. Para onde ides por esses ásperos caminhos? Para onde ides? O bem que amais, dele procede, mas só é bom e suave quando se dirige a ele; porém, será justamente amargo se, abandonando a Deus, amardes injustamente o que dele procede. Por que continuai por caminhos difíceis e trabalhosos? O descanso não está onde o buscais. Buscais a vida feliz na região das trevas: não está lá. Como achar a vida bem-venturada onde nem sequer há vida?

Ele, nossa vida real veio até nós; sofreu nossa morte, e a suplantou com a abundância da sua vida; com voz de trovão clamou para que voltássemos a ele, para o lugar escondido de onde veio até nós, passando primeiro pelo seio de uma virgem, onde se desposou com ele a natureza humana, carne mortal, para não ficar sempre mortal.

Dali, como o esposo que sai do tálamo, deu saltos como um gigante, para correr seu caminho. E não se deteve; correu clamando com as suas palavras, com as suas obras, com a sua própria morte, com a sua vida, com a sua descida aos infernos e com a sua ascensão, clamando para que voltássemos a ele. Se ele se afastou da nossa vista, foi para que entremos em nosso coração, e ali o encontremos; se partiu, ainda está connosco. Não quis ficar por muito tempo entre nós, mas não nos abandonou. Retirou-se de onde nunca se afastou, pois o mundo foi criado por ele, e no mundo estava, e ao mundo veio para salvar os pecadores. E a ele se confessa minha alma, a ele que a cura e contra quem pecou.

Filhos dos homens, até quando sereis duros de coração? Será possível que, depois de ter a vida descido até vós, não queirais subir e viver? Mas para onde subis, quando vos ergueis e abris vossa boca no céu? Descei para subir, para subir até Deus, já que caístes levantando-vos contra Deus.

Diz-lhes isto, minha alma, para que chorem neste vale de lágrimas, e assim os arrebates contigo para Deus, pois, ao dizer estas palavras ardendo em chamas de caridade, é o espírito divino que te inspira.

(cont)

(Revisão de versão portuguesa por ama)


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