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16/01/2016

Tratado da vida de Cristo 67

Questão 39: Do baptizado de Cristo

Art. 5 — Se no baptismo de Cristo os céus deviam abrir-se.

O quinto discute-se assim. — Parece que no baptismo de Cristo os céus não deviam abrir-se.


1. — Pois, deve abrir-se o céu a quem estando de fora, precisa de entrar nele. Ora, Cristo sempre esteve no céu, como o diz o Evangelho. Logo, parece que os céus não deviam abrir-se-lhe.

2. Demais. — A abertura dos céus entende-se em sentido espiritual ou material. Ora, não se pode entender em sentido material, pois que os corpos celestes são impassíveis e infrangíveis, conforme o dito da Escritura: Talvez formaste tu com ele os céus, que são tão sólidos como se fossem de metal. Nem em sentido espiritual, porque ante os olhos de Deus os céus nunca estiveram fechados. Logo, parece inconveniente dizer que no baptismo de Cristo se lhe abriram os céus.

3. Demais. — Aos fiéis o céu se abriu pela paixão de Cristo, segundo o Apóstolo: Temos confiança de entrar no santuário pelo sangue de Cristo. Por isso, os que não receberam o baptismo de Cristo e que morreram antes da sua paixão, também não puderam entrar no céu. Logo, os céus deviam ter-se aberto antes na paixão que no baptismo de Cristo.

Mas, em contrário: o Evangelho: Depois de baptizado Jesus e estando em oração, abriu-se o céu.

Como se disse, Cristo quis baptizar-se para consagrar, com o seu baptismo o que nós devíamos receber. Por isso o baptismo de Cristo devia manifestar o que constitui a eficácia do nosso. No que se apresentam três pontos à nossa consideração. Primeiro, a virtude principal donde o baptismo tira a sua eficácia, que é uma virtude celeste. Por isso, no baptismo de Cristo, o céu se abriu para mostrar como, no futuro, a virtude celeste santificaria o baptismo. Segundo, a fé da Igreja e a do baptizado cooperam para a eficácia do baptismo; por isso, os baptizados fazem profissão da sua fé e o baptismo se chama o sacramento da fé. Ora, pela fé nós nos alçamos à contemplação das coisas celestes, excedentes ao sentido e à razão humana. E para o significar, os céus abriram-se no baptismo de Cristo. Terceiro, porque pelo baptismo de Cristo nos é especialmente franqueada a entrada do reino celeste, que fora fechada ao primeiro homem pelo pecado. Por isso, no baptismo de Cristo, abriram-se os céus para mostrar que aos baptizados está patente o caminho para o céu. – Porém, depois do baptismo o homem necessita de uma oração contínua, para entrar no céu. Embora, pois, pelo baptismo se perdoem os pecados, permanece contudo a concupiscência como seu efeito, que nos impugna interiormente, bem como o mundo e os demónios, nossos inimigos externos. Por isso, diz assinaladamente o Evangelho: Depois de baptizado Jesus e estando em oração, abriu-se o céu; porque aos fiéis é necessária a oração depois do baptismo. - Ou para compreendermos que o facto de se abrirem os céus aos crentes, pelo baptismo, foi em virtude da oração de Cristo. Donde o dizer o Evangelho assinaladamente, que se lhe abriu o céu, isto é, a todos por causa de Cristo, assim como um imperador diria a quem lhe suplicasse por um terceiro – eis que não lhe dou esse benefício a ele, mas a ti, isto é, por tua causa é que lho dou, como diz Crisóstomo.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Como diz Crisóstomo, assim como Cristo foi baptizado em razão da sua natureza humana, embora em si mesmo não precisasse de baptismo, assim os céus se lhe abriram à sua natureza humana, embora pela sua natureza divina sempre estivesse no céu.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz Jerónimo, os céus abriram-se a Cristo baptizado, não pela divisão dos elementos, mas aos olhos do espírito; assim como Ezequiel diz, no começo das suas profecias, que os céus se lhe abriram. E isso prova-o Crisóstomo quando diz, que se fosse a própria criatura dos céus, que se rompesse, não diria o evangelista - abriu-se-lhe; pois o que materialmente se abre a todos, está aberto. Por isso, Marcos expressamente diz que logo que saiu da água, viu Jesus os céus abertos, como referindo a própria abertura dos céus à visão de Cristo. O que alguns referem à visão corpórea, dizendo ter sido tamanho o esplendor com que refulgiu Cristo no seu baptismo, que parecia terem-se rasgado os céus. Mas também podemos referi-lo à visão imaginária, modo pelo qual Ezequiel viu os céus abertos; assim por acção da virtude divina e da vontade racional, formou-se uma tal visão na imaginação de Cristo, para exprimir que o baptismo abriu aos homens a entrada do céu. Enfim, podemos entendê-lo da visão intelectual, isto é, Cristo viu, depois de santificado pelo baptismo, o céu aberto aos homens; o que já antes via como devendo realizar-se.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A paixão de Cristo foi uma causa comum de os céus se abrirem aos homens. Mas essa causa há-de aplicar-se a cada um para lhe tornar possível a entrada no céu. E isso dá-se pelo baptismo, o Apóstolo: Todos os que fomos baptizados em Jesus Cristo, fomos baptizados na sua morte. Por isso se faz menção da abertura dos céus, antes no baptismo, que na paixão. - Ou, como diz Crisóstomo, os céus só se abriram depois de Cristo baptizado, mas depois que venceu o tirano, não sendo mais necessárias as portas, pois que o céu não devia mais fechar-se, os anjos não disseram - Abri as portas (pois já estavam abertas), mas - tirai as portas. Pelo que Crisóstomo dá a entender, que os obstáculos, que antes impediam as almas dos defuntos de entrar no céu, foram totalmente arredados pela paixão de Cristo; mas pelo baptismo foram abertas, como para nos mostrar a via pela qual os homens haviam de entrar no céu.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.



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