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16/04/2015

Evangelho, comentário, L. Espiritual (A beleza de ser cristão)


Semana II da Páscoa


Evangelho: Jo 3 31-36

31 «Aquele que vem lá de cima é superior a todos. Aquele que vem da terra, é da terra, e terrestre é a sua linguagem. Aquele que vem do céu, é superior a todos. 32 Ele testifica o que viu e ouviu, mas ninguém recebe o Seu testemunho. 33 Quem recebe o Seu testemunho certifica que Deus é verdadeiro. 34 Aquele a Quem Deus enviou fala palavras de Deus, porque Deus não Lhe dá o Espírito por medida. 35 O Pai ama o Filho e pôs todas as coisas na Sua mão. 36 Quem acredita no Filho tem a vida eterna; quem, porém, não acredita no Filho não verá a vida, mas a ira de Deus permanece sobre ele».

Comentário:

Jesus Cristo fala de Si próprio e explica repetindo uma vez mais, quase com as mesmas palavras, Quem É e ao que veio!

O mais importante a reter é que Ele mesmo Se afirma como o caminho – o único – para o Pai e, sendo assim, como de facto é, só por Ele, com Ele e nele poderemos alcançar a vida eterna.

(ama, comentário sobre Jo 3, 31-36, 2014.05.01)

Leitura espiritual


a beleza de ser cristão

PRIMEIRA PARTE

O QUE É SER CRISTÃO?

I.            Relações que Deus estabelece com o homem.

…/2


Até aqui o esquema dos desejos de Deus de viver com os homens as relações que Deus Uno e Trino quis estabelecer com cada ser humano, que serão o objecto da primeira parte do nosso estudo. E, como estamos tratando de Deus e dos homens, não mencionaremos a criação e a existência dos anjos, que damos por assente.

Assim como antes sublinhamos que Deus não é um ser que o homem possa «inventar”; parece oportuno recordar agora que esses desejos que Deus manifesta de relacionar-se com o homem – desejos engendrados no arcano mistério do Espírito de Deus e, portanto, também no arcano mistério da liberdade, segundo a afirmação do Apóstolo: «O Senhor é Espírito, e onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade»[i] – hão-de ser recebidos e aceites pelo homem, pelo homem na sua liberdade, para que sejam realmente eficazes e alcancem o seu fim.

Para que a liberdade do homem se encontre em harmonia com a liberdade de Deus, essa harmonia se desenvolva no amor que origina os vínculos e consiga os fins que o amor de Deus pretende alcançar transmitindo ao homem a sua própria vida na graça, o homem necessita de viver livremente umas disposições espirituais de fundo.

Essas disposições, ensinou-no-las Jesus Cristo; e são fundamentalmente: a mansidão, a humildade, a caridade: «Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração».[ii] «Dou-vos um mandato novo: que vos ameis uns aos outros. E nisto todos conhecerão que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros».[iii]

Aberto o seu espírito com estas disposições, as relações do homem dom Deus permitem-lhe descobrir que Deus, a criar e vincular desta forma o homem a Ele anseia não só conceder-lhe a condição de filho por adopção, mas também que Deus Pai, Filho e Espírito Santo “sonha” em converter o homem em seu colaborador nas três grandes obras de Deus: na Criação, na Redenção e na Santificação de todo o Universo.

Consciente desses projectos de Deus sobre si, o cristão descobre a sua própria grandeza.

Nessa perspectiva da sua inteligência, da sua vontade, chega a vislumbrar a profunda conversão que se origina na sua pessoa: recebe a vida que Deus lhe oferece, Deus, depois, não o abandona, chama-o a colaborar com Ele, como seu filho em Cristo.

Desta forma, o homem que vive de uma “certa participação na vida de Deus”, vivida na ordem natural e na ordem da graça na unidade do seu eu, converte todo o seu actuar, todo o seu amar, todo o seu ser em Criação, em Redenção, em santificação.

Como é possível esta colaboração do homem com Deus?

ii . a criação

Assinalámos que o homem não pode “criar”, “inventar” Deus. Agora não é difícil entender que o homem é um ser que tampouco está em condições de se ter criado a si próprio.

Não é estranho encontrar-se com frases como «o homem faz-se a si mesmo”; «o homem é o que faz”; «o homem realiza-se a sai próprio segundo o seu projecto de vida”; etc.

São afirmações e desejos que desconhecem, ou que não desejam conhecer, as perguntas sobre a origem e o fim do ser humano; perguntas que, definitivamente, são as verdadeiramente radicais que o homem pode e deve colocar-se a si mesmo; se não mente ou se engana a si mesmo ao dizer que anseia conhecer quem é.

Se nascemos, se vivemos, se morremos, como é evidente, teve de transmitir-nos esta vida, que temos e de que gozamos, mas que não nos demos, Quem não existe não se pode “inventar”.

A doação original da vida que sustém o mundo, e o homem no mundo, é o acto criador de Deus.

Fica no ar a pergunta sobre a realidade de um Criador: quem é? Como é?

Se o mundo tem uma origem, e esta parece ser uma verdade já alcançada. E não digo "cientificamente” alcançada porque a pergunta sobre a origem do mundo não tem uma resposta «científica”. A realidade não se esgota no que é “cientificamente verificável”.

Ou seja, se esta é já uma verdade alcançada para explicar a origem do mundo, conceptualmente só há dois caminhos possíveis para encontrar a resposta: um Criador pessoal, inteligente e livre; ou antes, um ser anónimo, convertível e variável em força amorfa, que necessariamente sustenha em marcha um processo sem começo nem fim e sem nenhum sentido. Não há meios-termos. Deus pessoal ou panteísmo. [iv]

O segundo destes caminhos reduz-se, definitivamente, a um certo “panteísmo”.
Ou seja, ou Deus cria o homem e o homem vive fora de Deus ou o homem e Deus são uma “mesma coisa”, em contínuo movimento, contínuo fazer-se; um deus que nasce e morre continuamente em nós, que somos, portanto, esse mesmo “deus”.

A narração bíblica dos primeiros dias do ser humano, homem e mulher, sobre a terra, apresenta-nos a verdade do facto histórico da criação numa linguagem cheia de imagens, que descreve uma realidade impensável par qualquer ser humano que não tivesse “visto” já a Deus por caminhos para nós desconhecidos.

A consideração que alguns escritores voltam a apresentar de vez em quando e até periodicamente, que Deus não é mais que um produto da mente do homem face aos medos, os temores, e ao tomar consciência da instabilidade, da fragilidade e das limitações que comporta a sua condição de criatura, carece de qualquer fundamento racional.

Simplesmente, porque se dá por adquirido a existência fora do homem do Ser que se pretende objecto da invenção do homem e porque pressupõe que o homem “inventa” um ser com a finalidade de acalmar uns medos e temores que, sem esse ser, o homem não teria jamais nenhuma razão nem motivo para sentir.

Com efeito: que razão há para que o homem tema e fraqueje ante “um algo”, “um alguém”, ou, simplesmente, ante “um nada” se não sabe já que existe?

Porque é que o homem pode encher-se de medo ante “o desconhecido”, se em absoluto não sabe “o que há de verdade no desconhecido”, e tampouco o que “o desconhecido” esconde?

Como pode sequer originar-se no homem o conceito de “desconhecido”, se não descobre no seu próprio ser uns limites que só podem ser realidade na sua condição de criatura?

De que estranho poço de sabedoria pode o homem tomar consciência das suas limitações, dos seus limites, se o seu existir é “pura química”, fruto das «necessidades” da força e da energia evolutiva?

Só se pode negar Deus a partir de um conhecimento prévio de Deus.
E a Deus não é possível, absolutamente, “afirmá-lo” fora dele, a partir do homem.
O homem descobre Deus nele; não o inventa, uma vez mais sublinho.

O homem tomou consciência da existência de Deus a partir do próprio instante da sua criação, ao receber o espírito que o constituía homem.
E esta é a razão pela qual o homem, ao longo de toda a sua história, em qualquer rincão do mundo em que se encontre, em qualquer condição em que estivesse a sua vida, adorou a Deus.

Ainda que, e é necessário admiti-lo: «este conhecimento seja com frequência obscurecido e desfigurado pelo erro».[v]

E com esse acto de adoração deixou um traço da profundidade da inteligência com que foi dotado desde o princípio e rico na sabedoria de a utilizar.

Estando já assente no crente a verdade de um Deus pessoal Criador, o espírito do homem abre-se à compreensão da criação, pondo-se duas interrogações; ainda que possa parecer estranho começar por essas perguntas e não outras; e estranho porque contêm uma palavra que em si mesma parece não necessitar de resposta: criação.

Porquê Deus criou o homem?

Para quê Deus criou o homem?

A primeira pergunta não tem possibilidade de outra resposta que a seguinte: Deus criou o mundo por Amor.

«Assim pois, acerca da questão Porquê Deus criou o mundo? há que dizer o seguinte: Na medida em que esta questão reclama uma resposta por causa da nossa imagem humana de Deus – e só na razão da nossa imagem humana de Deus o problema se pode colocar, não há mais que a resposta de uma confissão esclarecedora: Deus é o amor e, levado por esse amor, cria o mundo para o homem e por causa do homem.
O motivo do seu amor é o seu próprio amor, cujo acto fundamental não é uma resposta a um bem fora de si próprio, mas um dispor criador de todos os bens. [vi]

Uma resposta semelhante corre o perigo de ser entendida num sentido muito redutor; se aplicamos a Deus noções de egoísmo que podemos encontrar em qualquer amor humano.

Deus cria a sua criação por amor; porque anseia transmitir vida e amor. Não para aumentar a sua bem-aventurança nem para adquirir um aumento de perfeição, mas simplesmente para manifestar o seu amor pelos bens que outorga às suas criaturas.
Só o verdadeiro Deus, no seu desígnio libérrimo, criou do nada e ao mesmo tempo uma e outra criatura, a espiritual e a corporal; e. com a criatura, começou o tempo.

(cont)

ernesto juliá, La belleza de ser cristiano, trad. ama)






[i] 2 Co 3, 17
[ii] Mt 11, 29
[iii] Jo 13, 34-35
[iv] juan arana, El Dios sin rostro, Biblioteca Nueva, Madrid 2003
[v] Catecismo n. 286
[vi] johann auer, El mundo, creación de Dios, Herder, Barcelona 1985, Part I, cap. II, pag. 9.

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