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24/03/2015

Tratado do verbo encarnado 141

Questão 23: Se a adopção convém a Cristo

Art. 3 — Se ser adoptado é próprio da criatura racional.

O terceiro discute-se assim. — Parece que ser adoptado não é próprio da criatura racional.

1. — Pois, Deus não é chamado Pai da criatura racional senão por adopção. Pois, é também chamado Pai da criatura irracional, como quando a Escritura diz: Quem é o Pai da chuva? Ou quem produziu as gotas de orvalho? Logo, ser adoptado não é próprio da criatura racional.

2. Demais. — Alguns chamam-se filhos de Deus por adopção. Ora, o serem filhos de Deus a Escritura propriamente o atribui aos anjos, como naquele passo: Mas um certo dia como os filhos de Deus se tivessem apresentado na frente do Senhor. Logo, não é próprio da criatura racional o ser adoptado.

3. Demais. — O próprio a uma natureza convém a todos os seres que a têm; assim, a faculdade de rir convém a todos os homens. Ora, ser adoptado não convém a toda natureza racional. Logo, ser adoptado não é próprio à natureza racional.

Mas, em contrário, os filhos adoptados são herdeiros de Deus, como diz o Apóstolo. Ora, tal herança convém à criatura racional. Logo, é próprio da criatura racional ser adoptada.

Como dissemos, a filiação da adopção é uma certa semelhança da filiação natural. Pois, o Filho de Deus naturalmente procede do Pai, como Verbo mental, tendo unidade de existência com ele. Ora, um ser pode se assemelhar a esse Verbo, de três modos. De um modo, em razão da forma, mas não pela mente; assim, a forma exterior de uma casa construída se assemelha ao Verbo mental do artífice, pela espécie formal; mas não pela mente, porque a forma da casa, na matéria; não é inteligível, quando o era na mente do artífice. E deste modo, qualquer criatura se assimila ao Verbo eterno, por ter sido feita pelo Verbo. - De um segundo modo, uma criatura se assimila ao Verbo, não só em razão da forma, mas ainda quanto a sua mente, assim, a ciência, que nasce na mente do discípulo, se assimila ao Verbo existente na mente do Mestre. E deste modo, a criatura racional, mesmo pela sua natureza, se assemelha ao Verbo de Deus, pela unidade que tem com o Pai; resultante da graça e da caridade. Por isso o Senhor orava: Para que eles sejam um, como também nós somos um. E tal assimilação completa a ideia de adopção, pois, a seres assim assimilados é lhes devida a herança eterna. — Donde é manifesto, que ser adoptado convém só à criatura racional, mas não a todas, senão só as que têm a caridade, que está derramada nos nossos corações pelo Espírito Santo, no dizer do Apóstolo. E por isso, ainda na frase do Apóstolo, o Espírito Santo se chama espírito de adopção de filhos.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Deus é chamado Pai da criatura irracional, não propriamente pela adopção, mas pela criação, participando da semelhança, no primeiro sentido.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Os anjos chamam-se filhos de Deus pela filiação adoptiva; não que ela lhes convenha primariamente, mas por terem sido eles os primeiros que receberam a adopção de filhos.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A adopção não é uma propriedade resultante da natureza, mas, da graça da qual a natureza racional é capaz. Por isso, não é necessário que convenha a toda criatura racional. Mas sim, que toda criatura racional seja capaz da filiação adoptiva.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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