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17/03/2015

Tratado do verbo encarnado 139 – Mar 17

Questão 23: Se a adopção convém a Cristo

Em seguida devemos tratar da adopção – se ela convém a Cristo.

E nesta questão discutem-se quatro artigos:

Art. 1 – Se a Deus convém adoptar filhos.
Art. 2 — Se adoptar convém a toda a Trindade.
Art. 3 — Se ser adoptado é próprio da criatura racional.
Art. 4 — Se Cristo, enquanto homem, é filho adoptivo de Deus.

Art. 1 – Se a Deus convém adoptar filhos.

O primeiro discute-se assim. — Parece que a Deus não convém adoptar filhos.

1. — Pois, ninguém adopta como filho senão uma pessoa estranha, conforme o ensinam os juristas. Ora, Deus, sendo criador de todas as coisas, nenhuma pessoa lhe é estranha. Logo, parece que a Deus não convém adoptar.

2. Demais. — A adopção foi introduzida para suprir a falta de filiação natural. Ora, em Deus há filiação natural, como se estabeleceu. Logo, não convém a Deus adoptar filhos

3. Demais. — A adopção tem por fim fazer o adoptado suceder na herança do adoptante. Ora, ninguém pode suceder na herança de Deus, porque este nunca morrerá. Logo, a Deus não convém adoptar.

Mas, em contrário, o Apóstolo: O qual nos predestinou para sermos seus filhos adoptivos. Ora, a predestinação de Deus não é vã. Logo, Deus adopta para si alguns como filhos.

Adoptamos alguém como filho para, por nossa bondade, fazê-lo participar da nossa herança. Ora, a bondade de Deus é infinita, e por isso admite as suas criaturas a participarem dos seus bens; e sobretudo as criaturas racionais, que enquanto feitas à imagem de Deus são capazes da bem-aventurança divina. E esta consiste na fruição de Deus; pela qual também o próprio Deus é feliz e rico por si mesmo, por fruir de si mesmo. Ora, chama-se herança de alguém o que o torna rico. Donde, por Deus na sua bondade admitir alguns homens à herança da bem-aventurança, dizemos que os adopta. Mas a adopção divina tem sobre a humana a vantagem de Deus tornar idóneo o homem que adopta, pelo dom da graça, a receber a herança celeste; ao contrário, o homem não torna idóneo aquele que adopta, mas o escolhe para a adopção já idóneo

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — O homem, considerado na sua natureza, não é estranho para Deus, quanto aos bens naturais que recebe, mas é estranho quanto aos bens da graça e da glória; e é por causa disto que é adoptado.

RESPOSTA À SEGUNDA. — É próprio do homem agir para suprir a sua indigência; mas não, de Deus, a quem convém o obrar para comunicar a abundância da sua perfeição. Donde, assim como, pelo acto de criação, a bondade divina é comunicada a todas as criaturas segundo uma certa semelhança, assim, pelo acto de adopção é comunicada uma semelhança de filiação natural aos homens, segundo o Apóstolo: Os que ele conheceu na sua presciência também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Os bens espirituais podem ser possuídos simultaneamente por muitos, mas não os materiais. Por isso, ninguém pode receber uma herança material senão sucedendo ao morto; mas a herança espiritual todos a recebem simultânea e integralmente, sem detrimento do Pai sempre vivo. Embora possamos dizer que o Deus, existente em nós pela fé, morre, para começar a existir em nós, pela visão, segundo a Glosa do Apóstolo: Se filhos, também herdeiros.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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