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24/03/2015

Evangelho, com., Leit.espiritual (Evangelli Gaudium)

Tempo de Quaresma V Semana

Evangelho: Jo 8 21-30

21 Jesus disse-lhes mais: «Eu retiro-Me: vós Me buscareis, e morrereis no vosso pecado. Para onde Eu vou, vós não podeis ir». 22 Diziam, pois, os judeus: «Será que Ele Se mate a Si mesmo, pois diz: Para onde Eu vou, vós não podeis ir?». 23 Ele disse-lhes: «Vós sois cá de baixo, Eu sou lá de cima. Vós sois deste mundo, Eu não sou deste mundo. 24 Por isso Eu vos disse que morreríeis nos vossos pecados; sim, se não crerdes que “Eu sou”, morrereis nos vossos pecados». 25 Disseram-Lhe então eles: «Quem és Tu?». Jesus respondeu-lhes: «É exactamente isso que Eu vos estou a dizer. 26 Muitas coisas tenho a dizer e a julgar a vosso respeito, mas O que Me enviou é verdadeiro e o que ouvi d'Ele é o que digo ao mundo». 27 Eles não compreenderam que Jesus lhes falava do Pai. 28 Jesus disse-lhes mais: «Quando tiverdes levantado o Filho do Homem, então conhecereis que “Eu sou” e que nada faço por Mim mesmo, mas que, como o Pai Me ensinou, assim falo. 29 O que Me enviou está comigo, não Me deixou só, porque Eu faço sempre aquilo que é do Seu agrado». 30 Dizendo estas coisas, muitos acreditaram n'Ele.


Comentário:

A Liturgia quaresmal prossegue com os textos do Evangelho escrito por São João que, como sabemos, se detém principalmente na figura de Jesus Cristo autêntico Deus e autêntico homem.

Já referimos que, por vezes, parecem um pouco enigmáticas as explicações que Jesus dá aos que O interrogam mas, de facto, o próprio Evangelista confirma que muitos compreendiam e acreditavam nele.

Não diz contudo algo mais que podemos adivinhar: muitos desses que acreditaram hão-de levar outros muitos a acreditar também.

(ama, comentário sobre Jo 8, 21-30, 2014.04.08)

Leitura espiritual


EXORTAÇÃO APOSTÓLICA EVANGELII GAUDIUM
DO SANTO PADRE FRANCISCO
AO EPISCOPADO, AO CLERO ÀS PESSOAS CONSAGRADAS E AOS FIÉIS LEIGOS SOBRE O ANÚNCIO DO EVANGELHO NO MUNDO ACTUAL

O diálogo entre a fé, a razão e as ciências

242. O diálogo entre ciência e fé também faz parte da acção evangelizadora que favorece a paz.[i]

O cientificismo e o positivismo recusam-se a «admitir, como válidas, formas de conhecimento distintas daquelas que são próprias das ciências positivas».[ii]

A Igreja propõe outro caminho, que exige uma síntese entre um uso responsável das metodologias próprias das ciências empíricas e os outros saberes como a filosofia, a teologia, e a própria fé que eleva o ser humano até ao mistério que transcende a natureza e a inteligência humana.
A fé não tem medo da razão; pelo contrário, procura-a e tem confiança nela, porque «a luz da razão e a luz da fé provêm ambas de Deus»,[iii] e não se podem contradizer entre si.

A evangelização está atenta aos progressos científicos para os iluminar com a luz da fé e da lei natural, tendo em vista procurar que sempre respeitem a centralidade e o valor supremo da pessoa humana em todas as fases da sua existência.
Toda a sociedade pode ser enriquecida através deste diálogo que abre novos horizontes ao pensamento e amplia as possibilidades da razão.
Também este é um caminho de harmonia e pacificação.

243. A Igreja não pretende deter o progresso admirável das ciências. Pelo contrário, alegra-se e inclusivamente desfruta reconhecendo o enorme potencial que Deus deu à mente humana.

Quando o progresso das ciências, mantendo-se com rigor académico no campo do seu objecto específico, torna evidente uma determinada conclusão que a razão não pode negar, a fé não a contradiz.

Nem os crentes podem pretender que uma opinião científica que lhes agrada – e que nem sequer foi suficientemente comprovada – adquira o peso dum dogma de fé.

Em certas ocasiões, porém, alguns cientistas vão mais além do objecto formal da sua disciplina e exageram com afirmações ou conclusões que extravasam o campo da própria ciência.
Neste caso, não é a razão que se propõe, mas uma determinada ideologia que fecha o caminho a um diálogo autêntico, pacífico e frutuoso.

O diálogo ecuménico

244. O compromisso ecuménico corresponde à oração do Senhor Jesus pedindo «que todos sejam um só»[iv].

A credibilidade do anúncio cristão seria muito maior, se os cristãos superassem as suas divisões e a Igreja realizasse «a plenitude da catolicidade que lhe é própria naqueles filhos que, embora incorporados pelo Baptismo, estão separados da sua plena comunhão».[v]
Devemos sempre lembrar-nos de que somos peregrinos, e peregrinamos juntos.
Para isso, devemos abrir o coração ao companheiro de estrada sem medos nem desconfianças, e olhar primariamente para o que procuramos: a paz no rosto do único Deus.

O abrir-se ao outro tem algo de artesanal, a paz é artesanal. Jesus disse-nos: «Felizes os pacificadores»[vi].

Neste esforço, mesmo entre nós, cumpre-se a antiga profecia: «Transformarão as suas espadas em relhas de arado»[vii].

245. Sob esta luz, o ecumenismo é uma contribuição para a unidade da família humana.

A presença no Sínodo do Patriarca de Constantinopla, Sua Santidade Bartolomeu I, e do Arcebispo de Cantuária, Sua Graça Rowan Douglas Williams,[viii] foi um verdadeiro dom de Deus e um precioso testemunho cristão.

246. Dada a gravidade do contra-testemunho da divisão entre cristãos, sobretudo na Ásia e na África, torna-se urgente a busca de caminhos de unidade.
Os missionários, nesses continentes, referem repetidamente as críticas, queixas e sarcasmos que recebem por causa do escândalo dos cristãos divididos.

Se nos concentrarmos nas convicções que nos unem e recordarmos o princípio da hierarquia das verdades, poderemos caminhar decididamente para formas comuns de anúncio, de serviço e de testemunho.
A imensa multidão que não recebeu o anúncio de Jesus Cristo não pode deixar-nos indiferentes.
Por isso, o esforço por uma unidade que facilite a recepção de Jesus Cristo deixa de ser mera diplomacia ou um dever forçado para se transformar num caminho imprescindível da evangelização.

Os sinais de divisão entre cristãos, em países que já estão dilacerados pela violência, juntam outros motivos de conflito vindos da parte de quem deveria ser um activo fermento de paz.

São tantas e tão valiosas as coisas que nos unem!
E, se realmente acreditamos na acção livre e generosa do Espírito, quantas coisas podemos aprender uns dos outros!

Não se trata apenas de receber informações sobre os outros para os conhecermos melhor, mas de recolher o que o Espírito semeou neles como um dom também para nós.

Só para dar um exemplo, no diálogo com os irmãos ortodoxos, nós, os católicos, temos a possibilidade de aprender algo mais sobre o significado da colegialidade episcopal e sobre a sua experiência da sinodalidade.
Através dum intercâmbio de dons, o Espírito pode conduzir-nos cada vez mais para a verdade e o bem.

As relações com o Judaísmo

247. Um olhar muito especial é dirigido ao povo judeu, cuja Aliança com Deus nunca foi revogada, porque «os dons e o chamamento de Deus são irrevogáveis»[ix].

A Igreja, que partilha com o Judaísmo uma parte importante das Escrituras Sagradas, considera o povo da Aliança e a sua fé como uma raiz sagrada da própria identidade cristã[x].
Como cristãos, não podemos considerar o Judaísmo como uma religião alheia, nem incluímos os judeus entre quantos são chamados a deixar os ídolos para se converter ao verdadeiro Deus[xi].
Juntamente com eles, acreditamos no único Deus que actua na história, e acolhemos, com eles, a Palavra revelada comum.

248. O diálogo e a amizade com os filhos de Israel fazem parte da vida dos discípulos de Jesus.
O afecto que se desenvolveu leva-nos a lamentar, sincera e amargamente, as terríveis perseguições de que foram e são objecto, particularmente aquelas que envolvem ou envolveram cristãos.

249. Deus continua a operar no povo da Primeira Aliança e faz nascer tesouros de sabedoria que brotam do seu encontro com a Palavra divina.
Por isso, a Igreja também se enriquece quando recolhe os valores do Judaísmo.
Embora algumas convicções cristãs sejam inaceitáveis para o Judaísmo e a Igreja não possa deixar de anunciar Jesus como Senhor e Messias, há uma rica complementaridade que nos permite ler juntos os textos da Bíblia hebraica e ajudar-nos mutuamente a desentranhar as riquezas da Palavra, bem como compartilhar muitas convicções éticas e a preocupação comum pela justiça e o desenvolvimento dos povos.

O diálogo inter-religioso

250. Uma atitude de abertura na verdade e no amor deve caracterizar o diálogo com os crentes das religiões não-cristãs, apesar dos vários obstáculos e dificuldades, de modo particular os fundamentalismos de ambos os lados.

Este diálogo inter-religioso é uma condição necessária para a paz no mundo e, por conseguinte, é um dever para os cristãos e também para outras comunidades religiosas.

Este diálogo é, em primeiro lugar, uma conversa sobre a vida humana ou simplesmente – como propõem os Bispos da Índia – «estar aberto a eles, compartilhando as suas alegrias e penas».[xii]
Assim aprendemos a aceitar os outros, na sua maneira diferente de ser, de pensar e de se exprimir.
Com este método, poderemos assumir juntos o dever de servir a justiça e a paz, que deverá tornar-se um critério básico de todo o intercâmbio.

Um diálogo, no qual se procurem a paz e a justiça social, é em si mesmo, para além do aspecto meramente pragmático, um compromisso ético que cria novas condições sociais.
Os esforços à volta dum tema específico podem transformar-se num processo em que, através da escuta do outro, ambas as partes encontram purificação e enriquecimento.
Portanto, estes esforços também podem ter o significado de amor à verdade.

(cont)

(Revisão da versão portuguesa por ama)





[i] Cf. Propositio 54. 
[ii] João Paulo II, Carta enc. Fides et ratio (14 de Setembro de 1998), 88: AAS 91 (1999), 74.
[iii] São Tomás de Aquino, Summa contra gentiles, I, 7; cf. João Paulo II, Carta enc. Fides et ratio (14 de Setembro de 1998), 43: AAS 91 (1999), 39.
[iv] Jo 17, 21
[v] Conc. Ecum. Vat. II, Decr. sobre o ecumenismo Unitatis redintegratio, 4.
[vi] Mt 5, 9
[vii] Is 2, 4
[viii] Cf. Propositio 52.
[ix] Rm 11, 29
[x] cf. Rm 11, 16-18
[xi] cf. 1 Ts 1, 9
[xii] Conferência dos Bispos da Índia, Decl. final da XXX Assembleia Geral: The Church’s Role for a Better India (8 de Março de 2012), 8.9.

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