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17/01/2015

Tratado do verbo encarnado 93

Questão 14: Das fraquezas do corpo, que Cristo assumiu na natureza humana.

Art. 4 — Se Cristo devia ter assumido todas as misérias corporais dos homens.

O quarto discute-se assim. — Parece que Cristo devia ter assumido todas as misérias corporais dos homens.

1. — Pois, diz Damasceno: O  na assumível é incurável. Ora, Cristo veio curar todos os nossos males. Logo, devia assumir todas as nossas misérias.

2. Demais. — Foi dito que, para Cristo satisfazer por nós, devia ter os hábitos perfectivos da alma e as deficiências do corpo. Ora, a alma de Cristo assumiu a plenitude de todas as graças. Logo, o seu corpo devia assumir todas as misérias.

3. Demais. — Dentre todas as misérias do corpo a principal é a morte. Ora, Cristo sofreu a morte. Logo, com maior razão, devia ter assumido todas as outras misérias.

Mas, em contrário, não pode um mesmo sujeito ser sede de causas opostas. Ora, algumas fraquezas são opostas entre si, como causadas de princípios contrários. Logo, Cristo não podia ter assumido todas as enfermidades humanas.

Como dissemos, Cristo assumiu as misérias humanas para satisfazer pelo pecado da natureza humana, e para isso era necessário que a sua alma tivesse a perfeição da ciência e da graça. Donde, Cristo devia assumir aquelas misérias resultantes do pecado comum de toda a natureza, mas não repugnantes à perfeição da ciência e da graça. Assim, não era conveniente que assumisse todas as deficiências ou enfermidades humanas. Pois, algumas fraquezas repugnam à perfeição da ciência e da graça, como a ignorância, a inclinação para o mal e a dificuldade para o bem. Outras não atingem a natureza humana geral e totalmente como se fossem resultantes do pecado dos nossos primeiros pais, mas são provocadas em alguns homens por causas particulares, como a lepra, o mal caduco e outras semelhantes. E essas misérias são às vezes causadas pela culpa pessoal, por exemplo, pela alimentação desordenada, outras, resultam da deficiência da virtude formativa. Ora, nada disso podia dar-se com Cristo, tanto por a sua carne ter sido concebida do Espírito Santo, de sabedoria e virtude infinitas e, portanto, isenta do erro e da miséria, quanto por não ter Cristo praticado nada de desordenado no regime da sua vida. Mas, há uma terceira categoria de misérias existente comumente em todos os homens, em virtude do pecado dos nossos primeiros pais, como, a fome, a sede e outras tais. E Cristo assumiu essas todas. A elas chama-lhes Damasceno sofrimentos naturais e sem desonra, naturais porque resultam em geral de toda a natureza humana, sem desonra, por não implicarem falta de ciência nem de graça.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Todas as misérias particulares dos homens são causadas pela corruptibilidade e pela passibilidade do corpo, com a colaboração de algumas causas particulares. Donde, quando Cristo sanou a passibilidade e a corruptibilidade do nosso corpo, por as ter assumido, sanou por consequência todos os outros defeitos.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A plenitude de toda graça e ciência da alma de Cristo era, em si mesma, a esta devida, por isso mesmo que foi assumida pelo Verbo de Deus. Mas, as nossas misérias ele assumiu-as por condescendência, para satisfazer pelos nossos pecados, e não porque em si mesmo devesse assumi-las. Por isso não devia assumi-las todas, mas só aquelas que bastavam para satisfazer pelo pecado de todo o género humano.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A morte fere todos os homens em virtude do pecado dos nossos primeiros pais, não porém algumas outras misérias, embora sejam menores que a morte. Donde a comparação não colhe.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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