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12/10/2014

Deus está presente

Humildade de Jesus: em Belém, em Nazaré, no Calvário... Porém, mais humilhação e mais aniquilamento na Hóstia Santíssima; mais que no estábulo, e que em Nazaré, e que na Cruz. Por isso, que obrigação tenho de amar a Missa! (A "nossa" Missa, Jesus...) (Caminho, 533)

Por vezes, talvez nos perguntemos como será possível corresponder a tanto amor de Deus e até desejaríamos, para o conseguir, que nos pusessem com toda a clareza diante dos nossos olhos um programa de vida cristã. A solução é fácil e está ao alcance de todos os fiéis: participar amorosamente na Santa Missa, aprender a conviver e a ganhar intimidade com Deus na Missa, porque neste Sacrifício se encerra tudo aquilo que o Senhor quer de nós.

Permiti que aqui vos recorde o desenrolar das cerimónias litúrgicas, que já observámos em tantas e tantas ocasiões. Seguindo-as passo a passo é muito possível que o Senhor nos faça descobrir em que pontos devemos melhorar, que defeitos precisamos de extirpar e como há-de ser o nosso convívio, íntimo e fraterno, com todos os homens.


O sacerdote dirige-se para o altar de Deus, do Deus que alegra a nossa juventude. A Santa Missa inicia-se com um cântico de alegria, porque Deus está presente. É esta alegria que, juntamente com o reconhecimento e o amor, se manifesta no beijo que se dá na mesa do altar, símbolo de Cristo e memória dos santos, um espaço pequeno e santificado, porque nesta ara se confecciona o Sacramento de eficácia infinita. (Cristo que passa, 88)

Fortaleza

Lembramo-nos daquele homem do Evangelho que tinha a mão ressequida, paralítica. O Senhor disse-Lhe: Estende a tua mão. E ele estendeu-a e ficou curado (cfr. Mt 12, 13). Primeiro estendeu a mão e depois ficou curado. Mas como ia abrir a mão antes de ser curado, se esta não se podia mexer precisamente porque estava paralítica? E, no entanto, assim foi. É que ele a estendeu com a vontade, porque o seu querer, sob o império da voz de Cristo, foi um querer profundo, mais profundo que a sua paralisia.

(rafael llano cifuentesFortaleza, Quadrante, S. Paulo 1991 nr. 28)

Tratado da Graça 24

Questão 112: Da causa da graça

Art. 5 – Se o homem pode saber que tem a graça.

(I Sent., dist. XVII, a. 4, III, dist. XXXIII, q. 1.a. 2, ad 1, IV, dist. IX, q. 1, a. 3, qª 2, dist. XXI, q. 2, a. 2, ad 2, De Verit., q. 10, a. 10, II Cor., cap. XII, lect. I, cap. XIII, lect. II).

O quinto discute-se assim. – O homem pode saber que tem a graça.

1. – Pois, a graça está, por sua essência, na alma. Ora, a alma tem conhecimento certíssimo do que está nela, essencialmente, como se vê claro em Agostinho. Logo, a graça pode ser certissimamente conhecida por quem a possui.

2. Demais. – Como a ciência, também a graça é dom de Deus. Ora, quem recebeu de Deus a ciência, sabe que a tem conforme a Escritura: O Senhor me deu a verdadeira ciência destas coisas. Logo, por igual razão, quem recebeu de Deus a graça sabe que a tem.

3. Demais. – O lume é mais cognoscível que as trevas, porque, segundo o Apóstolo, tudo o que se manifesta é luz. Ora, o pecado, que é a treva espiritual, o pecador pode saber com certeza que o tem. Logo, com maior razão, a graça, que é a luz espiritual.

4. Demais. – O Apóstolo diz: Ora, nós não recebemos o espírito deste mundo, mas sim o Espírito que vem de Deus, para sabermos as coisas que por Deus nos foram dadas. Ora, a graça é o primeiro dom de Deus. Logo, quem recebe a graça, pelo Espírito Santo, sabe quem, pelo mesmo, ela lhe foi dada.

5. Demais. – Foi dito a Abraão, por parte do Senhor: Agora conheci que temes a Deus, i. é, te fiz conhecer. Ora, esse lugar refere-se ao temor casto, que não existe sem a graça. Logo, o homem pode saber que a tem.

Mas, em contrário, diz a Escritura: Não sabe o homem se é digno de amor ou de ódio. Ora, a graça santificante torna o homem digno do amor de Deus. Logo, ninguém pode saber se tem a graça santificante.

Podemos conhecer um objecto de três modos. Primeiro, pela revelação. E assim, alguém pode saber se está em graça, pois Deus revela-o, às vezes a alguns, por um privilégio especial, para nesta vida, já começarem a gozar a alegria da segurança, e prossigam, mas confiante e fortemente, nas suas obras magníficas, e suportem os males da vida presente. Assim, foi dito a Paulo: Basta-te a minha graça.

De outro modo, o homem pode conhecer um objecto, por si mesmo e com certeza. E então, ninguém pode saber que tem a graça. Pois, só podemos ter certeza do que podemos julgar pelo seu princípio próprio. Assim, temos certeza das conclusões demonstrativas, pelos princípios indemonstráveis universais, pois ninguém pode saber que tem a ciência de uma conclusão, se ignorar o princípio. Ora, o princípio da graça e o seu objecto é o próprio Deus que, por causa da sua excelência, é-nos desconhecido, conforme a Escritura: Com efeito, Deus é grande, que excede à nossa ciência. Portanto, não podemos conhecer com certeza a sua presença nem a sua ausência em nós, segundo a Escritura: Se ele vier a mim, eu o não verei, se for eu o não perceberei. Logo, o homem não pode julgar com certeza se tem a graça, consoante a Escritura: Pois, nem ainda eu me julgo a mim mesmo, pois, o Senhor é quem me julga.

De terceiro modo, conhecemos um objecto conjecturalmente, por certos sinais. E desta maneira podemos saber que temos a graça, percebendo que pomos em Deus o nosso prazer e desprezamos as coisas mundanas e não tendo consciência de nenhum pecado mortal. E neste sentido, pode-se entender o lugar da Escritura: Eu darei ao vencedor o maná escondido, o qual não conhece senão quem o recebe. Porque, quem o recebe o sabe, por experiência da sua doçura, a qual não a sente quem não o recebe. Mas tal conhecimento é imperfeito. Por isso o Apóstolo diz: De nada me argui a consciência, mas nem por isso me dou por justificado. Pois, como diz outro lugar da Escritura: Quem é que conhece os seus delitos? Purifica-me dos que me são ocultos, e perdoa ao teu servo os alheios.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. – O que está essencialmente na alma é conhecido por conhecimento experimental, enquanto o homem descobre, pelos seus actos, os princípios internos que os produzem. Assim, percebemos a vontade, querendo, e a vida, pelos actos vitais.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Essencialmente, a ciência dá ao homem a certeza sobre o seu objecto, do mesmo modo, a fé torna-o certo do seu. E isto, porque a certeza pertence à perfeição do intelecto, onde existem os dons referidos. Portanto, quem tem a ciência ou a fé está certo de as ter. Não se dá o mesmo, porém, com a graça, com a caridade e dons semelhantes, que aperfeiçoam a potência apetitiva.

RESPOSTA À TERCEIRA. – O pecado tem, como princípio o objecto, um bem mutável, que nos é conhecido. Ao passo que o objecto ou o fim da graça é-nos desconhecido, por causa da imensidade da sua luz, segundo a Escritura: Habita numa luz inacessível.

RESPOSTA À QUARTA. – O Apóstolo, nesse lugar, refere-se aos dons da glória que nos são dados em esperança. Ora, nós conhecemo-los certissimamente pela fé, embora não saibamos com certeza que temos a graça pela qual podemos merecê-los. – Ou pode dizer-se que se refere a um conhecimento privilegiado, dado pela revelação. Por isso, acrescenta: Porém Deus nos revelou a nós pelo seu Espírito.

RESPOSTA À QUINTA. – Essa palavra dita a Abraão pode referir-se ao conhecimento experimental, derivado da verificação da obra realizada. Pois, pela obra que fez, Abraão podia conhecer experimentalmente que tinha o temor de Deus. – Ou também pode referir-se à revelação.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


Evangelho diário, coment. e leit espiritual (Enc. Octobri mense Leão XIII)

Tempo comum XXIII Semana

Evangelho: Mt 22 1-14

1 Jesus, tomando a palavra, voltou a falar-lhes em parábolas ,2 dizendo: «O Reino dos Céus é semelhante a um rei, que preparou o banquete de bodas para seu filho. 3 Mandou os seus servos chamar os convidados para as bodas, mas eles não quiseram ir. 4 Enviou de novo outros servos, dizendo: “Dizei aos convidados: Eis que preparei o meu banquete, os meus touros e animais cevados já estão mortos, e tudo está pronto; vinde às núpcias”. 5 Mas eles desprezaram o convite e foram-se, um para a sua casa de campo e outro para o seu negócio. 6 Outros lançaram mão dos servos que ele enviara, ultrajaram-nos e mataram-nos. 7 «O rei, tendo ouvido isto, irou-se e, enviando os seus exércitos, exterminou aqueles homicidas, e incendiou-lhes a cidade. 8 Então disse aos servos: “As bodas, com efeito, estão preparadas, mas os convidados não eram dignos. 9 Ide, pois, às encruzilhadas dos caminhos e a quantos encontrardes convidai-os para as núpcias”. 10 Tendo saído os seus servos pelos caminhos, reuniram todos os que encontraram, maus e bons; e a sala das bodas ficou cheia de convidados. 11 «Entrando depois o rei para ver os que estavam à mesa, viu lá um homem que não estava vestido com o traje nupcial. 12 E disse-lhe: “Amigo, como entraste aqui, não tendo o traje nupcial?”. Ele, porém, emudeceu. 13 Então o rei disse aos seus servos: “Atai-o de pés e mãos e lançai-o nas trevas lá de fora, aí haverá choro e ranger de dentes. 14 Porque são muitos os chamados mas poucos os escolhidos”».

Comentário:

A frase com que São Mateus termina este seu texto, dá-nos que pensar! Que queria Jesus dizer com tal?

De facto, muitos recebem a vocação para seguir Cristo mais de perto e, muitos, correspondem tentando santificar a sua vida que outra coisa não é que fazer, em tudo, a Justíssima e Amabilíssima Vontade de Deus.

Mas, desses, só uma ínfima parte é escolhida para O seguir de muito mais perto, colocando-se ao Seu serviço, entregando-lhe toda a sua vida.


Estes ‘escolhidos’ são as pedras onde Cristo assenta a Sua Igreja, os guias do Seu rebanho, os que têm o poder de «atar e desatar» os vínculos que unem os homens ao Criador, e, sobretudo, os que na Santa Missa perpetuam a Sua presença real e substancial em Corpo, Alma e Divindade ao consagrarem o pão e o vinho tal como Ele, pela primeira vez na Última Ceia, o fez.

(ama, comentário sobre Mt 22, 1-14, 2012.08.23)

Leitura espiritual


Documentos do Magistério
CARTA ENCÍCLICA
OCTOBRI MENSE
DE SUA SANTIDADE
PAPA LEÃO XIII
A TODOS OS NOSSOS VENERÁVEIS
IRMÃOS, OS PATRIARCAS,
PRIMAZES, ARCEBISPOS
E BISPOS DO ORBE CATÓLICO,
EM GRAÇA E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA

SOBRE O ROSÁRIO DE NOSSA SENHORA

Veneráveis Irmãos,
Saúde e Bênção Apostólica.

Convite ao Rosário

1. Ao aproximar-se o mês de Outubro, já agora consagrado à beatíssima Virgem, é para Nós coisa sumamente grata relembrar as solícitas recomendações que, nos anos precedentes, vos dirigimos, ó Veneráveis Irmãos, a fim de que em toda parte os fiéis, impelidos pelo vosso zelo autorizado, se volvessem, com reavivada piedade, para a grande Mãe de Deus, para a poderosa auxiliadora do povo cristão, a ela recorrendo suplicantes, durante o mês inteiro, com o rito do santo Rosário: Rosário que a Igreja habitualmente usou e divulgou, sobretudo nos tempos mais tempestuosos, e sempre com o desejado êxito.

2. Temos a peito manifestar-vos, também este ano, o mesmo desejo, e renovar-vos a mesma exortação. Impele-nos a isto urgentemente, e a isso nos estimula, o Nosso amor à Igreja, cujas angústias, antes que se aligeirarem, crescem cada dia mais em número e em aspereza.

Males que afligem a Igreja

3. De todos são conhecidos os males que Nós deploramos: a luta desapiedada contra os sagrados e intangíveis dogmas, que a Igreja guarda e transmite, a zombaria da integridade da virtude cristã, que a Igreja defende, a trama de calúnias de mil modos urdidas, o ódio fomentado contra a sagrada ordem dos bispos, e principalmente contra o Romano Pontífice, os ataques dirigidos, com a mais impudente audácia e a criminosa impiedade, contra a própria divindade de Cristo, no intuito de extirpar pelas raízes e de destruir a obra divina da Redenção, que força alguma poderá jamais destruir nem cancelar.

4. Estes ataques não são, certamente, uma novidade para a Igreja militante. Porquanto, depois do aviso dado por Cristo aos Apóstolos, ela sabe que, para instruir os homens no caminho da verdade e guiá-los à salvação eterna, deve todo dia descer a campo e travar combate. E, na realidade, nos séculos sempre lutou intrepidamente até ao martírio, considerando como sua precípua alegria e glória o poder unir o seu sangue ao do seu Fundador: no qual está depositada a segura esperança da prometida vitória.

5. Por outra parte, entretanto, não podemos ocultar-vos o profundo senso de tristeza que penetra os melhores, ante esta contínua tensão de batalha. De facto, é motivo de imensa tristeza ver o grande número dos que, pela perversidade dos erros e por esta insolente atitude contra Deus, são arrastados para longe e impelidos para o abismo, o grande número dos que, pondo num mesmo plano todas as formas de religião, pode-se dizer que já estão na iminência de abandonar a fé divina, o número notável dos que são cristãos só de nome, e não cumprem os deveres da sua fé.

E ainda mais nos aflige e nos atormenta o ânimo, o considerarmos que a causa principal de tais ruinosos e deploráveis males está na exclusão completa da Igreja das ordenações sociais, enquanto de propósito se hostiliza a sua salutar influência. E nisto é de reconhecer um grande e merecido castigo de Deus, o qual cega miseravelmente as nações que se afastam d’Ele.

A necessidade da oração

6. Este estado de coisas mostra, com evidência sempre maior, o quanto é necessário que os católicos orem e supliquem a Deus com fervor e perseverança "sem nunca cessar" (1Tim 5, 17), e não somente em particular, porém ainda mais em público. Reunidos nos sagrados templos, conjurem Deus a dignar-Se, na sua infinita bondade, livrar a sua Igreja "dos homens insolentes e malvados" (2 Tim 3, 2), e a reconduzir os povos ao caminho da salvação e da razão, na luz e no amor de Cristo.

7. Espectáculo incrível e maravilhoso! Enquanto o mundo percorre o seu caminho tormentoso, fiado nas suas riquezas, na sua força, nas suas armas e no seu engenho, a Igreja, com passo veloz e seguro, atravessa os séculos, depositando a sua confiança somente em Deus, a quem, de dia e de noite, ergue o olhar e estende as mãos súplices. Porque, embora na sua prudência não desdenhe os socorros humanos que, pela bondade divina, os tempos lhe oferecem, todavia não é nestes meios que deposita a sua principal esperança, mas sim na oração, colectiva e insistente, elevada ao seu Deus. Nesta fonte ela alimenta e fortifica a sua vida, porque, elevando-se, mediante a oração assídua, acima das vicissitudes humanas, e mantendo-se constantemente unida a Deus, é-lhe dado viver, plácida e tranquila, da própria vida de Cristo. E nisto é fiel imagem de Cristo, a quem o horror dos tormentos, sofridos pelo nosso bem, nada diminuiu nem tirou da beatíssima luz e da felicidade que lhe são próprias.

Exemplos de oração na Sagrada Escritura

8. Este grande ensinamento do cristianismo sempre foi escrupulosamente praticado pelos cristãos dignos deste nome. Quando à Igreja ou a quem lhe regia os supremos destinos estava iminente algum perigo, mercê da perfídia e da violência de homens perversos, então com maior insistência e frequência elevavam os cristãos as suas preces a Deus.

9. De tal costume achamos luminoso exemplo nos fiéis da Igreja nascente, exemplo digno de ser proposto à imitação de todos os pósteros. Pedro, Vigário de Cristo, Pontífice supremo de toda a Igreja, por ordem do ímpio Herodes fora lançado no cárcere, e destinado a morte certa. Ninguém estava em condições de lhe levar auxílio para o subtrair àquele perigo. Mas não faltava esse auxílio único que a oração devota sabe obter de Deus. Como nos testemunha a Sagrada Escritura, a Igreja elevava a Deus fervorosíssimas preces por ele: "Mas a Igreja fazia a Deus contínuas preces por ele" (At 12, 5). E tanto mais ardente se tornava o empenho da sua oração, quanto mais grave era a angústia que eles experimentavam por aquela desventura. Todos sabem que essas preces foram atendidas. Antes, todos os anos o povo cristão celebra sempre com agradecida alegria a lembrança da miraculosa libertação de S. Pedro.

10. Outro exemplo, ainda mais luminoso, antes divino, dá-no-lo o próprio Cristo, que se propusera encaminhar e formar na perfeição a sua Igreja não só com os novos preceitos, mas também com a sua vida. Durante e curso de toda a sua vida dedicara-Se mui frequente e longamente à oração.

Mas, nas suas horas supremas, quando, no horto de Getsémani, a sua alma foi invadida por uma angústia imensa e oprimida por uma tristeza mortal, Ele não somente orava, porém "orava mais intensamente" (Lc 22, 43). E Ele fez isto não para Si mesmo, pois, como Deus, nada podia temer e de nada precisava, mas fê-lo para nossa vantagem, e para vantagem da sua Igreja, cujas orações futuras e futuras lágrimas desde então Ele generosamente fazia suas, tornando fecundas umas e outras com a sua graça.

Maria mediadora de todas as graças

11. Mas, depois que, por virtude do mistério da Cruz, foi realizar a salvação do género humano, e depois que, com o triunfo de Cristo, a Igreja foi plenamente constituída dispensadora da sua salvação, desde então a Providência preparou e estabeleceu para este novo povo uma ordem nova.

12. As disposições da divina Sabedoria devem ser olhadas com profunda veneração. O Filho eterno de Deus, querendo assumir a natureza humana para redimi-la e nobilitá-la, e portanto para contrair um místico consórcio com o género humano, não deu cumprimento a este seu desígnio senão depois de obter o livre consentimento daquela que fora designada para sua Mãe, e que, em certo sentido, representava todo o género humano, segundo a célebre e veracíssima sentença do Aquinate: "Por meio da Anunciação aguardava-se o consentimento da Virgem, em nome e em representação de toda a natureza humana" (S. Tomás, 3, q. 30, a. 1).

Por consequência, pode com toda verdade e rigor afirmar-se que, por divina disposição, nada nos pode ser comunicado, do imenso tesouro da graça de Cristo - sabe-se que "a glória e a verdade vieram de Jesus Cristo" (Jo 1, 17), - senão por meio de Maria. De modo que, assim como ninguém pode chegar-se ao Pai Supremo senão por meio do Filho, assim também, ordinariamente, ninguém pode chegar-se a Cristo senão por meio de sua Mãe.

13. Quanta sabedoria e misericórdia resplandece nesta disposição da Divina Providência! Que compreensão da debilidade e fragilidade humana! De facto, nós cremos na infinita bondade de Cristo, e por ela lhe rendemos louvor, mas também cremos na sua infinita justiça, e desta temos temor. Sentimos uma profunda gratidão pelo amor do Salvador, que por nós deu generosamente o seu Sangue e a sua vida, mas, ao mesmo tempo, tememo-lo no seu carácter de juiz inexorável. Apreensivos pela consciência dos nossos pecados, precisamos, por isto, de um intercessor e de um patrono que, de um lado, goze em alto grau do favor divino, e, de outro, seja de ânimo tão benévolo que a ninguém recuse o seu patrocínio, nem mesmo os mais desesperados, e ao mesmo tempo infunda confiança na divina clemência àqueles que, abatidos, jazem no desconforto.

Mãe de Deus e Mãe dos homens

14. Pois bem: essa eminentíssima criatura é justamente Maria: certamente Ela é poderosa, porque é Mãe de Deus onipotente, porém - o que é mais consolador - é amorosa, de uma extrema benevolência, de uma indulgência sem limites. Tal no-la deu o próprio Deus, que, havendo-a escolhido para Mãe de seu Unigénito, lhe infundiu, por isso mesmo, sentimentos requintadamente maternos, capazes somente de bondade e de perdão. Tal no-la mostrou Jesus, quer quando consentiu em ser sujeito e obedecer a Maria, como um filho a sua mãe, quer quando, do alto da Cruz, confiou às suas amorosas solicitudes todo o género humano, na pessoa do discípulo João. Tal, enfim, se mostrou ela própria quando, acolhendo generosamente a pesada herança que lhe deixava seu Filho moribundo, desde aquele momento começou a cumprir, para com todos, os seus deveres de Mãe.

O recurso a Maria na tradição cristã

15. Este plano de terna misericórdia executado por Deus em Maria e ractificado por Cristo com a sua última vontade, foi desde o início compreendido com imensa alegria pelos santos Apóstolos e pelos primeiros fiéis, foi compreendido e ensinado pelos venerandos Padres da Igreja, foi concordemente compreendido, em todos os tempos, pelo povo cristão. E mesmo quando a tradição e a literatura se calassem, esta verdade seria igualmente atestada com grandíssima eloquência pela voz que irrompe do coração de cada cristão.

Sem uma fé divina não se explicaria o imperioso impulso que nos impele e docemente nos arrasta para Maria, o vivo desejo, ou, melhor, a necessidade que sentimos de procurar refúgio na protecção e no auxílio daquela a quem podemos confiar plenamente os nossos projectos e as nossas acções, a nossa inocência e o nosso pensamento, os nossos tormentos e as nossas alegrias, as nossas preces e os nossos votos, em suma todas as nossas coisas, a doce esperança e a confiança, por nós nutridas, de que aquilo que seria menos aceite por Deus, porque apresentado por nós, indignos pecadores, poderá tornar-se-lhe agradabilíssimo se o confiarmos a sua Mãe Santíssima.

Quanto mais a alma se alegra com a verdade e suavidade destes pensamentos, outro tanto se entristece por causa daqueles que, privados da fé divina, não honram Maria: antes, não a consideram nem mesmo como Mãe. E ainda mais se contrista o Nosso coração por causa daqueles que, embora participantes da santa fé, ousam acusar os bons de excessivo e exagerado culto para com Maria, ofendendo com isto grandemente a piedade filial.

16. Portanto, no meio da tempestade de males que tão duramente atormentam a Igreja, todos os devotos filhos desta mesma Igreja veem claramente que urgente dever têm de orar insistentemente a Deus onipotente, e, sobretudo, de que modo devem aplicar-se a isso para que as suas preces tenham máxima eficácia. Seguindo o exemplo de nossos piedosíssimos pais e antepassados, recorramos a Maria, nossa santa Rainha, e, concordemente, supliquemos a Maria, Mãe de Jesus Cristo e Mãe nossa: "Mostra-te nossa Mãe, e por meio de ti acolha nossas preces Aquele que, nascido para nós, quis ser teu Filho" (Da sagrada liturgia).

(cont)

(Revisão da versão portuguesa por ama)