Padroeiros do blog: SÃO PAULO; SÃO TOMÁS DE AQUINO; SÃO FILIPE DE NÉRI; SÃO JOSEMARIA ESCRIVÁ
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09/08/2014
Um grande Amor te espera no Céu
Cada vez estou mais persuadido: a
felicidade do Céu é para os que sabem ser felizes na terra. (Forja,
1005)
(Hoje, a Igreja celebra a Festividade
de S. Josemaria Escrivá)
Escrevias: "'simile est regnum
caelorum', o Reino dos Céus é semelhante a um tesouro... Esta passagem do Santo
Evangelho caiu na minha alma lançando raízes. Tinha-a lido tantas vezes, sem
captar o seu âmago, o seu sabor divino".
Tudo..., tudo há-de vender o homem
prudente, para conseguir o tesouro, a pérola preciosa da Glória! (Forja,
993)
Pensa quão grato é a Deus Nosso Senhor
o incenso que se queima em sua honra; pensa também no pouco que valem as coisas
da terra, que mal começam logo acabam...
Pelo contrário, um grande Amor te
espera no Céu: sem traições, sem enganos: todo o amor, toda a beleza, toda a
grandeza, toda a ciência...! E sem enfastiar: saciar-te-á sem saciar. (Forja,
995)
Não há melhor senhorio que saber-se ao
serviço: ao serviço voluntário de todas as almas!
É assim que se ganham as grandes
honras: as da terra e as do Céu. (Forja, 1045)
Temas para meditar 200
Espírito Santo - Frutos
Alegrar-se nas provações, sorrir no sofrimento..., cantar com o coração e com o melhor timbre quanto maiores e mais aguçados sejam os espinhos (...) e tudo isto por amor... isto é, junto do amor, o fruto que o Vinhateiro Divino quer recolher nos sarmentos da Vinha Mística, fruto que somente o Espírito Santo pode produzir em nós.
(a. riaud La acción del Espiritu Santo en las almas Palabra 4ª Ed. Madrid 1985 nr. 120 trad. ama)
Tratado da lei 79
Em seguida devemos tratar da lei do
Evangelho, chamada lei nova. E primeiro, em si mesmo considerada. Segundo,
comparada com a lei antiga. Terceiro, do que a lei nova contém.
Na primeira questão discutem-se quatro
artigos:
Art. 1 — Se a lei nova é uma lei
escrita.
Art. 2. — Se a lei nova justifica.
Art. 3 — Se a lei nova devia ter sido
dada desde o princípio do mundo.
Art. 4 — Se a lei nova há-de durar até
o fim do mundo.
Art.
1 — Se a lei nova é uma lei escrita.
[Art.
Seq., q. 107, a. 1, ad 2, 3, q. 108, a. 1. II Cor., cap. III, lect, II, Ad
Hebr., cap. VIII, lect. II].
O primeiro discute-se assim. — Parece
que a lei nova é uma lei escrita.
1. — Pois, a lei nova é o Evangelho
mesmo. Ora, este é escrito (Jo 20, 31): Mas,
foram escritas estas coisas, a fim de que vós creiais. Logo, a lei nova é uma
lei escrita.
2. Demais. — A lei infusa é a da
natureza, conforme a Escritura (Rm 2, 14-15): Naturalmente fazem as coisas que
são da lei os que mostram a obra da lei escrita nos seus corações. Se pois a
lei do Evangelho fosse infusa, não diferiria da lei natural.
3. Demais. — A lei do Evangelho é
própria dos que vivem no regime do Novo Testamento. Ora, a lei infusa é comum
tanto a esses como aos que viveram no regime do Velho Testamento. Pois, diz a
Escritura (Sb 7, 27), que a divina Sabedoria, pelas nações, se transfunde nas
almas santas, forma os amigos de Deus e os profetas. Logo, a lei nova não é uma
lei infusa.
Mas, em contrário, a lei nova é a lei
do Novo Testamento. Ora, esta é infusa no coração. Pois, o Apóstolo, citando a
autoridade da Escritura (Jr 31, 31-33) — Eis
aí virão os dias, diz o Senhor, e farei nova aliança com a casa de Israel e com
a casa de Judá — e expondo qual seja essa aliança, diz (Heb 8, 8-10): Porque este é o testamento que ordenarei à
casa de Israel, imprimindo as minhas leis na mente deles, e as escreverei sobre
o seu coração. Logo, a lei nova é infusa.
Todo o ser é considerado
como sendo o que nele é principal, consoante o Filósofo. Ora, o que há de
principal na lei do Novo Testamento, e no que consiste toda a sua virtude, é a
graça do Espírito Santo, dada pela fé em Cristo. Donde, a lei nova é
principalmente a graça mesma do Espírito Santo, dada aos fiéis de Cristo. E
isto torna-se manifesto pelas palavras do Apóstolo (Rm 3, 27): Onde está o motivo de te gloriares? Todo ele
foi excluído. Por que lei? Pela das obras? Não, mas pela lei da fé — chamando,
assim, lei à graça mesma da fé. E mais expressamente (Rm 8, 2): A lei do espírito de vida em Jesus Cristo me
livrou da lei do pecado e da morte. Por isso diz Agostinho, que, assim como
a lei das ações foi escrita em tábuas de pedra, assim, a lei da fé o foi nos corações
dos fiéis. E noutro lugar do mesmo livro: Que
são as leis de Deus por Ele próprio escritas nos corações, senão a presença
mesma do Espírito Santo?
Contudo, a lei nova encerra certos
preceitos como que secundários disponentes à graça do Espírito Santo e ao uso
dessa graça. E sobre eles era necessário que os fiéis de Cristo fossem
instruídos por palavras e escrituras, tanto em relação ao que devem crer como
ao que devem agir.
Donde, devemos dizer, que a lei nova é
principalmente uma lei infusa, e, secundariamente, uma lei escrita.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— O escrito nos Evangelhos não contém senão o que diz respeito à graça do
Espírito Santo, quer dispondo, quer ordenando para o uso dessa graça. Dispondo
o intelecto pela fé, pela qual se obtém a graça do Espírito Santo, o Evangelho
encerra o concernente à manifestação da divindade ou da humanidade de Cristo.
Quanto ao afecto, ele contém a atinente ao desprezo do mundo, que torna o homem
capaz da graça do Espírito Santo, pois, o mundo, i. é, os amantes do mundo, não
pode receber o Espírito Santo, como diz a Escritura (Jo 14, 17). Quanto ao uso
da graça espiritual, ele consiste nos actos virtuosos, aos quais frequentemente
o escrito do Novo Testamento exorta os homens.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Pode haver algo
de infuso no homem de dois modos. — Primeiro, como fazendo parte da natureza
humana. E nesse sentido a lei natural é nela infusa. — De outro modo, como lhe
sendo acrescentado à natureza pelo dom da graça. E deste modo a lei nova é infusa
no homem, e indica não só o que ele deve fazer, mas também o ajuda a cumprir a
lei.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Ninguém nunca
teve a graça do Espírito Santo, senão por fé explícita ou implícita em Cristo.
Ora, pela fé em Cristo o homem pertence ao Novo Testamento. Donde, aqueles a
quem foi infundida a lei da graça pertenciam ao Novo Testamento.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
Evang.; Coment.; Leit. Esp. (Magistério - Ratzinguer)
Evangelho: Mt 25, 1-13
1 «Então, o Reino dos Céus será semelhante a dez virgens, que, tomando
as suas lâmpadas, saíram ao encontro do esposo. 2 Cinco delas eram
néscias, e cinco prudentes. 3 As cinco néscias, tomando as lâmpadas,
não levaram azeite consigo; 4 as prudentes, porém, levaram azeite
nas vasilhas juntamente com as lâmpadas. 5 Tardando o esposo,
começaram todas a cabecear e adormeceram. 6 À meia-noite, ouviu-se
um grito: “Eis que vem o esposo! Saí ao seu encontro”. 7 Então
levantaram-se todas aquelas virgens, e prepararam as suas lâmpadas. 8
As néscias disseram às prudentes: “Dai-nos do vosso azeite, porque as nossas
lâmpadas apagam-se”. 9 As prudentes responderam: “Para que não suceda
que nos falte a nós e a vós, ide antes aos vendedores, e comprai para vós”. 10
Mas, enquanto elas foram comprá-lo, chegou o esposo, e as que estavam
preparadas entraram com ele a celebrar as bodas, e foi fechada a porta. 11
Mais tarde, chegaram também as outras virgens, dizendo: “Senhor, Senhor,
abre-nos”. 12 Ele, porém, respondeu: “Em verdade vos digo que não
vos conheço”. 13 Vigiai, pois, porque não sabeis nem o dia nem a
hora.
Comentário:
Algumas traduções
chamam “néscias” às virgens “imprudentes”. Ser néscio é ser pouco atilado,
prudente ou coerente.
Alguém que não leva
as coisas muito a sério, que está disposto a “esperar para ver o que acontece”,
não se preocupar ou não dar importância a algo que a deve ter.
Neste caso, parece
evidente, que aquelas virgens a que o Senhor se refere na Sua parábola, são
retrato, a imagem destas pessoas que vão pela vida como se não tivessem
qualquer responsabilidade ou dever e, pior, que não lhes venham a ser pedidas
contas do que deveriam ter feito e não fizeram.
Preparar-se é sinal
de prudente coerência de quem se diz empenhado na sua salvação, o maior bem a
que pode aspirar.
(ama, comentário sobre Mt 25, 1-13, 2013.08.09)
Leitura espiritual
Magistério
cardeal joseph ratzinger
Algumas perguntas pessoais
Um auto-retrato.
Poderia descrever-se a si
mesmo?
É
impossível fazer um auto-retrato; é difícil julgar-se a si mesmo. Posso apenas
dizer que venho de uma família muito simples, muito humilde, e por isso, mais
do que um cardeal, sinto-me um homem simples.
Tenho
a minha casa na Alemanha, numa cidade pequena, cujos habitantes trabalham na agricultura,
em ofícios manuais, e ali sinto-me no meu ambiente. Também procuro ser assim no
meu trabalho: não sei se o consigo, não me atrevo a julgar-me.
Recordo
sempre com grande carinho a profunda bondade do meu pai e da minha mãe; naturalmente,
para mim, bondade inclui a capacidade de dizer "não", pois uma
bondade que deixasse o outro fazer qualquer coisa não lhe faria bem. Algumas
vezes, bondade significa ter que dizer "não" e correr assim o risco
de que nos contradigam.
Esses
são os meus critérios, essa é a minha origem; quanto ao resto, deveriam ser os outros
a julgar [i].
Homem de consciência.
Seu irmão fez a seguinte
caracterização da sua pessoa:
"Custa-lhe ter de
agir com força, mas, quando precisa combater, actua segundo a sua
consciência". O senhor é um homem de consciência?
Procuro
sê-lo. Não ouso dizer que o seja. Mas parece-me bastante importante não colocar
a aprovação ou o ambiente simpático do meio a que se pertence acima da verdade,
embora isto seja sempre uma grande tentação. É claro que o apelo à consciência
pode transformar-se na mania de ter sempre razão, de modo que uma pessoa pense
que tem de se opor a tudo. Mas, entendido num sentido correto, o homem que ouve
a sua consciência, e para quem aquilo que se conhece - o bem - está acima da aprovação
e da aceitação dos outros, é para mim, de facto, um ideal e uma tarefa. E figuras
como Thomas More, o Cardeal Newman e outras grandes testemunhas – entre elas,
os que foram implacavelmente perseguidos pelo regime nazi, como por exemplo Dietrich
Bonhoeffer [ii]
são, para mim, grandes modelos [iii].
Medo de Deus? Eminência,
às vezes o senhor também sente medo de Deus?
Não
falaria de medo. Graças a Cristo, sabemos como Deus é, sabemos que nos ama
[...]. No entanto, sempre experimento a consciência fulminante de não estar à
altura da ideia que Deus faz de mim [iv].
O
primado da verdade na vida. Ao longo do meu caminho espiritual, senti muito intensamente
o problema de saber se, no fundo, não é presunção dizer que podemos conhecer a
verdade, em virtude de todas as nossas limitações. Também me interroguei até
que ponto não seria talvez melhor pôr essa categoria em segundo plano. Ao aprofundar
essa questão, pude observar, e também compreender, que a renúncia à verdade não
resolve nada: pelo contrário, conduz à ditadura da arbitrariedade. Tudo o que
resta só pode então ser decidido por nós e é substituível. O homem perde a dignidade
quando não é capaz de conhecer a verdade, quando tudo não passa de produto de
uma decisão individual ou colectiva.
Assim,
vi como é importante que não se perca o conceito de verdade, mas permaneça como
categoria central, não obstante as ameaças e os riscos que sem dúvida envolve.
Como
exigência que nos é feita, não nos dá direitos, mas, pelo contrário, requer a
nossa humildade e a nossa obediência, como também nos pode pôr no caminho
daquilo que é comum a todos os homens. A partir de um longo confronto com a
situação espiritual em que nos encontramos, este primado da verdade foi
lentamente tornando-se visível para mim; como disse, não pode ser simplesmente
entendido de forma abstracta, mas precisa estar envolvido em sabedoria [v].
Verdade e bondade.
Certa vez, o senhor
afirmou que um homem deveria acentuar o primado da verdade sobre a bondade.
Julgo que é uma atitude que pode ser perigosa. Isso não corresponderia à imagem
do Grande Inquisidor, tal como Dostoievski a descreveu?
É
preciso interpretar todo o contexto. Nessa frase, a bondade é entendida no
sentido de uma falsa bondade, do tipo "não pretendo aborrecer-me". É
uma atitude muito comum, que se verifica também, e sobretudo, no campo da
política: não se quer ser impopular.
Em
vez de ter aborrecimentos e de os criar, prefere-se contemporizar, mesmo com o
que é errado, com o que não é puro, nem verdadeiro, nem bom. Está-se disposto a
comprar bem-estar, sucesso, reconhecimento público e aceitação por parte da
opinião dominante, à custa da renúncia à verdade. Não quis atacar a bondade em geral.
A verdade só pode ter sucesso e vencer com a bondade. Referia-me a uma
caricatura da bondade que é bastante comum: que se negligencie a consciência
com o pretexto da bondade, que se coloque acima da verdade a aceitação e a
preocupação de evitar problemas, o comodismo, o ser bem-visto [vi].
Autoridade em matéria de
fé.
Como é possível, hoje em
dia, ter autoridade em questões de fé?
Certamente
é uma tarefa difícil, em parte porque já não existe o conceito de autoridade.
O
facto de haver uma autoridade que decida coisas parece hoje incompatível com a liberdade
para fazer o que se quiser. É difícil também porque muitas tendências gerais da
nossa época se opõem à fé católica. Busca-se uma visão do mundo simplificada:
Cristo
não poderia ser o Filho de Deus, mas um mito ou uma grande personalidade humana,
pois Deus não poderia ter aceito o sacrifício de Cristo, Deus não seria um Deus
cruel... Em última análise, há muitas ideias que se opõem ao cristianismo, e
seria necessário reformular muitas verdades de fé para que se adequassem ao
homem de hoje.
Mas
tenho de dizer que muitas pessoas também agradecem que a Igreja continue a ser uma
força que transmite a fé católica e ofereça um fundamento sobre o qual se pode viver
e morrer. E isso é consolador para mim [vii].
Posição incómoda.
Eminência, [...] o senhor
escreveu um livro chamado Deus e o mundo, no qual disse que a sua posição como
Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé era a posição mais incómoda que
já tinha ocupado. (O cardeal Ratzinger ri tranquilamente) O que quis dizer com isso?
Sim,
é uma posição incómoda de muitas maneiras. Sobretudo porque, com frequência, somos
obrigados a enfrentar todos os problemas da Igreja: relativismo, heresias, teologias
inaceitáveis, teólogos complicados e o resto, juntamente com os casos disciplinares;
o problema dos pedófilos, por exemplo, também é problema nosso. Nesta
Congregação,
temos de lutar com os aspectos mais complicados da vida da Igreja hoje.
Além
disso, somos atacados como "a Inquisição"; o senhor deve sabê-lo
melhor do que eu...
Isso
por um lado. Mas, por outro, comprovo todos os dias que as pessoas estão agradecidas
quando dizem: "Sim, a Igreja tem uma identidade, uma continuidade; a fé é real
e está presente também hoje, e é possível professá-la..." E o mesmo quando
vou à Praça de São Pedro e vejo tantas pessoas de lugares tão variados do mundo
que me dizem: "Obrigado, padre. Estamos agradecidos pelo difícil trabalho
que faz, porque nos ajuda". Muitos amigos protestantes chegam também a dizer-me:
"O que o senhor vem fazendo é útil para nós porque também defende a nossa
fé e a validade da fé em Cristo.
Precisamos
de uma instância como a sua, mesmo quando não compartilhamos o que diz.
E
é útil também para ver que temos de prosseguir na contínua defesa da fé; o
senhor alenta-nos a perseverar na fé, a continuar a vivê-la". E nos
últimos dias, aproximou-se de mim uma delegação de ortodoxos que me disseram o
mesmo. Portanto, o nosso trabalho tem uma dimensão ecuménica que, com
frequência, não é apreciada. [viii]
Deus
O Deus escondido. Onde
está Deus, onde pode ser encontrado? Está escondido?
Parece
que se revela muito raramente. As pessoas desesperam-se porque pensam que Ele
não fala com elas, não dá sinais, não interfere na sua vida.
Ele
manifesta-se, mas não de forma ruidosa, não necessariamente sob a forma de uma catástrofe
natural, embora as catástrofes naturais também possam ser manifestações suas.
Não o faz, pois, de forma ruidosa, mas sempre se está manifestando. É claro que
o receptor tem de estar, por assim dizer, sintonizado para captar o emissor.
Na
nossa maneira de viver e de pensar, há tantas interferências perturbadoras que
não somos capazes de captar o som, que também se tornou tão estranho para nós
que não o reconhecemos como vindo dEle. Mas eu diria que qualquer pessoa que
esteja atenta pode fazer essa experiência e perceber: neste momento, Ele
dirige-se a mim; é uma oportunidade que me é dada para conhecê-lo. [...] Ele
pode manifestar-se se eu estiver vigilante, e também se houver alguém que me
ajude a decifrar a realidade. É claro que Ele não fala de forma ruidosa, mas
sim através de sinais e dos acontecimentos da vida, e através das outras
pessoas. É necessário, pois, ter uma certa vigilância, e perseverança para não
ser dominado pelas coisas que ocupam o primeiro plano [ix].
O Deus marginalizado.
Onde está Deus na
sociedade contemporânea?
Está
muito marginalizado. Na vida política, parece quase indecente falar de Deus,
como se fosse um ataque à liberdade de quem não crê. O mundo político segue as
suas normas e os seus caminhos, excluindo Deus como uma realidade que não
pertence a esta terra.
O
mesmo acontece no mundo do comércio, da economia e da vida privada. Deus fica à
margem. No entanto, parece-me necessário voltar a descobrir [...] que também a
esfera política e económica têm necessidade de uma responsabilidade moral, de
uma responsabilidade que nasce do coração do homem e que, em última análise,
tem a ver com a presença ou a ausência de Deus. Uma sociedade em que Deus
esteja absolutamente ausente autodestrói-se [x].
Existência de Deus e
existência humana.
Li
recentemente as afirmações de um intelectual alemão que, em relação à
"questão de Deus", se dizia agnóstico e, ao mesmo tempo, acrescentava
que não se poderia nem provar nem excluir totalmente a existência de Deus, de
modo que esse problema permaneceria sempre em aberto. No entanto, declarava-se
firmemente convencido da existência do inferno: bastava-lhe ligar a televisão
para comprová-lo sem sombra de dúvida.
Se
a primeira parte dessa afirmação corresponde plenamente ao sentir moderno, a segunda
parece extravagante, ao menos à primeira vista. Como é possível crer no inferno
se Deus não existe? Mas, se considerarmos essas palavras com um pouco mais de
atenção, veremos que encarnam uma certa lógica. O inferno é, por definição,
viver na ausência de Deus. Onde Deus não está, ali está o inferno. Certamente,
não é tanto o espetáculo diário da televisão que nos fornece a prova, quanto um
olhar sobre o século que terminou e que nos deixou palavras como
"Auschwitz" ou "Arquipélago Gulag", e nomes como Hitler,
Stalin, Pol Pot. Esses infernos foram construídos para preparar um mundo futuro
de homens auto-suficientes que não teriam nenhuma necessidade de Deus.
Mas
onde Deus não está, surge o inferno, e o inferno persiste, muito simplesmente,
pela ausência de Deus. Pode-se chegar a esse extremo também de maneiras subtis,
que quase sempre afirmam que o que se busca é o bem dos homens. Hoje, quando se
comercializam órgãos humanos, quando se fabricam fetos para dispor de órgãos de
reposição ou para promover o avanço da ciência e da prevenção médicas, muitos consideram
implícito o caráter humanitário dessas práticas. Mas o desprezo pelo homem que
esse usar e abusar do ser humano pressupõe, conduz, quer se queira quer não, à
descida aos infernos.
Isto
não significa que não possa haver ou não haja ateus com um grande senso ético.
Seja
como for, atrevo-me a afirmar que essa ética se baseia na luz que emanou um dia
do Monte Sinai e que continua a brilhar até hoje: a luz de Deus. Nietzsche
tinha razão ao sublinhar que, quando a notícia da morte de Deus se tornasse
conhecida por todo o mundo, quando a sua luz se tivesse apagado
definitivamente, esse momento seria necessariamente terrível.
O
cristianismo não é uma filosofia complicada e envelhecida com o passar do
tempo, não é uma imensa coleção de dogmas e preceitos: a fé cristã consiste em
sermos tocados por Deus e sermos as suas testemunhas.
Precisamente
por isso podemos dizer: a Igreja existe para que Deus, o Deus vivente, seja
anunciado, para que o homem possa aprender a viver com Deus, sob o seu olhar e em
comunicação com Ele. A Igreja existe para evitar o avanço do inferno sobre a
terra e para fazer com que esta se torne mais habitável à luz de Deus.. Graças
a Ela, e somente graças a Ela, a terra será humana. Nem que seja apenas por
este motivo, a Igreja deve continuar a existir, porque a sua eventual
desaparição arrastaria a humanidade para o torvelinho das trevas, da escuridão,
até à destruição de tudo o que torna humano o homem. [...] Sem Deus, o mundo
não consegue iluminar-se. A Igreja serve ao mundo fazendo com que Deus viva
nela, permitindo que Ele transpareça nEla, e estando pronta assim para levá-lo
à humanidade [xi].
Encontro pessoal com Deus.
O
cristianismo apresenta-se hoje como uma antiga tradição carregada de antigos
mandamentos, algo que já conhecemos e que não nos diz nada de novo, uma
instituição forte, uma das grandes instituições que pesam sobre os nossos
ombros. [...] Mas se pararmos nesta impressão, não viveremos o núcleo do cristianismo,
que é um encontro sempre novo, um acontecimento graças ao qual podemos encontrar
o Deus que fala connosco, que se aproxima de nós, que se faz nosso amigo. [...]
É decisivo chegar a este ponto fundamental de um encontro pessoal com Deus, que
também hoje se faz presente e que é nosso contemporâneo. [...] Se encontrarmos
este centro essencial, compreenderemos também o restante; mas se este acontecimento
que toca o coração não se realizar, tudo o mais passará a ser como que um peso,
quase que algo absurdo [xii].
(cont.)
(Revisão da versão portuguesa por ama)
[i] Entrevista à Radio Vaticano, 23.11.2001
[ii]
Dietrich Bonhoeffer (1906-1945), teólogo e pastor luterano alemão que se opôs à
ditadura nazi; foi condenado à morte e enforcado (N. do T.).
[iii] O
sal da terra, págs. 55-56.
[iv]
Dios y el mundo, repr. em Avvenire, 27.09.2001
[v] O
sal da terra, pág. 55
[vi]
Ibid., pág. 56
[vii]
Entrevista à Radio Vaticana
[viii] A
crise da Igreja: uma fé fraca, entrevista a Raymond Arroyo, canal de televisão
EWTN, Irondale (Alabama), 23.08.2003; repr. por Zenit, 24.08.2003
[ix] O
sal da terra, pág. 26
[x] El
laicismo está poniendo en peligro la libertad religiosa, entrevista a La
Reppublica, repr. por Zenit, 19.11.2004
[xi] 1Testigos
de Ia luz de Dios, em La Razôn, 23.04.2001
[xii] Por
qué el cristianismo no es visto como fuente de alegria, declarações ao
semanário Vita Trentina, Zenit, 07.05.2004