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27/07/2014

Agora é Cristo quem vive em ti!

Os teus parentes, os teus colegas, os teus amigos, vão notando a diferença, e reparam que a tua mudança não é uma mudança passageira; que já não és o mesmo. Não te preocupes. Para a frente! Cumpre o "vivit vero in me Christus" – agora é Cristo quem vive em ti! (Sulco, 424)

Qui habitat in adiutorio Altissimi in protectione Dei coelí commorabitur – Habitar sob a protecção de Deus, viver com Deus: eis a arriscada segurança do cristão. É necessário convencermo-nos de que Deus nos ouve, de que está sempre solícito por nós, e assim se encherá de paz o nosso coração. Mas viver com Deus é indubitavelmente correr um risco, porque o Senhor não Se contenta compartilhando; quer tudo. E aproximar-se d'Ele um pouco mais significa estar disposto a uma nova rectificação, a escutar mais atentamente as suas inspirações, os santos desejos que faz brotar na nossa alma, e a pô-los em prática.


Desde a nossa primeira decisão consciente de viver integralmente a doutrina de Cristo, é certo que avançámos muito pelo caminho da fidelidade à sua Palavra. Mas não é verdade que restam ainda tantas coisas por fazer? Não é verdade que resta, sobretudo, tanta soberba? (Cristo que passa, 58)

Pequena agenda do cristão

DOMINGO



(Coisas muito simples, curtas, objectivas)





Propósito:
Viver a família.

Senhor, que a minha família seja um espelho da Tua Família em Nazareth, que cada um, absolutamente, contribua para a união de todos pondo de lado diferenças, azedumes, queixas que afastam e escurecem o ambiente. Que os lares de cada um sejam luminosos e alegres.

Lembrar-me:
Cultivar a Fé.

São Tomé, prostrado a Teus pés, disse-te: Meu Senhor e meu Deus!
Não tenho pena nem inveja de não ter estado presente. Tu mesmo disseste: Bem-aventurados os que crêem sem terem visto.
E eu creio, Senhor.
Creio firmemente que Tu és o Cristo Redentor que me salvou para a vida eterna, o meu Deus e Senhor a quem quero amar com todas as minhas forças e, a quem ofereço a minha vida. Sou bem pouca coisa, não sei sequer para que me queres mas, se me crias-te é porque tens planos para mim. Quero cumpri-los com todo o meu coração.

Pequeno exame:
Cumpri o propósito que me propus ontem?



Temas para meditar - 187



Perdão


Nada nos assemelha tanto a Deus como o estar sempre dispostos para o perdão.




(s. joão crisóstomoHomilias sobre S. Mateus, 19, 7)

Tratado da lei 66

Questão 102: Das causas dos preceitos cerimoniais.

Art. 6 — Se as observâncias cerimoniais tinham causa racional.

(IIª-IIªª, q. 86., a. 3, ad 1, 2, 3; Ad Rom., cap. XIV, lect. I, III; I Tim., cap. IV, lect. I; Ad Tit., cap. I, lect. IV).

O sexto discute-se assim. — Parece que as observâncias cerimoniais não tinham nenhuma causa racional.

1. — Pois, como diz o Apóstolo (1 Tm 4, 4) toda criatura de Deus é boa e não é para desprezar nada do que se participa com acção de graças. Logo, proibia-se inconvenientemente o uso de alguns alimentos, por imundos (Lv 11).

2. Demais. — Como os animais eram dados em alimento ao homem, assim também as ervas; donde o dizer a Escritura (Gn 9, 3): eu vos entreguei toda carne, como as viçosas hortaliças. Ora, a lei não distinguia ervas imundas, apesar de algumas delas serem venenosas e muito nocivas. Logo, também não devia proibir certos animais, por imundos.

3. Demais. — Se a matéria de que alguma coisa provém é imunda, pela mesma razão há-de sê-lo o gerado dela. Ora, a carne é gerada do sangue. E como nem todas as carnes eram proibidas, como imundas, pela mesma razão não devia sê-lo, como tal, o sangue, nem a gordura gerada dele.

4. Demais. — O Senhor diz (Mt 10, 28), que não são para temer os que matam o corpo, porque depois dessa morte, nada mais podem fazer. Ora, tal não seria verdade se se convertesse em mal do homem o que se lhe viesse a fazer ao cadáver. Logo, com maior razão, não importava o modo por que se viessem a cozer as carnes do animal já morto. E portanto, parece irracional o que diz a Escritura (Ex 23, 19): Não cozerás o cabrito no leite da sua mãe.

5. Demais. — Era de preceito oferecer ao Senhor, por mais perfeitas, as primícias dos homens e dos animais. Logo, era inconveniente o seguinte preceito (Lv 19, 23): Quando entrares na terra e plantares nela árvores frutíferas, cortar-lhes-ei os seus prepúcios, i. é, os primeiros gérmenes, e serão imundos para vós e não comereis deles.

6. Demais. — As vestes são exteriores ao corpo do homem. Logo, não se deviam proibir aos judeus certas vestes especiais, p. ex., como as referidas nos lugares da Escritura (Lv 19, 19): Não usarás de vestido que seja tecido de fios diferentes; (Dt 22, 5) a mulher não se vestirá de homem, nem o homem se vestirá de mulher; e ainda (Dt 22, 11): Não te vestirás de coisa que seja tecida de lã e de linho.

7. Demais. — A memória dos mandamentos de Deus não respeita ao corpo, mas ao coração. Logo, era inconveniente a Escritura ordenar (Dt 6, 8 ss), que os preceitos de Deus ligavam como um sinal na sua mão; e que se deviam escrever no limiar das portas; e que fizessem umas guarnições nos remates das capas, pondo nelas fitas de cor de jacinto, para que se recordem dos mandamentos do Senhor.

8. Demais. — O Apóstolo diz (1 Cor 9, 9), que Deus não tem cuidado dos bois; e, por consequência, nem dos outros animais irracionais. Logo, eram inconvenientes os preceitos (Dt 22, 6): Se, indo por um caminho, achares o ninho duma ave, não apanharás a mãe com os filhinhos; e (Dt 25, 4): Não atarás a boca ao boi que trilha na eira; e (Lv 19, 19): Não lançarás a tua besta a ter cópula com animais doutra espécie.

9. Demais. — Não se fazia nenhuma separação entre plantas mundas e imundas. Logo, com maior razão, não se devia fazer qualquer distinção relativamente à sua cultura. Portanto eram inconvenientes os preceitos (Lv 19, 19): Não semearás o teu campo com diversa semente; e (Dt 22, 9 ss): Não semearás a tua vinha de outra semente; e: Não lavrarás juntamente com boi e asno.

10. Demais. — Os seres inanimados, sobretudo, estão sujeitos ao poder do homem. Logo, era inconveniente o preceito da lei, que privava o homem do uso da prata e do ouro, de que se fabricavam os ídolos, e do mais que se encontrava no templo destes. E também era ridículo o outro preceito, que se lê (Dt 7, 25): tendo satisfeito à tua necessidade, cavarás ao redor e cobrirás com a terra que tiraste.

11. Demais. — Sobretudo dos sacerdotes se exige a piedade. Ora, esta manda que assistamos aos funerais dos amigos; e por isso Tobias foi louvado (Tb 1, 20 ss). Também algumas vezes, por piedade, pode alguém receber uma meretriz como esposa, pela livrar assim do pecado e da infâmia. Logo, tais coisas se proibiam inconvenientemente aos sacerdotes (Lv 21).

Mas, em contrário, diz a Escritura (Dt 18, 14): tu, porém, foste instruído de outra sorte pelo Senhor teu Deus. Donde se pode coligir, que as observâncias de que se trata foram instituídas por Deus por uma certa prerrogativa especial do povo judeu. Logo, não eram irracionais ou sem causa.

O povo judeu, como já dissemos (a. 5), foi especialmente destinado ao culto divino; e dele, em especial, os sacerdotes. E assim como as coisas aplicadas a esse culto deviam ter algo de particular, exigido pela honorificência do mesmo; assim, o género de vida do povo judeu e, sobretudo, dos sacerdotes, devia especialmente ter uma certa congruência, espiritual ou corporal com tal culto. Ora, o culto da lei figura o mistério de Cristo. Por isso, todas as suas observâncias figuram o concernente a Cristo, conforme a Escritura (1 Cor 10, 11): Todas estas coisas lhes aconteciam a eles em figura. Por isso, podem assinalar-se duas razões a essas observâncias: a congruência com o culto divino, e o figurarem o que respeita à vida dos Cristãos.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Como já dissemos (a. 5 ad 4, 5), a lei estabelecia dupla corrupção ou imundície. Uma, da culpa, que mancha a alma; a outra, a de qualquer corrupção que de certo modo contamina o corpo. — Quanto, pois, à primeira imundície, não havia nenhum género de comida por natureza imundo ou susceptível de contaminar o homem; donde o dizer a Escritura (Mt 15, 11): Não é o que entra pela boca o que faz imundo o homem; mas o que sai da boca, isso é o que faz imundo o homem; o que é aplicado aos pecados. Contudo algumas comidas podiam acidentalmente manchar a alma, por serem tomadas contra a obediência, o voto, ou por nímia concupiscência; ou enquanto constituíam fomento à luxúria, razão pela qual alguns se abstinham do vinho e da carne.

Quanto à imundície corpórea, a proveniente de alguma corrupção, certas carnes dos animais tinham-na. Ou porque estes se nutrem de coisas imundas, como o porco. Ou vivem imundamente, como alguns, que habitam debaixo da terra, p. ex., as toupeiras, os ratos e semelhantes, que contraem também por isso mau cheiro. Ou porque a carne deles, por causa da demasiada umidade ou secura, geram humores corruptos no corpo humano. Por isso, eram proibidas aos judeus as carnes dos animais que têm sola, i. é, unha inteira, não fendida por causa da sua tenra idade. Semelhantemente, era-lhes proibida a carne dos animais que têm muitas fendas nos pés, como a do leão e outros semelhantes porque são muito coléricos e ardentes. Pela mesma razão, certas aves de rapina, demasiado secas; e certas aves aquáticas, pelo excesso de umidade. Também certos peixes sem barbatanas e escamas, como as enguias e outros, por causa do excesso de umidade. Era-lhes permitido comer os animais ruminantes, de unha fendida, porque tem humores bem digeridos e de compleição média; e porque nem são demasiado úmidos, como as unhas o significam; nem demasiado terrenos, por não terem a unha inteira, mas fendida. Dos peixes eram-lhes permitidos os mais secos, como o davam a entender as escamas e as barbatanas, que tornam temperada a sua compleição húmida. Das aves, as melhor constituídas, como a galinha, a perdiz e outras. — A outra razão era fazer detestar a idolatria. Pois, os gentios e principalmente os egípcios, entre os quais os judeus viviam, imolavam aos ídolos esses animais proibidos ou empregavam-nos para feitiçarias. Ao passo que não comiam aqueles que era permitido aos judeus comerem; mas os adoravam como deuses. Ou por alguma outra causa se abstinham deles, como já dissemos (a. 3, ad 2). — A terceira razão era para impedir a diligência demasiada em relação à comida. Donde, concediam-lhes os animais susceptíveis de serem conseguidos fácil e prontamente.

Contudo geralmente era-lhes proibido comerem o sangue e a gordura de qualquer animal. — O sangue, quer para evitarem a crueldade e detestarem derramar sangue humano, como já dissemos (a. 3, ad 8). Quer também para fazer evitar o rito da idolatria; porque era costume dos idólatras reunirem-se ao redor do sangue recolhido, para comerem em honra dos ídolos, a quem o consideravam muitíssimo agradável. Por isso o Senhor mandou, que o sangue fosse derramado e coberto com terra. E também lhes era proibido comer animais sufocados ou estrangulados, porque o sangue deles não se separa da carne; ou porque tais géneros de morte fazem os animais sofrer muito, e o Senhor queria afastá-los da crueldade, mesmo para com os brutos, para que, habituando-se a tratá-los, mesmo a estes, com comiseração, mais se afastassem da crueldade para com os homens. — Também lhes era proibida a gordura, quer porque os idólatras a comiam em honra dos seus deuses; quer também porque era queimada em honra de Deus; quer enfim porque o sangue e a gordura não fazem boa nutrição, causa essa dada pelo Rabbi Moisés. A causa de ser proibido comer os nervos está na Escritura (Gn 32, 32): os filhos de Israel não comem nervo, porque o anjo tocou o nervo da coxa de Jacó, e ficou entorpecido.

A razão figurada dessas observâncias é que todos esses animais eram proibidos por serem figuras de certos pecados. Donde o dizer Agostinho: A quem indagar se o porco e o cordeiro são limpos por natureza, por ser boa toda criatura de Deus, respondemos que, em certo sentido, o cordeiro é limpo e o porco é imundo. Mas, perguntar isto seria o mesmo que perguntar, considerando a natureza da expressão, e as letras e sílabas, de que constam, se as palavras — estulto e sábio — são puras. Pois, uma é pura e a outra, imunda. Assim, o animal ruminante e de casco fendido era puro por significação. Porque a fenda das unhas significa a distinção entre os dois Testamentos; ou a do Padre e do Filho; ou a das duas naturezas de Cristo; ou a separação entre o bem e o mal. A ruminação significa a meditação das Escrituras e a sã inteligência das mesmas. Ora, quem não é capaz de compreender alguma destas coisas é imundo.

Semelhantemente, os peixes, que têm escamas e barbatanas eram puros, por significação. Pois, as barbatanas significam a vida sublime ou a contemplação; e as escamas, a vida áspera. Sendo ambas elas necessárias à pureza espiritual.

Das aves eram proibidos certos géneros especiais. Na águia, de voo alto, proíbe-se a soberba. No grifo, nocivo aos cavalos e aos homens, a crueldade dos poderosos. O halieto, que se nutre de pequenas aves, significa os molestos aos pobres. O milhano, muito dado a preparar insídias, os fraudulentos. O abutre, que acompanha os exércitos, com o fito de comer os cadáveres dos mortos — os que provocam mortes e sedições entre os homens, para daí tirarem lucro. Os animais do género dos corvos significam os difamados pelos prazeres; ou os desprovidos de bons afectos, pois o corvo, uma vez mandado fora da arca, não voltou. O avestruz, apesar de ave, incapaz de voar e sempre apegado à terra, os que militando por Deus vivem, contudo, implicados em negócios seculares. O bufo, de visão noturna aguda, mas que não vê de dia, os astutos nas coisas temporais, mas botos nas espirituais. A gaivota, que voa no ar e nada na água, os que veneram a circuncisão a par do batismo; ou, ainda, os que querem alçar o voo da contemplação, mas vivem nas águas dos prazeres. O açor, empregado para caçar, os que servem aos poderosos para depredarem os pobres. O mocho, que busca alimento de noite e se esconde de dia, os luxuriosos que buscam ocultar o que fazem, agindo de noite. O mergulhão, capaz de ficar muito tempo debaixo da água, os gulosos que se atacam nas águas dos prazeres. O íbis, ave da África, de bico comprido, e que se nutre de serpentes e é talvez o mesmo que a cegonha, os invejosos que se nutrem, como de serpentes, dos males dos outros. O cisne, de cor branca e de pescoço comprido, com o qual tira o alimento do fundo da terra ou da água, pode significar os homens que, sob candor da justiça externa buscam lucros terrenos. O onocrótalo, ave dos países orientais, de bico comprido, com umas bolsinhas na garganta onde repõe, primeiro, o alimento que, depois de uma hora, manda ao ventre, significa os avarentos que, com cuidados imoderados, acumulam o necessário à vida. O porfirião, diferente das outras aves, tem um pé espalmado para nadar e outro fendido para andar, pois nada na água como os adens e anda na terra como as perdizes; e só bebe, ao comer, molhando na água a comida. Significa os que nada querem fazer por vontade de outrem, senão só o que for banhado na água da vontade própria. A cegonha, vulgarmente chamada falcão, significa aqueles cujos pés são ligeiros para derramar sangue. O carádrio, ave gárrula, os loquazes. A poupa, que nidifica no estrume e se nutre de excrementos fétidos, e simulando no canto um gemido, significa a tristeza do século geradora de morte, nos homens imundos. O morcego, que voa achegado à terra, aqueles a quem, ornados da ciência profana, só sabem as coisas terrenas.

Além disso, das aves e dos quadrúpedes só lhes eram permitidos os de pernas posteriores mais longas, para poderem saltar. Eram porém proibidos os que vivem mais apegados à terra, por serem considerados imundos os que abusam da doutrina dos quatro Evangelistas, afim de não serem por ela elevados para o alto.

No sangue enfim, na gordura e no nervo entendiam-se proibidas a crueldade, a volúpia e a contumácia no pecado.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Já antes do dilúvio os homens se nutriam de plantas e mais ervas da terra. Mas parece que o uso da carne foi introduzido depois, conforme a Escritura (Gn 9, 3): eu vos dei toda carne como viçosas hortaliças. E isto porque alimentar-se dos frutos da terra é mais próprio da simplicidade da vida; ao passo que comer carne revela antes o prazer e o apego ao viver. Pois naturalmente a terra germina em ervas, ou, com pequeno esforço, obtém-se em grande cópia esses, produtos; ao contrário, só com grande diligência podem-se nutrir ou apanhar os animais. Donde, querendo o Senhor reduzir o seu povo a uma vida mais simples, proibiu-lhes muitos géneros de animais, e não dos produtos da terra. Ou também porque aqueles eram imolados aos ídolos e não, estes.

À TERCEIRA OBJECÇÃO É CLARA A RESPOSTA, pelo já dito.

RESPOSTA À QUARTA. — Embora o bode imolado não sinta como, lhe sejam as carnes cozidas, contudo, ao espírito de quem o coze parece implicar uma certa crueldade, empregar, para lhes consumir o leite materno, que lhe foi dado como nutrição. Ou pode dizer-se, que os gentios, na solenidade dos ídolos, coziam totalmente as carnes do bode, para imolá-las ou comê-las. E por isso, a Escritura, depois de ter tratado das solenidades que se deviam, pela lei, celebrar, acrescenta (Ex 23): Não cozerás o cabrito no leite de sua mãe.

A razão simbólica dessa proibição é figurar que Cristo, comparado com o bode, por causa da semelhança da carne do pecado, não devia ser cozido, i. é, morto, pelos judeus, no leite materno i. é, no tempo da infância. Ou significa que o bode, i. é, o pecador, não deve ser cozido no leite materno, i. é, corrompido pelas lisonjas.

RESPOSTA À QUINTA. — Os gentios ofereciam aos seus deuses as primícias dos frutos, que julgavam afortunadas; ou então queimavam-nas para fazer certas magias. Por isso, foi preceituado aos judeus que considerassem imundos os frutos dos três primeiros anos. Pois, em três anos, quase todas as árvores da terra deles, cultivadas de semente, pela enxertia ou pela plantação, produziam fruto. E raramente acontecia que os caroços dos frutos da árvore, ou as sementes latentes fossem semeados, por produzirem frutos mais retardados. Ora, a lei diz respeito ao que mais frequentemente se faz. Donde, os pomos do quarto ano, como sendo as primícias dos frutos puros, eram oferecidos a Deus; os do quinto, porém e seguintes, comidos.

A razão figurada desses preceitos é simbolizar que, depois dos três estados da lei — o primeiro, de Abraão até Davi; o segundo, até a transmigração de Babilónia; o terceiro, até Cristo — Cristo, que, é o fruto dela, devia ser oferecido a Deus. Ou que as primícias das nossas obras nos devem ser suspeitas, por causa da sua imperfeição.

RESPOSTA À SEXTA. — Como diz a Escritura (Sr 19, 27), o vestido do corpo dá a conhecer o que o homem é. Donde, o Senhor quis que o seu povo se distinguisse dos outros, não só pelo sinal carnal da circuncisão, mas também: por uma diferença no vestir. E por isso, foi-lhe proibido vestir-se de roupa tecida de lã e de linho; e que as mulheres usassem trajes masculinos e inversamente, por duas razões. — A primeira fazer evitar a idolatria. Pois, os gentios, no culto dos seus deuses, usavam de várias vestes de diversas contexturas. E também, no culto de Marte, as mulheres usavam das armas dos homens; no de Vénus, ao inverso, os homens usavam trajes femininos. A outra razão era fazer evitar a luxúria. Pois, pela exclusão de várias misturas nos tecidos das vestes, excluía-se toda união em coitos desordenados. Porque é um incentivo à concupiscência e dá ocasião à libidinagem o vestir a mulher trajes masculinos.

A razão figurada de proibir nas vestes, tecidas de lã e de linho, é evitar a união da inocência e da simplicidade, representadas pela lã, como a subtileza e a malícia, figuradas pelo linho. Também proibia a mulher usurpar para si a doutrina ou os ofícios dos homens; ou ao homem o pendor para a efeminação.

RESPOSTA À SÉTIMA. — Diz Jerónimo: O Senhor mandou que se fizesse umas guarnições de jacinto nas quatro pontas das capas, para distinguir o povo de Israel dos outros povos. Pois, assim, mostravam ser judeus e, à vista desse sinal, despertavam a memória da sua lei. E o que diz a Escritura — E as atarás com um sinal na tua mão, e estarão sempre diante dos teus olhos — os Fariseus interpretavam mal, escrevendo em pergaminho o decálogo de Moisés, e prendendo-o na fronte, como coroa, para que se movesse diante dos olhos. Entretanto a intenção do Senhor, mandando assim fazer, era que fossem ligadas na mão, i. é, nas obras, e estivessem diante dos olhos, i. é, na meditação. As fitas cor de jacinto, entremeadas nas capas significam a intenção celeste, inspiradora de todas as nossas obras. E também pode dizer-se que, como o povo judeu era carnal e de cerviz dura, era necessário excitá-los à observância da lei por esses sinais sensíveis.

RESPOSTA À OITAVA. — Há no homem afecto duplo: o racional e o passional. — Ao primeiro não importa como se tratem os brutos, porque Deus lhe sujeitou todas as coisas ao poder, conforme a Escritura (Sl 8, 8): Todas as coisas sujeitastes debaixo de seus pés. E neste sentido o Apóstolo diz que Deus não cuida dos bois, por não exigir que o homem dê contas de como trata os bois ou os outros animais. — Mas, pelo afecto da paixão o homem é movido em relação aos brutos. Pois, como a paixão da misericórdia nasce dos sofrimentos alheios, e sofrer também podem os brutos, no homem pode nascer o afecto da misericórdia mesmo para com os sofrimentos deles. Ora, quem com os animais exerce o afecto da misericórdia está mais próximo a tê-lo para com os homens. Donde o dizer a Escritura (Pr 11, 10): O justo atende pela vida dos seus animais; mas as entranhas dos ímpios são cruéis. E por isso o Senhor, para provocar a misericórdia no povo judaico, inclinado à crueldade, quis exercê-lo na misericórdia, mesmo para com os brutos, proibindo-lhe tratá-los com qualquer crueldade. Donde, era proibido aos judeus cozer o bode no leite da mãe, prender a boca do boi que trilhava, matar a mãe com os filhos. Embora também se possa dizer, que isso lhes era proibido para levá-los a detestar a idolatria. Pois, os egípcios reputavam por nefário os bois comerem dos grãos que trilhavam. E alguns feiticeiros também empregavam a ovelha, enquanto amamentava os filhos, e estes, apanhados simultaneamente com ela, para conseguir a fecundidade e a boa fortuna na nutrição dos filhos. E também porque nos augúrios tinha-se como boa fortuna encontrar a mãe criando os filhos.

Do cruzamento entre animais de espécies diversas pode-se assinalar tríplice razão literal. — Uma, fazer detestar a idolatria dos egípcios, que provocavam esses cruzamentos diversos, para cultuar aos planetas que, conforme as suas diversas conjunções, produzem efeitos vários e sobre diversas espécies de coisas. — Outra razão era excluir o coito contra a natureza. — A terceira, tolher universalmente, toda ocasião de concupiscência. Pois, animais de espécies diversas não se cruzam facilmente, se não forem provocados pelo homem; e a vista do coito provoca no homem movimentos de concupiscência. Por isso, ainda mesmo nas tradições dos judeus, preceitua-se, como refere Rabbi Moisés, que os homens desviem os olhos de animais em cópula.

A razão figurada é que o boi que trilha; i. é, o pregador, que distribui as sementes da doutrina, não deve ser privado da subsistência necessária à vida, como diz o Apóstolo (1 Cor 9, 4 ss). — Também não devemos tomar a mãe juntamente com os filhos; porque em certos casos devemos seguir o sentido espiritual, como filho; e abandonar como nas cerimónias da lei a observância literal, como mãe. — Também era proibido fazer os jumentos, i. é, os homens do povo cristão, ter cópula, i. é, ter sociedade, com animais de outra espécie, i. é, com os gentios ou judeus.

RESPOSTA À NONA. — Todos os cruzamentos a que se alude, eram proibidos na agricultura, literalmente, para fazer detestar a idolatria. Porque os egípcios, em veneração das estrelas, faziam diversas misturas de sementes, animais e roupas, representativas das diversas conjunções delas. — Ou, todas essas várias mesclas eram proibidas para fazer detestar o coito contra a natureza.

Mas também têm uma razão figurada. Pois, o preceito — Não semearás a tua vinha doutra semente — deve ser entendido, espiritualmente, da Igreja, que, sendo a vinha espiritual, não deve ser semeada com doutrina estranha. — E semelhantemente, o campo, i. é, a Igreja, não o semearás com diversa semente, i. e, com a doutrina católica e a herética. — Não lavrarás com boi e asno juntamente, porque o fátuo, na predicação, não se deve unir com o sábio, porque um é empecilho ao outro.

RESPOSTA À DÉCIMA. — Com razão a Escritura (Dt 7) proibia a prata e o ouro, não por não estarem sujeitos ao poder dos homens, mas porque tanto os ídolos, como tudo aquilo de que eram fundidos, estavam sujeitos à maldição, como soberanamente abomináveis a Deus. E isso está claro no seguinte passo do referido capítulo (Dt 7, 26): Nem em tua casa meterás coisa alguma que seja de ídolo, por não vires a ser anátema, como ele o é também. Ou ainda para que, recebendo cobiçosamente o ouro e a prata, não viessem com facilidade a cair na idolatria, à qual eram os judeus inclinados. — O segundo preceito, de cobrir as dejecções com terra, era justo e honesto, quer por limpeza corporal; quer para conservar a salubridade do ar; quer pela reverência devida ao tabernáculo da aliança, colocá-lo no arraial, onde se dizia habitar o Senhor. E isto está claramente dito no lugar em que, depois de se estabelecer esse preceito, dele se dá a razão: O Senhor teu Deus anda no meio do campo para te livrar de todo o perigo etc.; e para que o teu campo seja santo, i. é, limpo, e não apareça nele coisa de fealdade.

A razão figurada desse preceito, segundo Gregório, é significar que os pecados oriundos do instinto da nossa mente, como excrementos fétidos, devem ser cobertos pela penitência, para sermos aceites por Deus, conforme a Escritura (Sl 31, 1): Bem-aventurados aqueles cujas iniquidades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos. Ou, conforme a Glosa: Para que, conhecida a miséria da condição humana, a surdisse da mente enaltecida e soberba fosse coberta e purgada pela humildade, na fossa da profunda meditação. 

RESPOSTA À UNDÉCIMA. — Os feiticeiros e os sacerdotes dos ídolos empregavam, nos seus ritos, os ossos ou as carnes dos mortos. E por isso, para extirpar o culto da idolatria, o Senhor mandou os sacerdotes menores, que ministravam no santuário em tempos determinados, não se contaminarem nas mortes, senão só dos parentes muito próximos, como o pai e a mãe, e outras pessoas assim chegadas. Porém, o pontífice devia estar sempre preparado para o ministério do santuário; e por isso lhe era totalmente proibido achegar-se aos mortos, embora lhe tivessem sido próximos. — Também lhes era proibido tomar mulher meretriz ou repudiada; mas que a tomassem virgem. Quer pela reverência para com eles, cuja dignidade pareceria, de certo modo, diminuída com uma tal união; quer também por causa dos filhos, por quem seria uma ignomínia a torpeza da mãe. O que era sobretudo para evitar, quando a dignidade do sacerdócio era conferida conforme à sucessão na família. — Também lhes era preceituado não raspassem a cabeça nem a barba, nem fizessem incisão no corpo; para remover o rito da idolatria. Pois, os sacerdotes raspavam a cabeça e a barba aos gentios; por isso, diz a Escritura (Br 6, 30): Estão assentados os sacerdotes tendo as túnicas rasgadas e as cabeças e a barba rapada. E também, no culto dos ídolos, eles se retalhavam com canivetes e lancetas, como se diz em outro lugar (1 Rs 18, 28). Donde, mandou-se o contrário aos sacerdotes da lei antiga.

A razão espiritual desses preceitos é deverem os sacerdotes ser absolutamente imunes de obras mortas, que são as do pecado. E também não devem raspar a cabeça, i. é, perder a sabedoria; nem a barba, i. é, perder a perfeição da sabedoria; nem ainda cindir as vestes ou fazer incisão no corpo, isto é, não incorrer no vício do cisma.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


Evangelho e comentário, Leit. Espiritual (Cong para a Doutrina da Fé - Igreja entendida como comunhão,)


Tempo comum XVII Semana

Evangelho: Mt 13, 44-46

44 «O Reino dos Céus é semelhante a um tesouro escondido num campo que, quando um homem o acha, esconde-o e, cheio de alegria pelo achado, vai e vende tudo o que tem e compra aquele campo. 45 O Reino dos Céus é também semelhante a um negociante que busca pérolas preciosas 46 e, tendo encontrado uma de grande preço, vai, vende tudo o que tem e a compra.

Comentário:


Não se sabe exactamente o que é o Reino dos Céus?
Sabe! Jesus Cristo deu a entender de forma muito clara o que é, o valor que tem.
Quem o encontra vê a sua vida mudar radicalmente porque o bem alcançado supera em muito o imaginável.
E, o mais extraordinário é saber que, este “tesouro”, está ao alcance de qualquer um porque, ao contrário dos tesouros da terra que estão escondidos e exigem enormes esforços e meios na sua procura, com resultados sempre incertos, o 'tesouro' do Reino de Deus está patente e disponível par ser conquistado.
Exige esforços? Sem dúvida que sim porque o Senhor conta sempre com a nossa participação, mas, os resultados são garantidos e sempre muito superiores ao que podemos esperar.
E o que é preciso fazer?
É o próprio Cristo Quem, repetidas vezes, o revela: «quem tem ouvidos... que oiça»!
Pois... não basta ouvir, é fundamental guardar o que se ouve e pô-lo em prática.

(AMA, comentário sobre Mt 13, 44-46, 2012.08.01)

Leitura espiritual


Documentos do Magistério

CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ

CARTA AOS BISPOS DA IGREJA CATOLICA
SOBRE ALGUNS ASPECTOS DA IGREJA ENTENDIDA COMO COMUNHÃO

…/2

III COMUNHÃO DAS IGREJAS, EUCARISTIA E EPISCOPADO

11. A unidade ou comunhão entre as Igrejas particulares na Igreja universal, está radicada, afora a mesma fé e o Baptismo comum, sobretudo na Eucaristia e no Episcopado.

Está radicada na Eucaristia, porque o sacrifício eucarístico, embora se celebre sempre numa comunidade particular, nunca é apenas uma celebração dessa comunidade: esta, de facto, recebendo a presença eucarística do Senhor, recebe o dom integral da salvação e manifesta-se assim, apesar da sua constante particularidade visível, como imagem e verdadeira presença da Igreja una, santa, católica e apostólica 49.

A redescoberta de uma eclesiologia eucarística, com os seus indubitáveis valores, exprime-se, porém, às vezes, com acentuações unilaterais a respeito do princípio da Igreja local. Afirma-se que onde se celebra a Eucaristia, far-se-ia presente a totalidade do mistério da Igreja, de modo que deveria considerar-se -essencial qualquer outro princípio de unidade e de universalidade. Outras concepções, sob influxos teológicos diversos, tendem a radicalizar ainda mais esta perspectiva particular da Igreja, ao defenderem que é o próprio reunir-se em nome de Jesus (cfr. Mt 18, 20) que gera a Igreja: a assembleia que em nome de Jesus se torna comunidade, teria em si os poderes da Igreja, incluindo o relativo à Eucaristia; a Igreja, como dizem alguns, nasceria "das bases". Estes e outros erros semelhantes  têm em conta suficiente que é a própria Eucaristia que torna impossível toda a autossuficiência da Igreja particular. Efectivamente, a unidade e a indivisibilidade do Corpo eucarístico do Senhor implicam a unicidade do seu Corpo místico, que é a Igreja una e indivisível. Do centro eucarístico surge a necessária abertura de cada comunidade celebrante, de cada Igreja particular: ao deixar-se atrair pelos braços abertos do Senhor consegue-se a inserção no Seu Corpo, único e indiviso. Até por isto, a existência do ministério Petrino, fundamento da unidade do Episcopado e da Igreja universal, está em correspondência profunda com a índole eucarística da Igreja.

12. De facto, a unidade da Igreja está também radicada na unidade do Episcopado 50. Do mesmo modo que a própria ideia de Corpo das Igrejas demanda a existência de uma Igreja Cabeça das Igrejas, que é precisamente a Igreja de Roma, a qual "preside à comunhão universal da caridade" 51, assim também a unidade do Episcopado comporta a existência de um Bispo Cabeça do Corpo ou Colégio dos Bispos, que é o Romano Pontífice 52. Da unidade do Episcopado, como da unidade de toda a Igreja, "o Romano Pontífice, enquanto sucessor de Pedro, é perpétuo e visível princípio e fundamento" 53. Esta unidade do Episcopado perpetua-se ao longo dos séculos mediante a sucessão apostólica e é também fundamento da própria identidade da Igreja de todos os tempos com a Igreja edificada por Cristo sobre Pedro e os outros Apóstolos 54.

13. O Bispo é princípio e fundamento visível da unidade na Igreja particular confiada ao seu ministério pastoral 55, mas para que cada Igreja particular seja plenamente Igreja, isto é, presença particular da Igreja universal com todos os seus elementos essenciais, constituída portanto à imagem da Igreja universal, nela deve estar presente, como elemento próprio, a suprema autoridade da Igreja: o Colégio episcopal "juntamente com a sua Cabeça, o Romano Pontífice, e nunca sem ele" 56. O Primado do Bispo de Roma e o Colégio episcopal sao elementos próprios da Igreja universal " derivados da particularidade das Igrejas" 57, mas interiores a cada Igreja particular. Portanto, "devemos ver o ministério do sucessor de Pedro, só como um serviço 'global' que atinge cada Igreja particular do 'exterior', mas como já pertencente a cada Igreja particular a partir 'de dentro'" 58. De facto, o ministério do Primado comporta essencialmente uma potestade verdadeiramente episcopal,  só suprema, plena e universal, mas também imediata, sobre todos, quer sejam Pastores ou outros fiéis 59. O facto do ministério do Sucessor de Pedro ser interior a cada Igreja particular é expressão necessária dessa fundamental mútua interioridade entre Igreja universal e Igreja particular 60.

14. Unidade da Eucaristia e unidade do Episcopado com Pedro e sob Pedro não são raízes independentes da unidade da Igreja, porque Cristo instituiu a Eucaristia e o Episcopado como realidades essencialmente vinculadas 61. O Episcopado é um só assim como uma só é a Eucaristia: o único Sacrifício do único Cristo morto e ressuscitado. A liturgia exprime de diversos modos esta realidade, manifestando, por exemplo, que cada celebração da Eucaristia é feita em união não só com o próprio Bispo, mas também com o Papa, com a ordem episcopal, com todo o clero e com todo o povo 62. Toda celebração válida da Eucaristia exprime esta comunhão universal com Pedro e com toda a Igreja ou, como no caso das Igrejas cristas separadas de Roma, assim a reclama objectivamente 63.

IV UNIDADE E DIVERSIDADE NA COMUNHÃO ECLESIAL

15. "A universalidade da Igreja, por um lado, comporta a mais sólida unidade e, por outro, uma pluralidade e uma diversificação, que não obstaculizam a unidade, mas lhe conferem o carácter de 'comunhão'" 64. Esta pluralidade refere-se quer à diversidade de ministérios, de carismas, de formas de vida e de apostolado no interior de cada Igreja particular, quer à diversidade de tradições litúrgicas e culturais entre as diversas Igrejas particulares 65.

A promoçao da unidade que não obstaculiza a diversidade, como também o reconhecimento e a promoção duma diversificação que não impede a unidade mas até a enriquece, são tarefa primordial do Romano Pontífice para toda a Igreja 66 e, salvo o direito geral da própria Igreja, de cada Bispo na Igreja particular confiada ao seu ministério pastoral 67. Mas a edificação e salvaguarda desta unidade, à qual a diversificação confere o carácter de comunhão, é também tarefa de todos na Igreja, porque todos sao chamados a construí-la e a respeitá-la em cada dia, sobretudo mediante a caridade que é "o vínculo da perfeição" 68.

16. Para ter uma visão mais completa deste aspecto da comunhão eclesial - unidade na diversidade -, é necessário considerar que existem instituições e comunidades estabelecidas pela Autoridade Apostólica para tarefas pastorais peculiares. Estas enquanto tais pertencem à Igreja universal, não deixando os seus membros de ser também membros das Igrejas particulares onde vivem e actuam. Esta pertença às Igrejas particulares, com a flexibilidade que lhe é própria 69, tem diversas expressões jurídicas. Isto  só  prejudica a unidade da Igreja particular fundamentada no Bispo, mas, ao contrário, contribui para conferir a esta unidade a diversificação interior própria da comunhão 70.

No contexto da Igreja entendida como comunhão, devem ser considerados também os diversos institutos e sociedades, manifestação dos carismas de vida consagrada e de vida apostólica, com os quais o Espírito Santo enriquece o Corpo Místico de Cristo: embora  pertencendo à estrutura hierárquica da Igreja, pertencem à sua vida e à sua santidade 71.

Pelo seu carácter supra-diocesano, radicado no ministério Petrino, todas estas realidades eclesiais sao também elementos ao serviço da comunhão entre as diversas Igrejas particulares.

V COMUNHÃO ECLESIAL E ECUMENISMO

17. "Com aqueles que, estando baptizados, se honram com o nome de cristãos, mas  professam a fé integral ou  conservam a unidade da comunhão sob o Sucessor de Pedro, a Igreja reconhece-se unida por muitos motivos" 72. Nas Igrejas e Comunidades cristãs católicas existem, na verdade, muitos elementos da Igreja de Cristo que permitem reconhecer com alegria e esperança uma certa comunhão, embora perfeita 73.

Esta comunhão existe especialmente com as Igrejas orientais ortodoxas, as quais, apesar de separadas da Sede de Pedro, permanecem unidas à Igreja Católica mediante estreitíssimos vínculos, como são a sucessão apostólica e a Eucaristia válida, e merecem portanto o título de Igrejas particulares 74. De facto, "com a celebração da Eucaristia do Senhor nestas Igrejas particulares, a Igreja de Deus é edificada e cresce" 75, já que em cada celebração válida da Eucaristia se torna verdadeiramente presente a Igreja una, santa, católica e apostólica 76.

No entanto, dado que a comunhão com a Igreja universal, representada pelo Sucessor de Pedro, é um complemento externo da Igreja particular, mas um dos seus elementos constitutivos internos, a situaçao dessas veneráveis comunidades cristas implica também uma ferida na sua condição de Igreja particular. A ferida é ainda mais profunda nas comunidades eclesiais que conservaram a sucessão apostólica e a Eucaristia válida. Por outro lado, este facto comporta ainda para a Igreja Católica, chamada pelo Senhor a ser para todos "um só rebanho e um só pastor" 77, uma ferida enquanto obstáculo para a realizaçao plena da sua universalidade na história.

18. Esta situação exige seriamente de todos, um empenho ecuménico com vista à plena comunhão na unidade da Igreja; essa unidade "que Cristo desde o princípio doou à sua Igreja e que cremos subsistir, sem possibilidade de se perder, na Igreja Católica e esperamos que cresça cada dia mais até ao final dos séculos" 78. Neste empenho ecuménico, assumem prioritária importância a oração, a penitência, o estudo, o diálogo e a colaboração, para que numa renovada conversão ao Senhor se torne possível a todos reconhecer a perenidade do Primado de Pedro nos seus sucessores, os Bispos de Roma, e ver realizado o ministério petrino, tal como é entendido pelo Senhor, como universal serviço apostólico, que está presente no interior de todas as Igrejas e que, salvaguardada a sua substância de instituiçao divina, pode exprimir-se de diversos modos, de acordo com os lugares e os tempos, como atesta a história.

CONCLUSÃO

19. A Santíssima Virgem Maria é modelo da comunhão eclesial na fé, na caridade e na uniao com Cristo 79. "Eternamente presente no mistério de Cristo" 80, Ela está, no meio dos apóstolos, no próprio coraçao da Igreja nascente 81 e da Igreja de todos os tempos. Na verdade, "a Igreja foi congregada na parte alta (do cenáculo) com Maria, que era a Mãe de Jesus, e com os Seus irmãos.  se pode, portanto, falar de Igreja se aí  estiver presente Maria, a mae do Senhor, com os Seus irmãos" 82.

Ao concluir esta Carta, a Congregação para a Doutrina da Fé, evocando as palavras finais da Constituição Lumen gentium 83, convida todos os Bispos e, por meio deles, todos os fiéis, especialmente os teólogos, a confiar à intercessão da Santíssima Virgem o seu empenho de comunhão e de reflexão teológica sobre a comunhão.

O Sumo Pontífice João Paulo II, no decurso da audiência concedida ao abaixo assinado Cardeal Prefeito, aprovou a presente Carta, decidida na reunião ordinária desta Congregação, e ordenou a sua publicação.

Roma, Sede da Congregação para a Doutrina da Fé, 28 de Maio de 1992.

Joseph Card. Ratzinger
Prefeito

+ Alberto Bovone
Arceb. Tit. de Cesareia de Numidia
Secretário

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Notas:
49 Cfr. Const. Lumen gentium, n. 26/a; STO. AGOSTINHO, In Ioann. Ev. Tract., 26, 13: PL 35, 1612-1613.
50 Cfr. Const. Lumen Gentium, nn. 18/b, 21/b, 22/a. Cfr. também S.CIPRIANO, De unitate Ecclesiae, 5: PL 4, 516-517; STO. AGOSTINHO, In Ioann. Ev. Tract., 46, 5: PL 35, 1730.
51 STO. INÃCIO DE ANTIOQUIA, Epist. ad Rom., prol.: PG 5, 685; cfr. Const. Lumen Gentium, n. 13/c.
52 Cfr. Const. Lumen Gentium, n. 22/b.
53 Ibidem, n. 23/a. Cfr. Const. Pastor aeternus: Denz.-Schön. 3051-3057; S.CIPRIANO, De unitate Ecclesiae, 4: PL 4, 512-515.
54 Cfr. Const. Lumen gentium, n. 20; STO. IRINEU, Adversus haereses, III, 3, 1-3: PG 7, 848- 849; S.CIPRIANO, Epist. 27, 1: PL 4, 305-306; STO. AGOSTINHO, Contra advers. legis et prophet., 1, 20, 39: PL 42, 626.
55 Cfr. Const. Lumen Gentium, n. 23/a.
56 Ibidem, n. 22/b; cfr. ainda n. 19.
57 JOÃO PAULO II, Discurso à Cúria Romana, 20-XII-1990, n. 9: cit., p. 5.
58 JOÃO PAULO II, Discurso aos Bispos dos Estados Unidos da América, 16-IX-1987, n. 4: cit., p. 556.
59 Cfr. Const. Pastor aeternus, cap. 3: Denz-Schön 3064; Const. Lumen gentium, n. 22/b.
60 Cfr. supra, n. 9.
61 Cfr. Const. Lumen gentium, n. 26; STO. INÃCIO DE ANTIOQUIA, Epist. ad Philadel., 4: PG 5, 700; Epist. ad Smyrn., 8: PG 5, 713.
62 Cfr. MISSAL ROMANO, Oraçao Eucarística III.
63 Cfr. Const. Lumen gentium, n. 8/b.
64 JOÃO PAULO II, Discurso na Audiência geral, 27-IX-1989, n. 2: "Insegnamenti di Giovanni Paolo II" XII,2 (1989) p. 679.
65 Cfr. Const. Lumen gentium, n. 23/d.
66 Cfr. ibidem, n. 13/c.
67 Cfr. Decr. Christus Dominus, n. 8/a.
68 Col 3, 14. S. TOMÃS DE AQUINO, Exposit. in Symbol. Apost., a. 9: "A Igreja é una (...) pela unidade da caridade, porque todos estao unidos no amor de Deus, e entre eles no amor mútuo".
69 Cfr. supra, n. 10.
70 Cfr. supra, n. 15.
71 Cfr. Const. Lumen gentium, n. 44/d
72 Const. Lumen gentium, n. 15.
73 Cfr. Decr. Unitatis redintegratio, nn. 3/a e 22; Const. Lumen gentium, n. 13/d.
74 Cfr. Decr. Unitatis redintegratio, nn. 14 e 15/c.
75 Ibidem, n. 15/a.
76 Cfr. supra, nn. 5 e 14.
77 Jo 10, 16.
78 Decr. Unitatis redintegratio, n. 4/c.
79 Cfr. Const. Lumen gentium, nn. 63 e 68; STO. AMBROSIO, Exposit. in Luc., 2, 7: PL 15, 1555; STO. ISAAC DE STELLA, Sermo 27: PL 194, 1778-1779; RUPERTO DE DEUTZ, De Vict. Verbi Dei, 12, 1: PL 169, 1464-1465.
80 JOÃO PAULO II, Enc. Redemptoris Mater, 25-III-1987, n. 19.
81 Cfr. At 1, 14: JOÃO PAULO II, Enc. Redemptoris Mater, cit., n. 26.
82 S. CROMACIO DE AQUILEIA, Sermo 30, 1: "Sources Chrétiennes" 164, p. 134. Cfr. PAULO VI, Ex. Ap. Marialis cultus, 2-II-1974, n. 28.
83 Cfr. Const. Lumen gentium, n. 69.