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24/06/2014

Temas para meditar 155

Amor de Deus

Desejemos que Jesus seja o despertar do nosso ser. Assim entenderemos melhor o Seu vivo sofrimento, ao mesmo tempo que nos daremos conta que não vislumbramos mais que uma chispa do Seu amor incomensurável. Por isso, pedimos ao Mestre divino e humano que nos conceda a graça de não esquecer que somos o objecto do Seu amor e da Sua dor, que anseia a limpeza das almas e sofre pelas nossas ofensas. Com o nosso comportamento consolá-lo-emos, como nos pediu por meio da súplica que dirigiu aos discípulos.

(javier echevarríaGetsemani, Planeta 3ª ed. pg. 17)

Lançamento de livro - Convite

Rev. Cónego António Ferreira dos Santos
Reitor da Igreja da Lapa
Igreja da Lapa (Porto)
Altar Mor




                                                                                                          

Auxílio dos cristãos

"Auxilium christianorum!", Auxílio dos cristãos!, reza com plena segurança a ladainha loretana. Já experimentaste repetir essa jaculatória nos teus transes difíceis? Se o fizeres com fé, com ternura de filha ou de filho, verificarás a eficácia da intercessão da tua Mãe Santa Maria, que te levará à vitória. (Sulco, 180)

É a hora de recorreres à tua Mãe bendita do Céu, para que te acolha nos seus braços e te consiga do seu Filho um olhar de misericórdia. E procura depois fazer propósitos concretos: corta de uma vez, ainda que custe, esse pormenor que estorva e que é bem conhecido de Deus e de ti. A soberba, a sensualidade, a falta de sentido sobrenatural aliar-se-ão para te sussurrarem: isso? Mas se se trata de uma circunstância tonta, insignificante! Tu responde, sem dialogar mais com a tentação: entregar-me-ei também nessa exigência divina! E não te faltará razão: o amor demonstra-se especialmente em coisas pequenas. Normalmente, os sacrifícios que o Senhor nos pede, os mais árduos, são minúsculos, mas tão contínuos e valiosos como o bater do coração.


Quantas mães conheceste como protagonistas de um acto heróico, extraordinário? Poucas, muito poucas. E contudo, mães heróicas, verdadeiramente heróicas, que não aparecem como figuras de nada espectacular, que nunca serão notícia – como se diz – tu e eu conhecemos muitas: vivem sacrificando-se a toda a hora, renunciando com alegria aos seus gostos e passatempos pessoais, ao seu tempo, às suas possibilidades de afirmação ou de êxito, para encher de felicidade os dias dos seus filhos. (Amigos de Deus, 134)

Pequena agenda do cristão


TeRÇa-Feira



(Coisas muito simples, curtas, objectivas)




Propósito:
Aplicação no trabalho.

Senhor, ajuda-me a fazer o que devo, quando devo, empenhando-me em fazê-lo bem feito para to poder oferecer.

Lembrar-me:
Os que estão sem trabalho.

Senhor, lembra-te de tantos e tantas que procuram trabalho e não o encontram, provê às suas necessidades, dá-lhes esperança e confiança.

Pequeno exame:
Cumpri o propósito que me propus ontem?




Tratado da lei 33

Questão 98: Da lei antiga.

Em seguida devemos tratar da lei antiga. E, primeiro, da lei em si mesma. Segundo, dos seus preceitos.

Na primeira questão discutem-se seis artigos:

Art. 1 — Se a lei antiga era boa.
Art. 2 — Se a lei antiga procedia de Deus.
Art. 3 — Se a lei antiga foi dada pelos anjos, ou imediatamente por Deus.
Art. 4 — Se a lei antiga devia ter sido dada só ao povo judeu.
Art. 5 — Se todos os homens estavam obrigados a observar a lei antiga.
Art. 6 — Se a lei antiga foi dada, no tempo conveniente, a Moisés.

Art. 1 — Se a lei antiga era boa.

(Art. seq., ad 1, 2; Ad Rom., cap. VII, lect. II, III; Ad Galat., cap. III, lect. VII, VIII; I Tim., cap. I, lect. II).

O primeiro discute-se assim. — Parece que a lei antiga não era boa.

1. — Pois, diz a Escritura (Ez 20, 25): Eu lhes dei uns preceitos não bons, e umas ordenanças nas quais eles não acharam a vida. Ora, uma lei não é considerada boa senão pela bondade dos preceitos que contém. Logo, a lei antiga não era boa.

2. Demais. — Pela sua bondade é que a lei é útil para o bem público, como diz Isidoro. Ora, a lei antiga não era salutar, mas antes, mortífera e nociva. Pois, diz o Apóstolo (Rm 7, 8): Sem a lei o pecado estava morto. E eu nalgum tempo vivia sem lei; mas quando veio o mandamento reviveu o pecado; e eu sou morto. E ainda (Rm 5, 20): Sobreveio a lei para que abundasse o pecado. Logo, a lei antiga não era boa.

3. Demais. — Pela sua bondade é que a lei é de observância possível, quanto à natureza e quanto ao costume humano. Ora, tal não era a lei antiga, conforme diz Pedro (At 15, 10): Porque tentais pôr um jugo sobre as cervizes dos discípulos, que nem nossos pais nem nós pudemos suportar. Logo, parece que a lei antiga não era boa.

Mas, em contrário, diz o Apóstolo (Rm 7, 12): Assim que, a lei é na verdade santa, e o mandamento é santo, e justo, e bom.

Sem nenhuma dúvida, a lei antiga era boa. Pois, assim como se manifesta verdadeira uma doutrina, por estar de acordo com a razão; assim, mostra ser boa uma lei, por estar de acordo com a razão recta. Ora, a lei antiga estava de acordo com a razão, pois reprimia a concupiscência, que lhe é contrária, como o prova aquele mandamento (Ex 20, 17): Não cobiçaras os bens do teu próximo. E também proibia todos os pecados contrários à razão. Donde é manifesto, que era boa. E esta é a razão do Apóstolo, quando diz (Rm 7, 22): Eu deleito-me na lei de Deus, segundo o homem interior; e ainda (Rm 7, 16): consinto com a lei, tendo-a por boa.

Devemos porém notar que a bondade tem diversos graus, como diz Dionísio. Assim há uma bondade perfeita e outra, imperfeita. A perfeita relativamente aos meios consiste em ser um meio tal, que por si mesmo é conducente ao fim. A imperfeita consiste em praticarmos algum acto para a consecução do fim, mas não bastante a atingi-lo. Assim, o remédio perfeitamente bom cura-nos; o imperfeito ajuda, mas não pode curar.

Ora, como sabemos um é o fim da lei humana, e outro, o da divina. O fim da lei humana é a tranquilidade temporal da cidade. E esse fim a lei consegue-o coibindo os actos exteriores, excluindo os males capazes, de perturbar a paz civil. Ao passo que a lei divina visa levar o homem ao fim da felicidade eterna, fim que todo pecado impede; e não só por actos externos, como também por internos. Portanto, o bastante à perfeição da lei humana, que é proibir os pecados e cominar a pena, não o é à perfeição da lei divina, que há de tornar o homem totalmente capaz de participar da felicidade eterna. Ora, isto não pode ser senão por graça do Espírito Santo, pela qual se difunde a caridade nos nossos corações, que cumpre a lei; pois, a graça de Deus é a vida eterna, como diz o Apóstolo (Rm 5, 5). Mas, esta graça a lei antiga não a podia conferir, pois isso estava reservado a Cristo. Porque, como diz João, a lei foi dada por Moisés, a graça e a verdade foi trazida por Jesus Cristo. Donde vem, que a lei antiga era, por certo boa, mas imperfeita, conforme (Heb 7, 19): a lei nenhuma coisa levou à perfeição.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — No lugar citado o Senhor fala dos preceitos cerimoniais, chamados não bons por não conferirem a graça, que purifica os homens do pecado, embora por eles os homens se mostrassem pecadores. Por isso assinaladamente diz: e umas ordenanças nas quais eles não achavam a vida, i. é, pelas quais não podem obter a vida da graça. E depois acrescenta: E permiti que eles se manchassem nos seus dons, i. é, mostrei-os manchados, quando para expiação dos seus pecados ofereciam lodo o que rompe o claustro materno.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Diz-se que a lei matava, não certamente efectiva, mas, ocasionalmente, por causa da sua imperfeição, por não conferir a graça, pela qual os homens pudessem cumprir o que ela mandava e evitar o que proibia. E assim, essa ocasião não era dada, mas tomada pelos homens. E por isso o Apóstolo diz, no mesmo lugar (Rm 5, 11): o pecado, tomando ocasião do mandamento, me enganou, e me matou pelo mesmo mandamento. E por esta razão diz: sobreveio a lei para que abundasse o pecado; onde se deve considerar a expressão — para que — não consecutiva, mas causalmente, i. é, porque os homens, tomando ocasião da lei, pecaram mais intensamente. Quer por ser o pecado mais grave, depois da proibição da lei; quer ainda porque a concupiscência aumentasse, pois, maior é a nossa concupiscência quando se trata do proibido.

RESPOSTA À TERCEIRA. — O jugo da lei não podia ser suportado sem a graça coadjuvante, que a lei não dava. Pois, diz o Apóstolo (Rm 9, 16): querer e correr nos preceitos de Deus não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus usar da sua misericórdia. Donde o dizer a Escritura (Sl 118, 32): Corri pelo caminho dos teus mandamentos, quando dilataste o meu coração, i. é, pelo dom, da graça e da caridade.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


Evangelho diário, comentário e leitura espiritual (A paz na familia 5)


Tempo comum Semana XII

Nascimento de São João Baptista

Evangelho: Lc 1, 57-66. 80

7 Completou-se para Isabel o tempo de dar à luz e deu à luz um filho. 58 Os seus vizinhos e parentes ouviram falar da graça que o Senhor lhe tinha feito e congratulavam-se com ela. 59 Aconteceu que, ao oitavo dia, foram circuncidar o menino e chamavam-lhe Zacarias, do nome do pai. 60 Interveio, porém, sua mãe e disse: «Não; mas será chamado João». 61 Disseram-lhe: «Ninguém há na tua família que tenha este nome». 62 E perguntavam por acenos ao pai como queria que se chamasse. 63 Ele, pedindo uma tabuinha, escreveu assim: «O seu nome é João». Todos ficaram admirados.64 E logo se abriu a sua boca, soltou-se a língua e falava bendizendo a Deus. 65 O temor se apoderou de todos os seus vizinhos, e divulgaram-se todas estas maravilhas por todas as montanhas da Judeia. 66 Todos os que as ouviram as ponderavam no seu coração, dizendo: «Quem virá a ser este menino?». Porque a mão do Senhor estava com ele.
80 Ora o menino crescia e se fortificava no espírito. E habitou nos desertos até ao dia da sua manifestação a Israel.

Comentário:


Sendo João da mesma idade de Jesus Cristo – apenas com seis meses de diferença – verificamos que passou os primeiros trinta anos da sua vida «habitando os desertos».


Tal como Aquele cujo caminho vem preparar, a preparação do que lhe está cometido necessita de um longo tempo de recolhimento.


Ao contrário, Jesus Cristo, vive esses mesmos trinta anos no seio da família, actuando como qualquer jovem e, depois, homem vulgar e corrente na pequena sociedade da Sua terra de origem.


Poderíamos então dizer que, João, é alguém muito especial que escolhe viver afastado da sociedade, num retiro voluntário. O que o espera é de tal forma grande e extraordinário que não pode deixar de ser assim e, acresce, que não quer que durante esse tempo, as pessoas acorram a ele porque o seu papel é de absoluta discrição e anonimato.


(ama, comentário sobre, Lc 1, 57-66, Carvide, 2013.12.23)


Leitura espiritual



Temas


A PAZ NA FAMÍLIA
…/5

SITUAÇÃO OU VOCAÇÃO

É inútil tentar resolver essa “incapacidade de fazer família” com panos quentes:
assessoramento psiquiátrico (fora de casos patológicos), aprendizado das dez “técnicas” de convívio feliz publicadas – com a costumeira superficialidade – pelas revistas do coração.

A solução, a única solução, está em algo de muito mais profundo. Não há, em muitos rapazes e moças, capacidade de “fazer família”, porque se perdeu a noção do que “é a família”. Não há capacidade de criar amor familiar, porque se perdeu a noção do verdadeiro amor. Não há capacidade de conseguir, no lar, um clima de bondade, paciência, serenidade, alegria, caridade e paz, porque todos esses valores positivos são virtudes ou fruto das virtudes e, hoje, a maioria das pessoas, em vez de aprenderem virtudes, passam os anos a aprender interesses e conveniências. Entram, assim, nas lutas da vida como um combatente moralmente desarmado.

Que é, afinal, a família?

Hoje, mais do que nunca, é preciso fazer ressoar, com a força de uma verdade jubilosa e de um apelo premente, que o casamento e a família não são uma situação, nem uma solução, mas uma vocação e uma missão.

Uma situação. Uma solução. É assim que muitos dos que ainda concedem algum papel ao casamento e à família costumam considerá-los. “Eu – pensam eles – situo-me profissionalmente, situo-me familiarmente, e tento manter nos dois campos, enquanto for conveniente para mim, a situação que, no momento, vejo como a solução mais conveniente”.

A família não é isso. É algo muito maior. Para compreendê-la, escutemos uma das vozes que têm proclamado com maior clareza o sentido divino, cristão, do casamento e da família. Refiro-me ao Bem-aventurado Josemaría Escrivá. Contemplando ele, sob o foco luminoso da fé, o sentido da existência humana, dizia: “Para que estamos no mundo?
Para amar a Deus com todo o nosso coração e com toda a nossa alma, e para estender esse amor a todas as criaturas [...]. Deus não deixa nenhuma alma abandonada a um destino cego; para todas tem um desígnio, a todas chama com uma vocação pessoalíssima, intransferível”.

Também “o matrimónio é caminho divino, é vocação” 7.

Esta afirmação categórica – “o matrimónio é vocação” – feita por Mons. Escrivá já desde os começos dos anos trinta, surpreendia e desconcertava, de início, os seus ouvintes.

Depois, quando penetravam nessa verdade e lhe descobriam as consequências, deslumbrava-os e rasgava-lhes empolgantes horizontes de vida.

“Há quase quarenta anos – dizia o Bem-aventurado, em 1968 – que venho pregando o sentido vocacional do matrimónio. Que olhos cheios de luz vi mais de uma vez quando – julgando eles e elas incompatíveis na sua vida a entrega a Deus e um amor humano nobre e limpo – me ouviam dizer que o matrimónio é um caminho divino na terra!”

Se o matrimónio é uma vocação, quer dizer que é uma chamada de Deus para “algo”, ou seja, que é um apelo divino para o cumprimento de uma missão. Ilustrando essa verdade, na mesma ocasião, o Beato Josemaría continuava a dizer: “O matrimónio existe para que aqueles que o contraem se santifiquem nele e santifiquem através dele: para isso os cônjuges têm uma graça especial, conferida pelo sacramento instituído por Jesus Cristo.

Quem é chamado ao estado matrimonial encontra nesse estado – com a graça de Deus – tudo o que necessita para ser santo, para se identificar cada dia mais com Jesus Cristo e para levar ao Senhor as pessoas com quem convive.

“Por isso penso sempre com esperança e com carinho nos lares cristãos, em todas as famílias que brotaram do Sacramento do Matrimónio, que são testemunhos luminosos desse grande mistério divino – Sacramentum magnum! (Ef 5, 32), sacramento grande – da união e do amor entre Cristo e a sua Igreja. Devemos trabalhar para que essas células cristãs da sociedade nasçam e se desenvolvam com ânsia de santidade [...]. Os esposos cristãos devem ter consciência de que são chamados a santificar-se santificando, de que são chamados a ser apóstolos, e de que o seu primeiro apostolado está no lar. Devem compreender a obra sobrenatural que supõe a fundação de uma família, a educação dos filhos, a irradiação cristã na sociedade. Desta consciência da própria missão dependem, em grande parte, a eficácia e o êxito da sua vida: a sua felicidade” 8.

VOCAÇÃO DIVINA, VOCAÇÃO DE AMOR

“Compreender a obra sobrenatural que supõe a fundação de uma família”, ter “consciência da própria missão”.

Para muitas moças e rapazes, frases como as que acabamos de ler devem parecer-lhes belas palavras ou sonhos irreais. E, no entanto, desses ideais sobre o casamento e a família, que eles ainda não entendem, “dependem, em grande parte, a eficácia e o êxito da sua vida: a sua felicidade”.

O casamento e a família, como qualquer outra vocação, significam para um cristão um chamamento pessoal de Cristo, um apelo para segui-Lo.

Se alguém quiser vir após mim – diz Jesus Cristo –, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me (Mt 16, 24). Estamos nos antípodas do utilitarismo egoísta. Em vez de dizer:
“Procure-se a si mesmo, realize-se a si mesmo”, diz-nos: “Não pense em si, doe-se generosamente”.

Esse apelo à renúncia e ao esquecimento próprio não é, absolutamente, uma tristonha anulação da personalidade, nem um abafamento da alegria de viver. É exatamente o contrário: as palavras de Cristo estão a mostrar-nos o rosto do amor. E o amor é a seiva vivificante da família.

Será preciso lembrar que o amor cristão se formula assim: Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei (Jo 13, 34)? Será que há alguma dúvida sobre como Ele, Cristo, nos amou? Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos (Jo 15, 13).

Com Cristo, um amor inédito entrou no mundo, um amor que o mundo pagão desconhecia totalmente. Era um amor à medida do Amor de Deus, que os cristãos designaram com uma palavra nova: “agápe”, em grego; “caritas” – caridade –, em latim. Era um amor à imagem e semelhança do amor de Cristo.

O que fizemos desse amor?
No mundo de hoje, é preciso reaprendê-lo; é urgente – para todos, mas especialmente para os jovens – redescobrir a beleza inefável do Amor com maiúscula, que vem de Deus (1 Jo 44, 7). A nossa alma tem uma necessidade vital de experimentar o deslumbramento feliz de São João, quando exclamava: Nisto conhecemos o amor: em que Jesus deu a sua vida por nós, e também nós devemos dar a vida pelos nossos irmãos (1 Jo 3, 16). Desse João Apóstolo que, com quase cem anos de idade, acrescentava, extasiado: Nós conhecemos o amor de Deus e acreditamos nele!... Se Deus nos amou assim, também nós nos devemos amar-nos uns aos outros (1 Jo 4, 11.16).

Não duvidemos: é aí, e somente aí, nas profundezas do amor cristão, que finca as suas raízes a paz familiar.

A SABEDORIA DE SÃO TOMÁS

Antes de terminar esta panorâmica – “a família em perspectiva” –, talvez valha a pena acrescentar ainda, como complemento útil, umas breves reflexões. São considerações que procedem de boa fonte, de São Tomás de Aquino.

Na sua Suma Teológica, a certa altura, o santo doutor, na esteira de Aristóteles, formula várias perguntas sobre o amor e – como se estivesse a dizer a coisa mais óbvia do mundo – escreve que há dois tipos de amor:
Um é o que chama amor de concupiscência (que não significa só o amor sexual, pois a palavra latina concupiscentia designa os desejos em geral). Dá-se esse amor quando “em vez de querer o bem de quem amamos, queremos que ele seja um bem para nós, como quando dizemos que amamos o vinho ou um cavalo...” São Tomás parece brincar, mas fala com a maior seriedade. Não sei se o que vou dizer não será rude demais, mas creio que o amante egoísta, descrito nas páginas anteriores, encara a esposa – ou o marido, ou os filhos, ou os pais – com a mesma mentalidade com que degusta um vinho ou experimenta o trote de um cavalo.

O outro tipo de amor – acrescenta São Tomás – é o que se chama amor de amizade.

“Não é – diz – um amor qualquer, mas o amor que possui a benevolência, isto é, o amor que existe quando amamos alguém de tal maneira que queremos o seu bem” 9.

Pronto. Poucas palavras para enormes verdades. Há um amor que busca só o bem e o interesse próprios. Há outro amor que busca e trabalha pelo bem da pessoa amada. Este último – amor de amizade –, vivificado pela capacidade de querer que nos infunde o Espírito Santo (cf. Rom 5, 5), é o amor cristão. E é só com esse tipo de amor que se faz, de verdade, família e nela se consegue a paz.

Enquanto escrevo estas últimas linhas, vem-me ao pensamento – e comove-me novamente – a lembrança de um casal amigo, excelentes pessoas, unidas e fiéis após longos anos de convívio. Com uma lucidez plácida e simples, o marido, bom cristão, dizia-me:
“O senhor sabe? Depois de tantos anos, cheguei à conclusão de que o amor entre marido e mulher só é amor mesmo quando os dois se tornam amigos, quando são dois bons amigos.
O verdadeiro amor é amizade”.

E, com isto, finalizamos a nossa digressão sobre a “família em perspectiva”.

As considerações gerais que acabamos de fazer serão o ponto de partida para as que faremos a seguir comentando atitudes e gestos concretos que, brotando do amor, podem construir a paz familiar.

(CONT.)

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Notas:
(7) Josemaría Escrivá, Questões atuais do cristianismo, 3a. ed., Quadrante, São Paulo, 1986, n. 106;
(8) ibid., n. 91; ver também, do mesmo autor, a homilia O Matrimónio, vocação cristã, em É Cristo que passa, 2a. ed., Quadrante, São Paulo, 1975, ns. 22-30;
(9) São Tomás de Aquino, Suma teológica, II-II, q. XXIII, art. 1, concl.;