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24/12/2014

Tratado do verbo encarnado 69

Questão 9: Da ciência de Cristo em geral

Art. 2 — Se Cristo teve a ciência dos santos ou dos que gozam da visão beatífica.

O segundo discute-se assim. — Parece que Cristo não teve a ciência dos santos ou dos que gozam da visão beatífica.

1 - Pois, a ciência dos santos é uma participação do lume divino, segundo a Escritura: No teu lume veremos o lume. Ora, Cristo não tinha o lume divino corno participado, mas tinha a própria divindade imanente em si substancialmente, conforme o diz o Apóstolo: Nele habita toda a plenitude da divindade corporalmente. Logo, Cristo não tinha a ciência dos santos.

2. — Demais. - A ciência dos santos torna-os santos, segundo o Evangelho: A vida eterna consiste em que eles conheçam por um só verdadeiro Deus a ti e a Jesus Cristo, que tu enviaste. Ora, o homem Cristo foi santo desde que foi unido pessoalmente a Deus, segundo a Escritura: Bem-aventurado o que elegeste e tomaste para o teu serviço. Logo, não devemos atribuir a Cristo a ciência dos santos.

3. Demais. — Ao homem compete uma ciência dupla, a que lhe é conforme e a que lhe é superior à natureza. Ora, a ciência dos santos, consistente na visão divina, não é conforme à natureza do homem, mas é-lhe superior. Mas, Cristo teve outra ciência sobrenatural muito mais elevada, que era a ciência divina. Logo, não era necessário que Cristo tivesse a ciência dos santos.

Mas, em contrário. — A ciência dos santos consiste na visão ou no conhecimento de Deus. Ora, Cristo conheceu a Deus plenamente, mesmo enquanto homem, segundo o Evangelho. Mas eu o conheço e guardo a sua palavra. Logo, Cristo teve a ciência dos santos.

O potencial reduz-se ao actual pelo que já é actual. Assim, há-de ser quente o que aquece. Ora, o homem tem em potência a ciência dos santos, consistente na visão de Deus, a qual se ordena como ao fim, pois, é uma criatura racional capaz desse conhecimento dos bem-aventurados, como feito que é à imagem de Deus. Ora, os homens são levados a esse fim da bem-aventurança pela humanidade de Cristo, segundo o Apóstolo: Convinha que aquele para quem são todas as coisas e por quem todas existem, havendo de levar muitos filhos à glória, consumasse pela paixão ao autor da sua salvação. Logo, era necessário que o conhecimento consistente na visão beatífica de Deus, o que o homem Cristo o tivesse excelentissimamente, pois, sempre e necessariamente a causa é superior ao causado.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A divindade uniu-se à humanidade de Cristo, pessoalmente, não pela essência ou pela natureza, mas com a unidade da pessoa permanece a distinção das naturezas. Donde, a alma de Cristo, que faz parte da natureza humana, teve, por um lume participado da natureza divina, a ciência perfeita dos santos, pela qual veem a essência de Deus.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Em virtude própria da união, o homem Cristo é santo por santidade incriada, assim como é Deus pela união. Mas, além da bem-aventurança incriada, era necessário que a natureza humana de Cristo tivesse uma certa bem-aventurança criada, pela qual a sua alma fosse constituída no fim último da natureza humana.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A visão ou a ciência dos santos é de certo modo superior à natureza da alma racional, isto é, enquanto não pode esta chegar a ela pelas suas próprias forças. Mas, num outro sentido, essa ciência é-lhe natural, isto é, enquanto que pela Sua natureza, é capaz dela, por ser a alma racional feita à imagem de Deus, como se disse. Mas, a ciência incriada é, de todos os modos, superior à natureza da alma humana.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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