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01/11/2014

Morte e Eternidade

Já desde a minha primeira infância, ao chegar Novembro, ouvi repetir a minha volta palavras que não esqueci ao longo da vida: “Bendito mês, que começa com todos os santos e termina com santo André”.

No Ângelus de 1 de Novembro, Bento XVI recordou, doutra forma, a verdade escondida nessas palavras do povo: “A Solenidade de todos os Santos é uma ocasião propícia para elevar o olhar das realidades terrenas, marcadas pelo tempo, à dimensão de Deus, a dimensão de eternidade e de santidade”.
Nenhum momento na vida do homem mais apropriado para ajudar-nos a “elevar o olhar” que o da morte de pessoas queridas, de amigos, de conhecidos que nos deixam depois de uma longa doença, ou que abandonam a terra de improviso e sem o anunciar.
Porque é um momento apropriado? Simplesmente, porque a morte põ à prova a qualidade do “amor” que se esconde no coração de todo o homem. Se não amamos, a morte de um ser querido pode levar-nos a descobrir que já estamos mortos, ainda que nos mantenhamos em pé, porque perdemos todo o sentido da nossa vida.
Muitas pessoas, na sociedade actual, esforçam-se por tirar da perspectiva da sua vida o horizonte da morte. A morte é um tema de conversação quase proibido. Há no ambiente um certo e impreciso medo à morte, talvez pela obstinação de não pensar o que o homem pode encontrar depois da morte.
Esse temor manifesta-se em fazer desaparecer até as cinzas dos defuntos, atirando-as ao mar, a um lago, ao vento. Outras vezes, o medo expressa-se no eliminar da nossa mente todo o juízo do nosso actuar e do nosso viver: nada vale a pena e a morte apagará para sempre a memória das nossas misérias. E quer-se apagar da mente, também, sequer a possibilidade de que haja céu e inferno. Na realidade, alguns querem simplesmente “morrer para sempre”; e temem descobrir na morte, que esse desejo é uma “pretensão inútil”.
A morte situa-nos, talvez sem nos dar muita conta, ante a ineludível pregunta sobre o sentido da nossa vida. E talvez nos faça descobrir a verdade destas palavras de Bento XVI:
 “O homem pode explicar-se, encontra o seu sentido profundo, só se Deus existe”
O cristão não tem medo do juízo – sabe que só Deus nos pode julgar - e Deus é pai que nos acolhe quando arrependidos voltamos para Ele. Sabe que existe céu e inferno. E não faz desaparecer as cinzas dos seus defuntos, simplesmente porque ao enterrá-las, poderá visitá-las, saudá-las, ainda que apenas seja um dia no ano, ajuda-o a não perder de vista a eternidade. A realidade da eternidade dá-lhe ar para respirar na atmosfera viciada que se encontra tão amiúde à sua volta.
 “O homem necessita da eternidade, e qualquer outra esperança é para ele demasiado breve, demasiado limitada”.
O antigo costume de visitar os cemitérios nestes dias é um ar fresco em qualquer momento do viver. E as flores com que se adornam as tumbas, além de um detalhe de carinho para com os nossos defuntos, são também um desejo de lhes expressar um afecto, um carinho que por vezes não lhes manifestamos durante a vida.
 “Também na visita aos cemitérios, ao mesmo tempo que lembramos laços de afecto com quem nos amou durante a nossa vida, recorda-nos que todos vamos para outra vida, mais para além da morte. Que o choro, devido ao distanciamento terreno, não prevaleça sobre a certeza da ressurreição, sobre a esperança de alcançar a bem-aventurança da eternidade”, recorda-nos o Papa.
Essa bem-aventurança eterna, a vida eterna com Deus Pai, Filho e Espírito, que pedimos ao Senhor tenha concedido já aos nossos defuntos.

ernesto juliá díaz

(trad. do castelhano por ama)

Nota do tradutor:
Não estou totalmente de acordo com o autor no que se refere a quanto diz sobre as cinzas dos defuntos já que no ponto de vista cristão – que é o meu – a cremação de um ente querido não tem a ver nem com o temor da morte nem com qualquer “vontade” de apagar a sua memória; esta estará, para sempre, bem viva no coração dos que ficam. Devolver as cinzas à terra é, na minha maneira de ver, dar um destino coerente aos restos corporais. O que sim me interessa sobremaneira é manter viva a sua memória e na oração diária, frequente e profundamente sentida impetrando Deus Pai que os tenha acolhido para todo o sempre nos Seus braços amorosos. 


António Mexia Alves                                                        

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