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29/03/2014

Tratado dos vícios e pecados 43

Questão 78: Da causa do pecado, por parte da vontade, chamada malícia.

Art. 3 — Se quem peca por malícia intencional peca por hábito.

(II Sent., dist. XLIII, a. 2; In Matth., cap. XII).

O terceiro discute-se assim. — Parece que quem peca por malícia intencional peca por hábito.

1. — Pois, diz o Filósofo, que nem todos podem praticar actos injustos, ao modo do injusto, i. é, por eleição, mas, só o que tem o hábito para tal. Ora, pecar por malícia intencional é fazê-lo, com eleição do mal, conforme já se disse. Logo, só quem tem o hábito pode pecar por malícia intencional.

2. Demais. — Orígenes diz que ninguém se anula ou falha subitamente, mas só paulatinamente e aos poucos há-de resvalar. Ora, o máximo deslize é pecar por malícia intencional. Logo, não é repentinamente e desde o princípio, mas por um costume diuturno, capaz de gerar o hábito, que chegamos a pecar por essa malícia.

3. Demais. — Sempre que pecamos por malícia intencional, necessariamente a vontade por si mesma inclinar-se-á ao mal que elegeu. Ora, pela própria natureza da potência, o homem não se inclina para o mal, mas ao contrário, para o bem. Logo, se escolhe o mal fá-lo necessariamente por alguma coisa sobreveniente, a saber, a paixão ou o hábito. Ora, quem peca por paixão não peca por malícia intencional, mas por fraqueza, como já se disse. Logo, quem peca por malícia intencional há-de, sempre e necessariamente, pecar por hábito.

Mas, em contrário. — O hábito bom está para a eleição do bem, como o mau, para a do mal. Ora, podemos sem termos o hábito da virtude, escolher o que é virtuosamente bom. Logo, também podemos eleger o mal, sem termos um hábito vicioso, e isso é pecar por malícia intencional.

A vontade comporta-se, de um modo, em relação ao bem e, de outro, ao mal. Pois, pela natureza da sua potência, inclina-se para o bem racional como para o objecto próprio, e por isso todo pecado é considerado contrário à razão. Portanto e necessariamente, só por alguma causa estranha a eleição da vontade se inclina para o mal. E, isso às vezes dá-se por deficiência da razão, como quando pecamos por ignorância, outras, por impulso do apetite sensitivo, como quando pecamos por paixão. E em nenhum destes casos pecamos por malícia intencional, mas só quando a vontade se move propriamente para o mal. O que pode dar-se de dois modos. — Primeiro, por alguma disposição corrupta, inclinante para o mal, de modo a, em vista dessa disposição, algum mal nos ser conveniente e semelhante, para o qual, em razão da semelhança, a vontade tende como se fosse bem. Pois, cada ser tende, em si mesmo, ao que lhe é conveniente. E essa disposição corrupta é ou um hábito adquirido pelo costume, que se converteu em natureza, ou algum hábito corpóreo doentio, como quando temos certas inclinações naturais para certos pecados, por causa da corrupção da nossa natureza.

De outro modo, a vontade pode tender, por si mesma, para o mal, pela remoção de um obstáculo proibitivo. Assim, se nos abstivermos de pecar, não propriamente por nos desagradar o pecado, mas pela esperança da vida eterna, ou pelo temor da Geena, uma vez perdida a esperança, pelo desespero, ou o temor, pela presunção, resultará o pecarmos por malícia intencional e quase sem freios.

Donde fica claro, que o pecado, cometido por malícia intencional, sempre pressupõe alguma desordem no homem, que contudo nem sempre é habitual. Portanto, quem peca por malícia intencional nem por isso peca por hábito, necessariamente.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Proceder como o injusto é, não somente praticar actos injustos por malícia intencional, mas ainda com prazer, e sem grave oposição da razão. Ora, isso só o faz quem assim age habitualmente.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Não é repentinamente que resvalamos, pecando por malícia intencional, mas isso pressupõe uma causa que nem sempre é um hábito, como já se disse.

RESPOSTA À TERCEIRA. — O que inclina a vontade para o mal nem sempre é um hábito ou paixão, mas podem ser algumas outras coisas, como já se disse.

RESPOSTA À QUARTA. — A eleição do bem e a do mal não têm o mesmo fundamento. Pois, ao passo que o mal nunca existe sem o bem natural, o bem pode existir sem o mal da culpa perfeita.


Revisão da tradução portuguesa por ama

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