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21/02/2014

Tratado dos vícios e pecados 18


Questão 73: Da relação dos pecados entre si.


Art. 3 ― Se a gravidade dos pecados varia com os objectos deles.





O terceiro discute-se assim. ― Parece que a gravidade dos pecados não varia com os seus objectos.

1. ― Pois, ela depende do modo ou qualidade do pecado. Ora, o objecto é a matéria do mesmo. Logo, a gravidade deste não varia conforme os seus diversos objectos.

2. Demais. ― A gravidade do pecado está na intensidade da sua malícia. Ora, ele não tira esta da conversão para o seu objecto próprio, que é algum bem desejável, mas, antes, do afastamento desse objecto. Logo, a gravidade do pecado não varia conforme os seus diversos objectos.

3. Demais. ― Pecados com objectos diversos são de géneros diferentes. Ora, coisas de diversos géneros não são suscetíveis de comparação entre si, como Aristóteles prova 1. Logo, um pecado não é mais grave que outro pela diversidade dos objectos.

Mas, em contrário. ― Os pecados especificam-se pelos seus objectos, como do sobredito resulta (q. 62, a. 1). Ora, uns são especificamente mais graves que outros, assim, o homicídio, mais que o furto. Logo, a gravidade deles varia com os seus objectos.

Como do sobredito (a. 5) claramente resulta, a gravidade dos pecados difere do mesmo modo que uma doença é mais grave que outra. Pois, assim como o bem da saúde consiste num certo equilíbrio dos humores, por conveniência com a natureza do animal, assim o bem da virtude está num certo equilíbrio dos actos humanos, por conveniência com a regra da razão. Ora, é manifesto que uma doença é tanto mais grave, quanto mais se afasta desse devido equilíbrio dos humores, comensurado pelo primeiro princípio. Assim, a doença do coração, ou de qualquer outro órgão que tenha quase tanta importância como ele, é mais perigosa, por ser o coração o princípio da vida. Donde e necessariamente, tanto mais grave será o pecado quanto mais a sua desordem ferir algum princípio primeiro, na ordem da razão.

Ora, a razão ordena-nos todos os actos em dependência do fim. E portanto, quanto mais elevado for o fim de que um acto humano pecaminoso se desvia, tanto mais grave será o pecado. Ora, os objectos dos actos são os seus fins, como do sobredito claramente se colhe (q. 72, a. 3 ad 2). Logo, da diversidade dos objectos depende a diversa gravidade do pecado. Mas, ao passo que, claramente, as coisas exteriores ordenam-se para o homem como para o fim, este se ordena ulterior e finalmente para Deus. Donde, o pecado que recai sobre a própria substância do homem, como o homicídio, é mais grave do que outro cujo objecto são as coisas exteriores, como o furto, mas ainda é mais grave o cometido directamente contra Deus, como a infidelidade, a blasfémia e outros. E na ordem desses pecados, cada um é mais ou menos grave segundo recai sobre o mais ou menos principal. E como os pecados se especificam pelos seus objectos, a diferença de gravidade nestes fundada é a primária e a principal, sendo quase consequente à espécie.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― Embora o objecto seja a matéria em que termina o acto, exerce contudo a função de fim, por recair sobre ele a intenção do agente, como já dissemos acima (ibid). Ao passo que a forma do acto moral depende do fim, como resulta claramente do sobredito (q. 71, a. 3).  

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Da mesma conversão indébita para algum bem mutável resulta o afastamento do bem imutável, o que completa a essência do mal. E portanto importa que, da diversidade do que respeita à conversão resulta a diversa gravidade da malícia dos pecados.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Todos os objectos dos actos humanos se ordenam uns para os outros. E portanto todos convêm, de certo modo, num mesmo género, como ordenados para o fim último. Logo, nada impede que todos os pecados sejam suscetíveis de comparação entre si. 

Revisão da tradução portuguesa por ama

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Notas:
1. VII Physic. (lect. VII).





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