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07/06/2013

Tratado das paixões da alma 44



Questão 32: Da causa do prazer

Art. 2 ― Se o movimento é causa do prazer.


(IV Sent., dist. XLIX, q. 3, a . 2, ad 3).



O segundo discute-se assim. ― Parece que o movimento não é causa do prazer.


1. ― Porque, como já dissemos 1, o bem presentemente obtido é a causa do prazer, e por isso o Filósofo diz, que o prazer não é comparável à geração, mas à operação de um ser já existente 2. Ora, o que é movido para um termo ainda não o alcançou, mas de certo modo está em via de geração, relativamente a ele, enquanto todo movimento implica a geração e a corrupção, como diz Aristóteles 3. Logo, o movimento não é causa do prazer.

2. Demais. ― O movimento introduz no agir a fadiga e a lassidão. Ora, actividades laboriosas fatigantes não são deleitáveis mas antes, aflitivas. Logo, o movimento não é causa do prazer.

3. Demais. ― O movimento implica uma certa inovação que se opõe ao hábito. Ora, as coisas habituais são-nos deleitáveis, como diz o Filósofo 4. Logo, o movimento não é causa do prazer.

Mas, em contrário, diz Agostinho: Porque isto, Senhor, meu Deus, quando és eternamente para ti mesmo a tua alegria, e quando várias das tuas criaturas gozam junto de ti sempiternamente? Porque este vosso mundo se compraz, contínua e alternadamente na deficiência e na abundância, na guerra e na paz? 5 Donde se conclui que os homens gozam e se deleitam com certas mudanças. E então, o movimento, parece, é causa do prazer.

Requerem-se três condições para o prazer: duas primeiras, cuja união é deleitável, e a terceira, o conhecimento dessa união. E de acordo com essas três condições o movimento torna-se deleitável, como diz o Filósofo 6. Pois, quanto a nós, que nos deleitamos, a transmutação torna-se-nos deleitável porque a nossa natureza é sujeita a mudanças, donde, o que agora nos é conveniente já não o é mais tarde, assim, aquecer-se ao fogo, conveniente ao homem no inverno, não o é no verão. ― Também quanto ao bem que deleita, e que se nos une a nós, a transmutação é deleitável. Porque a actividade continuada de um agente aumenta-lhe o efeito, assim, quanto mais alguém se aproxima do fogo, mais se aquece e desseca. Ora, a disposição natural implica uma certa medida. Logo, quando a presença continuada do objecto deleitável sobre-excede a medida dessa disposição natural, torna-se desejável o seu afastamento. ― E por fim, em relação ao conhecimento, a mudança também nos é deleitável. Pois, de um lado, o homem deseja conhecer, total e perfeitamente, tudo o que conhece, mas como, de outro, não pode apreender total e simultaneamente certos objectos, deleitar-se com a transmutação, de modo que, a uma parte sucede outra e, assim, seja sentido o todo. Donde o dito de Agostinho: Não queres por certo que as sílabas se detenham, mas que se evolem e dêm lugar a outras, de modo que ouças toda a palavra. O mesmo se dá com todas as coisas que formam um todo, mas que não existem simultaneamente: o todo, se pudesse ser apreendido simultaneamente, deleitaria mais que cada uma das partes 7.

Se portanto um objecto deleitável, intransmutável por natureza, não puder ser excessivo, pela sua continuada presença, em relação à disposição natural do homem, e se demais disso, puder ser apreendido total e simultaneamente, a sua mudança não será agradável. E quanto mais os prazeres se aproximarem deste tipo, tanto mais poderão ter uma presença continuada.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― Embora o que é movido ainda não tenha chegado perfeitamente ao termo, já começa contudo de ter algo desse termo. E neste sentido, o movimento, em si mesmo, já participa algo do prazer, embora não encerre o prazer perfeito, pois os prazeres mais perfeitos são os que têm por objecto objectos imóveis. ― E também o movimento torna-se deleitável enquanto por ele se torna conveniente o que antes não o era, ou deixa de o ser, como já se disse.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― O movimento causa fadiga e lassidão, quando ultrapassa a nossa disposição natural. Ora, não é nesse sentido que o movimento é deleitável, mas enquanto remove o que encontre essa disposição natural.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― O habitual é deleitável quando se torna natural, pois o hábito é uma quase segunda natureza. Ora, o movimento é deleitável, não por certo enquanto se afasta do habitual, mas antes, enquanto impede a corrupção da disposição natural, que poderia provir de uma actividade continuada. De modo que pela mesma causa de conaturalidade tornam-se deleitáveis o hábito e o movimento.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. Q. 31, a. 1.
2. VII Ethic., lect. XII.
3. VIII Physic., lect. VI.
4. I Rhetor., cap. XI.
5. VIII Confess., cap. III.
6. VII Ethic., lect. XIV et I Rhetoric., cap. XI.
7. IV Confess., cap. XI.

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