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25/04/2013

Tratado das paixões da alma 7



Art. 4 ― Se uma mesma potência pode ter paixões especificamente diferentes e não opostas entre si.



(III Sent., dist. XXVI, q. 1, a . 3, De Verit., q. 26, a . 4, II Ethic., lect. V).

O quarto discute-se assim. ― Parece que uma mesma potência não pode ter paixões especificamente diferentes e não opostas entre si.



1. ― Pois, as paixões da alma diferem pelos seus objectos. Ora, estes são o bem e o mal cujas diferenças fundamentam a oposição das paixões. Logo, paixões da mesma potência, sem oposição mútua, não podem entre si diferir especificamente.

2. Demais. ― A diferença específica é uma diferença formal. Ora, toda a diferença formal implica alguma oposição, como diz Aristóteles 1. Logo, paixões da mesma potência, não opostas, não diferem especificamente.

3. Demais. ― Toda a paixão da alma consistindo numa aproximação ou afastamento do bem ou do mal, resulta necessariamente que toda diferença entre as paixões se funda ou na diferença entre o bem e o mal, ou na aproximação ou afastamento, ou na de maior ou menor aproximação ou afastamento. Ora, as duas primeiras diferenças implicam a oposição entre as paixões como já se disse 2, ao passo que a terceira não diversifica a espécie, porque então seriam infinitas as espécies de paixões. Logo, uma mesma potência da alma não pode ter paixões especificamente diferentes e que não sejam opostas.

Mas, em contrário. ― O amor e a alegria diferem especificamente e pertencem ao concupiscível. Contudo não são opostos entre si, antes, aquele é causa desta. Logo, há paixões de uma mesma potência que diferem entre si especificamente sem entretanto serem opostas.

 As paixões se distinguem pelas suas causas activas, que são os seus objectos. Ora, a diferença das causas activas pode ser considerada de dois pontos de vista, especificamente e conforme a própria natureza delas, e assim o fogo difere da água, ou segundo a diversidade da faculdade que age. Ora, a diversidade da causa activa ou motora, quanto à faculdade de mover, pode ser considerada, nas paixões da alma, por analogia com os agentes naturais. Assim, todo motor atrai de certo modo para si o paciente, ou de si o repele. No primeiro caso produz no paciente três efeitos. Primeiro, infunde-lhe a inclinação ou aptidão a tender para si, assim, quando um corpo leve e situado no alto dá a leveza ao corpo que gera, pela qual este tem inclinação ou aptidão a elevar-se. Segundo, se o corpo gerado está fora do seu lugar próprio, dá-lhe o mover-se para o lugar. Terceiro, dá-lhe o repouso no lugar alcançado, pois pela mesma causa um corpo move-se para um lugar e nele repousa. E o mesmo se deve dizer quando se trata da causa de uma repulsão.

Ora, nos movimentos da parte apetitiva o bem tem uma quase virtude atractiva, e o mal, repulsiva. Donde, aquele causa primeiramente na potência apetitiva uma certa inclinação ou aptidão ou conaturalidade para si mesmo, e isto pertence à paixão do amor, ao qual por contrariedade, corresponde o ódio, por parte do mal. Em segundo lugar, o bem-amado ainda não possuído, causa o movimento para ser conseguido o que pertence à paixão do desejo ou da concupiscência, e por contrariedade e quanto ao mal, a fuga ou a aversão. Terceiro, obtido o bem, o apetite produz um como que repouso no bem possuído, o que respeita à deleitação ou alegria a que se opõe, do lado do mal, a dor ou a tristeza.

As paixões do apetite irascível porém já pressupõem, a aptidão ou inclinação a buscar o bem ou a evitar o mal, próprias do concupiscível, que visa o bem e o mal absolutamente.

Assim, em relação ao bem ainda não possuído, temos a esperança e o desespero, em relação ao mal presente, o temor e a audácia. Relativamente porém ao bem não possuído, não há no irascível nenhuma paixão, porque, não existe nesse caso a ideia de árduo, como já dissemos 3, mas a paixão da ira resulta do mal presente.

Donde é claro, que há três pares de paixões no concupiscível: amor e ódio, desejo e aversão, alegria e tristeza. Semelhantemente, há três no irascível: esperança e desespero, temor e audácia, e a ira a qual nenhuma paixão se opõe.

Logo, são onze ao todo as paixões especificamente diferentes: seis do concupiscível e cinco do irascível. E estas abrangem todas as paixões da alma.

Donde se deduzem claras as RESPOSTAS ÀS OBJECÇÕES.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. X Metaph., lect. X.
2. Q. 23, a. 2.
3. Q. 23, a. 3.

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