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04/01/2013

Tratado da bem-aventurança 31


Questão 4: Do necessário à bem-aventurança.



Art. 7 — Se para a bem-aventurança são também necessários bens externos.

(2.2, q. 186, a 3, ad 4).

O sétimo discute-se assim. — Parece que para a bem-aventurança são também necessários os bens externos.



1. — Pois o prometido aos Santos como prémio conclui-se na bem-aventurança. Ora, a eles estão-lhes prometidos os bens externos, como a comida e a bebida, as riquezas e o reinado, conforme a Escritura (Lc 22,30): Para que comais e bebais à minha mesa no meu reino: Mas entesourai para vós tesouros no céu, e (Mt 6, 20): Vinde benditos de meu Pai, possui o reino. Logo, para a bem-aventurança, são necessários os bens externos.

2. Demais. — Segundo Boécio, a bem-aventurança é o estado perfeito pela reunião de todos os bens (1). Ora, os bens externos são bens do homem, embora mínimos, como diz Agostinho (2). Logo, também eles são necessários para a bem-aventurança.

3. Demais. — O Senhor diz (Mt 5, 12): O vosso galardão é copioso nos céus. Ora, estar nos céus significa estar num lugar. Logo, pelo menos um lugar externo é necessário para a bem-aventurança.

Mas, em contrário, diz a Escritura (Sl 72, 25): Pois que tenho eu no céu? E, fora de ti, que desejei eu sobre a terra? Que é como se dissesse: Não quero senão o seguinte — (72, 28) para mim é bom unir-me a Deus. Logo, além de Deus nada mais é necessário à bem-aventurança.

Para a bem-aventurança imperfeita, tal como pode ser alcançada nesta vida, são necessários os bens externos, não que lhe constituam a essência, mas como que servindo-lhe de instrumento, que consiste na operação da virtude, como diz Aristóteles (3). Pois, precisa o homem nesta vida de bens necessários ao corpo, para a actividade — tanto da virtude contemplativa como da activa, sendo-lhe ainda, para esta, necessários muitos outros bens pelos quais exerça as obras da virtude activa.

Para a bem-aventurança perfeita porém, que consiste na visão de Deus, de nenhum modo são necessários tais bens. E a razão é que todos os bens externos são necessários ou para o sustento do corpo animado, ou para certas operações adequadas à vida humana e as quais exercemos pelo corpo animado. Mas, a perfeita bem-aventurança consistente na visão de Deus, há de tê-la a alma sem o corpo, ou unida ao corpo, não já animal, mas espiritual. E portanto, de nenhum modo tais bens externos, ordenados à vida animal, são necessários à bem-aventurança. E sendo, nesta vida, a felicidade contemplativa mais semelhante a Deus, mais que a activa se assemelha à perfeita bem-aventurança, como resulta do que já foi dito (4), e portanto, necessita menos dos referidos bens do corpo, como diz Aristóteles (5).

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Todas as promessas materiais contidas na Sagrada Escritura devem entender-se metaforicamente, pois nelas costumam designar-se as coisas espirituais por meio das corpóreas, para das coisas conhecidas, nos elevarmos a desejar as desconhecidas, como diz Gregório numa homilia. Assim, pela comida e pela bebida entende-se o deleite da bem-aventurança, pelas riquezas, a suficiência pela qual ao homem basta Deus, pelo reinado, a exaltação do homem até a união com Deus.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Os referidos bens, que servem à vida animal, não cabem à vida espiritual, na qual consiste a bem-aventurança perfeita. E contudo, haverá nesta a reunião de todos os bens, pois, tudo o que estes têm de bom, há-de totalmente conter-se na suma fonte deles.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Segundo Agostinho (6), do galardão dos Santos não se diz que estejam nos céus corpóreos, mas, por céus entende-se a altura dos bens espirituais. – Contudo, haverá para os bem-aventurados um lugar corpóreo, que é o céu empíreo, não que este seja necessário à bem-aventurança, senão por uma como congruência e decoro.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:

1. III De Consol.
2. De lib. Arb., 2, c. 19.
3. I Ethic.
4. Q. 3 a. 5 ad 1.
5. X Ethic.
6. De Serm. Dom. in monte, L. 1, cap. 5.

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