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03/01/2013

Tratado da bem-aventurança 30


Questão 4: Do necessário à bem-aventurança.



Art. 6 — Se a perfeição do corpo é necessária à perfeita bem-aventurança do homem.

(III, q. 15, a. 10, IV Sent., dist. XLIX, q. 4, a. 5, q ª2).

O sexto discute-se assim. — Parece que a perfeição do corpo não é necessária à perfeita bem-aventurança do homem.



1. — Pois, a perfeição do corpo é um bem temporal. Ora, como já se demonstrou (1), a bem-aventurança não consiste nos bens corpóreos. Logo, à bem-aventurança do homem não é necessária nenhuma perfeita disposição do corpo.

2. Demais. — A bem-aventurança do homem consiste na visão da divina essência, como já se demonstrou (2). Ora, para esta operação em nada contribui o corpo, conforme se disse (3). Logo, nenhuma disposição do corpo é necessária à bem-aventurança.

3. Demais. — Quanto mais abstracto do corpo for o intelecto, tanto mais perfeitamente intelige. Ora, a bem-aventurança consiste na operação perfeitíssima do intelecto. Logo, a alma há-de necessariamente, de todos os modos, ser abstracta do corpo. Portanto, de nenhum modo é necessária qualquer disposição deste para a bem-aventurança.

Mas, em contrário. — O prémio da virtude é a bem-aventurança, donde o dito da Escritura (Jo 13, 17): Bem-aventurados sereis, se as praticardes. Mas por seu lado, é prometida aos Santos, como prémio, não só a visão de Deus e o deleite, mas também a boa disposição do corpo, segundo Isaías (Is 66, 14): Vós o vereis, e folgará o vosso coração, e os vossos ossos como erva brotarão. Logo, a boa disposição do corpo é necessária à bem-aventurança.

Se nos referimos à bem-aventurança do homem tal qual pode ser obtida nesta vida, é claro que ela implica a boa disposição do corpo. Pois, essa bem-aventurança consiste, segundo o Filósofo (4), na operação da virtude perfeita. Ora, é manifesto, que pela invalidade do corpo o homem pode ser impedido de toda actividade virtuosa.

Se nos referimos porém à bem-aventurança perfeita, então alguns afirmam que lhe não é necessária nenhuma disposição do corpo, antes é necessário que a alma esteja completamente separada dele. E por isso Agostinho cita as palavras de Porfírio: para a alma ser feliz deve estar separada de qualquer corpo (5). — Mas tal doutrina é inadmissível, porque sendo natural à alma estar unida a um corpo, não é possível que a perfeição dela exclua a sua natural perfeição.

Donde, devemos admitir que à bem-aventurança perfeita implica a todos os respeitos, a perfeita disposição do corpo, tanto antecedente como consequentemente. — Antecedentemente, porque, como diz Agostinho (6), sendo o corpo tal que o seu governo seja difícil e oneroso, como a carne que corrompe e onera a alma, a alma desvia-se da visão do sumo céu. Donde conclui que, quando o corpo actual já não for animal, mas espiritual, então equiparar-se-á aos anjos e ser-lhe-á glória o que lhe foi empecilho. — E consequentemente, porque a bem-aventurança da alma redundará no corpo, de modo que este entre em posse da sua perfeição. E por isso diz Agostinho: Deus fez a alma de tão poderosa natureza, de modo a redundar a sua pleníssima bem-aventurança, em a natureza inferior, o vigor da incorrupção (7).

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A bem-aventurança não consiste no bem corpóreo, como seu objecto, mas, tal bem pode contribuir para o decoro ou perfeição da bem-aventurança.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Embora o corpo não contribua, em nada, para a operação do intelecto pela qual vemos a essência de Deus, pode contudo impedir essa visão. Por isso, é necessária a perfeição do corpo para não ficar impedida a elevação da mente.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A perfeita operação do intelecto implica por certo a separação deste corpo corruptível, que onera a alma, não porém a do corpo espiritual, que estará totalmente sujeito ao espírito. E disto tratará a terceira parte desta obra8.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:

1. Q. 2.
2. Q. 3 a. 8.
3. Q. 4, a. 5.
4. I Ethic.
5. XII De civ. Dei.
6. XII Super Gen. ad litt.
7. Ad Dioscorum.
8. Suppl. q. 82 ss

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