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23/12/2012

Tratado da bem-aventurança 19


Questão 3: Que é a bem-aventurança.



Art. 3 — Se a bem-aventurança consiste também na actividade dos sentidos.

(III Cont. Gent., cap. XXXIII. Compend. Theol., part. II, cap. IX, I Ethic., lect. X).

O terceiro discute-se assim. — Parece que a bem-aventurança consiste na actividade dos sentidos.


1. — Pois, não há nenhuma actividade do homem superior à sensitiva, a não ser a intelectiva. Ora, em nós, esta depende daquela, porque não podemos inteligir sem o fantasma, como diz Aristóteles (1). Logo, a bem-aventurança consiste também na actividade sensitiva.

2. Demais. — Boécio diz, que a bem-aventurança é o estado perfeito pela reunião de todos os bens (2). Mas certos bens são sensíveis e nós atingimo-los por operação do sentido. Logo, esta é necessária para a bem-aventurança.

3. Demais. — A bem-aventurança é o bem perfeito, como prova Aristóteles (3), o que não seria se o homem por ela não se aperfeiçoasse relativamente a todas as suas partes. Ora, algumas destas partes aperfeiçoam-se pelas operações sensitivas. Logo, elas são necessárias para a bem-aventurança.

Mas, em contrário. — A actividade sensitiva é-nos comum com os animais. Ora, a bem-aventurança não é comum. Logo, esta não consiste na operação sensitiva.

Uma coisa pode respeitar à bem-aventurança de três modos: essencial, antecedente e consequentemente.

Essencialmente, por certo, não pode a actividade sensitiva dizer-lhe respeito, pois, a bem-aventurança do homem consiste essencialmente na sua união com o bem incriado, que é o último fim, como já se demonstrou, e o homem não se pode unir a ele pela actividade dos sentidos. E semelhantemente, porque também, como já se demonstrou, a bem-aventurança do homem não pode consistir nos bens corpóreos, únicos que alcançamos pela operação do sentido.

Porém a actividade dos sentidos pode concernir à bem-aventurança, antecedente e consequentemente. — Antecedentemente, quanto à bem-aventurança imperfeita, tal como pode ser obtida na vida presente, pois, a operação do intelecto pre-exige a do sentido. — Consequentemente, quanto à perfeita bem-aventurança, que é esperada no céu, pois, após a ressurreição, da bem-aventurança própria da alma, como diz Agostinho (4), haverá uma certa refluência para o corpo e os sentidos corpóreos, de modo que se aperfeiçoem nas suas operações, e isto resultará mais claro quando se tratar, a seguir, da ressurreição dos corpos. E então, o acto pelo qual a alma humana se une a Deus, não dependerá do sentido.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A objecção aduzida prova que a operação do sentido exigida, antecedentemente, para a bem-aventurança imperfeita, tal como ela pode ser adquirida nesta vida.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A bem-aventurança perfeita, tal como os anjos a têm, absorve todos os bens pela união com a fonte universal de todo o bem, e ele não precisa, para isso, de cada um dos bens particulares. Mas para a bem-aventurança imperfeita actual, é necessária a reunião dos bens suficientes à mais perfeita actividade desta vida.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Na bem-aventurança perfeita o homem aperfeiçoa-se totalmente, mas quanto à parte inferior, por uma redundância da superior. Porém na bem-aventurança imperfeita da vida presente, inversamente, da perfeição da parte inferior procede-se à da superior.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:

1. III De Anima
2. III De Consol.
3. I Ethic.
4. Epistola ad Dioscorum

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