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15/12/2012

Tratado da bem-aventurança 11


Questão 2: Em que consiste a bem-aventurança do homem.

Art. 3 — Se a felicidade do homem consiste na glória.




(III Cont. Gent., cap. XXIX).

O terceiro discute-se assim. — Parece que a bem-aventurança do homem consiste na glória.


1. — Pois, a bem-aventurança consiste no que é atribuído aos santos em recompensa das tribulações sofridas no mundo. Ora, tal é a glória, segundo diz a Escritura (Rm 8, 18): As penalidades da presente vida não têm proporção alguma com a glória vindoura que se manifestará em nós. Logo, a bem-aventurança consiste na glória.

2. Demais. — Como se vê em Dionísio, o bem é difundido de si. Ora, pela glória principalmente é que o bem do homem chega ao conhecimento dos outros, pois, como diz Ambrósio (Agostinho) ela não é senão um conhecimento glorioso acompanhado de louvor. Logo, a bem-aventurança do homem consiste na glória.

3. Demais. — A bem-aventurança é o mais estável dos bens. Ora, tal é a fama ou glória, pela qual os homens de certo modo conseguem a eternidade. Donde o dizer Boécio: Mostrai-vos perpetuadores da vossa imortalidade quando buscais a fama nos tempos futuros. Logo, a bem-aventurança consiste na fama ou glória.

Mas, em contrário. — A bem-aventurança é o verdadeiro bem do homem. Ora, a fama ou glória pode ser falsa, pois, como diz Boécio, muitos conseguiram as falsas opiniões do vulgo, muitas vezes, um grande nome. E que de mais torpe se pode pensar? Pois, os que são apregoados falsamente hão de eles próprios se envergonhar dos seus louvores. Logo, a bem-aventurança do homem não consiste na fama ou glória.

É impossível a bem-aventurança do homem consistir na fama ou glória humana. Pois, a glória não é senão um conhecimento glorioso acompanhado de louvor, como diz (Agostinho) Ambrósio. Ora, a causa conhecida refere-se, de certo modo, ao conhecimento humano, e de outro, ao divino, pois aquele é causado pela coisa conhecida, e este é a causa desta. Donde, a perfeição do bem humano, chamada bem-aventurança, não pode ser causada pelo conhecimento humano, mas antes, este procede da bem-aventurança de alguém e é, de certo modo, causado pela própria bem-aventurança humana, incoada ou perfeita. E logo, a bem-aventurança não pode consistir na fama ou na glória do homem, mas o bem deste depende, como da causa, do conhecimento de Deus. Portanto, da glória existente em Deus depende, como da causa, a bem-aventurança do homem, conforme aquilo da Escritura (Sl 90, 16): livrá-lo-ei e glorificá-lo-ei, saciá-lo-ei com diuturnidade de dias e mostrar-lhe-ei o meu salvador.

Mas também devemos considerar, que o conhecimento humano muitas vezes falha, e sobretudo nos singulares contingentes, como os actos humanos. Donde, frequentemente a glória humana é falaz. Mas como Deus não pode enganar-se, a sua glória é sempre verdadeira, e por isso diz a Escritura (2 Cor 10, 18): O que é estimável é aquele a quem Deus recomenda.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — O Apóstolo não se refere, no passo aduzido, à glória procedente dos homens, mas da que procede de Deus, em face dos seus anjos. Por isso diz o Evangelho: O Filho do homem o confessará (na glória do seu Pai) ante os anjos de Deus.

RESPOSTA À SEGUNDA. — O bem de um homem, que está no conhecimento de muitos, pela fama ou pela glória, se esse conhecimento for verdadeiro necessariamente há-de derivar do bem nesse homem existente, e então pressupõe a bem-aventurança perfeita ou incoada. Se porém for falso, não concorda como o objecto e então não existe o bem no que é celebrado pela fama. Donde é claro que a fama de nenhum modo pode tornar o homem feliz.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A fama não tem estabilidade, antes, o falso rumor facilmente se perde, e se por vezes perseverar estável, sê-lo-á por acidente. Ora, a bem-aventurança tem por si e sempre a estabilidade.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.

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