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14/09/2012

Tratado sobre o Homem 73


Questão 86: Do que o nosso intelecto conhece nas coisas materiais.


Art. 4 — Se o nosso intelecto conhece os futuros.


(Supra, q. 57, a. 3; IIª IIae, q. 95, a. 1; q. 172, a. 1; I Sent., dist. XXXVIII, a. 5, ad; II, dist. VII, q. 2, a. 2; III Cont. Gent., cap. CLIV; De Verit. Q. 8, a. 12; De Malo, q. 16, a. 7; Compend. Theol., cap. CXXXIII; In Isai., cap. III).

O quarto discute-se assim. ― Parece que o nosso intelecto conhece as coisas futuras.

1. ― Pois, o nosso intelecto conhece pelas espécies inteligíveis, que abstrai das condições particulares de lugar e tempo; e por isso elas se referem indiferentemente a todos os tempos. Ora, ele pode conhecer o presente. Logo, também as coisas futuras.

2. Demais. ― O homem, mesmo quando privado dos sentidos, pode conhecer certos futuros, como é patente nos adormecidos e nos frenéticos. Ora, essa privação dos sentidos dá maior vigor à inteligência. Logo, o intelecto, por si mesmo, pode conhecer as coisas futuras.

3. Demais. ― O conhecimento intelectivo do homem é mais eficaz do que qualquer conhecimento dos brutos. Ora, certos animais preveem certos futuros; assim, as gralhas pequenas, frequentemente crocitando, anunciam a chuva que em breve virá. Logo, com maioria de razão, o intelecto humano pode conhecer as coisas futuras.

Mas, em contrário, diz a Escritura (Ecle 8, 6-7): É muita a aflição do homem, porque ignora as coisas passadas, e por nenhum mensageiro pode saber as futuras.

Sobre o conhecimento dos futuros deve distinguir-se, do mesmo modo que sobre o dos contingentes. Pois, os futuros, enquanto sujeitos ao tempo, são singulares, que o intelecto humano não conhece senão pela reflexão, como já se disse antes (a. 1). Porém, as noções dos futuros podem ser universais e perceptíveis pelo intelecto, de modo que se pode ter ciência delas. Para tratarmos, porém, completamente do conhecimento dos futuros, deve-se saber que podem ser conhecidos de duplo modo: em si mesmos e nas suas causas. Em si mesmos, só podem ser conhecidos por Deus, a quem estão presentes, quando ainda são futuros, no decurso das causas; pois o olhar eterno de Deus domina, simultaneamente, todo o decurso do tempo como já se disse antes (q. 14, a. 13), quando se tratou da ciência de Deus. Mas, nas suas causas, podem ser conhecidos também de nós. E se provêm das causas necessariamente, são conhecidos com a certeza da ciência; assim, o astrólogo conhece o eclipse futuro. Se porém provêm das causas, no mais das vezes, então podem ser conhecidos por conjectura mais ou menos certa, conforme as causas forem mais ou menos inclinadas para os efeitos.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― A objeção procede, quanto ao conhecimento por meio das noções universais das coisas; pelas quais os futuros podem ser conhecidos segundo a dependência do efeito em relação à causa.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Como diz Agostinho, a alma recebe uma certa colaboração do acaso de modo que, por sua natureza pode conhecer os futuros. Assim, quando se retrai dos sentidos corpóreos e, de certo modo, volta-se para si mesma, torna-se participante do conhecimento dos futuros. Tal opinião seria racional se admitíssemos que a alma adquire o conhecimento das causas pela participação das ideias, como ensinavam os Platónicos; porque então, ela conheceria, por natureza, as causas universais de todos os efeitos, mas ficaria impedida pelo corpo; de modo que, uma vez separada dos sentidos, conheceria os futuros. Ora, este modo de conhecer não é conatural ao nosso intelecto, que tira dos sentidos os elementos do seu conhecimento. Donde, não é por natureza que a alma, quando separada dos sentidos, conhece os futuros; mas é, antes, pela impressão de certas causas superiores espirituais e corporais. ― Espirituais, como quando, pelo ministério dos anjos, com a virtude divina, o intelecto humano é iluminado e os fantasmas são ordenados ao conhecimento de certos futuros. Ou também quando, por operação dos demônios produz-se uma comoção na fantasia, designando de antemão certos futuros, que os demônios conhecem, como já se disse antes (q. 57, a. 3). Ora, essas impressões das causas espirituais a alma pode naturalmente recebê-las, sobretudo quando separada dos sentidos; porque, então, se torna mais próxima das substâncias espirituais e mais livre das agitações exteriores. ― Mas também o facto pode sedar pela impressão das causas superiores corporais; pois, é manifesto que os corpos superiores causam impressão nos inferiores. Donde, como as virtudes sensitivas são actos dos órgãos corpóreos, é consequente que a impressão dos corpos celestes cause, de certo modo, imutação na fantasia. E por isso, sendo os corpos celestes causa de muitos futuros, produzem-se na imaginação sinais de certos deles. E tais sinais são percebidos mais de noite, pelos que dormem, do que de dia, pelos que estão acordados; porque, como diz Aristóteles, as coisas transmitidas de dia dissipam-se facilmente; ao passo que o ar da noite é tranquilo porque as noites são mais silenciosas. E despertam o sentido, no corpo, por causa do sono; pois, os pequenos movimentos interiores são sentidos mais pelos adormecidos do que pelos acordados. Ora, esses movimentos produzem os fantasmas, pelos quais são previstos os futuros.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Os brutos nada têm, acima da fantasia, que ordene os fantasmas, como os homens, que têm a razão; e por isso, a fantasia dos brutos é consequente, totalmente, à impressão celeste. Donde, pelos movimentos deles podem-se conhecer certos futuros, como a chuva e outros, mais do que pelo movimento dos homens, que se movem pelo conselho da razão. E por isso diz o Filósofo: há certos homens imprudentíssimos que são previdentes em sumo grau; porque a inteligência deles não é trabalhada de cuidados; mas, deserta e vazia de tudo é, quando movida, como que levada pelo motor.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama

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