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30/08/2012

Tratado sobre o homem 58

Questão 84: Por meio do que a alma, unida ao corpo, intelige as coisas corpóreas.

Art. 5 ― Se a alma intelectiva conhece as coisas materiais nas razões eternas.

(Supra, q. 12 a. 2 ad 3; De Verit., q. 8, a. 7, ad 13; q. 1a. 8 ).

O quinto discute-se assim. ― Parece que a alma intelectiva não conhece as coisas materiais nas razões eternas.

1. ― Aquilo, pelo que alguma coisa é conhecida, é objecto de conhecimento maior e anterior. Ora, a alma intelectiva do homem, no estado da vida presente, não conhece as razões eternas, porque não conhece a Deus, em quem existem tais razões e a quem está unido como a um ignoto, segundo diz Dionísio. Logo, a alma não conhece todas as coisas nas razões eternas.

2. Demais. ― A Escritura diz: as coisas invisíveis de Deus vêm-se por aquelas que foram feitas. Logo, entre as coisas invisíveis de Deus enumeram-se as razões eternas. Portanto, estas razões são conhecidas pelas criaturas materiais, e não inversamente.

3. Demais. ― As razões eternas não são senão as ideias. Pois, Agostinho diz, que as ideias são as razões estáveis das coisas existentes na mente divina. Se, portanto, se admite que a alma intelectiva conhece todas as coisas nas razões eternas, há-de admitir-se a opinião de Platão, ensinando que toda ciência deriva das ideias.

Mas, em contrário, diz Agostinho: Se ambos vemos ser verdade o que dizes, e ambos vemos ser verdade o que digo, onde, pergunto, o vemos? Por certo não o vejo eu em ti, nem tu em mim, mas ambos o vemos na verdade incomutável superior às nossas mentes. Ora, a verdade incomutável está contida nas razões eternas. Logo, a alma intelectiva conhece todas as coisas verdadeiras, nas razões eternas.

Como diz Agostinho, os chamados filósofos, se porventura, disseram algumas coisas verdadeiras e acomodadas à nossa fé, devemos indicá-las a eles, como de possuidores injustos, para o nosso uso. Pois, as doutrinas dos gentios tem certas ficções simuladas e supersticiosas que cada um de nós, saindo da sociedade deles, deve evitar. E por isso Agostinho, que fora imbuído das doutrinas dos Platónicos, tomou o que encontrou ser acomodado à verdade, nos ditos deles; porém o que achou contrário à nossa fé, mudou para melhor. Assim, como já se viu antes, Platão ensinava que as formas das coisas subsistem por si, separadas da matéria, e lhes chamava ideias, por participação das quais – dizia – o nosso intelecto conhece todas as coisas; pois, como a matéria corpórea, participando da ideia de pedra, faz-se pedra, assim o nosso intelecto, por participação da mesma ideia, conhece a pedra. Ora, é alheio à fé que as formas das coisas subsistam por si, fora delas, sem matéria, como queriam os Platónicos, dizendo que a vida em si ou a sapiência em si, são certas substâncias criadoras, como refere Dionísio. Donde, Agostinho ensinou, em lugar dessas ideias que Platão admitia, que as razões de todas as coisas existem na mente divina, de acordo com as quais todas as coisas são formadas, e segundo as quais também a alma humana conhece tudo.

Quando, pois, se pergunta se a alma humana conhece tudo nas razões eternas, deve responder-se que de duplo modo se pode dizer que uma coisa é conhecida em outra. ― De um modo, como no objecto conhecido; como quando alguém vê num espelho as coisas cujas imagens nele se refletem. E deste modo, a alma, no estado da vida presente, não pode ver tudo nas razões eternas; pois esse é o conhecimento dos bem-aventurados que vêm a Deus e, nele, tudo. ― De outro modo, diz-se que uma coisa é conhecida em outra, como no princípio da cognição; como quando dizemos que no sol se vêm as coisas vistas por meio do sol. E assim, necessário é admitir que a alma humana conhece tudo nas razões eternas, por cuja participação conhecemos todas as coisas. Pois, o mesmo lume intelectual existente em nós não é senão uma semelhança participada do lume incriado, no qual estão contidas as razões eternas. Donde, diz a Escritura: Muitos dizem: Quem nos patenteará os bens? A cuja pergunta o Salmista dá a seguinte resposta: Gravada está sobre nós, Senhor, a luz do teu rosto; como se dissesse: pela sigilação mesma do divino lume em nós todas as coisas são reveladas.

Como, porém, além do lume intelectual, são necessárias, em nós, espécies inteligíveis derivadas das coisas, para que possamos ter ciência das coisas materiais, por isso, não é só pela participação das razões eternas que temos ciência destas, como ensinavam os Platónicos, dizendo que só a participação das ideias basta para a aquisição da ciência. Donde, diz Agostinho: Pois, pelo facto de os filósofos terem persuadido, com ensinamentos certíssimos que, pelas razões eternas se fazem todas as coisas temporais, puderam, por isso, contemplar nessas razões ou delas coligir quantos são os géneros dos animais e quais as origens de cada um? Pois, não indagaram todas estas coisas pela história dos lugares e dos tempos?

E que Agostinho não era de opinião que todas as coisas são conhecidas nas razões eternas, ou na verdade incomutável, como se essas próprias razões fossem vistas, é claro pelo que diz em outro passo: assegura-se, que não toda e qualquer alma racional é idónea para essa visão; a saber, das razões eternas, mas a que for santa e pura; como são as almas dos bem-aventurados.

E daqui se deduzem as RESPOSTAS ÀS OBJEÇÕES.

Nota: Revisão da tradução para português por ama

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