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29/08/2012

Tratado sobre o homem 57

Questão 84: Por meio do que a alma, unida ao corpo, intelige as coisas corpóreas.

Art. 4 — Se as espécies inteligíveis efluem, para a alma, de algumas foras separadas.

(De Verit., q. 10 a. 6; q. 11, a. 1; Qu. De Anima, a. 15 ).

O quarto discute-se assim. ― Parece que as espécies inteligíveis efluem, para a alma, de algumas formas separadas.

1. ― Todo o ser participado é causado por um ser essencial; assim, um corpo ígneo se reduz ao fogo, como à sua causa. Ora, a alma intelectiva, enquanto intelige em acto, participa dos inteligíveis; pois, o intelecto em acto é, de certo modo, a coisa inteligida em acto. Logo, as coisas que, em si e por essência, são inteligidas em acto, são as causas de a alma intelectiva inteligir em acto. Ora, as coisas inteligidas em acto, por essência, são formas agentes, sem matéria. Logo, as espécies inteligíveis pelas quais a alma intelige são causadas por certas formas separadas.

2. Demais. ― Os inteligíveis estão para a coisa inteligida como os sensíveis para o sentido. Ora, os sensíveis, que estão em acto, fora da alma, são as causas dos mesmos sensíveis que estão no sentido e pelos quais sentimos. Logo, as espécies inteligíveis, pelas quais o nosso intelecto intelige, são causadas por certos inteligíveis em acto existentes fora da alma. Ora, estes não são senão formas separadas da matéria. Logo, as formas inteligíveis do nosso intelecto efluem de certas substâncias separadas.

3. Demais. ― Tudo o que está em potência se reduz ao acto por aquilo que já está no acto. Portanto, a causa de o nosso intelecto, ser primeiramente potencial, e em seguida inteligir em acto, é algum intelecto sempre actual. Ora, este é o intelecto separado. Logo, é por certas substâncias separadas que são causadas as espécies inteligíveis pelas quais inteligimos em acto.

Mas, em contrário, se fosse assim, não precisaríamos dos sentidos para inteligir. O que é evidentemente falso, principalmente pelo facto de não poder, de nenhum modo, quem carece de um sentido ter ciência dos sensíveis desse sentido.

Alguns ensinaram que as espécies inteligíveis do nosso intelecto procedem de certas formas ou substâncias separadas. E isso, de duplo modo.

Assim, para Platão, como já se disse, as formas das coisas sensíveis são subsistentes por si, sem matéria; p. ex., a forma do homem a que chamava homem em si, a forma ou ideia do cavalo, a que chamava cavalo em si, e assim por diante. Ora, tais formas separadas, ensinava, são participadas tanto pela nossa alma como pela matéria corpórea; por aquela, a fim de conhecer; por esta, a fim de existir. Pois, assim como a matéria corpórea, participando da ideia da pedra, faz-se pedra, assim o nosso intelecto, participando dessa mesma ideia intelige a pedra. E a participação da ideia faz-se por uma certa semelhança da ideia mesma, naquele que dela participa, ao modo pelo qual o exemplar é participado pelo exemplado. Portanto, ensinando que as formas sensíveis, existentes na matéria corpórea, efluem das ideias, como certas semelhanças delas que são, ensinava também que as espécies inteligíveis do nosso intelecto são certas semelhanças das ideias das quais efluem. E por isso, como se disse antes, Platão referia as ciências e as definições às ideias. Mas, sendo contra – essência das coisas sensíveis que as formas delas subsista sem as matérias, como Aristóteles o prova superabundantemente, por isso Avicena, rejeitando tal posição, ensinou que as espécies inteligíveis de todas as coisas, não subsistem, por certo, sem matéria, mas preexistem imaterialmente, nos intelectos separados. E destes derivam, primariamente, tais espécies para o intelecto seguinte; e assim por diante, até o último intelecto separado, a que chamava intelecto agente, do qual, como dizia, efluem as espécies inteligíveis para as nossas almas, e as formas sensíveis, para a matéria corpórea. ― E assim, Avicena concorda com Platão em que as espécies inteligíveis do nosso intelecto efluem de certas formas separadas; ao passo que, para Platão, elas subsistem por si, como o refere Aristóteles, para Avicena elas existem no intelecto agente. E ainda Avicena, diferindo de Platão, ensina que as espécies inteligíveis não permanecem no nosso intelecto, depois de ter este acabado de inteligir em acto, sendo preciso que o intelecto se converta a recebê-las de novo, reiteradamente. Donde, não admite que a ciência seja naturalmente inata na alma, como Platão, que ensinava permanecerem na alma, imovelmente, as participações das ideias. Mas, segundo tal posição, não se poderia dar a razão suficiente porque a nossa alma está unida ao corpo. Pois, não se poderia dizer que a alma intelectiva está unida ao corpo, por causa do corpo; porque, nem a forma existe para a matéria, nem o motor para o móvel, mas antes, ao contrário. Mas, principalmente, o corpo é necessário à alma intelectiva para a operação que lhe é própria, que é o inteligir, pois, pela sua essência, não depende do corpo. Se, pois, a alma fosse apta, por natureza, a receber as espécies inteligíveis, por influência somente de certos princípios separados, sem que as recebesse pelos sentidos, não precisaria, então, de corpo para inteligir e em vão estaria unida ao corpo. E nem é suficiente dizer que a nossa alma precisa dos sentidos para inteligir, sendo por eles excitada, de certo modo, à consideração das coisas, cujas espécies inteligíveis recebe, dos princípios separados. Porque tal excitação não é necessária à alma, senão por estar de certo modo adormecida, segundo os Platónicos, e esquecida, por causa da união com o corpo. De modo que, então, os sentidos só serviriam à alma intelectiva para eliminar o impedimento que lhe advém da união com o corpo. Logo, resta indagar qual a causa da união da alma com o corpo. Ora, não basta admitir, com Avicena, que os sentidos são necessários à alma, para, excitada por eles, se converter à inteligência agente, da qual recebe as espécies. Porque, se estivesse na natureza da alma inteligir por espécies influídas da inteligência agente, seguir-se-ia que, às vezes; a alma poderia converter-se à inteligência agente, por inclinação da sua natureza; ou ainda, excitada por um sentido, poderia converter-se a tal inteligência para receber as espécies de sensíveis próprios a outro sentido de que, p. ex., alguém estivesse privado. E, então, o cego de nascença poderia ter ciência das cores, coisa manifestamente falsa. ― Donde, deve concluir-se que as espécies inteligíveis, pelas quais a nossa alma intelige, não efluem de formas separadas.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― As espécies inteligíveis, participadas pelo nosso intelecto, reduzem-se, como à causa primeira, a algum princípio inteligível por sua essência, que é Deus. E desse princípio procedem, mediante as formas das coisas sensíveis e materiais, das quais obtemos a ciência, como diz Dionísio.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― As coisas materiais, segundo o ser que têm fora da alma, podem ser sensíveis em acto, não porém, inteligíveis em acto. Donde não há símile entre o sentido e o intelecto.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― O nosso intelecto possível reduz-se da potência ao acto por algum ser em acto, ou seja, pelo intelecto agente, que é uma virtude da nossa alma, como já se disse; e não por algum intelecto separado, como pela causa próxima, embora talvez como pela causa remota.

Nota: Revisão da tradução para português por ama

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