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04/08/2012

Tratado sobre o homem 33

Questão 79: Das potências intelectivas.

Art. 6 ― Se a memória está na parte intelectiva da alma.

(Iª IIae q. 67, a. 2; I Sent., dist. III q. 4, a. 1; III, dist. XXVI, q. 1, a. 5 ad. 4; IV, dist. XLIV, q. 3, a. 3qª 2, ad 4; dist. L, q. 1, a. 2; II Cont. Gent., cap. LXXIV; De Verit., q. 10, a. 2; q. 19, a. 1; Quodl. III, q. 9, a. 1; XII, q. 9, a. 1; I Cor., cap. XIII, lect. III; De Mem. et Remin., lect. II).

O sexto discute-se assim. ― Parece que a memória não está na parte intelectiva da alma.

1. ― Pois, Agostinho diz que aquelas coisas que não são comuns aos homens e aos animais à pertencem parte superior da alma pertencem à parte superior da alma. Ora, a memória é comum a uns e a outros, pois, o mesmo autor diz, que os animais podem sentir, pelos sentidos do corpo, as coisas corpóreas, e mandá-las à memória. Logo, a memória não pertence à parte intelectiva da alma.

2. Demais. ― A memória guarda as coisas pretéritas. Mas pretérito refere-se a um tempo determinado. Logo, a memória é cognoscitiva das causas, num determinado tempo, o que é conhecê-las local e actualmente. Ora, isto não é próprio do intelecto, mas do sentido. Logo, a memória não está na parte intelectiva, mas só na sensitiva.

3. Demais. ― Na memória conservam-se as espécies das coisas que não são pensadas actualmente. Ora, isso não se pode dar com o intelecto, pois este actualiza-se informado pela espécie inteligível; ora, como o intelecto em acto é o próprio inteligir, em acto, resulta que o intelecto intelige actualmente todas as coisas cujas espécies traz em si. Logo, a memória não está na parte intelectiva.

Mas, em contrário, Agostinho diz que a memória, a inteligência e a vontade são uma somente.

Sendo da natureza da memória conservar as espécies das coisas não actualmente apreendidas, é preciso, antes de tudo, examinar se as espécies inteligíveis se podem conservar desse modo, no intelecto. Ora, Avicena ensinava que isso é impossível, dizendo que tal se dá com certas potências, actos de órgãos corpóreos, nas quais podem conservar-se algumas espécies sem a apreensão actual. Porém no intelecto, que não tem órgão corpóreo, nada existe senão inteligivelmente. Donde é necessário ser inteligido em acto aquilo cuja semelhança existe no intelecto. Assim, pois, na opinião dele, logo que alguém acaba de inteligir alguma coisa em acto, acaba de existir a espécie dessa coisa no intelecto; sendo necessário, se quiser de novo inteligir tal coisa, converter-se ao intelecto agente, que Avicena admite como substância separada, para que dele efluam as espécies inteligíveis para o intelecto possível. E desse exercício e uso de se converter ao intelecto agente, resulta, segundo o mesmo filósofo, uma certa habilidade, para o intelecto possível, de se converter ao intelecto agente, e dizia ser o hábito da ciência. Segundo, pois, tal opinião, nada se conserva, na parte intelectiva, que não seja inteligido em acto. Por isso, não se pode admitir, desse modo, a memória na parte intelectiva.

Essa opinião, porém, manifestamente repugna às palavras de Aristóteles, dizendo que o intelecto possível, quando considerado em acto, torna-se, como ciente, nas coisas singulares; o que, porém, acontece, quando ele pode operar por si mesmo. Está, pois, então, em potência, de certo modo; não, porém, absolutamente, como antes de aprender ou descobrir. Ora diz-se que o intelecto possível se torna nas coisas singulares, recebendo as espécies delas. Donde, recebendo as espécies dos inteligíveis, pode operar quando quiser, mas não operar sempre; porque então está, de certo modo, em potência, embora de maneira diferente da de antes de inteligir, a saber, do modo pelo qual o ciente habitual está em potência para considerar em acto. ― Demais, tal opinião também repugna à razão. Pois, o que é recebido em algum ser é-o ao modo do ser recipiente. Ora, o intelecto é de natureza mais estável e imóvel do que a matéria corpórea. Se, portanto, esta conserva as formas que recebe, não só enquanto, por elas, age actualmente, mais ainda depois que cessou de agir pelas mesmas; com muito maior razão, o intelecto, imóvel e inadmissivelmente, recebe as espécies inteligíveis, tanto as recebidas dos sentidos, como as dimanadas de algum intelecto superior.

Se, portanto, se entende a memória somente como a virtude conservadora das espécies, é necessário admiti-la como existente na parte intelectiva. Se, porém, a natureza dela é ter como objecto o pretérito como tal, então não existe na parte intelectiva, senão só na sensitiva, apreensora dos particulares. Pois, o pretérito, como tal, exprimindo o ser, num determinado tempo, tem a condição do particular.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― A memória, como conservativa das espécies, não nos é comum com os animais; pois, aquelas se conservam, não somente na parte sensitiva da alma, mas sobretudo no conjunto, porque a virtude memorativa é o acto de um órgão. Porém o intelecto, em si, é conservativo das espécies, mesmo sem a cooperação do órgão corpóreo. E, por isso, o Filósofo diz que a alma é o lugar das espécies, não toda ela, mas só o intelecto.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― A preterição tem duplo ponto de referência: o objecto conhecido e o acto do conhecimento; ambos simultaneamente se unem na parte sensitiva, apreensiva das coisas, quando sofre mutação proveniente do sensível presente. Por onde, é simultaneamente que o animal se lembra de que, primeiro, sentiu no passado, e depois, de que sentiu um certo pretérito sensível. Mas, no atinente à parte intelectiva, a preterição é acidental e não conveniente por si mesma, quanto ao objecto do intelecto. Pois, o intelecto intelige o homem como tal. Ora, a este, como tal, é-lhe acidental estar no presente, no pretérito ou no futuro. Quanto ao acto, porém, a preterição pode ser admitida, em si, tanto no intelecto como no sentido; porque o inteligir da nossa alma é um acto particular existente num determinado tempo, segundo o qual é considerado inteligir agora, ontem ou amanhã. O que não repugna à intelectualidade; porque tal inteligir, embora seja um particular é, contudo, um acto imaterial, como antes já se disse (q. 76, a. 1), tratando-se do intelecto. E, portanto, assim como o intelecto se intelige a si mesmo, embora seja um intelecto singular; assim também intelige o seu inteligir, que é um acto singular, existindo no pretérito, no presente ou no futuro. Assim, pois, fica salva a natureza da memória, quanto a referir-se às coisas passadas, no intelecto, e segundo os quais ela se intelige como tendo inteligido anteriormente; não porém enquanto intelige o pretérito, local e actualmente determinado.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― As espécies inteligíveis ora estão no intelecto só potencialmente, e então o intelecto é chamado potencial; ora estão segundo o acabamento último do acto e, então, o intelecto intelige em acto; ora, estão de um modo intermédio entre a potência e o acto, e então o intelecto chama-se habitual; e, deste último modo, o intelecto conserva as espécies, mesmo quando não as intelige em acto.

Nota: Revisão da tradução para português por ama

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