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13/07/2012

Tratado sobre o homem 9

Questão 76 Da alma em si mesma
Art. 4 ― Se há, no homem, além da alma intelectiva, outra forma.

(IV. Sent., dist. XLIV, q; 1, a. 1, qª 1, ad 4; IV Cont. Gent., cap LXXX De Spirit. Creat., a. 3; Qu. De Anima, a. 9; QuodI. I, q. 4, a.1; XI, q. 5; Compend. Theol., cap. XC).

O quarto discute-se assim. ― Parece que há, no homem, outra forma, além da alma intelectiva.

1. ― Pois, diz o Filósofo, a alma é o acto do corpo físico que tem a vida em potência. Ora, a alma está para o corpo como a forma para a matéria. Mas, o corpo tem uma forma substancial pela qual é corpo. Logo, à alma precede, no corpo outra forma substancial.

2. Demais. ― O homem, bem como qualquer animal, move-se a si mesmo. Ora, todo ser que se move a si mesmo divide-se em duas partes, uma motora e, outra, movida, como o prova Aristóteles. Ora, a parte motora sendo a alma, é necessário que a outra parte seja tal, que possa ser movida. Mas, a matéria-prima não pode ser movida, apenas por ser potencial, como prova Aristóteles; e, tudo o que é movido é corpo. Logo, é necessário que, no homem e em qualquer animal, haja outra forma substancial pela qual seja constituído o corpo.

3. Demais. ― A ordem das formas depende da tendência delas para a matéria-prima; pois, anterior e posterior, dizem-se por comparação com algum princípio. Se, portanto, não houvesse, no homem, nenhuma forma substancial, além da alma racional, mas esta aderisse imediatamente à matéria-prima, daí resultaria que a alma pertence à ordem das formas as mais imperfeitas, que aderem imediatamente à matéria.

4. Demais. ― O corpo humano é um corpo misto. Ora, a missão não se opera só pela matéria, porque, então, só haveria corrupção. Logo, é necessário que permaneçam as formas dos elementos, no corpo misto, que são as formas substanciais. Portanto, no corpo humano, há outras formas substanciais, além da alma intelectiva.

Mas, em contrário. ― Uma mesma coisa tem um só ser substancial. Ora, como a forma substancial é que dá o ser substancial, cada coisa tem só uma forma substancial. Logo, é impossível que haja, no homem, alguma outra forma substancial, além da alma intelectiva.

Se se admitisse, como os Platónicos, que a alma intelectiva não está unida ao corpo, como forma, mas só como motor, seria necessário admitir, no homem, outra forma substancial que constituísse, no seu ser, o corpo, movido pela alma. Mas se, como já dissemos antes (a. 1), a alma intelectiva está unida ao corpo como forma substancial, é impossível haja, no homem, qualquer outra forma substancial, além dela.

Para a evidência do que devemos considerar que a forma substancial difere da acidental, por não esta dar o ser absolutamente mas o ser sob certo aspecto; assim, o calor faz o seu objecto ser, não absolutamente, mas ser quente. Donde, pela proveniência da forma acidental, um ser não é feito ou gerado, absolutamente, senão sob certo aspecto ou de determinado modo; e, semelhantemente, desaparecida a forma acidental, um corpo não se corrompe absolutamente, mas só de certo modo. Ao passo que a forma substancial dá o ser absoluto. Por isso, com a sua proveniência, um ser é gerado, pura e simplesmente; e, pelo seu desaparecimento, fica pura e simplesmente, concorrido. E, por essa razão, os antigos Filósofos da natureza, admitindo a matéria-prima como um ser actual, ao modo do fogo, do ar ou corpos semelhantes, diziam que nenhum ser é, pura e simplesmente, gerado nem corrompido, mas que todo o vir a ser é alteração, como se vê em Aristóteles. Se, portanto além da alma intelectiva, preexistisse, na matéria, qualquer outra forma substancial, que tornasse actual o sujeito da alma, resultaria daí que a alma não dá o ser, pura e simplesmente e, por consequência não é forma substancial; e que, advindo à alma ou separando-se, não haveria geração nem corrupção, pura e simplesmente, mas só sob certo aspecto. Coisas manifestamente falsas.

Donde, deve-se admitir que, além da alma intelectiva, não há no homem nenhuma outra forma substancial; e que esta, assim como, na sua virtude, contém a alma sensitiva e a nutritiva, assim também contém todas as formas inferiores, fazendo, ela só, tudo o que as formas menos imperfeitas fazem nos outros seres.

E o mesmo se deve dizer da alma sensitiva, nos brutos, da nutritiva, nas plantas e, universalmente, de todas as formas mais perfeitas, em relação às mais imperfeitas.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. Aristóteles não diz que a alma é o acto somente do corpo, mas o acto do corpo físico orgânico tendo a vida em potência e, que tal potência não exclui a alma. Donde, é manifesto, a alma também está incluída no ser de que ela é acto, do mesmo modo que o calor é o acto do que é cálido, a luz do que é lúcido; não que, separadamente, haja corpo lúcido sem luz, senão que é lúcido por ela. E, semelhantemente, se diz, que a alma é o acto do corpo, etc., porque, pela alma, é que há corpo, e esse, orgânico com vida potencial. Mas, o acto primeiro é assim chamado em relação ao acto segundo, que é a operação. Portanto, tal potência não rejeita, isto á, não exclui a alma.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― A alma não move o corpo pelo seu ser, enquanto unida a este como forma. Mas, pela potência motora, cujo acto pressupõe o corpo já actualizado pela alma; de modo que esta, pela força motora, é a parte que move, sendo o corpo animado, a parte motora.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Na matéria, consideram-se diversos graus de perfeição, como, ser, viver, sentir e inteligir. Mas, sempre, o que sobrevém, em segundo lugar, é mais perfeito do que o que existe em primeiro. Donde, a forma, que dá só o primeiro grau da perfeição da matéria, é imperfeitíssima; mas, a que dá o primeiro, o segundo e o terceiro, e assim por diante, é perfeitíssima e, contudo imediata à matéria.

RESPOSTA À QUARTA. ― Avicena ensinava que as formas substanciais dos elementos permanecem íntegras no misto; e a mistão faz-se pela redução das qualidades contrárias dos elementos à média. ― Mas isto é impossível. Pois, as diversas formas dos elementos só podem existir nas diversas partes da matéria e, para essas diversidades, é necessário suporem-se as dimensões, sem as quais a matéria não pode ser divisível. Ora, matéria sujeita à dimensão só se encontra no corpo. E, como corpos diversos não podem ocupar o mesmo lugar, segue-se que os elementos estão, no misto, distintos pela situação e, assim, não haverá verdadeira mistão, em relação à totalidade, mas só em relação aos nossos sentidos, o que se dá quando corpos mínimos estão justapostos. ― Porém Averróis ensinava que as formas dos elementos, pela sua imperfeição, são médias entre as formas acidentais e as substanciais e, portanto, admitindo o mais e o menos, ficando, mitigadas, na mistão, reduzem-se ao médio e, deles, se compõe uma só forma. ― Mas, isto ainda é mais impossível. Porque o ser substancial de qualquer coisa é indivisível; e toda adicção ou subtracção varia a espécie, como nos números, conforme diz Aristóteles. Donde, é impossível que qualquer forma substancial seja susceptível de mais e de menos. Nem é menos impossível que haja um meio entre a substância e o acidente. ― E, portanto, deve-se admitir, com o Filósofo, a permanência, não actual, mas virtual, das formas dos elementos, no misto. Permanecem, assim, as qualidades próprias dos elementos, embora mitigados e nas quais está a virtude das formas elementares. E, deste modo, a qualidade da mistão é a disposição própria para receber a forma substancial do corpo misto, por exemplo, a forma da pedra ou de qualquer ser animado.

Nota: Revisão da tradução para português por ama

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