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04/06/2012

Tratado dos anjos 61

Questão 62: Da perfeição dos anjos na existência da graça e da glória.

Art. 9 — Se os anjos beatos podem progredir na beatitude.


O nono discute-se assim. — Parece que os anjos beatos podem progredir na beatitude.

1. — Pois, a caridade é o princípio do mérito. Ora, os anjos têm a caridade perfeita. Logo, os anjos beatos podem merecer. Ora, crescendo com o mérito o prémio da beatitude, os anjos beatos podem progredir nesta.

2. Demais. — Agostinho diz que Deus usa-nos para a nossa utilidade e para a sua bondade; e semelhantemente, dos anjos, os quais usa nos ministérios espirituais, pois eles são espíritos administradores, mandados ao ministério por causa dos que recebem a herança da salvação, conforme a Escritura. Ora, isso em nada lhes seria útil, se por aí não merecessem nem progredissem na beatitude. Conclui-se, portanto, que os anjos beatos podem merecer e progredir na beatitude.

3. Demais. — Só por imperfeição não pode progredir aquele que não está no sumo grau. Ora, os anjos não estão neste grau. Logo, se não podem progredir, resulta que há neles imperfeição e defeito, o que é inconveniente.

Mas, em contrário, merecer e progredir é próprio do estado do viandante. Ora, os anjos não são viandantes, mas compreensores. Logo, os anjos beatos não podem merecer e nem progredir na beatitude.

Em qualquer momento, a intenção do motor visa um fim determinado, ao qual pretende conduzir o móvel; pois, a intenção visa o fim, ao qual repugna o processo ao infinito. Ora, é manifesto, não podendo a criatura racional atingir a beatitude, consistente na visão de Deus, pela sua virtude, como resulta do supradito, ela necessita ser conduzida por Deus à beatitude. Logo, é forçoso haver algo de determinado ao que qualquer criatura racional seja dirigida, como ao último fim. Mas, esse algo determinado não pode se referir, na visão divina, ao objeto mesmo que visto, pois a sua verdade é contemplada, em graus diversos, por todos os bem-aventurados. Porém, quanto ao modo da visão, o termo é de diversos modos pré-fixado, segundo a intenção do dirigente ao fim. Pois, por ser a criatura racional levada a ver a suma essência, não é possível seja levada ao sumo modo da visão, que é a compreensão, modo que só a Deus pode convir, como resulta do sobredito. Mas, sendo necessária eficácia infinita para compreender a Deus, e a eficácia da criatura na visão, não podendo ser senão finita, de infinitos modos, mais ou menos claramente, pode a criatura racional inteligir a Deus, dado que qualquer finito diste, em infinitos graus, do infinito. E como a beatitude consiste na própria visão, assim o grau daquela consiste num certo modo desta. Portanto, toda criatura racional é conduzida por Deus ao fim da beatitude, de modo a alcançar um certo grau desta, por predestinação divina; e conseguido esse grau, não pode atingir outro mais elevado.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O merecer é próprio do que se move para um fim. Ora, a criatura racional move-se para um fim, não somente padecendo, mas também operando. E se esse fim estiver ao alcance da sua operação, esta considera-se aquisitiva do fim; assim o homem, meditando, adquire a ciência. Se porém o fim não estiver ao seu alcance, mas for esperado em virtude de outro, a operação será meritória do fim. Mas, ao que está no último termo não lhe convém mover-se, mas ser movido. Donde, da caridade imperfeita, que é a da via, é próprio o merecer; porém, da perfeita é próprio, não o merecer, mas fruir do prémio. Do mesmo modo que, nos hábitos adquiridos, a operação precedente ao hábito é aquisitiva deste; porém, a proveniente do hábito já adquirido é a operação perfeita acompanhada do prazer. E semelhantemente, o acto da caridade perfeita não tem a natureza do mérito, mas, antes, pertence à perfeição do prémio.

RESPOSTA À SEGUNDA. — De dois modos diz-se que uma coisa é útil. De um, como via para o fim; assim é útil o mérito da beatitude. De outro, como a parte é útil ao todo; assim as paredes, à casa; e deste modo, os ministérios dos anjos são úteis aos anjos beatos, enquanto parte da beatitude deles; pois é da natureza do perfeito, como tal, difundir em outros a perfeição adquirida.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Embora o anjo beato não esteja, no sumo grau da beatitude absoluta, está todavia no último, quanto a si mesmo, por predestinação divina. Contudo, a alegria dos anjos pode ser aumentada por causa da salvação dos salvos, pelo ministério deles, conforme a Escritura: Haverá júbilo entre os anjos de Deus por um pecador que faz penitência. Mas essa alegria respeita o prémio acidental, que certamente pode aumentar até o dia do juízo. Donde vem alguns dizerem que os anjos também podem merecer, quanto ao prémio acidental. Melhor, porém é dizer-se que o bem-aventurado de nenhum modo pode merecer, a menos que não seja simultaneamente viador, como Cristo que, único, foi viador e compreensor. Ora, a alegria predita é, antes, adquirida do que merecida em virtude da beatitude.

Revisão da tradução portuguesa por ama

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