Páginas

20/04/2012

Leitura Espiritual para 20 Abr 2012

Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemariaCaminho 116)


Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.


Para ver, clicar SFF.
Evangelho: Jo 1, 1-18


1 No princípio existia o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. 2 Estava no princípio com Deus. 3 Todas as coisas foram feitas por Ele; e sem Ele nada foi feito. 4 N'Ele estava a vida, e a vida era a luz dos homens, 5 e a luz resplandeceu nas trevas, mas as trevas não O receberam. 6 Apareceu um homem enviado por Deus que se chamava João. 7 Veio como testemunha para dar testemunho da luz, a fim de que todos cressem por meio dele. 8 Não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz. 9 O Verbo era a luz verdadeira, que vindo a este mundo ilumina todo o homem. 10 Estava no mundo, e o mundo foi feito por Ele, mas o mundo não O conheceu. 11 Veio para o que era Seu, e os Seus não O receberam.12 Mas a todos os que O receberam, àqueles que crêem no Seu nome, deu poder de se tornarem filhos de Deus; 13 eles que não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus. 14 E o Verbo fez-Se carne, e habitou entre nós; e nós vimos a Sua glória, glória como de Filho Unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade. 15 João dá testemunho d'Ele e clama: «Este era Aquele de Quem eu disse: O que há-de vir depois de mim é mais do que eu, porque existia antes de mim». 16 Todos nós participamos da Sua plenitude, e recebemos graça sobre graça; 17 porque a Lei foi dada por Moisés, mas a graça e a verdade foram trazidas por Jesus Cristo. 18 Ninguém jamais viu a Deus; o Unigénito de Deus, que está no seio do Pai, Ele mesmo é que O deu a conhecer.


 

Dives in misericordia
sobre a Misericórdia Divina

1980.11.30

/…2
III. A MISERICÓRDIA NO ANTIGO TESTAMENTO

O conceito de «misericórdia» no Antigo Testamento

4. O conceito de «misericórdia» no Antigo Testamento tem longa e rica história. Devemos remontar a essa história, para fazer resplandecer mais plenamente a misericórdia que Cristo revelou. Revelando-a, quer pelas suas obras quer pelo seu ensino, Cristo dirigia-se a homens que não só conheciam o conceito de misericórdia, mas também, como povo de Deus da Antiga Aliança, tinham colhido da própria história plurissecular uma peculiar experiência da misericórdia de Deus. Esta íntima experiência foi tanto social e comunitária, como particular e individual.

Israel foi o povo da aliança com Deus, aliança que muitas vezes violou. Quando tomava consciência da própria infidelidade apelava para a misericórdia. E ao longo da história de Israel não faltaram Profetas e outros homens que despertavam tal consciência. A este propósito, os Livros do Antigo Testamento apresentam-nos numerosos testemunhos. Entre os factos e os textos mais salientes, podemos recordar: o início da história dos Juízes 31, a oração de Salomão ao ser inaugurado o Templo 32, uma parte das intervenções proféticas de Miqueias 33, as consoladoras garantias oferecidas por Isaías 34, a súplica dos hebreus exilados 35 e a renovação da Aliança depois do regresso do exílio 36.

É significativo o facto de os Profetas na sua pregação apresentarem a misericórdia, a qual muitas vezes se referem por causa dos pecados do povo, em ligação com a incisiva imagem do amor da parte de Deus. O Senhor ama Israel com amor de singular eleição, semelhante ao amor de um esposo 37; e por isso perdoa as suas culpas e até as infidelidades e traições. Ao encontrar-se perante a penitência, a conversão autêntica do povo, restabelece-o novamente na graça 38. Na pregação dos Profetas, a misericórdia significa a especial força do amor, que prevalece sobre o pecado e sobre a infidelidade do povo eleito.

Neste amplo contexto «social», a misericórdia aparece como o elemento correlativo da experiência interior de cada uma das pessoas que se encontram em estado de culpa, ou que suportam sofrimentos e desgraças de toda a espécie. Tanto o mal físico como o mal moral, ou pecado, fazem com que os filhos e as filhas de Israel se voltem para o Senhor, apelando para a sua misericórdia. Deste modo a Ele se dirige David, consciente da gravidade da sua culpa 39; igualmente a Ele se dirige Job, depois das suas rebeliões, ao encontrar-se na sua tremenda desventura 40; assim se dirige ao Senhor também Ester, consciente da ameaça mortal, iminente, contra o seu povo 41. E, além destes, deparamos ainda com outros exemplos nos Livros do Antigo Testamento 42.

Na origem desta multiforme convicção comunitária e pessoal, como é comprovado por todo o Antigo Testamento no decurso dos séculos, há que colocar a experiência fundamental do povo eleito, vivido nos dias do êxodo: o Senhor observou a aflição do seu povo, reduzido à escravidão, ouviu os seus clamores, deu-se conta dos seus sofrimentos e decidiu libertá-lo 43. Neste acto de salvação realizado pelo Senhor, o Profeta quis ver o seu amor e a sua compaixão 44. A segurança de todo o povo e de cada um dos seus membros radica na misericórdia divina que pode ser invocada em todas as circunstâncias dramáticas.

A isto vem juntar-se o facto de que a miséria do homem é também o seu pecado. O povo da Antiga Aliança conheceu esta miséria desde os tempos do êxodo, quando ergueu o bezerro de ouro. Mas o próprio Senhor triunfou sobre este gesto de ruptura da Aliança, quando se definiu solenemente a Moisés como «Deus compassivo e misericordioso, lento para a ira e cheio de bondade e de fidelidade» 45. É nesta revelação central que o povo eleito e cada um dos seus componentes irão encontrar, depois de terem prevaricado, a força e a razão para de novo se voltarem para o Senhor, para Lhe recordarem exactamente aquilo que Ele tinha revelado acerca de si próprio 46, e para Lhe implorarem perdão.

O Senhor revelou a sua misericórdia tanto nas obras como nas palavras, desde os primórdios do povo que escolheu para si. No decurso da sua história, este povo, quer em momentos de desgraça, quer ao tomar consciência do próprio pecado, entregou-se continuamente com confiança ao Deus das misericórdias. Na misericórdia do Senhor para com os seus manifestam-se todos os matizes do amor: Ele é para eles Pai 47, dado que Israel é seu filho primogénito 48; Ele é também o esposo daquela a quem o Profeta anuncia um nome novo: «bem-amada» (ruhama), porque usará de misericórdia para com ela 49.

Mesmo quando o Senhor, exasperado pela infidelidade do seu povo, decide acabar com ele, são ainda a compaixão e o amor generoso para com os seus que O levam a suster a sua indignação 50. E então, torna-se fácil compreender a razão pela qual os Salmistas, ao quererem cantar ao Senhor os mais sublimes louvores, entoarão hinos ao Deus do amor, da compaixão, da misericórdia e da fidelidade 51.

De tudo isto se deduz que a misericórdia faz parte não somente da noção de Deus, mas caracteriza também a vida de todo o povo de Israel e de cada um dos seus filhos e filhas: é a essência da intimidade com o seu Senhor, a essência do seu diálogo com Ele. Precisamente sob este aspecto, a misericórdia é apresentada em cada um dos Livros do Antigo Testamento com grande riqueza de expressões. Seria difícil, talvez, procurar nestes livros resposta meramente teórica à pergunta: o que é a misericórdia em si mesma. Contudo, a própria terminologia que neles é usada pode dizer-nos muitíssimo a tal respeito 52.

O Antigo Testamento proclama a misericórdia do Senhor mediante numerosos termos com significados afins. Estes termos são diferenciados no seu conteúdo particular, mas tendem a convergir, se assim se pode dizer, de vários pontos de vista para um único conteúdo fundamental, a fim de exprimir a riqueza transcendental da misericórdia e, ao mesmo tempo, para aproximá-la do homem sob aspectos diversos. O Antigo Testamento encoraja os homens desventurados, sobretudo os que estão oprimidos pelo pecado — como também todo o povo de Israel, que tinha aderido à Aliança com Deus — a fazerem apelo à misericórdia e permite-lhes contar com ela. Recorda-a nos tempos de queda e de desalento. Em seguida, dá graças e glória a Deus pela misericórdia, todas as vezes que ela se tenha manifestado e realizado, tanto na vida do povo como na das pessoas individualmente.

Deste modo, a misericórdia é contraposta, em certo sentido, à justiça divina; e revela-se, em muitos casos, não só mais poderosa, mas também mais profunda que ela. Já no Antigo Testamento se ensina que, embora a justiça no homem, seja autêntica virtude e em Deus signifique perfeição transcendente contudo o amor é «maior» do que a justiça. E é maior no sentido de que, relativamente a ela, é primário e fundamental. O amor condiciona, por assim dizer, a justiça; e, em última análise, a justiça serve a caridade. O primado e a superioridade do amor em relação à justiça — ponto característico de toda a Revelação — manifestam-se precisamente através da misericórdia. Isto pareceu tão claro aos Salmistas e aos Profetas que o próprio termo justiça acabou por significar a salvação realizada pelo Senhor por meio da sua misericórdia 53. A misericórdia difere da justiça, mas não se lhe opõe, se admitirmos na história do homem — como faz o Antigo Testamento precisamente — a presença de Deus, o qual já como Criador se ligou com particular amor às suas criaturas.

O amor, por natureza, exclui o ódio e o desejo do mal em relação àquele a quem alguma vez se deu a si mesmo como dom: Nihil odisti eorum quae fecisti, «não aborreceis nada do que fizestes» 54. Tais palavras indicam o fundamento profundo da conexão entre a justiça e a misericórdia em Deus, nas suas relações com o homem e com o mundo. Dizem-nos também que devemos procurar as raízes vivificantes e as razões íntimas desse nexo, remontando ao «princípio», no próprio mistério da criação. No contexto da Antiga Aliança, essas palavras preanunciam a plena revelação de Deus, que «é amor» 55.

O mistério da criação está em conexão com o mistério da eleição, que de modo especial plasmou a história do povo cujo pai espiritual é Abraão, como mérito da sua fé. Por meio deste povo que caminha através da história, tanto da Antiga como da Nova Aliança, aquele mistério de eleição refere-se a todos e a cada um dos homens e a toda a grande família humana. «Amo-te com amor eterno, por isso ainda te conservo os meus favores» 56. «Ainda que os montes sejam abalados... o meu amor jamais se apartará de ti, e a minha aliança de paz não será alterada» 57. Esta verdade, anunciada outrora a Israel, encerra em si a perspectiva de toda a história do homem, perspectiva que é simultaneamente temporal e escatológica 58. Cristo revela o Pai na mesma perspectiva, na perspectiva e no estado dos espíritos já preparados, como o demonstram numerosas páginas do Antigo Testamento. Como remate desta revelação, na véspera da sua morte, diz ao Apóstolo Filipe aquelas memoráveis palavras: «Há tanto tempo que estou convosco e não me conheces?... Quem me vê, vê o Pai» 59.

IV. A PARÁBOLA DO FILHO PRÓDIGO

Analogia

5. No limiar do Novo Testamento repercute-se no Evangelho de S. Lucas singular correspondência entre duas vozes que proclamam a misericórdia divina, nas quais ecoa intensamente toda a tradição do Antigo Testamento. Nelas encontram expressão os conteúdos semânticos, ligados à terminologia diferenciada dos Livros Antigos. A primeira destas vozes é a de Maria que, entrando em casa de Zacarias, engrandece o Senhor louvando-O com toda a alma «pela sua misericórdia», da qual se tornam participantes, «de geração em geração», os homens que vivem no temor de Deus. Pouco depois, comemorando a eleição de Israel, proclama a misericórdia, da qual «se recorda» desde sempre Aquele que a escolheu 60.

A outra voz é a de Zacarias que, na mesma casa, por ocasião do nascimento de João Baptista, seu filho, bendizendo o Deus de Israel, glorifica a misericórdia que Ele quis «usar... para com os nossos pais e lembrar-se da sua santa aliança» 61.

No ensino do próprio Cristo esta imagem, herdada do Antigo Testamento, torna-se mais simples e, ao mesmo tempo, mais profunda. É o que se manifesta com especial evidência na parábola do filho pródigo 62, na qual a essência da misericórdia divina — embora no texto original não seja usada a palavra «misericórdia» — aparece de modo particularmente límpido. Contribui para isso, não tanto a terminologia, como nos Livros do Antigo Testamento, mas a analogia, que permite compreender com maior profundidade o próprio mistério de misericórdia, como drama profundo que se desenrola entre o amor do pai e a prodigalidade e o pecado do filho.

Este filho, que recebe do pai a parte da herança que lhe toca e deixa a casa paterna para esbanjar essa herança numa terra longínqua «vivendo dissolutamente», em certo sentido é o homem de todos os tempos, a começar por aquele que foi o primeiro a perder a herança da graça e da justiça original. Neste ponto a analogia é muito vasta. Indirectamente a parábola estende-se a todas as rupturas da aliança de amor: a toda a perda da graça, e todo o pecado.

Ao contrário do que acontecia na tradição profética, esta analogia, embora se possa estender também a todo o povo de Israel, não o visa em primeiro lugar.

Aquele filho, «depois de ter esbanjado tudo..., começou a passar privações», tanto mais que sobreveio grande carestia «naquela terra» para onde ele tinha ido depois de abandonar a casa paterna. Em tal situação, «bem desejava matar a fome» com qualquer coisa, até mesmo «com as alfarrobas que os porcos comiam», animais que ele guardava, ao serviço de «um dos habitantes daquela terra». Mas até isso lhe era recusado. A analogia desloca-se claramente para o interior do homem. A herança que o jovem tinha recebido do pai era constituída por certa quantidade de bens materiais. Mas, mais importante do que esses bens era a sua dignidade de filho na casa paterna. A situação em que veio a encontrar-se quando se viu sem os bens materiais que dissipara, é natural que o tivesse também feito cair na conta da perda dessa dignidade. Quando pediu ao pai que lhe desse a parte de herança que lhe tocava, para se ausentar para longe, não reflectiu por certo nisso. Parece que nem mesmo agora está bem consciente dessa realidade, quando diz para si próprio: «Quantos jornaleiros na casa de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui morro de fome!». Avalia-se a si mesmo pela medida dos bens que tinha perdido e que já «não possui», enquanto os criados na casa de seu pai «continuam a possuí-los». Estas palavras exprimem principalmente a sua atitude perante os bens materiais. No entanto, por detrás delas esconde-se também o drama da dignidade perdida, a consciência da condição de filho malbaratada.

É então que toma a decisão: «Levantar-me-ei, irei ter com o meu pai e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e contra ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como a um dos teus jornaleiros» 63. Tais palavras permitem descobrir mais profundamente o problema essencial. Através da complexa situação material de penúria a que o filho pródigo chegou, por causa da sua leviandade, por causa do pecado, amadureceu nele o sentido da dignidade perdida. Quando tomou a decisão de voltar para a casa paterna e de pedir ao pai para ser recebido, não já gozando dos direitos de filho, mas na condição de assalariado, o jovem parece à primeira vista agir por motivo da fome e da miséria em que caiu. Subjacente a esse motivo, porém, está a consciência de perda mais profunda: ser um assalariado na casa do próprio pai é com certeza grande humilhação e vergonha. Apesar disso, o filho pródigo está disposto a arrostar com tal humilhação e vergonha. Caiu em conta que já não tem mais direito algum, senão o de ser um empregado na casa do pai. Esta reflexão, brota em primeiro lugar da plena consciência da perda que mereceu e do que, doutro modo, poderia vir a possuir. Este raciocínio, precisamente, demonstra que, no âmago da consciência do filho pródigo, se manifesta o sentido da dignidade perdida, daquela dignidade que brota da relação do filho com o pai. Com essa decisão empreendeu o caminho de regresso.

Na parábola do filho pródigo não é usado, nem uma vez sequer, o termo «justiça», assim como também não é usado no texto original, o termo «misericórdia». Contudo, a relação da justiça com o amor que se manifesta como misericórdia aparece profundamente vincada no conteúdo desta parábola evangélica. Torna-se claro que o amor se transforma em misericórdia quando é preciso ir além da norma exacta da justiça: norma precisa mas, por vezes, demasiado rigorosa.

O filho pródigo, depois de ter gasto os bens recebidos do pai, ao regressar merece apenas ganhar para viver, trabalhando na casa paterna como empregado e, eventualmente, ir amealhando, pouco a pouco, certa quantidade de bens materiais, mas sem dúvida nunca em quantidade igual aos que tinha esbanjado. Tal seria a exigência da ordem da justiça, até porque aquele filho, com o seu comportamento, não tinha somente dissipado a parte de herança que lhe competia, mas tinha também magoado profundamente e ofendido o pai. Na verdade o seu comportamento, que a seu juízo o tinha privado da dignidade de filho não podia deixar indiferente o pai; devia fazê-lo sofrer e fazer com que se sentisse, de algum modo, envolvido nesse procedimento. Tratava-se com efeito do seu próprio filho, e esta relação não podia ser alienada nem destruída, fosse qual fosse o seu comportamento. O filho pródigo tem consciência disso, e é precisamente essa consciência que lhe mostra claramente a dignidade perdida e o leva a avaliar correctamente o lugar que ainda lhe poderia tocar na casa do pai.

Copyright © Libreria Editrice Vaticana

(Nota: Revisão da tradução para português por ama)
_____________________
Notas:
31 Cf. Jz 3,7-9 32
32 Cf. 1 Sam 8,22-53.
33 Cf. Miq 7,18-20.
34 Cf. Is 1,18; 51,4-16.
35 Cf. Bar 2,11-3,8.
36 Cf. Ne 9.
37 Cf. por ex. Os 2,21-25 e 15; Is 54,6-8.
38 Cf. Jer 31,20- Ex 39,25-29.
39 Cf. 2 Sam 11; 12; 24,10.
40 Job passim.
41 Est 4,17k ss.
42 Cf. por ex. Ne 9,30-32- Tob 3,2-3, 11-12; 8,16s.; 1 Mac 4,24.
43 Cf. Ex 3,7s
44 Cf. Is 63,9.
45 Ex 34 6.
46 Cf. Núm 14,18; 2 Crón 30,9; Ne 9,17; Sl 86(85), 15; Sab 15,1; Sir 2,11; Jl 2,13.
47 Cf. Is 63,16.
48 Cf. Ex 4.22.
49 Cf Os 2,3.
50 Cf Os11,7-9; Jer 31,20; Is 54,7s.
51 Cf. Sl 103(102) e 145(144).
52 Ao definirem a misericórdia, os Livros do Antigo Testamento servem-se sobretudo de duas expressões, cada uma das quais tem um matiz semantico diverso. Antes de mais, o termo hesed, que indica uma profunda atitude de «bondade». Quando esta disposição se estabelece entre duas pessoas, estas passam a ser, não apenas benévolas uma para com a outra, mas também reciprocamente fiéis por força de um compromisso interior, portanto, também em virtude de uma fidelidade para consigo próprias. E se é certo que hesed significa também «graça» ou «amor», isto sucede precisamente na base de tal fidelidade. O facto de o compromisso em questão ter um carácter, não apenas moral, mas como que jurídico, não altera a sua realidade. Quando no Antigo Testamento o vocábulo hesed é referido ao Senhor isso acontece sempre em relação com a aliança que Deus fez com Israel. Esta aliança foi da parte de Deus um dom e uma graça para Israel. Contudo, uma vez que Deus, em coerência com a Aliança estabelecida, se tinha comprometido a respeitá-la, hesed adquiria, em certo sentido, um conteúdo legal. O compromisso «jurídico» da parte de Deus deixava de obrigar quando Israel infringia a aliança e não respeitava as condições da mesma. E era precisamente então que hesed, deixando de ser uma obrigação jurídica, revelava o seu aspecto mais profundo: tornava-se manifesto aquilo que fora ao princípio, ou seja, amor que doa, amor mais potente do que a traição, graça mais forte do que o pecado.
Esta fidelidade para a «filha do meu povo» infiel (cf. Lam 4,3.6), em última análise é, da parte de Deus, fidelidade a si próprio. Isto aparece evidente sobretudo pela frequência com que é usado o binómio hesed we'emet (= graça e fidelidade), que se poderia considerar uma endíades (cf. p. ex., Ex 34,6; 2 Sam 2,6; 15,20; Sl 25[24],10; 40[39], 11 s.; 85[84],11; 138[137],2; Miq 7,20). «Eu faço isto, não por causa de vós, ó casa de Israel, mas pela honra do meu santo nome» (Ez 36,22). Assim, também Israel, embora sob o peso das culpas, por ter quebrado a aliança, não pode ter pretensões em relação ao hesed de Deus, com base numa suposta justiça (legal). No entanto, pode e deve continuar a esperar e a ter confiança em obtê-lo, já que o Deus da aliança é realmente «responsável pelo seu amor». Fruto deste amor é o perdão e a reconstituição na graça, o restabelecimento da aliança interior.
O segundo vocábulo que na terminologia do Antigo Testamento serve para definir a misericórdia é rahªmim. O matiz do seu significado é um pouco diverso do significado de hesed. Enquanto hesed acentua as características da fidelidade para consigo mesmo e da «responsabilidade pelo próprio amor» (que são características em certo sentido masculinas), rahªmim, já pela própria raiz, denota o amor da mãe (rehem= seio materno). Do vínculo mais profundo e originário, ou melhor, da unidade que liga a mãe ao filho, brota uma particular relação com ele, um amor particular. Deste amor se pode dizer que é totalmente gratuito, não fruto de merecimento, e que, sob este aspecto, constitui uma necessidade interior: é uma exigência do coração. É uma variante como que «feminina» da fidelidade masculina para consigo próprio, expressa pelo hesed. Sobre este fundo psicológico, rahªmim dá origem a uma gama de sentimentos, entre os quais a bondade e a ternura, a paciência e a compreensão, que o mesmo é dizer a prontidão para perdoar.
O Antigo Testamento atribui ao Senhor estas características quando, ao falar d'Ele, usa o termo rahªmim. Lemos em Isaías: «Pode porventura a mulher esquecer-se do seu filho e não ter carinho para com o fruto das suas entranhas? Pois ainda que a mulher se esquecesse do próprio filho, eu jarnais me esqueceria de ti» (Is 49,15). Este amor, fiel e invencível graças à força misteriosa, da maternidade, é expresso nos textos do Antigo Testamento de várias maneiras: como salvação dos perigos, especialmente dos inimigos, como perdão dos pecados — em relação aos indivíduos e também a todo o povo de Israel— e, finalmente, como prontidão em satisfazer a promessa e a esperança (escatológicas), não obstante a infidelidade humana, conforme lemos em Oséias: «Eu os curarei das suas infidelidades, amá-los-ei de todo o coração» (Os 14,5).
Na terminologia do Antigo Testamento encontramos ainda outras expressões, que se referem de modo diverso ao mesmo conteúdo fundamental. Todavia, as duas acima mencionadas merecem uma atenção particular. Nelas se manifesta claramente o seu originário aspecto antropomórfico: para indicar a misericórdia divina, os autores bíblicos servem-se dos termos que correspondem à consciência e à experiência dos homens seus contemporâneos. A terminologia grega da versão dos Setenta apresenta-se com uma riqueza menor do que a hebraica; não reflecte todos os cambiantes semânticos próprios do texto original. Em todo o caso, o Novo Testamento constrói sobre a riqueza e a profundidade que já caracterizavam o Antigo.
Deste modo, herdamos do Antigo Testamento — como que numa síntese especial — não apenas a riqueza das expressões usadas por aqueles Livros para definir a misericórdia divina, mas também uma específica, obviamente antropomórfica, «psicologia» de Deus: a impressionante imagem do seu amor que, em contacto com o mal e, em particular, com o pecado do homem e do povo, se manifesta como misericórdia. Esta imagem é composta, mais do que pelo conteudo, bastante genérico aliás, do verbo hãnan, sobretudo pelo conteúdo de hesed e de rahªmim O termo hãnan, exprime um conceito mais amplo: significa a manifestação da graça que comporta, por assim dizer, uma constante predisposição magnânima, benévola e clemente.
Além destes elementos semânticos fundamentais, o conceito de misericórdia no Antigo Testamento inclui também o conteúdo do verbo hãmal, que literalmente significa «poupar (o inimigo derrotado)», mas também significa «manifestar piedade e compaixão» e, por conseguinte, perdão e remissão da culpa. O termo hus exprime igualmente piedade e compaixão, mas isso sobretudo em sentido afectivo. Estes termos aparecem nos textos bíblicos com menor frequência para indicar a misericórdia. É oportuno ainda lembrar o já citado vocábulo 'emet, que significa: em primeiro lugar «solidez, segurança» (no grego dos Setenta, «verdade»); e depois, também «fidelidade»; e desta maneira parece relacionar-se com o conteúdo semântico próprio do termo hesed.
53 Sl 40(39),11; 98(97),2 s.; Is 45,21; 51,5.8; 56,1.
54 Sab 11,24
55 1 Jo 4.8.16.
56 Jer 31,3.
57 Is 54,10
58 Jon 4,2.11, Sl 145(144),9; Sir 18,8-14; Sab 11,23-12,1.
59 Cf. Jo 14,9
60 Em ambos os casos se trata de hesed, isto é, da fidelidade que Deus manifesta ao próprio amor para com o povo, fidelidade às promessas, que encontrarão precisamente na maternidade da Mãe de Deus o seu cumprimento definitivo (cf. Lc 1,49-54).
61 Cf. Lc 1,72. Também neste caso se trata da misericórdia no significado de hesed, ao passo que nas frases seguintes, em que Zacarias fala do «coração misericordioso do nosso Deus», é expresso claramente o segundo significado, o de rahªmim (tradução latina: viscera misericordiae), que identifica prevalentemente a misericórdia divina com o amor materno.
62 Cf. Lc 15,11-32.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.