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12/04/2012

Leitura Espiritual para 12 Abr 2012

Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemariaCaminho 116)


Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.


Para ver, clicar SFF.
Evangelho: Lc 22, 21-38

21 «Entretanto, eis que a mão de quem Me há-de entregar está à mesa comigo. 22 Em verdade, o Filho do Homem vai, segundo o que está decretado, mas, ai daquele homem por quem será entregue!». 23 Eles começaram a perguntar entre si qual deles seria o que haveria de fazer tal coisa. 24 Levantou-se também entre eles uma discussão sobre qual deles se devia considerar o maior. 25 Jesus, porém, disse-lhes: «Os reis das nações dominam sobre elas, e os que têm autoridade sobre elas chamam-se benfeitores. 26 Não seja assim entre vós, mas o que entre vós é o maior faça-se como o mais pequeno, e o que governa seja como o que serve. 27 Porque, qual é maior, o que está à mesa, ou o que serve? Não é maior o que está sentado à mesa? Pois Eu estou no meio de vós como um que serve. 28 Vós sois os que tendes permanecido comigo nas Minhas tribulações. 29 Por isso Eu preparo o reino para vós, como Meu Pai o preparou para Mim, 30 para que comais e bebais à Minha mesa, no Meu reino, e vos senteis sobre tronos a julgar as doze tribos de Israel. 31 «Simão, Simão eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como o trigo; 32 mas Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça; e tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos». 33 Pedro disse-Lhe: «Senhor, eu estou pronto a ir contigo para a prisão e para a morte». 34 Jesus, porém, disse-lhe: «Digo-te, Pedro, que não cantará hoje o galo, sem que tu, por três vezes, tenhas negado que Me conheces». Depois disse-lhes: 35 «Quando Eu vos mandei sem bolsa, nem alforge, nem sandálias, faltou-vos, porventura, alguma coisa?». 36 Eles responderam: «Nada». Disse-lhes pois: «Mas agora quem tem bolsa, tome-a, e também alforge, e quem não tem espada venda o seu manto e compre uma. 37 Porque vos digo que é necessário que se cumpra em Mim isto que está escrito: “Foi posto entre os malfeitores”. Porque as coisas que Me dizem respeito estão perto do seu cumprimento». 38 Eles responderam: «Senhor, eis aqui duas espadas». Jesus disse-lhes: «Basta».

 


CARTA APOSTÓLICA
SALVIFICI DOLORIS
DO SUMO PONTÍFICE
JOÃO PAULO II
AOS BISPOS, AOS SACERDOTES,
ÀS FAMÍLIAS RELIGIOSAS
E AOS FIÉIS DA IGREJA CATÓLICA
SOBRE O SENTIDO CRISTÃO
DO SOFRIMENTO HUMANO



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26. Se é verdade que o primeiro grande capítulo do Evangelho do sofrimento vai sendo escrito ao longo das gerações, por aqueles que sofrem perseguições por Cristo, também é verdade que a «pari passu» com ele um outro grande capítulo deste Evangelho do sofrimento se vai desenrolando ao longo da história. Escrevem-no todos aqueles que sofrem com Cristo, unindo os próprios sofrimentos humanos ao seu sofrimento salvífico. Neles se realiza aquilo que as primeiras testemunhas da Paixão e da Ressurreição disseram e escreveram acerca da participação nos sofrimentos de Cristo. Neles se realiza, por conseguinte, o Evangelho do sofrimento; e, ao mesmo tempo, cada um deles continua, de certo modo, a escrevê-lo: escreve-o e proclama-o ao mundo, anuncia-o no próprio ambiente e aos homens seus contemporâneos.

No decorrer dos séculos e das gerações, tem-se comprovado que no sofrimento se esconde uma força particular que aproxima interiormente o homem de Cristo, uma graça particular. A esta ficaram a dever a sua profunda conversão muitos Santos como, por exemplo, São Francisco de Assis, Santo Inácio de Loyola etc. O fruto de semelhante conversão é não apenas o facto de que o homem descobre o sentido salvífico do sofrimento, mas sobretudo que no sofrimento ele se torna um homem totalmente novo. Encontra como que uma maneira nova para avaliar toda a sua vida e a própria vocação. Esta descoberta constitui uma confirmação particular da grandeza espiritual que no homem supera o corpo de um modo totalmente incomparável. Quando este corpo está gravemente doente, ou mesmo completamente inutilizado, e o homem se sente como que incapaz de viver e agir, é então que se põem mais em evidência a sua maturidade interior e grandeza espiritual; e estas constituem uma lição comovedora para as pessoas sãs e normais.

Esta maturidade interior e grandeza espiritual no sofrimento são fruto, certamente, de uma particular conversão e cooperação com a graça do Redentor crucificado. É Ele próprio a agir, no mais vivo do sofrimento humano, por meio do seu Espírito de Verdade, do Espírito Consolador. É Ele que transforma, em certo sentido, a própria substância da vida espiritual, indicando à pessoa que está a sofrer um lugar perto de si. É Ele — como Mestre e Guia interior — que ensina ao irmão e à irmã que sofrem esta admirável permuta, que se situa no coração do mistério da Redenção. O sofrimento é, em si mesmo, experimentar o mal; mas Cristo fez dele a base mais sólida do bem definitivo, ou seja, do bem da salvação eterna. Com o seu sofrimento na Cruz, Cristo atingiu as próprias raízes do mal: as raízes do pecado e da morte. Ele venceu o autor do mal, que é Satanás com a sua permanente rebelião contra o Criador. Perante o irmão ou a irmã que sofrem, Cristo abre e descobre gradualmente os horizontes do reino de Deus: os horizontes de um mundo convertido ao Criador, de um mundo liberto do pecado, que se vai edificando, alicerçado no poder salvífico do amor. E, lenta mas eficazmente, Cristo introduz neste mundo, neste reino do Pai, o homem que sofre, através, em certo sentido, do coração do seu sofrimento. De facto, o sofrimento não pode ser transformado e mudado por uma graça que aja do exterior, mas sim por uma graça interior. Cristo, mediante o seu próprio sofrimento salvífico encontra-se bem dentro de cada sofrimento humano, e pode assim actuar a partir do interior do mesmo, pelo poder do seu Espírito de Verdade, do seu Espírito Consolador.

E não é tudo: o divino Redentor quer penetrar no ânimo de todas a pessoas que sofrem, através do coração da sua Mãe Santíssima, primícia e vértice de todos os redimidos. Como que a prolongar aquela maternidade, que por obra do Espírito Santo lhe havia dado a vida, Cristo ao morrer conferiu à sempre Virgem Maria uma nova maternidade — espiritual e universal — em relação a todos os homens, a fim de que cada um deles, na peregrinação da fé, à semelhança e junto com Maria, lhe permanecesse intimamente unido até à Cruz; e assim, todo o sofrimento, regenerado pela virtude da Cruz, de fraqueza do homem se tornasse poder de Deus.

Entretanto, este processo interior não se realiza sempre da mesma maneira. Ele inicia-se e estabiliza-se, não raro, com dificuldade. O próprio ponto de partida já é diverso, pois é com disposições diferentes que o homem encara o estado de sofrimento. Pode-se todavia admitir que as pessoas quase sempre entram no sofrimento com uma queixa tipicamente humana e com a pergunta sobre o seu «porquê». Interrogam-se sobre o sentido do sofrimento e procuram uma resposta à pergunta no seu plano humano. Por certo, fazem muitas vezes esta pergunta também a Deus, e fazem-na igualmente a Cristo. Além disso, não podem deixar de se aperceber de que Aquele a quem fazem a sua pergunta também Ele sofre e quer responder-lhes da Cruz, do meio do seu próprio sofrimento. Contudo, por vezes é necessário tempo, muito tempo mesmo, para que esta resposta comece a ser percebida interiormente. Cristo, de facto, não responde directamente e não responde de modo abstracto a esta pergunta humana sobre o sentido do sofrimento. O homem percebe a sua resposta salvífica à medida que se vai tornando ele próprio participante dos sofrimentos de Cristo.

A resposta que lhe chega mediante essa participação, ao longo da caminhada de encontro interior com o Mestre, é, por sua vez, algo mais do que a simples resposta abstracta à pergunta sobre o sentido do sofrimento. Tal resposta é, sobretudo, um apelo. É uma vocação. Cristo não explica abstractamente as razões do sofrimento; mas, antes de mais nada, diz: «Segue-me!». Vem! Participa com o teu sofrimento nesta obra da salvação do mundo, que se realiza por meio do meu próprio sofrimento! Por meio da minha Cruz. A medida que o homem toma a sua cruz, unindo-se espiritualmente à Cruz de Cristo, vai-se-lhe manifestando mais o sentido salvífico do sofrimento. O homem não descobre este sentido ao seu nível humano, mas ao nível do sofrimento de Cristo. Ao mesmo tempo, porém, deste plano em que Cristo se situa, este sentido salvífico do sofrimento desce ao nível do homem, e torna-se, de algum modo, a sua resposta pessoal. E é então que o homem encontra no seu sofrimento a paz interior e mesmo a alegria espiritual.

27. Desta alegria fala o Apóstolo na Carta aos Colossenses: «Alegro-me nos sofrimentos suportados por vossa causa...». (88) Torna-se fonte de alegria o superar o sentimento da inutilidade do sofrimento, sensação que, por vezes, está profundamente arreigada no sofrimento humano; e isto, não só desgasta o homem por dentro, mas parece fazer dele um peso para os outros. O homem sente-se condenado a receber ajuda e assistência da parte dos outros e, ao mesmo tempo, considera-se a si mesmo inútil. A descoberta do sentido salvífico do sofrimento em união com Cristo transforma esta sensação deprimente. A fé na participação nos sofrimentos de Cristo traz consigo a certeza interior de que o homem que sofre «completa o que falta aos sofrimentos do mesmo Cristo», e de que, na dimensão espiritual da obra da Redenção, serve, como Cristo, para a salvação dos seus irmãos e irmãs. Portanto, no só é útil aos outros, mas presta-lhes ainda um serviço insubstituível. No Corpo de Cristo, que cresce sem cessar a partir da Cruz do Redentor, precisamente o sofrimento, impregnado do espírito de Cristo, é o mediador insubstituível e autor dos bens indispensáveis para a salvação do mundo. Mais do que qualquer outra coisa, o sofrimento é aquilo que abre caminho à graça que transforma as almas humanas. Mais do que qualquer outra coisa, é ele que torna presentes na história da humanidade as forças da Redenção. Naquela luta «cósmica» que se trava entre as forças espirituais do bem e as do mal, de que fala a Carta aos Efésios, (89) os sofrimentos humanos, unidos ao sofrimento redentor de Cristo, constituem um apoio particular às forças do bem, abrindo caminho à vitória destas forças salvíficas.

E por isso a Igreja vê em todos os irmãos e irmãs de Cristo que sofrem como que um sujeito multíplice da sua força sobrenatural. Quantas vezes os pastores da Igreja recorrem precisamente a eles e procuram concretamente neles ajuda e apoio! O Evangelho do sofrimento vai sendo escrito, sem cessar, e fala constantemente com as palavras deste estranho paradoxo: as fontes da força divina jorram exactamente do seio da fraqueza humana. Aqueles que participam nos sofrimentos de Cristo conservam nos sofrimentos próprios uma especialíssima parcela do infinito tesouro da Redenção do mundo, e podem partilhar este tesouro com os outros. Quanto mais o homem se vê ameaçado pelo pecado, quanto mais se apresentam pesadas as estruturas do pecado que comporta o mundo de hoje, maior é a eloquência que o sofrimento humano encerra em si mesmo e tanto mais a Igreja sente a necessidade de recorrer ao valor dos sofrimentos humanos para a salvação do mundo.

VII

O BOM SAMARITANO

28. A parábola do Bom Samaritano pertence também — e de modo orgânico — ao Evangelho do sofrimento. Nesta parábola Cristo quis dar uma resposta à pergunta «quem é o meu próximo?». (90) De facto, dos três que passavam pela estrada de Jerusalém a Jericó, à beira da qual jazia por terra, meio morto, um homem roubado e ferido pelos ladrões, foi exactamente o Samaritano quem demonstrou ser na verdade «próximo» daquele infeliz: «próximo» significa também aquele que cumpriu o mandamento do amor ao próximo. Outros dois homens seguiam o mesmo caminho; um era sacerdote e o outro levita; mas ambos «o viram e passaram adiante». O Samaritano, ao contrário, «tendo-o visto, encheu-se de compaixão. Aproximou-se, pensou-lhe as feridas», e depois «levou-o para uma estalagem e prestou-lhe assistência». (91) E, ao ir-se embora, confiou aos cuidados do hospedeiro o homem que estava a sofrer, comprometendo-se a pagar-lhe o que fosse preciso.

A parábola do Bom Samaritano pertence ao Evangelho do sofrimento. Ela indica, de facto, qual deva ser a relação de cada um de nós para com o próximo que sofre. Não nos é permitido «passar adiante», com indiferença; mas devemos «parar» junto dele. Bom Samaritano é todo o homem que se detém junto ao sofrimento de um outro homem, seja qual for o sofrimento. Parar, neste caso, não significa curiosidade, mas disponibilidade. Esta é como que o abrir-se de uma disposição interior do coração, que também tem a sua expressão emotiva. Bom Samaritano é todo o homem sensível ao sofrimento de outrem, o homem que «se comove» diante da desgraça do próximo. Se Cristo, conhecedor do íntimo do homem, põe em realce esta comoção, quer dizer que ela é importante para todo o nosso modo de comportar-nos diante do sofrimento de outrem. É necessário, portanto, cultivar em si próprio esta sensibilidade do coração, que se demonstra na compaixão por quem sofre. Por vezes esta compaixão acaba por ser a única ou a principal expressão do nosso amor e da nossa solidariedade com o homem que sofre.

O Bom Samaritano da parábola de Cristo não se limita, todavia, à simples comoção e compaixão. Estas transformam-se para ele num estímulo para as acções que tendem a prestar ajuda ao homem ferido. Bom Samaritano, portanto, é, afinal, todo aquele que presta ajuda no sofrimento, seja qual for a sua espécie; uma ajuda, quanto possível, eficaz. Nela põe todo o seu coração, sem poupar nada, nem sequer os meios materiais. Pode-se dizer mesmo que se dá a si próprio, o seu próprio «eu», ao outro. Tocamos aqui um dos pontos-chave de toda a antropologia cristã. O homem «não pode encontrar a sua própria plenitude a não ser no dom sincero de si mesmo». (92) Bom Samaritano é o homem capaz, exactamente, de um tal dom de si mesmo.

29. Seguindo a parábola evangélica, poder-se-ia dizer que o sofrimento, presente no nosso mundo humano sob tantas formas diversas, também aí está presente para desencadear no homem o amor, precisamente esse dom desinteressado do próprio «eu» em favor dos outros homens, dos homens que sofrem. O mundo do sofrimento humano almeja sem cessar, por assim dizer, outro mundo diverso: o mundo do amor humano; e aquele amor desinteressado que vem do coração e transparece nas acções da pessoa que sofre; amor que esta deve, aliás, em certo sentido ao sofrimento. O homem que é o «próximo» não pode passar com indiferença diante do sofrimento de outrem; e isso, por motivo da solidariedade humana fundamental e em nome do amor ao próximo. Deve «parar», «deixar-se comover», como fez o Samaritano da parábola evangélica. Esta parábola, em si mesma, exprime uma verdade profundamente cristã e, ao mesmo tempo, muitíssimo humana universalmente. Não é sem motivo que até na linguagem corrente se designa obra de «bom samaritano» qualquer actividade em favor dos homens que sofrem ou precisam de ajuda.

Esta actividade adopta, ao longo dos séculos, formas institucionais organizadas e constitui um campo de trabalho nas respectivas profissões. Quanto de «bom samaritano» têm as profissões do médico ou a da enfermeira, ou outras similares! Em virtude do conteúdo «evangélico» que nelas se encerra, somos inclinados a pensar, nestes casos, mais em vocação do que em simples profissão. E as instituições que, no decorrer das gerações, realizaram um serviço de «bom samaritano», desenvolveram-se e especializaram-se ainda mais nos nossos dias. Isto prova, sem sombra de dúvida, que o homem de hoje se detém cada vez com maior atenção a perspicácia junto aos sofrimentos do próximo, tenta compreendê-los e precavê-los, de modo cada vez mais preciso, e conquista também, cada vez mais, capacidade e especialização neste sector. Tendo presente tudo isto, podemos dizer que a parábola do Samaritano do Evangelho se tornou uma das componentes essenciais da cultura moral e da civilização universalmente humana. E pensando em todas aquelas pessoas que, com a sua ciência e capacidade, prestam múltiplos serviços ao próximo que sofre, não podemos deixar de ter para com elas uma palavra de reconhecimento e de gratidão.

Esta palavra estende-se a todos aqueles que exercem o próprio serviço para com o próximo que sofre, de maneira desinteressada, aplicando-se voluntariamente em dar ajuda de «bom samaritano» e destinando a essa causa todo o tempo e forças que lhes ficam do trabalho profissional. Tal actividade espontânea como «bom samaritano», ou caritativa, pode ser chamada actividade social; e pode também ser definida como apostolado quando é empreendida por motivos lidimamente evangélicos, sobretudo quando isso sucede em ligação com a Igreja ou com uma outra Comunidade cristã. A actividade voluntária de «bom samaritano» realiza-se nas instituições e meios apropriados, ou então através de organizações criadas para determinado fim. Estas formas de actuação têm grande importância, especialmente quando se trata de assumir tarefas de maior vulto, que exijam cooperação e uso de meios técnicos. Permanece não menos valiosa também a actividade individual, especialmente a actividade daquelas pessoas que se sentem mais aptas para cuidarem de certas espécies de sofrimento humano, a que não se pode dar ajuda senão individual e pessoalmente. Depois há a ajuda familiar, que compreende quer os actos de amor ao próximo feitos em benefício dos membros da própria família, quer a ajuda recíproca entre as famílias.

É difícil apresentar um elenco de todos os géneros e de todas as esferas da actividade de «bom samaritano» que existem na Igreja e na sociedade. Importa pelo menos reconhecer que são muito numerosos e, por isso, exprimir alegria; com efeito, graças a eles, os valores morais fundamentais, como o valor da solidariedade humana, o valor do amor cristão ao próximo, compõem o quadro da vida social e das relações inter-humanas e aí fazem frente às diversas formas do ódio, da violência, da crueldade, do desprezo pelo homem, ou até da simples «insensibilidade», ou seja, da indiferença para com o próximo e os seus sofrimentos.

Neste ponto é para salientar o grandíssimo significado das atitudes que convém adoptar na educação. A família, a escola e as outras instituições educativas — ainda que seja somente por motivos humanitários — devem trabalhar com perseverança no sentido de despertar e apurar aquela sensibilidade para com o próximo e o seu sofrimento, de que se tornou símbolo a figura do Samaritano do Evangelho. A Igreja deve fazer o mesmo, como é óbvio; e, se for possível, ajudar a aprofundar ainda mais tal sentido, com a perscrutação das motivações que Cristo apresentou na sua parábola e em todo o Evangelho. A eloquência da parábola do Bom Samaritano — como de todo o Evangelho, de resto — está sobretudo nisto: o homem deve sentir-se como que chamado, de maneira muito pessoal, a testemunhar o amor no sofrimento. As instituições são muito importantes e indispensáveis; no entanto, nenhuma instituição, só por si, pode substituir o coração humano, a compaixão humana, o amor humano, a iniciativa humana, quando se trata de ir ao encontro do sofrimento de outrem. Isto é válido pelo que se refere aos sofrimentos físicos; mas é mais válido ainda quando se trata dos múltiplos sofrimentos morais e, sobretudo, quando é a alma que está a sofrer.

30. A parábola do Bom Samaritano que, como foi dito, pertence sem dúvida ao Evangelho do sofrimento, com ele tem caminhado ao longo da história da Igreja e do Cristianismo e ao longo da história do homem e da humanidade. Ela testemunha que a revelação, feita por Cristo, do sentido salvífico do sofrimento, não o identifica, de forma alguma, com um comportamento de passividade. Muito pelo contrário. O Evangelho é a negação da passividade diante do sofrimento. O próprio Cristo, neste aspecto, é sobretudo activo. E assim, realiza o programa messiânico da sua missão em conformidade com as palavras do Profeta: «O Espírito do Senhor está sobre mim; porque me conferiu a unção e me enviou para anunciar aos pobres a boa nova, para anunciar aos cativos a libertação e aos cegos o dom da vista; para pôr em liberdade os oprimidos e promulgar um ano de graça da parte do Senhor». (93) Cristo realiza de modo superabundante este programa messiânico da sua missão: passa «fazendo o bem»; (94) e o bem resultante das suas obras assumiu grande realce sobretudo diante do sofrimento humano. A parábola do Bom Samaritano está em profunda harmonia com o comportamento do próprio Cristo.

Esta parábola, por fim, quanto ao seu conteúdo, tem cabimento naquelas inquietantes palavras do juízo final, que São Mateus recolheu no seu Evangelho: «Vinde, benditos de meu Pai, entrai na posse do reino que vos está preparado desde a criação do mundo. Porque tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber; era peregrino e destes-me hospedagem, andava nu e vestistes-me, estava doente e visitastes-me, estava no cárcere e fostes ver-me». (95) Aos justos que perguntam quando fizeram precisamente a ele tudo isso, o Filho do Homem responderá: «Em verdade vos digo que tudo o que fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes». (96) Sentença contrária caberá àqueles que se houverem comportado diversamente: «tudo o que não fizestes a um destes pequeninos a mim deixastes de o fazer». (97)

Poder-se-ia certamente ampliar a lista dos sofrimentos que encontraram eco na sensibilidade humana, na compaixão e na ajuda, ou que não o encontraram. A primeira e a segunda parte da declaração de Cristo sobre o juízo final indicam, sem ambiguidade, quanto são essenciais para todos os homens, na perspectiva da vida eterna, o «parar», como fez o Bom Samaritano, junto do sofrimento do seu próximo, o ter « compaixão » dele, e, por fim, ajudá-lo. No programa messiânico de Cristo, que é ao mesmo tempo o programa do reino de Deus, o sofrimento está presente no mundo para desencadear o amor, para fazer nascer obras de amor para com o próximo, para transformar toda a civilização humana na «civilização do amor». Com este amor é que o significado salvífico do sofrimento se realiza totalmente e atinge a sua dimensão definitiva. As palavras de Cristo sobre o juízo final permitem compreender isto, com toda a simplicidade e clareza típicas do Evangelho.

Estas palavras sobre o amor, sobre os actos de caridade relacionados com o sofrimento humano, permitem-nos descobrir, uma vez mais, por detrás de todos os sofrimentos humanos, o próprio sofrimento redentor de Cristo. O mesmo Cristo diz: «A mim o fizestes». É Ele próprio quem, em cada um, experimenta o amor; é Ele próprio quem recebe ajuda, quando ela é prestada a quem quer que sofra, sem excepção. Ele próprio está presente em quem sofre, pois o seu sofrimento salvífico foi aberto de uma vez para sempre a todo o sofrimento humano. E todos os que sofrem foram chamados, de uma vez sempre, a tornarem-se participantes «dos sofrimentos de Cristo». (98) Assim como todos foram chamados a «completar» com o próprio sofrimento «o que falta aos sofrimentos de Cristo». (99) Cristo ensinou o homem a fazer bem com o sofrimento e, ao mesmo tempo, a fazer bem a quem sofre. Sob este duplo aspecto, revelou cabalmente o sentido do sofrimento.

VIII

CONCLUSÃO

31. Tal é o sentido do sofrimento: verdadeiramente sobrenatural e, ao mesmo tempo, humano; é sobrenatural, porque se radica no mistério divino da Redenção do mundo; e é também profundamente humano, porque nele o homem se aceita a si mesmo, com a sua própria humanidade, com a própria dignidade e a própria missão.

O sofrimento faz parte, certamente, do mistério do homem. Talvez não esteja tão envolvido como o mesmo homem por este mistério, que é particularmente impenetrável. O Concílio Vaticano II exprimiu esta verdade assim: «na realidade, só no mistério do Verbo Encarnado encontra verdadeira luz o mistério do homem. Com efeito..., Cristo, que é o novo Adão, na própria revelação do mistério do Pai o do Seu amor, também manifesta plenamente o homem ao homem e descobre-lhe a sublimidade da sua vocação». (100) Se é verdade que estas palavras dizem respeito a tudo o que concerne o mistério do homem, então elas referem-se de modo particularíssimo, certamente, ao sofrimento humano. Quanto a este ponto, o «revelar o homem ao homem e descobrir-lhe a sublimidade de sua vocação» é sobremaneira indispensável. Acontece porém — como a experiência demonstra — isso ser particularmente dramático. Mas quando se realiza totalmente e se transforma em luz para a vida humana, é também particularmente bem-aventurante. «Por Cristo e em Cristo se esclarece o enigma da dor e da morte». (101)

Concluímos as presentes considerações sobre o sofrimento no ano em que a Igreja está a viver o Jubileu extraordinário, relacionado com o aniversário da Redenção.

O mistério da Redenção do mundo está radicado no sofrimento de modo maravilhoso; e o sofrimento, por sua vez, tem nesse mistério o seu supremo e mais seguro ponto de referência.

Desejamos viver este ano da Redenção numa união especial com todos os que sofrem. É necessário pois, que se congreguem em espírito, junto à Cruz do Calvário, todos aqueles que sofrem e acreditam em Cristo; e, especialmente, aqueles que sofrem por causa da sua fé n'Ele, Crucificado e Ressuscitado, a fim de que o oferecimento dos seus sofrimentos apresse o realizar-se da oração do mesmo Salvador pela unidade de todos. (102) Que para lá afluam também os homens de boa vontade, porque na Cruz está o « Redentor do homem », o Homem das dores, que assumiu sobre si os sofrimentos físicos e morais dos homens de todos os tempos, para que estes possam encontrar no amor o sentido salvífico dos próprios sofrimentos e respostas válidas para todas as suas interrogações.

Com Maria, Mãe de Cristo, que estava de pé junto à Cruz, (103) nós detemos-nos junto a todas as cruzes do homem de hoje.

Invocamos todos os Santos, que no decorrer dos séculos foram de modo especial participantes nos sofrimentos de Cristo. Pedimos a sua protecção.

E pedimos a todos vós que sofreis, que nos ajudeis. Precisamente a vós, que sois fracos, pedimos que vos torneis uma fonte de força para a Igreja e para a humanidade. Na terrível luta entre as forças do bem e do mal, de que o nosso mundo contemporâneo nos oferece o espectáculo, que vença o vosso sofrimento em união com a Cruz de Cristo!

A todos, caríssimos Irmãos e Irmãs, envio a minha Bênção Apostólica.

Dado em Roma, junto de São Pedro, na memória litúrgica de Nossa Senhora de Lourdes, a 11 de Fevereiro do ano de 1984, sexto do meu Pontificado.

IOANNES PAULUS PP. II

Notas:

(88) Col. 1, 24.
(89) Cfr. Eph. 6, 12.
(90) Luc. 10, 29.
(91) Ibid. 10, 33-34.
(92) Gaudium et Spes, 24.
(93) Luc. 4, 18-19; cfr. Is. 61, 1-2.
(94) Act. 10, 38.
(95) Matth. 25, 34-36.
(96) Ibid. 25, 40.
(97) Ibid. 25, 45.
(98) 1 Petr. 4, 13.
(99) Col. 1, 24.
(100) Gaudium et Spes, 22.
(101) Gaudium et Spes, 22.
(102) Cfr. Io. 17, 11. 21-22.
(103) Cfr. ibid. 19, 25.  

© Copyright 1984 - Libreria Editrice Vaticana

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