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15/03/2012

Tratado dos Anjos 7

Questão 51: Da relação dos anjos com os corpos.

Em seguida se trata dos anjos por comparação com os seres corpóreos. E, primeiro, da relação dos anjos com os corpos. Segundo, da relação dos anjos com os lugares corpóreos. Terceiro, da relação dos anjos com o movimento local.

Sobre o primeiro ponto três artigos se discutem:


Art. 1 — Se os anjos estão naturalmente unidos a corpos.
Art. 2 — Se os anjos assumem corpos.
Art. 3 — Se os anjos exercem operações vitais, nos corpos que assumem.

Art. 1 — Se os anjos estão naturalmente unidos a corpos.

Para ver desenvolvimento, clicar:
(I Sent., dist. VIII, a. 1; II Cont. Gent., cap. XCI; De Pot. q. 6, a. 6; De Malo. q. 16, a. 1; De Spirit. Creat., a. 5; Opusc. XV, De Angelis, cap. XVIII)

O primeiro discute-se assim. — Parece que os anjos estão naturalmente unidos a corpos.

1. — Pois, diz Orígenes: só da natureza de Deus, quer dizer do Pai, do Filho e do Espírito Santo, pode-se entender que é próprio o existir sem substância material e sem nenhuma mistura de corpo


[i]. — Bernardo também diz: Concedamos só a Deus tanto a imortalidade como a incorporeidade, do qual, somente, a natureza, nem por si nem por outro, precisa do adjutório de um instrumento corporal. Pois é claro que todo espírito criado precisa de tal ajutório [ii]. — Agostinho, por fim, diz: Os demónios chamam-se animais aéreos, porque se ajudam da natureza dos corpos aéreos [iii]. Ora a mesma é a natureza do demónio e do anjo. Logo, os anjos estão naturalmente unidos a corpos.

2. Demais. — Gregório chama ao anjo animal racional [iv]. Ora, todo animal é composto de corpo e alma. Logo, os anjos estão naturalmente unidos a corpos.

3. Demais. — É mais perfeita a vida dos anjos do que a das almas. Ora, a alma não somente vive, mas também vivifica o corpo. Logo, os anjos vivificam corpos que lhes estão naturalmente unidos.

Mas, em contrário diz Dionísio que os anjos, compreendidos como incorpóreos, também o devem ser como imateriais [v].

Os anjos não estão naturalmente unidos a corpos. Pois o que é acidental a uma natureza não se encontra nela universalmente; assim, ter asas não é da natureza do animal e por isso não convém a todo animal. Ora, como inteligir não é ato do corpo, nem nenhuma virtude deste — como a seguir se verá [vi] — não é da natureza da substância intelectual como tal, estar unida a um corpo; mas isto é acidental, por qualquer outra razão, à uma substância intelectual. Assim, à alma humana convém estar unida a um corpo, por ser imperfeita e potencial, no género das substâncias intelectuais, não tendo, por natureza, a plenitude da ciência, mas tirando-a das coisas sensíveis por meio dos sentidos do corpo, como a seguir se dirá [vii]. Mas havendo, em qualquer género, algo de imperfeito, é necessário que, nesse mesmo género, preexista algo de perfeito. Há, portanto, algumas substâncias perfeitas intelectuais, em a natureza intelectual, que não precisam de tirar a ciência, das coisas sensíveis. Logo, nem todas as substâncias intelectuais estão unidas a corpos; mas há algumas separadas deles, e a estas chamamos anjos.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Como antes já se disse [viii], alguns opinaram que todo ente é corpo. E considera-se como consequência dessa opinião, terem alguns ensinado que não há nenhumas substâncias incorpóreas que não estejam unidas a corpos; e portanto, terem alguns afirmado que Deus é a alma do mundo, como Agostinho refere [ix]. Mas, como isto repugna à fé católica, que exalta Deus sobre todas as coisas, segundo a Escritura (Sl 8, 2) — A tua magnificência se elevou sobre o céu. — Orígenes, rejeitando tal opinião, no tocante a Deus, seguiu a opinião dos outros, no tocante às outras coisas; assim como se enganou, em muitos outros assuntos, seguindo a opinião dos antigos filósofos. — E a expressão de Bernardo pode-se explicar dizendo que os espíritos criados precisam de um instrumento corporal, não que este lhes esteja naturalmente unido, mas sim que é assumido para algum fim, como a seguir se dirá [x]. — E quanto a Agostinho, ele não afirma mas usa da opinião dos Platónicos, que ensinavam haver certos animais aéreos a que chamavam demónios.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Gregório chama ao anjo animal racional, metaforicamente, pela semelhança com a razão.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Vivificar, efectivamente, é absolutamente uma perfeição e, por isso, convém a Deus, segundo a Escritura (1 Rs 2, 6): O Senhor é quem tem a vida e a dá. Mas vivificar, formalmente, pertence à substância que é parte de alguma natureza e que não tem em si a natureza íntegra da espécie. Por onde, a substância intelectual não unida a um corpo é mais perfeita que a unida.

(s. tomás de aquino, Suma Teológica, Tratado dos Anjos)



[i] Periarch., lib. I, cap. VI.
[ii] Hom. Super Cant., IV.
[iii] Super Gen. Ad litt., lib. III, cap. X.
[iv] Hom. Epiphaniae, X in Evang.
[v] De div. nom., cap. IV, lect. I.
[vi] Q. 75, a. 2.
[vii] Q. 84, a. 6; q. 89, a. 1.
[viii] Q. 50, a. 1.
[ix] De civ. Dei, lib. VII, cap. VI.
[x] Q. 51, a. 2.

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