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14/01/2011

Formas sofisticadas de hostilidade anti-cristã


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A violência desencadeada contra os cristãos em países sob ditaduras ou regimes fundamentalistas provoca muitas vezes protestos no Ocidente. No entanto, é feita vista grossa a outras formas de intolerância religiosa mais subtis que se exercem na Europa. Um relatório elaborado pelo Observatório de Intolerância e Discriminação contra os Cristãos, com sede em Viena, denuncia mais de 130 casos de discriminação contra cristãos cometidos na Europa entre 2005 e 2010.



Fará sentido falar de discriminação e de intolerância para com os cristãos num continente onde grande parte da população continua a dizer que é cristã? Como pode a maioria ser excluída socialmente pela minoria? Não será que alguns exageram, ao considerarem "discriminação" o que não é mais do que a perda de privilégios históricos?
Gudrun Kugler, doutora em Direito Internacional e directora do Observatório de Intolerância e Discriminação contra os Cristãos, responde a estas perguntas num relatório (1) onde denuncia -com abundantes dados- o laicismo radical que pretende converter os cristãos da Europa em cidadãos de segunda categoria.

Com os mesmos direitos que todos

A discriminação, explica Kugler, não tem a ver com um problema de números; o essencial é saber quem tem o poder para fixar o que é debatido e aquilo que o não é na esfera pública, que pontos de vista são levados em conta e quem é ouvido na altura em que se negoceia.

 O Observatório destaca os efeitos discriminatórios que, paradoxalmente, podem ter sobre os cristãos as leis de anti-discriminação
E o mesmo se pode dizer daquelas posições que não são estritamente religiosas (a definição do casamento como a união entre um homem e uma mulher, a protecção do não nascido a partir do momento da concepção...), mas que se afastam igualmente pelo simples facto de coincidirem com a doutrina cristã.
Por outro lado, o tema dos privilégios históricos do cristianismo tem subjacente uma determinada armadilha. Se por "privilégio" se entender qualquer manifestação da identidade e da história de um país, então haveria que proceder ao estilhaçar de inúmeras tradições europeias. O episódio da retirada do crucifixo das salas de aulas nas escolas públicas de Itália ficaria a constituir uma mera anedota.

Laicismo a três níveis

O Observatório de Intolerância e Discriminação contra os Cristãos revela no seu sítio web (www.intoleranceagainstchristians.eu) mais de 130 casos onde considera que cidadãos da União Europeia e de países da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE) foram "marginalizados" ou "discriminados" devido à sua fé cristã.

 Há tentativas de fazer calar as críticas contra as ideias de alguns grupos, aplicando ao discordante as leis previstas para sancionar os incentivos ao ódio
Sob o rótulo "intolerância e discriminação", o Observatório denuncia um mesmo fenómeno -o laicismo radical- com três vertentes diferentes: uma social, que se traduz na censura dos cristãos na opinião pública e na sua difamação através de estereótipos negativos; outra legal, ligada à negação dos direitos que cabem a qualquer cidadão pelo simples facto de o ser; e outra política, centrada sobretudo na marginalização dos cristãos na esfera pública.
Para o Observatório, o laicismo radical seria um produto tipicamente europeu. Pelo contrário, reserva o termo "perseguição" para a violência sofrida pelos cristãos nalguns países muçulmanos.

A intolerância refinada

Após o massacre causado por um atentado no passado dia 31 de Outubro numa igreja católica de Bagdad (cfr. Aceprensa, 11-11-2010), existe a tentação de minimizar a intransigência com que militam algumas elites culturais europeias.
Certamente, o martírio físico não constitui um perigo no Ocidente democrático. Contudo, nem João Paulo II nem Bento XVI deixaram de denunciar o laicismo agressivo como una nova forma de intolerância.
Em 1983, João Paulo II pediu expressamente que não se minimizassem -juntamente com a perseguição violenta- "outras formas de maus tratos mais sofisticadas como a discriminação social ou as subtis restrições à liberdade, que conduziriam a uma espécie de morte civil".
E na sua viagem à Grã-Bretanha aquando da beatificação do cardeal Newman, Bento XVI advertiu que "no nosso tempo, o preço que se tem de pagar pela fidelidade ao Evangelho já não é ser enforcado, desconjuntado e esquartejado, mas muitas vezes implica ser excluído, ridicularizado ou alvo de paródia" (cfr. Aceprensa, 20-09-2010).
Também na sua mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2011, centrada este ano na liberdade religiosa, o Papa expressou o seu desejo de "que no Ocidente, especialmente na Europa, cessem a hostilidade e os preconceitos contra os cristãos, pelo simples facto de tentarem orientar a sua vida em coerência com os valores e princípios contidos no Evangelho".

Discordar tem um preço

O relatório de Kugler inclui algumas chamadas de atenção da parte de pessoas que sofreram linchamento mediático por exercerem o seu direito de se expressarem com liberdade.
Um caso significativo é o de Edward Green, director do "Projecto de Investigação sobre a Prevenção da SIDA" da Universidade de Harvard. Em Março de 2009, Green situou-se no olho do furacão quando afirmou que concordava no essencial com a visão de Bento XVI sobre a forma de combater a SIDA em África; isto é, que a solução para a epidemia não passa por mais preservativos, mas por alterações no comportamento sexual (cfr. Aceprensa, 2-04-2009).
Depois de sofrer a intolerância na sua própria carne, Green escreveu perplexo no Washington Post (2-03-2009): "Nós os liberais que trabalhamos na prevenção da SIDA e no planeamento familiar, corremos sérios riscos se nos colocarmos do lado do Papa nestes assuntos".
E o pior é que Green voltou a insistir meses depois, dando razão ao Papa pela segunda vez (cfr. Aceprensa, 21-09-2009). Sem mais nem menos, o prestigiado cientista de Harvard -que não é cristão- sofreu a violenta crítica dos que afirmavam categoricamente que as palavras de Bento XVI eram contrárias à ciência.

Incitação ao ódio ou censura?

Como se disse, o relatório denuncia três versões do laicismo radical. No plano legal, o Observatório destaca os efeitos discriminatórios que, paradoxalmente, podem ter sobre os cristãos as leis de anti-discriminação ou as elaboradas para combater as mensagens de incitação ao ódio.
São efeitos discriminatórios perversos aqueles que para proteger uns, penalizam outros ao ponto de lhes negar direitos fundamentais como a liberdade de consciência, a liberdade de expressão ou o direito dos pais de educar os seus filhos de acordo com as suas convicções.
Entre os numerosos casos citados pelo relatório é de destacar as tentativas de fazer calar as críticas contra as ideias de alguns grupos, aplicando ao discordante as disposições legais previstas para sancionar os incentivos ao ódio (hate speech).
Isto acontece, por exemplo, quando se cataloga de "homófobicos" os que defendem que o casamento só pode acontecer na união entre um homem e uma mulher, ou que é melhor para as crianças terem um pai e uma mãe.
Nestes casos, as leis contra o incentivo ao ódio convertem-se numa estratégia para evitar um debate honesto sobre a concepção do casamento, assim como numa forma de silenciar o discordante, cristão ou não (cfr. Aceprensa, 19-11-2009).
O mesmo se passa quando, para evitar a discriminação por motivos de orientação sexual, se nega a liberdade das organizações de inspiração cristã para actuarem em consonância com as suas crenças.
Um exemplo recente é a Lei de Igualdade da Grã-Bretanha, que poderia colocar em perigo a liberdade religiosa se for utilizada para exigir às agências de adopção católicas que aceitem casais homossexuais entre os seus candidatos (cfr. Aceprensa, 3-11-2010).

Condenados a pensar a mesma coisa

No plano político, a intolerância religiosa aparece quando se tenta marginalizar qualquer manifestação pública da fé. Outras vezes é o "politicamente correcto" que com normas tão invisíveis como férreas, vai marcando os padrões de actuação na esfera pública.
"Tal como a moda condiciona os nossos gostos, o politicamente correcto moldeia as nossas convicções. Torna-se difícil elaborar pontos de vista independentes, e ainda é mais difícil conseguir que a sociedade comece a pensar de forma crítica", assegura o relatório.
Nas palavras de Kugler, estamos perante "a ditadura da opinião". Para sair dela, haverá que apostar tudo na coragem de cada um; ou seja, no grau de motivação com que cada um venha a defender publicamente as suas convicções.

Normas duplas

No plano social, a existência de uma estrutura politicamente correcta muito arraigada faz com que os estereótipos que desacreditam e os escárnios lançados ao cristianismo sejam tolerados como algo perfeitamente normal, coisa que é considerada inadmissível quando se trata de provocações sobre outras crenças ou minorias.
Como nas restantes partes do relatório, o Observatório destaca vários casos: a queima pública de um crucifixo por estudantes de Harvard após as declarações de Green; o boicote do Christian Youth Festival com frases blasfemas na Alemanha; os actos de vandalismo na casa onde nasceu Bento XVI (precisamente no dia do seu aniversário); ou as paródias em séries televisivas, revistas ou exposições de arte.
Parece que se estão a cumprir à letra as palavras do metropolita Hilarión Alféyev, representante da Igreja ortodoxa da Rússia nas instituições europeias em Bruxelas: "Ouvimos muitas vezes falar de anti-semitismo e islamofobia, mas poucos denunciam a cristianofobia, que cada vez ganha mais força na Europa".
O relatório conclui com recomendações dirigidas aos governos e instituições da União Europeia e da OSCE, assim como aos organismos internacionais que se dedicam à defesa dos direitos humanos.
Entre outras coisas, o Observatório exige com firmeza o respeito pelos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos cristãos na Europa: desde a liberdade religiosa e de crenças à liberdade de expressão, passando pela liberdade de associação e pelo direito à objecção de consciência.
Também encoraja todos os governos da União Europeia e da OSCE "a condenarem a intolerância e a discriminação contra os cristãos, e a garantirem os seus direitos a uma participação plena na vida pública".

Juan Meseguer,  10 Janeiro 2011

(Agradecimento a Vítor Costa Lima)




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