Páginas

31/08/2020

Reflexão - Graça


Deus não dá a graça aos homens de tal forma que se suspendam as funções e processos da natureza.

Ou permite que a natureza se acomode à graça e a sirva de tal modo que a boa obra seja feita com mais facilidade, ou, no caso em que a natureza esteja disposta a resistir, Deus faz com que ta mesma resistência, vencida e subjugada pela graça, aumente o mérito da obra, precisamente pelo motivo de que era difícil levar a cabo.


(São Tomas Moro, La agonia de Cristo, Rialp, Madrid, 5ª Ed. Pg. 26)


Diante de Deus tu és uma criança


Diante de Deus, que é Eterno, tu és uma criança mais pequena do que, diante de ti, um miúdo de dois anos. E, além de criança, és filho de Deus. – Não o esqueças. (Caminho, 860)

Se reparardes bem, é muito diferente a queda de uma criança e a queda de uma pessoa crescida. Para as crianças, uma queda, em geral, não tem importância; tropeçam com tanta frequência! E se começam a chorar, o pai lembra-lhes: os homens não choram. Assim se encerra o incidente com o empenho do miúdo por contentar o seu pai.
(…) Se procurarmos portar-nos como eles, os tropeções e os fracassos – aliás inevitáveis – na vida interior, nunca se transformarão em amargura. Reagiremos com dor, mas sem desânimo, e com um sorriso que brota, como a água límpida, da alegria da nossa condição de filhos desse Amor, dessa grandeza, dessa sabedoria infinita, dessa misericórdia, que é o nosso Pai. Aprendi durante os meus anos de serviço ao Senhor a ser filho pequeno de Deus. E isto vos peço: que sejais quasi modo geniti infantes, meninos que desejam a palavra de Deus, o pão de Deus, o alimento de Deus, a fortaleza de Deus para se comportarem de agora em diante, como homens cristãos. (Amigos de Deus, 146)

Leitura espiritual 31 Agosto



Cartas de São Paulo

Efésios - 2

A obra de Cristo –
1 Também a vós, que estáveis mortos pelas vossas faltas e pecados, 2 aqueles em que vivestes outrora, de acordo com o curso deste mundo, de acordo com o príncipe que domina os ares, o espírito que agora actua nos rebeldes... 3 Como eles, todos nós nos comportámos outrora: entregues aos nossos desejos mundanos, fazíamos a vontade dele, seguíamos os seus impulsos, de tal modo que estávamos sujeitos por natureza à ira divina, precisamente como os demais. 4 Mas Deus, que é rico em misericórdia, pelo amor imenso com que nos amou, 5 precisamente a nós que estávamos mortos pelas nossas faltas, deu-nos a vida com Cristo - é pela graça que vós estais salvos – 6 com Ele nos ressuscitou e nos sentou no alto do Céu, em Cristo. 7 Pela bondade que tem para connosco, em Cristo Jesus, quis assim mostrar, nos tempos futuros, a extraordinária riqueza da sua graça. 8 Porque é pela graça que estais salvos, por meio da fé. E isto não vem de vós; é dom de Deus; 9 não vem das obras, para que ninguém se glorie. 10 Porque nós fomos feitos por Ele, criados em Cristo Jesus, para vivermos na prática das boas obras que Deus de antemão preparou para nelas caminharmos.

Judeus e pagãos unidos em Cristo –
11 Lembrai-vos, portanto, de que vós outrora - os gentios na carne, os chamados incircuncisos por aqueles que se chamavam circuncisos, com uma circuncisão praticada na carne - 12 lembrai-vos de que nesse tempo estáveis sem Cristo, excluídos da cidadania de Israel e estranhos às alianças da promessa, sem esperança e sem Deus no mundo. 13 Mas em Cristo Jesus, vós, que outrora estáveis longe, agora, estais perto, pelo sangue de Cristo. 14 Com efeito, Ele é a nossa paz, Ele que, dos dois povos, fez um só e destruiu o muro de separação, a inimizade: na sua carne, 15 anulou a lei, que contém os mandamentos em forma de prescrições, para, a partir do judeu e do pagão, criar em si próprio um só homem novo, fazendo a paz, 16 e para os reconciliar com Deus, num só Corpo, por meio da cruz, matando assim a inimizade. 17 E, na sua vinda, anunciou a paz a vós que estáveis longe e paz àqueles que estavam perto. 18 Porque, é por Ele que uns e outros, num só Espírito, temos acesso ao Pai. 19 Portanto, já não sois estrangeiros nem imigrantes, mas sois concidadãos dos santos e membros da casa de Deus, 20 edificados sobre o alicerce dos Apóstolos e dos Profetas, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus. 21 É nele que toda a construção, bem ajustada, cresce para formar um templo santo, no Senhor. 22 É nele que também vós sois integrados na construção, para formardes uma habitação de Deus, pelo Espírito.


Amigos de Deus

144           
O exemplo de Jesus Cristo

Quasi modo geniti infantes... Tem constituído para mim grande alegria difundir por toda a parte esta mentalidade de filhos pequenos de Deus, que nos fará saborear as palavras que também aparecem na liturgia da Missa: Todo aquele que nasceu de Deus vence o mundo, supera as dificuldades, alcança a vitória, nesta grande batalha pela paz das almas e da sociedade.

A nossa sabedoria e a nossa força estão precisamente na convicção da nossa pequenez, do nosso nada aos olhos de Deus. Mas é Ele que nos anima, simultaneamente, a vivermos com plena confiança e a pregarmos Jesus Cristo, seu Filho Unigénito, apesar dos nossos erros e das nossas misérias pessoais, sempre que, a par da nossa fraqueza, não falte a nossa luta por superá-la.

Ter-me-eis ouvido repetir com frequência aquele conselho da Sagrada Escritura: discite benefacere, porque é certo que devemos aprender e ensinar a fazer o bem. Temos de começar por nós próprios, empenhando-nos em descobrir qual é o bem que temos de ambicionar para cada um de nós, para cada um dos nossos amigos, para cada um dos homens. Não conheço melhor caminho para considerar a grandeza de Deus do que partir deste ponto de vista inefável e simples de que Ele é nosso Pai e nós somos seus filhos.

145           
Fixemos de novo o nosso olhar no Mestre. Talvez também escutes neste momento a censura dirigida a Tomé: Mete aqui o teu dedo e vê as minhas mãos; aproxima também a tua mão e mete-a no meu lado, e não sejas incrédulo, mas fiel; e como ao Apóstolo, sairá da tua alma, com sincera contrição, aquele grito: Meu Senhor e meu Deus, reconheço-Te definitivamente como Mestre e, com o teu auxílio, vou guardar para sempre os teus ensinamentos e esforçar-me por segui-los com lealdade.

Antes, noutras páginas do Evangelho, revivemos o episódio em que Jesus se retira para fazer oração, estando próximos os discípulos, provavelmente a contemplá-lo. Quando terminou, um decidiu-se a pedir-lhe: «Senhor, ensina-nos a orar, como João ensinou os seus discípulos». E Jesus respondeu-lhes: «Quando orardes, dizei: Pai, santificado seja o teu nome.

Notai como é surpreendente a resposta: os discípulos convivem com Jesus Cristo e, no meio das suas conversas, o Senhor diz-lhes como hão-de rezar; revela-lhes o grande segredo da misericórdia divina: que somos filhos de Deus e que podemos falar confiadamente com Ele, como um filho conversa com o pai.

Quando vejo como algumas pessoas entendem a vida de piedade, o convívio de um cristão com o seu Senhor, e dela me apresentam uma imagem desagradável, teórica, feita de fórmulas, repleta de lengalengas sem alma, que mais favorecem o anonimato do que a conversa pessoal, de tu a tu, com o nosso Pai Deus - a autêntica oração vocal nunca admite o anonimato - recordo aquele conselho do Senhor: nas vossas orações, não useis muitas palavras, como os gentios, os quais julgam que serão ouvidos à força de palavras. Não os imiteis, porque o Vosso Pai sabe o que vos é necessário antes de que vós lho peçais. E comenta um Padre da Igreja: penso que Cristo manda que evitemos as orações longas; longas, porém, não quanto ao tempo, mas quanto à multiplicidade interminável de palavras... O próprio Senhor nos deu o exemplo da viúva que, à força de súplicas, venceu a renitência do juiz iníquo; e o daquele importuno que chegou a desoras, à noite, e pela sua teimosia, mais do que pela amizade, conseguiu que o amigo se levantasse da cama (cfr. Lc XI, 5-8; XVIII, 1-8). Com esses dois exemplos manda-nos que peçamos constantemente, não compondo orações intermináveis, mas antes contando-lhe com simplicidade as nossas necessidades.

De qualquer modo, se ao iniciar a vossa meditação não conseguis concentrar a atenção para conversar com Deus, se vos sentis secos e a cabeça parece que não é capaz de ter sequer uma ideia ou se os vossos afectos permanecem insensíveis, aconselho-vos o que tenho procurado praticar sempre nessas circunstâncias: ponde-vos na presença do vosso Pai e dizei-Lhe pelo menos: "Senhor, não sei rezar, não me lembro de nada para Te contar!"... e estai certos de que nesse mesmo instante começastes a fazer oração.

146           
Piedade, intimidade de filhos

A piedade que nasce da filiação divina é uma atitude profunda da alma, que acaba por informar toda a existência: está presente em todos os pensamentos, em todos os desejos, em todos os afectos. Não tendes visto como, nas famílias, os filhos, mesmo sem repararem, imitam os pais: repetem os seus gestos, seguem os seus costumes, se parecem com eles em tantos modos de comportar-se?

Pois o mesmo acontece na conduta de um bom filho de Deus. Chega-se também, sem se saber como nem por que caminho, a esse endeusamento maravilhoso que nos ajuda a olhar os acontecimentos com o relevo sobrenatural da fé; amam-se todos os homens como o nosso Pai do Céu os ama e - isto é o que mais importa - consegue-se um brio novo no esforço quotidiano para nos aproximarmos do Senhor. As misérias não têm importância, insisto, porque aí estão ao nosso lado os braços amorosos do nosso Pai Deus para nos levantar.

Se reparardes bem, é muito diferente a queda de uma criança e a queda de uma pessoa crescida. Para as crianças, uma queda, em geral, não tem importância; tropeçam com tanta frequência! E se começam a chorar, o pai lembra-lhes: os homens não choram. Assim se encerra o incidente com o empenho do miúdo por contentar o seu pai.

Vede, pelo contrário, o que acontece quando um homem adulto perde o equilíbrio e cai no chão. Se não fosse por compaixão, provocaria hilariedade, riso. Mas, além disso, a queda talvez tenha consequências graves e, num ancião, pode mesmo produzir uma fractura irreparável. Na vida interior, a todos nos convém ser quasi modo geniti infantes, como esses miuditos que parecem de borracha, que se divertem até com os seus trambolhões, porque imediatamente se põem de pé e continuam com as suas correrias e também porque não lhes falta, quando é precisa, a consolação dos pais.

Se procurarmos portar-nos como eles, os tropeções e os fracassos - aliás inevitáveis - na vida interior, nunca se transformarão em amargura. Reagiremos com dor, mas sem desânimo, e com um sorriso que brota, como a água límpida, da alegria da nossa condição de filhos desse Amor, dessa grandeza, dessa sabedoria infinita, dessa misericórdia, que é o nosso Pai. Aprendi durante os meus anos de serviço ao Senhor a ser filho pequeno de Deus. E isto vos peço: que sejais quasi modo geniti infantes, meninos que desejam a palavra de Deus, o pão de Deus, o alimento de Deus, a fortaleza de Deus para se comportarem de agora em diante, como homens cristãos.


Pequena agenda do cristão

SeGUNDa-Feira

Pequena agenda do cristão

(Coisas muito simples, curtas, objectivas)



Propósito:
Sorrir; ser amável; prestar serviço.

Senhor que eu faça "boa cara" que seja alegre e transmita aos outros, principalmente em minha casa, boa disposição.

Senhor que eu sirva sem reserva de intenção de ser recompensado; servir com naturalidade; prestar pequenos ou grandes serviços a todos mesmo àqueles que nada me são. Servir fazendo o que devo sem olhar à minha pretensa “dignidade” ou “importância” “feridas” em serviço discreto ou desprovido de relevo, dando graças pela oportunidade de ser útil.

Lembrar-me:
Papa, Bispos, Sacerdotes.

Que o Senhor assista e vivifique o Papa, santificando-o na terra e não consinta que seja vencido pelos seus inimigos.

Que os Bispos se mantenham firmes na Fé, apascentando a Igreja na fortaleza do Senhor.

Que os Sacerdotes sejam fiéis à sua vocação e guias seguros do Povo de Deus.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?

30/08/2020

Reflexão – Perfeição



A ânsia de perfeição, sendo legítima e boa, não deve desviar a atenção de fazer o que se deve em cada momento mesmo que pareça "comezinho" e de pouco relevo.



(AMA, reflexão, 2020)




A castidade é uma virtude


Escreveste-me, médico apóstolo: "Todos sabemos por experiência que podemos ser castos, vivendo vigilantes, frequentando os Sacramentos e apagando as primeiras chispas da paixão, sem deixar que a fogueira ganhe corpo. É precisamente entre os castos que se contam os homens mais íntegros, sob todos os aspectos. E entre os luxuriosos predominam os tímidos, os egoístas, os falsários e os cruéis, que são características de pouca virilidade". (Caminho, 124)

Não deves limitar-te a fugir da queda ou da ocasião, nem o teu comportamento deve reduzir-se, de maneira alguma, a uma negação fria e matemática. Já te convenceste de que a castidade é uma virtude e, como tal, deve desenvolver-se e aperfeiçoar-se? Não basta ser continente, cada um segundo o seu estado. Insisto: temos de viver castamente, com virtude heróica. Este comportamento é um acto positivo, com o qual aceitamos de boa vontade o pedido de Deus: Præbe, fili mi, cor tuum mihi et oculi tui vias meas custodiant, entrega-me, meu filho, o teu coração e espraia os teus olhos pelos meus campos de paz.
Pergunto-te eu, agora: como encaras tu esta batalha? Bem sabes que a luta já está vencida, se a mantivermos desde o princípio. Afasta-te imediatamente do perigo, mal percebas as primeiras chispas de paixão, e até antes. Fala, além disso, com quem dirige a tua alma; se possível antes, porque abrindo o coração de par em par não serás derrotado. Um acto repetido várias vezes cria um hábito, uma inclinação, uma facilidade. É preciso, pois, batalhar para alcançar o hábito da virtude, o hábito da mortificação, para não recusar o Amor dos Amores.
Meditai no conselho de S. Paulo a Timóteo: Te ipsum castum custodi, conserva-te a ti mesmo puro, para estarmos, também, sempre vigilantes, decididos a defender o tesouro que Deus nos entregou. Ao longo da minha vida, quantas e quantas pessoas não ouvi queixarem-se: Ah! Se eu tivesse cortado ao princípio! E diziam-no cheias de aflição e de vergonha. (Amigos de Deus, 182)


Perguntas e respostas

B. O MAIOR DOS IDEAIS

6.

Pergunto:

Exemplo de ideais que sirvam aos ateus?

Respondo:

O desejo de adquirir qualidades é sempre bom, também para os ateus, pois é melhor coleccionar qualidades a defeitos. Ao fim e ao cabo, ou se alcança uma qualidade ou o vício correspondente. Ou se é amável trabalhador e serviçal ou não se é. E perante a escolha, escolhamos o bem.

Leitura espiritual 30 Agosto



Cartas de São Paulo

Efésios - 1

Apresentação –
1 Paulo, Apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus, aos santos e fiéis em Cristo Jesus que estão em Éfeso: 2 a vós, graça e paz da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo.

I. A IGREJA E O EVANGELHO

Deus salva-nos por Cristo
3 Bendito seja o Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que no alto do Céu nos abençoou com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo. 4 Foi assim que Ele nos escolheu em Cristo antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis na sua presença, no amor. 5 Predestinou-nos para sermos adoptados como seus filhos por meio de Jesus Cristo, de acordo com o beneplácito da sua vontade, 6 para que seja prestado louvor à glória da sua graça, que gratuitamente derramou sobre nós, no seu Filho bem amado. 7 É em Cristo, pelo seu sangue, que temos a redenção, o perdão dos pecados, em virtude da riqueza da sua graça, 8 que Ele abundantemente derramou sobre nós, com toda a sabedoria e inteligência. 9 Manifestou-nos o mistério da sua vontade, e o plano generoso que tinha estabelecido, 10 para conduzir os tempos à sua plenitude: submeter tudo a Cristo, reunindo nele o que há no céu e na terra. 11 Foi também em Cristo que fomos escolhidos como sua herança, predestinados de acordo com o desígnio daquele que tudo opera, de acordo com a decisão da sua vontade, 12 para que nos entreguemos ao louvor da sua glória, nós, que previamente pusemos a nossa esperança em Cristo. 13 Foi nele, ainda, que vós ouvistes a palavra da verdade, o Evangelho que vos salva. Foi nele ainda que acreditastes e fostes marcados com o selo do Espírito Santo prometido, 14 o qual é garantia da nossa herança, para que dela tomemos posse, na redenção, para louvor da sua glória.

Cristo, plenitude do Universo –
15 Por isso, também eu, desde que ouvi falar da vossa fé no Senhor Jesus e do vosso amor para com todos os santos, 16 não cesso de dar graças a Deus por vós, quando vos recordo nas minhas orações. 17 Que o Deus de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai a quem pertence a glória, vos dê o Espírito de sabedoria e vo-lo revele, para o conhecerdes; 18 sejam iluminados os olhos do vosso coração, para saberdes que esperança nos vem do seu chamamento, que riqueza de glória contém a herança que Ele nos reserva entre os santos 19 e como é extraordinariamente grande o seu poder para connosco, os crentes, de acordo com a eficácia da sua força poderosa, 20 que eficazmente exerceu em Cristo: ressuscitou-o dos mortos e sentou-o à sua direita, no alto do Céu, 21 muito acima de todo o Poder, Principado, Autoridade, Potestade e Dominação e de qualquer outro nome que seja nomeado, não só neste mundo, mas também no que há-de vir. 22 Sim, Ele tudo submeteu a seus pés e deu-o, como cabeça que tudo domina, à Igreja, 23 que é o seu Corpo, a plenitude daquele que tudo preenche em todos.


Amigos de Deus

140           
Talvez até agora não nos tivéssemos sentido urgidos a seguir tão de perto os passos de Cristo. Talvez não nos tivéssemos apercebido de que podemos unir ao seu sacrifício reparador as nossas pequenas renúncias: pelos nossos pecados, pelos pecados dos homens de todas as épocas, por esse trabalho malvado de Lúcifer que continua a opor a Deus o seu non serviam! Como nos atreveremos a clamar sem hipocrisia: Senhor, doem-me as ofensas que ferem o teu Coração amabilíssimo, se não nos decidimos a privar--nos de uma ninharia ou a oferecer um sacrifício minúsculo em honra do seu Amor? A penitência - verdadeiro desagravo - lança-nos pelo caminho da entrega, da caridade. Entrega para reparar e caridade para ajudar os outros, como Cristo nos ajudou a nós.

De agora em diante, tende pressa de amar. O amor impedir-nos-á a queixa e o protesto. Porque com frequência suportamos a contrariedade, sim; mas lamentamo-nos; e então, além de desperdiçar a graça de Deus, cortamos-lhe as mãos para futuros pedidos. Hilarem enim datorem diligit Deus. Deus ama o que dá com alegria, com a espontaneidade que nasce de um coração enamorado, sem os espalhafatos de quem se entrega como se prestasse um favor.

141           
Torna a olhar de novo para a tua vida e pede perdão por esse pormenor e aquele outro que saltam imediatamente aos olhos da tua consciência; pelo mau uso que fazes da língua; por esses pensamentos que giram continuamente à volta de ti mesmo; por esse juízo crítico consentido que te preocupa tontamente, causando-te uma contínua inquietação e pesadelo... Podeis ser muito felizes! O Senhor quer-nos contentes, ébrios de alegria, andando pelos mesmos caminhos de felicidade que Ele percorreu! Só nos sentimos desgraçados quando nos empenhamos em sair do caminho e em meter por esse atalho do egoísmo e da sensualidade; e muito pior ainda se entramos no dos hipócritas.

O cristão tem de manifestar-se autêntico, veraz, sincero em todas as suas obras. Na sua conduta deve transparecer um espírito: o de Cristo. Se alguém tem neste mundo a obrigação de mostrar-se consequente, é o cristão, porque recebeu em depósito, para fazer frutificar esse dom, a verdade que liberta e salva. Padre, perguntar-me-eis, e como conseguirei essa sinceridade de vida? Jesus Cristo entregou à sua Igreja todos os meios necessários: ensinou-nos a rezar, a conviver com o Seu Pai Celestial; enviou-nos o Seu Espírito, o Grande Desconhecido, que actua na nossa alma; deixou-nos esses sinais visíveis da graça que são os sacramentos. Usa-os. Intensifica a tua vida de piedade. Faz oração todos os dias. E não afastes nunca os teus ombros do peso gostoso da Cruz do Senhor.

Foi Jesus quem te convidou a segui-lo como bom discípulo, com o fim de realizares a tua passagem pela terra semeando a paz e a alegria que o mundo não pode dar. Para isso - insisto - tens de andar sem medo à vida e sem medo à morte, sem fugir a todo o custo da dor que, para o cristão, é sempre um meio de purificação e ocasião de amar verdadeiramente os seus irmãos, aproveitando as mil circunstâncias da vida ordinária.

Passou o tempo. Tenho que pôr termo a estas considerações, com as quais tentei mover a tua alma, para que respondesses concretizando alguns propósitos, poucos, mas bem determinados. Pensa que Deus te quer contente e que, se dás da tua parte o que podes, serás feliz, muito feliz, felicíssimo, mesmo que em nenhum momento te falte a Cruz. Mas essa Cruz já não é um patíbulo, mas o trono no qual reina Cristo. E a Seu lado, Sua Mãe, nossa Mãe também. A Virgem Santa alcançar-te-á a fortaleza que necessitas para seguir com decisão os passos de seu Filho.

142           
O Domingo in albis traz-me à memória uma velha e piedosa tradição da minha terra. Neste dia, em que a liturgia convida a desejar o alimento espiritual - rationabile, sine dolo lac concupiscite, desejai ardentemente o puro leite espiritual - era costume levar a Sagrada Comunhão aos doentes, mesmo que não se tratasse de casos graves, para que pudessem cumprir o preceito pascal.

Nalgumas cidades grandes, cada paróquia organizava uma procissão eucarística. Recordo que, nos meus anos de estudante universitário, era habitual cruzarem-se no Coso de Saragoça três comitivas em que só iam homens, milhares de homens, com grandes círios a arder. Eram homens vigorosos que acompanhavam o Senhor Sacramentado com uma fé maior do que aquelas grandes velas que pesavam muitos quilos.

Esta noite, tendo acordado várias vezes, repeti, como jaculatória, quasi modo geniti infantes, como meninos recém-nascidos... Pensava que esse convite da Igreja vem muito a propósito para todos os que sentimos a realidade da filiação divina, porque nos convém ser muito rijos, fortes, gente de têmpera capaz de influir em qualquer ambiente em que nos encontremos. E, no entanto, diante de Deus, é tão bom que nos consideremos filhos pequenos!

Somos filhos de Deus

Quasi modo geniti infantes, rationabile, sine dolo lac concupiscite, como meninos que acabam de chegar ao mundo, gritai pelo leite limpo e puro do espírito. É extraordinário este versículo de S. Pedro, e entendo muito bem que logo a seguir a liturgia tenha acrescentado: exsultate Deo, adiutori nostro: iubilate Deo Iacob; alegrai-vos em Deus, nosso protector: aclamai o Deus de Jacob, que é também Senhor e Pai Nosso. Mas não pretendia que vós e eu meditássemos hoje sobre o Santo Sacramento do Altar, que arranca dos nossos corações os mais altos louvores a Jesus. Preferia que nos detivéssemos nessa certeza da filiação divina e nalgumas das suas consequências para todos os que pretendem viver com nobre empenho a sua fé cristã.

143           
Por motivos que não vem a propósito referir - mas que são bem conhecidos de Jesus, que aqui temos a presidir no Sacrário - a vida tem-me levado a sentir-me de um modo muito especial filho de Deus. Tenho saboreado a alegria de me meter no coração de meu Pai, para rectificar, para me purificar, para o servir, para compreender e desculpar a todos, tendo como base o seu amor e a minha humilhação.

Por isso, desejo agora insistir na necessidade de nos renovarmos, vós e eu, de despertarmos do sono da tibieza que tão facilmente nos amodorra e de voltarmos a entender, de maneira mais profunda e ao mesmo tempo mais imediata, a nossa condição de filhos de Deus.

O exemplo de Jesus, toda a vida de Cristo por aquelas terras do Oriente ajuda-nos a deixarmo-nos penetrar por essa verdade. Se admitimos o testemunho dos homens - lemos na Epístola - de maior autoridade é o testemunho de Deus. E em que consiste o testemunho de Deus? De novo fala S. João: Considerai o amor que nos mostrou o Pai em querer que nos chamemos filhos de Deus, e que o sejamos... Caríssimos, agora já somos filhos de Deus.

Ao longo dos anos, tenho procurado apoiar-me sem desfalecimento nesta feliz realidade. Em todas as circunstâncias, a minha oração tem sido a mesma com tonalidades diferentes. Tenho-lhe dito: Senhor, Tu colocaste-me aqui; Tu confiaste-me isto ou aquilo, e eu confio em Ti. Sei que és meu Pai e tenho visto sempre que as crianças confiam absolutamente nos pais. A minha experiência sacerdotal tem-me confirmado que este abandono nas mãos de Deus leva as almas a adquirir uma piedade forte, profunda e serena, que impele a trabalhar constantemente com rectidão de intenção.

 


Deus ama quem dá com alegria

Sofres! Pois olha: "Ele" não tem o coração mais pequeno do que o nosso. - Sofres? É porque convém. (Caminho, 230)

Advirto-te que as grandes penitências são compatíveis também com as quedas espalhafatosas, provocadas pela soberba. Em contrapartida, com o desejo contínuo de agradar a Deus nas pequenas batalhas pessoais - como sorrir quando não se tem vontade: asseguro-vos, aliás, que em certas ocasiões torna-se mais custoso um sorriso do que uma hora de cilício - é difícil alimentar o orgulho, a ridícula ingenuidade de nos considerarmos heróis notáveis: ver-nos-emos como uma criança que apenas consegue oferecer ninharias ao seu pai, que as recebe, no entanto, com imensa alegria.

Então, um cristão há-de ser sempre mortificado? Sim, mas por amor. (...) Talvez até agora não nos tivéssemos sentido urgidos a seguir tão de perto os passos de Cristo. Talvez não nos tivéssemos apercebido de que podemos unir ao seu sacrifício reparador as nossas pequenas renúncias: pelos nossos pecados, pelos pecados dos homens de todas as épocas, por esse trabalho malvado de Lúcifer que continua a opor a Deus o seu non serviam! Como nos atreveremos a clamar sem hipocrisia: Senhor, doem-me as ofensas que ferem o teu Coração amabilíssimo, se não nos decidimos a privar-nos de uma ninharia ou a oferecer um sacrifício minúsculo em honra do seu Amor? A penitência - verdadeiro desagravo - lança-nos pelo caminho da entrega, da caridade. Entrega para reparar e caridade para ajudar os outros, como Cristo nos ajudou a nós.

De agora em diante, tende pressa de amar. O amor impedir-nos-á a queixa e o protesto. Porque com frequência suportamos a contrariedade, sim; mas lamentamo-nos; e então, além de desperdiçar a graça de Deus, cortamos-lhe as mãos para futuros pedidos. Hilarem enim datorem diligit Deus. Deus ama o que dá com alegria, com a espontaneidade que nasce de um coração enamorado, sem os espalhafatos de quem se entrega como se prestasse um favor. (Amigos de Deus, 139-140)




Pequena agenda do cristão

DOMINGO

PEQUENA AGENDA DO CRISTÃO

(Coisas muito simples, curtas, objectivas)



Propósito:
Viver a família.

Senhor, que a minha família seja um espelho da Tua Família em Nazareth, que cada um, absolutamente, contribua para a união de todos pondo de lado diferenças, azedumes, queixas que afastam e escurecem o ambiente. Que os lares de cada um sejam luminosos e alegres.

Lembrar-me:
Cultivar a Fé

São Tomé, prostrado a Teus pés, disse-te: Meu Senhor e meu Deus!
Não tenho pena nem inveja de não ter estado presente. Tu mesmo disseste: Bem-aventurados os que crêem sem terem visto.
E eu creio, Senhor.
Creio firmemente que Tu és o Cristo Redentor que me salvou para a vida eterna, o meu Deus e Senhor a quem quero amar com todas as minhas forças e, a quem ofereço a minha vida. Sou bem pouca coisa, não sei sequer para que me queres mas, se me crias-te é porque tens planos para mim. Quero cumpri-los com todo o meu coração.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?



[i] Cfr. Lc 1, 38
[ii] AMA, orações pessoais
[iii] AMA, orações pessoais
[iv] AMA, orações pessoais
[v] Btº Álvaro del Portillo (oração pessoal)























[i] AMA orações pessoais
[ii] AMA orações pessoais
[iii] AMA orações pessoais
[iv] AMA orações pessoais
[v] AMA orações pessoais
[vi] Santa Teresa de Jesus

29/08/2020

A oração: "conversa amorosa com Jesus"


Sempre entendi a oração do cristão como uma conversa amorosa com Jesus, que não se deve interromper nem sequer nos momentos em que fisicamente estamos longe do Sacrário, porque toda a nossa vida está feita de coplas de amor humano divinizado..., e podemos amar sempre. (Forja, 435)

Que não faltem no nosso dia alguns momentos dedicados especialmente a travar intimidade com Deus, elevando até Ele o nosso pensamento, sem que as palavras tenham necessidade de vir aos lábios, porque cantam no coração. Dediquemos a esta norma de piedade um tempo suficiente, a hora fixa, se possível. Ao lado do Sacrário, acompanhando Aquele que ali ficou por Amor. Se não houver outro remédio, em qualquer lugar, porque o nosso Deus está de modo inefável na nossa alma em graça. Aconselho-te, contudo, a que vás ao oratório sempre que possas. (...)
Cada um de vós, se quiser, pode encontrar o caminho que lhe for mais propício para este colóquio com Deus. Não me agrada falar de métodos nem de fórmulas, porque nunca fui amigo de espartilhar ninguém; tenho procurado animar todas as pessoas a aproximarem-se do Senhor, respeitando cada alma tal como ela é, com as suas próprias características. Pedi-lhe vós que meta os seus desígnios na nossa vida: e não apenas na nossa cabeça, mas no íntimo do nosso coração e em toda a nossa actividade externa. Garanto-vos que deste modo evitareis grande parte dos desgostos e das penas do egoísmo e sentir-vos-eis com força para propagar o bem à vossa volta. Quantas contrariedades desaparecem, quando interiormente nos colocamos muito próximos deste nosso Deus, que nunca nos abandona! Renova-se com diversos matizes esse amor de Jesus pelos seus, pelos doentes, pelos entrevados, quando pergunta: que se passa contigo? Comigo... E, logo a seguir, luz ou, pelo menos, aceitação e paz.
Ao convidar-te para fazeres essas confidências com o Mestre, refiro-me especialmente às tuas dificuldades pessoais, porque a maioria dos obstáculos para a nossa felicidade nascem de uma soberba mais ou menos oculta. Pensamos que temos um valor excepcional, qualidades extraordinárias. Mas, quando os outros não são da mesma opinião, sentimo-nos humilhados. É uma boa ocasião para recorrer à oração e para rectificar, com a certeza de que nunca é tarde para mudar a rota. Mas é muito conveniente iniciar essa mudança de rumo quanto antes. (Amigos de Deus, 249).


Leitura espiritual 29 Agosto



Cartas de São Paulo

Gálatas - 6

Caridade fraterna –
1 Irmãos, se porventura um homem for apanhado nalguma falta, vós, que sois espirituais, corrigi essa pessoa com espírito de mansidão; e tu olha para ti próprio, não estejas também tu a ser tentado. 2 Carregai as cargas uns dos outros e assim cumprireis plenamente a lei de Cristo. 3 É que, se alguém julga ser alguma coisa, nada sendo, engana-se a si mesmo. 4 Mas examine cada um a sua própria acção, e então o motivo de glória que encontrar, tê-lo-á em relação a si próprio e não em relação ao outro. 5 Pois cada um terá de carregar o próprio fardo. 6 Mas quem está a ser instruído na Palavra esteja em comunhão com aquele que o instrui, em todos os bens. 7 Não vos enganeis: de Deus não se zomba. Pois o que um homem semear, também o há-de colher: 8 quem semear na própria carne, da carne colherá a corrupção; quem semear no Espírito, do Espírito colherá a vida eterna. 9 E não nos cansemos de fazer o bem; porque, a seu tempo colheremos, se não tivermos esmorecido. 10 Portanto, enquanto temos tempo, pratiquemos o bem para com todos, mas principalmente para com os irmãos na fé.

CONCLUSÃO

11 Vede com que grandes letras vos escrevo pela minha mão! 12 Todos quantos querem fazer boa figura, são esses que vos forçam a circuncidar-vos, só para não serem perseguidos por causa da cruz de Cristo. 13 Pois nem mesmo aqueles que se circuncidam observam a Lei; mas o que querem é que vos circuncideis, para se poderem gloriar na vossa carne. 14 Quanto a mim, porém, de nada me quero gloriar, a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo. 15 Pois nem a circuncisão vale alguma coisa nem a incircuncisão, mas sim uma nova criação. 16 Paz e misericórdia para todos quantos seguirem esta regra, bem como para o Israel de Deus. 17 De agora em diante ninguém mais me venha perturbar; pois eu levo no meu corpo as marcas de Jesus. 18 A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja com o vosso Espírito, irmãos! Ámen.


Amigos de Deus

135           
Tomemos outros exemplos, também da vida corrente. S. Paulo menciona-os: todos os que combatem na arena de tudo se abstêm, para alcançar uma coroa corruptível; nós, porém esperamos uma incorruptível. Basta deitar um olhar à nossa volta. Reparai a quantos sacrifícios se submetem de boa ou má vontade, eles e elas, para cuidar do corpo, para defender a saúde, para conseguir a estima alheia... Não seremos nós capazes de nos comover perante esse imenso amor de Deus, tão mal correspondido pela humanidade, mortificando o que tiver de ser mortificado, para que a nossa mente e o nosso coração vivam mais pendentes do Senhor?

Alterou-se de tal forma o sentido cristão em muitas consciências que, ao falar de mortificação e de penitência, se pensa apenas nesses grandes jejuns e cilícios que se mencionam nos admiráveis relatos de algumas biografias de santos. Ao iniciar esta meditação, aceitámos a premissa evidente de que temos de imitar Jesus Cristo, como modelo de conduta. É certo que Ele preparou o começo da sua pregação retirando-se para o deserto, a fim de jejuar durante quarenta dias e quarenta noites, mas antes e depois praticou a virtude da temperança com tanta naturalidade, que os seus inimigos aproveitaram para rotulá-lo caluniosamente de «glutão e bebedor de vinho, amigo dos publicanos e dos pecadores

136           
Interessa-me que descubrais em toda a sua profundidade esta simplicidade do Mestre, que não faz alarde da sua vida penitente, porque isso mesmo te pede Ele a ti: quando jejuais, não vos mostreis tristes como os hipócritas, que desfiguram os seus rostos para mostrar aos homens que jejuam. Na verdade vos digo que já receberam a sua recompensa. Mas tu, quando jejuas, unge a tua cabeça e lava o teu rosto, a fim de que não pareça aos homens que jejuas, mas a teu Pai, que está presente ao que há de mais secreto, e teu Pai, que vê no secreto, te dará a recompensa.

Assim te deves exercitar no espírito de penitência: na presença de Deus e como um filho, como o pequenito que demonstra a seu pai quanto o ama, renunciando aos seus poucos tesouros de escasso valor - um carro de linhas, um soldado sem cabeça, uma carica; custa-lhe dar esse passo, mas no fim o carinho pode mais e estende satisfeito a mão.

137           
Permiti-me que vos repita uma e outra vez o caminho que Deus espera que cada um percorra, quando nos chama para o servir no meio do mundo, para santificar e nos santificarmos através das ocupações normais. Com um sentido comum colossal, ao mesmo tempo cheio de fé, pregava S. Paulo que na lei de Moisés está escrito: não atarás a boca ao boi que debulha o grão.

E pergunta-se: Porventura preocupar-se-á Deus com os bois? Ou, pelo contrário, dirá isto sobretudo por nós? Sim, com certeza que se escreveram estas coisas por nós; porque a esperança faz lavrar o que lavra, e o que debulha fá-lo com esperança de participar dos frutos.

Nunca se reduziu a vida cristã a uma trama angustiante de obrigações, que deixa a alma submetida a uma desesperada tensão; a vida cristã adapta-se às circunstâncias individuais como a luva à mão e pede que no exercício das nossas tarefas habituais, nas grandes e nas pequenas, na oração e na mortificação, não percamos nunca o ponto de vista sobrenatural. Pensai que Deus ama apaixonadamente as suas criaturas, e como trabalhará o burro se não se lhe dá de comer nem dispõe de tempo para restaurar as forças ou se se quebranta o seu vigor com excessivas pauladas? O teu corpo é como um burrico - um burrico foi o trono de Deus em Jerusalém - que te carrega pelos caminhos divinos da terra: é necessário dominá-lo para que não se afaste dos caminhos de Deus e animá-lo para que o seu trote seja o mais alegre e brioso que se pode esperar de um jumento.

138           
Espírito de penitência

Procuras tomar já a tua resolução de propósitos sinceros? Pede ao Senhor que te ajude a sacrificares-te pelo seu amor; a pôr em tudo, com naturalidade, o aroma purificador da mortificação; a gastares-te ao seu serviço, sem espectáculo, silenciosamente, como se consome a lamparina que tremeluz junto do Tabernáculo. E se agora não te ocorre como responder concretamente aos apelos divinos que se fazem ouvir no teu coração, ouve-me bem.

Penitência é o cumprimento exacto do horário que te fixaste, mesmo que o corpo resista ou a mente pretenda evadir-se com sonhos quiméricos. Penitência é levantares-te pontualmente. E também, não deixar para mais tarde, sem motivo justificado, essa tarefa que te é mais difícil ou custosa.

A penitência está em saber compaginar as tuas obrigações relativas a Deus, aos outros e a ti próprio, exigindo-te, de modo que consigas encontrar o tempo necessário para cada coisa. És penitente quando te submetes amorosamente ao teu plano de oração, apesar de estares cansado, sem vontade ou frio.

Penitência é tratar sempre os outros com a maior caridade, começando pelos teus. É atender com a maior delicadeza os que sofrem, os doentes e os que padecem. É responder com paciência aos maçadores e inoportunos. É interromper ou modificar os nossos programas, quando as circunstâncias - sobretudo os interesses bons e justos dos outros - assim o requerem.

A penitência consiste em suportar com bom humor as mil pequenas contrariedades do dia; em não abandonar o trabalho, mesmo que no momento te tenha passado o entusiasmo com que o começaste; em comer com agradecimento o que nos servem, sem caprichos importunos.

Penitência, para os pais e, em geral, para os que têm uma missão de dirigir ou de educar é corrigir quando é necessário fazê-lo, de acordo com a natureza do erro e com as condições de quem necessita dessa ajuda, superando subjectivismos néscios e sentimentais.

O espírito de penitência leva a não nos apegarmos desordenadamente a esse esboço monumental dos projectos futuros, no qual já previmos quais serão os nossos traços e pinceladas mestras. Que alegria damos a Deus quando sabemos renunciar aos nossos gatafunhos e pinceladas, e permitimos que seja Ele a acrescentar os traços e cores que mais lhe agradam!

139           
Poderia continuar a assinalar-te uma quantidade de pormenores - citei-te apenas os que agora me vieram à cabeça - que podes aproveitar ao longo do dia, para te aproximares mais de Deus e mais do teu próximo. Se te mencionei esses exemplos, insisto, não é porque despreze as grandes penitências; pelo contrário, mostram-se santas e boas, e até necessárias, quando o Senhor chama por esse caminho, contando sempre com a aprovação de quem dirige a tua alma. Mas advirto-te que as grandes penitências são compatíveis também com as quedas espalhafatosas, provocadas pela soberba. Em contrapartida, com esse desejo contínuo de agradar a Deus nas pequenas batalhas pessoais - como sorrir quando não se tem vontade: asseguro-vos, aliás, que em certas ocasiões torna-se mais custoso um sorriso do que uma hora de cilício - é difícil alimentar o orgulho, a ridícula ingenuidade de nos considerarmos heróis notáveis: ver-nos-emos como uma criança que apenas consegue oferecer ninharias ao seu pai, que as recebe, no entanto, com imensa alegria.

Então, um cristão há-de ser sempre mortificado? Sim, mas por amor. Porque este tesouro da nossa vocação levamo-lo em vasos de barro, para que se veja bem que esse extraordinário poder vem de Deus e não de nós. Em tudo sofremos tribulação, mas não somos oprimidos; somos cercados de dificuldades, mas não desesperamos; somos perseguidos, mas não desamparados; somos abatidos, mas não perecemos, trazendo sempre em nosso corpo os traços da morte de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste nos nossos corpos.